Eu conheci os meus quatro avôs. A gente tinha uma avó que não gostava de ser chamada de avó, então a gente a chamava de “mãe gostosa”. Ela era pequenina, ágil, trabalhadora. O meu avô era mais rude, severo, meio ruim, uma pessoa que acho que não foi criada com tanto carinho.
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Eu conheci os meus quatro avôs. A gente tinha uma avó que não gostava de ser chamada de avó, então a gente a chamava de “mãe gostosa”. Ela era pequenina, ágil, trabalhadora. O meu avô era mais rude, severo, meio ruim, uma pessoa que acho que não foi criada com tanto carinho.
O sítio onde a gente nasceu era dos meus avós. A minha avó desse lado materno jogava no bicho, pedia dinheiro emprestado para jogar no bicho. Era uma pessoa muito boa, de uma casa que fica na memória, com um jardinzinho na frente, com muro baixinho. A minha avó criava cabrita, a gente gostava tirar leite da cabrita. Ela fazia farinha...era algo que fica na memória.
Meu pai sempre trabalhou no sitio, na roça. A gente sempre ajudou, dentro das possibilidades. Meu avô dizia que mulheres não precisavam estudar, mas cuidar dos deveres, do marido. Mas minha mãe não aceitava. Pela vontade dela, todos os filhos são estudados hoje. Com muita dificuldade, ganhando dinheiro com as coisas da roça: plantava, fazia manteiga, fazia lingüiça.
O sítio era a oito quilômetros da cidade, e às vezes a gente ia a pé mesmo. Até que uma vez meu irmão requisitou um passe da prefeitura e a partir daí a gente não pagava mais passe. Mas foi uma vida gostosa. A gente se juntava com uma outra família que foi criada com a nossa, e em noite de lua cheia a gente fazia muita farra. Tinha muitas brincadeiras que dava pra fazer juntos com esses “primos” que foram criados com a gente. Eu sempre gostei mais de brincar com os meninos. A gente pegava os caminhões e ia seguindo pela areia como se fossem estradas e viadutos; era tudo como se fosse de verdade. Aquilo era a nossa realidade.
Da casa até a estrada eram uns quinhentos metros de pasto. Depois pegava o ônibus. De mais velha, eu ouvia o motorista do ônibus dizer “Nossa, uma mocinha andando no meio do mato de noite”. Então ele iluminava com o farol pra gente atravessar o caminho do mato. Mas não tinha problema, tinha uma segurança, uma coisa gostosa de sítio.
A gente possuía só um rádio para ouvir as músicas de sucesso. A gente ficava ouvindo música, olhando a lua de noite, pensando nos namorados, nos paqueras do baile. Geralmente nos fins de semana tinha baile. Meu irmão toca sanfona e ele tocava nos bailes. Ele chegou a tocar nas rádios, fazer programas. Foi muito legal.
O meu sonho de pequena era vir pra São Paulo, crescer, ver coisas diferentes. Eu nunca gostei de coisas repetitivas. Hoje, o meu sonho praticamente está realizado, que é ver as minhas filhas bem. Eu estou até emocionada porque uma filha está estudando fora, e eu tenho muita saudade, mas ela está bem. E esse é meu sonho, ver o caminho delas seguindo.Recolher