IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Sergio Michelucci Rodrigues. Nasci em Porto Alegre, no dia três de maio de 1951. FAMÍLIA Os meus pais se chamavam Ney Serres Rodrigues e Inês Michelucci Rodrigues. Meus avós maternos, Luigi Michellucci e Lina Vegni; e os avós paternos, Horaides e M...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Sergio Michelucci Rodrigues. Nasci em Porto Alegre, no dia três de maio de 1951.
FAMÍLIA Os meus pais se chamavam Ney Serres Rodrigues e Inês Michelucci Rodrigues. Meus avós maternos, Luigi Michellucci e Lina Vegni; e os avós paternos, Horaides e Manoel de Oliveira Rodrigues. Meu avô paterno criava gado no interior do Rio Grande do Sul, ele tinha uma pequena propriedade rural. E o avô materno tinha uma serralheria em São Paulo, onde fazia artefatos em metal. Meus avós maternos são imigrantes italianos. Vieram da região de Lucca, na Itália, por volta de 1930, imagino eu. Não tenho essa data certa. E a família do meu pai é do interior do Rio Grande do Sul, desde os primórdios. Tenho mais cinco irmãos. Todos eles residem no Rio Grande do Sul.
BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA
Minha infância foi em Porto Alegre e durante as férias, às vezes, ia para Alegrete, para a chácara da avó.
Em Porto Alegre, durante a infância toda, sempre moramos em casa. Desde pequeno, morei em vários bairros de Porto Alegre. Me lembro bem que, durante muito tempo, moramos em frente ao Estádio Olímpico do Grêmio de Futebol Porto-alegrense, que é o meu time do coração até hoje. A gente passava muito tempo lá, brincando no Estádio Olímpico. Em Alegrete, tinha uma chácara onde a avó morava. Era bem interessante porque ela criava umas cabeças de gado leiteiro e vendia leite. Então, era uma atividade ir de manhã cedo buscar o gado, botar no curral, ajudar a tirar leite. Era bem divertido. E tinha aquelas brincadeiras de criança daquela época, que hoje são politicamente incorretas, como caçar passarinho e coisas do gênero. Era o que se fazia na época.
Imagina, numa chácara no meio do campo, fazia-se de um tudo. Excursões para os morros, explorar áreas distantes de casa. Nenhuma criança hoje em dia faz mais isso, né? Tiro pelos meus filhos. Eu moro em São Francisco. Eles se criaram ali desde pequenos. Tem um parque da cidade, um morro imenso. Eu acho que eles jamais subiram naquele morro, jamais subiram em uma árvore, jamais mataram um passarinho também. Ninguém mais mata passarinho hoje. Andar de bicicleta na rua era outra atividade que se fazia com a maior naturalidade. Sair de casa, de férias, de manhã cedo e voltar no fim da tarde. E tinha a surra da mãe, que, hoje em dia, também não tem.
Durante a minha infância, o cotidiano era ver meu pai saindo cedo, voltando tarde. Ele era dentista e professor, tinha uma jornada de trabalho sempre muito longa. E a mãe sempre dedicada aos seis filhos. Minha mãe casou muito cedo, eu digo sempre para a minha filha, que hoje tem 24 anos: “Olha, tua avó na tua idade já tinha seis filhos, um marido, cuidava de tudo. Tu achas que se tu estudas hoje, por isso tem que ter todas as regalias? Antigamente não era bem assim não, né?” Mas, então, era isso daí. Cuidar do marido, do filho, quer dizer, a mãe naquela época participava muito. Se não estudasse, tinha aquela história do pai olhar o boletim, se as notas não estivessem adequadas, tinha o tratamento adequado. A minha rotina era ir para a escola de manhã, em geral, e à tarde fazer o dever de casa e ir para o meio da rua, jogar bola, explorar a cidade. Havia muita brincadeira no pátio com outros amigos de rua. A gente, durante boa parte da infância, morou em uma casa em Porto Alegre que tinha um pátio muito grande, um terreno muito grande. A gente fala pátio hoje, mas era um terreno muito grande, mais de 100 metros de fundo, onde tinha horta, tinha espaço para tudo. Então, eu ajudava a plantar, a cuidar da horta. Tinha as tarefas também, eu tinha que ajudar a limpar. Mesmo dentro de casa, naquela época, filho tinha tarefa para fazer, a gente que arrumava a cama. Mas era bastante legal. Foi um período muito bom de infância.
JUVENTUDE / LAZER A partir dos 14, 15 anos, eu comecei a praticar atletismo num dos clubes de Porto Alegre, a Sogipa, Sociedade de Ginástica de Porto Alegre. E me dediquei bastante ao atletismo, até praticamente acabar a faculdade. Quando entrei na Petrobras, aí parei de praticar. Mas, desde os 14 anos até a conclusão da universidade, do curso de Geologia, praticava atletismo. Para o Brasil, eu tinha um nível alto de treinamento. Eu fazia decatlo, que são 10 modalidades do atletismo. Cheguei a ser bicampeão brasileiro de adultos, em 1971 e em 1973, sendo que, em 73, eu bati o recorde brasileiro do decatlo. Depois, no final do curso, tinha projeto de conclusão de curso, então comecei a desacelerar. Mesmo assim, me mantive competindo até entrar na Petrobras. Aí fui para o campo e não tinha mais condições de fazer nada, fui para o meio do Amazonas. E, na época, não havia incentivo, esporte era por esporte, né? Hoje qualquer atleta que queira praticar em alto nível tem dedicação exclusiva, é uma pressão muito maior, muito mais difícil. Depende de uma série de fatores que, às vezes, não estão ao alcance da mão do atleta. Naquele tempo, o diferencial era basicamente a dedicação. Quem se dedicava, conseguia um bom tempo, conseguia um nível técnico alto. Mas hoje em dia não. Hoje tem patrocínio, toda uma série de condições, espaço para treinar, condições de treinamento, material específico. Além de praticar, é importante participar de competições no exterior para subir o nível técnico. O máximo que eu participei foi do Campeonato Sul-Americano de Atletismo. Participei de dois deles e dos Campeonatos Luso-Brasileiros, com Portugal, também. Foi um período muito bom.
ENSINO FUNDAMENTAL / ENSINO MÉDIO Eu lembro vagamente do jardim da infância no Colégio Nossa Senhora da Glória. Era um colégio de freiras. Lembro de ter que rezar. Ainda tenho a imagem de rezar no início das aulas. Embora eu não tenha religião hoje, mas lembro vagamente daquela época. Lembro das brincadeiras, do jardim da infância, basicamente. Mas chamava a atenção por causa das freiras, das missas, das rezas. Depois eu entrei para o grupo, o famoso grupo escolar que todo mundo entrava, o colégio municipal. Embora fosse um colégio bastante antigo, era um dos famosos prédios construídos pelos Brizola, que marcou o governo dele no Rio Grande do Sul por criar e construir muitas salas de aulas. E era um prédio mais ou menos padrão, de madeira. Eu me lembro das aulas de canto, sempre muito desafinado, mas havia aquelas histórias de fazer os testes para ver se era primeira, segunda ou terceira voz. Naquele período, já tinha uma coisa que causava pressão, o famoso exame de admissão, para sair do primário e ingressar no ginásio. Eu ingressei num dos colégios mais famosos, o Julio de Castilho, que era tido por colégio padrão do Rio Grande do Sul, era muito concorrido. Então, hoje, às vezes, a gente acha que a gurizada sofre uma pressão muito grande para entrar na universidade, mas eu acho que a gente, naquela época, também tinha alguns pontos de muita pressão. Mas também fui feliz. Havia professores mais rigorosos, obviamente. Os inspetores andavam pelos corredores e, qualquer coisa diferente, os inspetores estavam ali, na marcação cerrada. Obviamente, fazendo uma comparação com hoje, o respeito pelos professores era maior. Eu acho que hoje a gente não educa os nossos filhos, quer dizer, as pessoas não são tão reprimidas, tem vantagens e desvantagens, mas, às vezes, passa do limite, do ponto de vista do respeito da pessoa.
O colégio era muito bom, tinha professores bons, conceituados, dedicados. O colégio tinha laboratórios de física, de química. Mesmo no ginásio, já se tinha oportunidade de contar com alguns laboratórios muito bem equipados. E me lembro muito das aulas de educação física também, na época do ginásio e do
científico. As aulas não eram no colégio, eram lá no Parque da Redenção, no famoso Campo dos Cadetes. Tinha uma pista de atletismo e foi durante as aulas de educação física que um professor me descobriu para o atletismo, ensinando a arremessar peso, arremessar dardo, achou que eu tinha jeito. Foi ele que me encaminhou para o clube.
OPÇÃO: GEOLOGIA Não acredito que a experiência no colégio tenha influenciado na minha escolha profissional, porque até o momento de preencher a ficha do vestibular eu ainda estava em dúvida, o que eu acho natural para todo mundo. Embora tivesse feito uma série de testes para ver qual era a minha tendência, durante o científico, o resultado não dava tendência nenhuma. Podia ser advogado, podia ser arquiteto, podia ser engenheiro. Eu podia ser qualquer coisa. Eram aqueles testes vocacionais. E aí a Geologia foi mais por influência da mãe, não sei por que achava que “geólogo acha ou vai achar uma mina de ouro”. Então, eu acho que a maioria do pessoal que chega na hora do vestibular realmente não tem uma noção exata do que é a profissão que está escolhendo. Mas foi uma boa escolha, não tenho nada a reclamar. Foi em cima da hora: “O que é que eu vou ser agora?”
JUVENTUDE Como eu falei, minha juventude foi sempre muito ligada ao atletismo. Porque eu treinava, quer dizer, ia para escola estudar e, depois, ia para o clube treinar. E dentro do clube se formou um grupo muito legal que, além do atletismo, fazia uma série de outras atividades em conjunto. Quer dizer, os amigos eram os do clube. A gente fazia acampamentos por aquelas praias do rio Guaíba. Naquela época, embora existisse as barraquinhas para comprar, a gente não tinha dinheiro. Então, a gente achou uma lona de caminhão. Pegava aquilo, botava num ônibus, ia até o fim da linha, até uma daquelas praias do rio Guaíba e acampava. As atividades eram sempre ligadas aos esportes, às competições, viajar para as competições, aos treinos. E as namoradas também foram todas do clube, ligadas ao atletismo de alguma maneira. Mas era uma dedicação, um esforço bastante grande. Principalmente durante a faculdade, porque a Geologia era um curso de dois turnos. Então, eu estudava de manhã e de tarde e sobrava a noite para treinar. E, no inverno, lá no Rio Grande do Sul, o minuano comendo solto, os treinos acabavam por volta de oito horas da noite, naquele invernão. Hoje a gente pensa: “Pô, como é que eu fazia aquilo?” Mas era prazeroso. Eu nunca aprendi a dançar, embora tivesse muita vontade, até hoje tenho. Mas nunca aprendi. A programação de final de semana era um cineminha, eventualmente uma lanchonete, um sanduíche. Pagar um sanduíche para a namorada, também não tinha muito mais dinheiro do que para isso não. Mas não era problema nenhum.
ENSINO SUPERIOR / FACULDADE DE GEOLOGIA Não havia expectativa em relação a uma carreira de geólogo, foi aquilo que eu falei: minha mãe imaginava que eu ia achar minas de ouro, diamantes, por aí. Acho que ela nunca imaginou, nem sabia talvez, a possibilidade de eu entrar na Petrobras estudando Geologia. E nem eu imaginava essa possibilidade, quando entrei para Geologia, porque o curso de Porto Alegre era muito mais voltado para a parte de mineração. Durante o curso, a Petrobras nunca foi uma opção clara. Eu me imaginava trabalhando mais na área de mineração, pesquisa de cobre, ferro, ouro, chumbo, coisas desse tipo, e não indo para a área do petróleo. A cultura e a influencia dos professores eram mais ou menos oriundos dessa área, tinham tido experiências profissionais fora do ensino, fora da universidade, todos eles vinham mais da área de mineração e alguns da área de geotécnica. Embora houvesse um ou outro que tivesse trabalhado na Petrobras, mas a tendência da escola era essa. De qualquer maneira, eu nunca fiz muitos planos, como eu digo, fui para a Geologia assim meio num soprinho da mãe. Depois, o pessoal da Petrobras veio ver quem queria trabalhar e fez uma entrevista. O pessoal achou bom o meu currículo e me chamou.
INGRESSO NA PETROBRAS Sempre que eu entro em alguma coisa, entro de cabeça, me envolvo completamente. E foram 30 anos – que eu estou completando agora – muito bons na Petrobras.
Eu me formei em dezembro de 1974 e, em março de 1975, fui admitido na Petrobras. Entrei por Belém, distrito de exploração lá do Norte. Minha primeira missão foi trabalhar numa equipe sísmica em que o acampamento base era no rio Javari, na fronteira com o Peru. O processo para ingresso na Petrobras foi o que me chamou primeiro. Os salários eram muito bons e então eu não pensei duas vezes. Mas, realmente, não conhecia a Empresa, não tinha a idéia exatamente do que ia fazer lá. Até lembro de quando saí de Porto Alegre para Belém. Naquele tempo, acho que era um vôo da Sadia. Levava 12 horas para chegar em Belém, porque subia em Porto Alegre, acho que parava em Florianópolis, Rio, Salvador, parava em tudo que era capital. E me lembro descendo lá em Belém, a hora que botei o pé fora do avião, disse: “Que é que eu vim fazer aqui? Que é que eu entendo de petróleo?”
E era o que eu disse: me formei em Geologia e na Petrobras eu fui admitido como geofísico, tem uma separação. “Puxa vida, que é que faz um geofísico?”
DEPARTAMENTO DE EXPLORAÇÃO / GEOFÍSICO / COTIDIANO DE TRABALHO O geofísico basicamente trabalha antes de perfurar o poço, usa métodos geofísicos de prospecção que a gente chama geofísica. E, dentro disso, a gente pode destacar a magnetometria, a gravimetria e a sísmica, que são levantamentos, estudos que tu fazes antes de localizar aonde posicionar os poços exploratórios que tu vais furar. Então, o geólogo já entra na perfuração do poço, vai lidar mais com as rochas. O geofísico mexe com esse tipo de ferramenta que eu falei. Mas o que eu digo: eu, na universidade, tinha estudado geologia e tinham me contratado como geofísico. E a primeira coisa que pensei ao desembarcar: “O que é que eu vim faze aqui?” Louco para pegar um avião, para voltar para casa. Mas, na Petrobras, se aprendia na prática. Embora tenha um programa de treinamento muito intenso, hoje é um pouco diferente. O pessoal já entra por um treinamento formal, depois vai para uma parte prática, depois volta para o treinamento formal. Naquela época não, se entrava e tinha um ano que a gente era chamado de estagiário. Então, ia para o campo para aprender com os mais antigos, com o geofísico que já estivesse trabalhando na equipe sísmica ou no próprio escritório. Mas era um período puramente de treinamento. Realmente, a única responsabilidade era ficar do lado das pessoas mais experientes aprendendo. As pessoas mais experientes também se dedicavam a ensinar, dar uma aula particular, ensinar os métodos, os princípios. As coisas básicas que tu precisas eles também ensinavam. O período de estagiário era isso aí, para aprender a ver como as coisas eram, como as coisas funcionavam na ponta, a equipe sísmica adquirindo o dado. E foi muito fácil porque a estrutura da Petrobras facilita demais as coisas. É obrigação dos mais velhos ensinar aos mais novos. Então, a coisa flui muito natural. A única coisa que eu lembro é que, logo que cheguei em Belém, que eu me apresentei para o meu chefe, de manhã, ele olhou para mim e disse: “Bom, hoje de manhã tu ficas por aqui para conhecer o pessoal. Vamos te apresentar a turma da área de exploração. Amanhã de manhã tu alugas um apartamento e de tarde tu te apresentas aqui para pegar a passagem para ir para o campo.” Pensei comigo: “Uma manhã para alugar um apartamento?” Obviamente, eu não falei nada. No outro dia de manhã arrumei uma república. Naquela época, tinha entrado uma turma bastante grande, cerca de 20 geólogos tinham sido contratados e ido para Belém, e já tinha algumas repúblicas lá. O que eu fiz foi procurar uma república para largar minha mala e de tarde estava lá para viajar.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / COTIDIANO DE TRABALHO A sede do distrito era em Belém e eu fui para a equipe sísmica na fronteira com o Peru. Foram mais 12 horas de avião. Era o velho Caraveli, acho que peguei o último vôo do Caraveli de Manaus para Tabatinga. Ir para a equipe sísmica foi tão longe quanto de Porto Alegre para Belém, era uma boa aventura. De Belém para Manaus era um vôo comercial e depois pegava um aviãozinho com turbo-hélice, ia para uma base da Petrobras mais avançada. Dessa base, pegava um helicóptero e aí chegava na equipe sísmica.
Eram 20 dias de campo e o regime de folga, quando começou, era três para um. Ficava três dias no campo e um dia de folga. Mas esse primeiro estágio foi um período de 45 dias na picada mesmo, abrindo picada para fazer os levantamentos sísmicos. Era a turma de topografia. Depois, no segundo estágio, aí já fui acompanhar a turma que fazia realmente o levantamento sísmico. Mas era muito interessante, dormir em rede no meio do mato, comer aquelas carnes em conserva, aquelas coisas que o pessoal chamava de boi ralado com uma farinha. Aquela farinha de mandioca do Pará, que tem uns grânulos grossos, que se tu morderes aquilo quebra os dentes. Mas foi uma experiência legal, no meio do mato, dormindo em rede, com mosquiteiro.
A gente caminhava muito durante o dia, ao longo daquelas picadas. A gente acha que o Amazonas é muito plano, mas não, lá no Acre já começa a ter um relevo bem acidentado. Então, chegava nos acampamentos à noite, extremamente cansado, comia aquela gororoba, deitava na rede e lá pelas seis e meia, sete horas, tu já estavas dormindo. Quando chegava à meia-noite, tu acordavas, aí já não achava mais posição na rede. Começava a pensar: “Pô, para isso que eu estudei? Estudar tanto tempo para vir me enfiar aqui nesse fim de mundo?”
O geofísico é o que vai à frente de todo mundo. Os levantamentos que o geofísico faz é que permitem definir onde vão ser furados os poços, o trabalho é fundamental. Se não tem essa fase, não tem como achar petróleo. Obviamente que achar petróleo depende de outras coisas. Mas todo o processo de exploração é muito sustentado, embasado nos dados geofísicos. A gente sempre faz analogia com a radiografia da terra, hoje é o ultra-som. A gente consegue ver o nenê dentro da barriga da mãe, a geofísica funciona de uma maneira mais ou menos parecida. A gente tenta ver a estrutura interna da terra, do subsolo, com base nos dados geofísicos. Então, eles que te permitem ter uma idéia de quais são os locais apropriados ou com maior chance de ter petróleo do que o outro. Porque não se consegue, não se acha petróleo furando poços aleatoriamente. Tem que se definir quais são as áreas com maior potencial. A geofísica é uma das ferramentas que é usada para definir essas áreas. Obviamente tem outros tipos de análise que se fazem usando dados geológicos. Mas o ponto exato onde se vai furar é o dado geofísico que te indica. Então é fundamental. E hoje em dia a geofísica também é muito usada, no momento que tu fazes uma descoberta, para delimitar a extensão, saber até onde vai, até onde ele se estende, até onde se pode furar poços produtores. Onde é que tu furas, tu posicionas os poços produtores para que o campo tenha uma resposta melhor em termos de produção, de recuperação do óleo que está lá em baixo. Então o trabalho do geofísico é fundamental, é básico. Não se imagina nem a exploração nem a produção de petróleo sem o trabalho de geofísica.
Desde que eu entrei, a tecnologia evoluiu muito. Basicamente a gente continuou usando os mesmos métodos. A gravimetria, a magnetometria, e a sísmica, principalmente a sísmica, que é a principal ferramenta. Então, o que aumentou foi a resolução dos equipamentos, tem maior resolução. O tipo de levantamento que se fazia, antigamente se fazia um levantamento em perfis 2D, hoje se faz levantamento em área que são os chamados levantamentos 3D. E se aumenta muito mais a densidade de amostragem que se faz no subsolo. Mas a tecnologia básica é a mesma. A sofisticação também evoluiu, porque, uma vez adquirido, o dado passa por uma fase de processamento e é preparado para ser interpretado, e, com a evolução dos computadores, maior capacidade dos computadores, os processamentos ficaram muito mais sofisticados. Os pacotes de visualização hoje em dia também são muito usados, no início não existiam esses pacotes, tipo Guerra nas Estrelas, e a gente usa esses efeitos especiais para visualizar esses dados sísmicos, dados geofísicos. Eles te dão uma imagem mais precisa, você
interpreta vendo imagens em três dimensões. Antigamente, se plotava os dados em papéis, o que a gente chamava sessões sísmicas, e se interpretava, media o tempo na mão, uma série de coisas eram manuais. Depois disso foi evoluindo e agora se faz toda a interpretação em estações de trabalho baseadas em computadores. Então, nesse aspecto, o básico do método continua o mesmo, mas com uma evolução tecnológica.
CURSO DE TREINAMENTO - CATEP
Em Belém, eu fiquei dois anos indo para a equipe sísmica. No primeiro ano, como falei, era basicamente trabalhando como estagiário, acompanhando os geofísicos mais velhos que eram responsáveis pelas equipes sísmicas. A partir do segundo ano, eu já assumi as responsabilidades de geofísico numa equipe sísmica. Mas sempre trabalhando no Amazonas, em equipes sísmicas. Em 1977, eu fui para o primeiro curso dentro da Petrobras, era um curso de um ano para dar aquele embasamento teórico maior que precisava para evoluir dentro da carreira de geofísico na Petrobras. Foi um curso de um ano na Bahia, que se chamava Catep – Curso de Atualização em Técnicas Exploratórias. Nos aperfeiçoamos em vários métodos sísmicos e em outras especialidades envolvidas na exploração de petróleo. Foi um período puxado também, o curso era bastante puxado, exigia demais. Todo dia estudando até altas horas. Foi um ano de curso intensivo. Lá em Salvador tinha um dos centros de ensino da Petrobras, o famoso Cemba, o outro era aqui no Rio. Depois desse curso, vim para o Rio de Janeiro, trabalhar no escritório na parte da interpretação de dados. Passei uns três anos aqui no Rio trabalhando.
MESTRADO
No final de 1979, me convocaram para fazer um curso de especialização em geofísica nos Estados Unidos, patrocinado pela Petrobras. Aí fui. A Petrobras investe demais na formação dos quadros, o tempo todo. Porque hoje em dia todo mundo diz: “o melhor ativo é o homem” e não tem jeito, é mesmo. Para ter um bom desempenho, principalmente na parte de exploração, tem muita coisa subjetiva, que depende da experiência e de acompanhar e estar atualizado. Então, sempre foi uma filosofia muito forte da Petrobras investir em treinamento. Tanto é que hoje tem gente que chega a fazer pós-doutorado dentro da Petrobras. Por conta da Petrobras, faz mestrado. Quer dizer, além dos cursos de formação internos, faz-se mestrado, doutorado e até caso de pós-doutorado.
Fiquei um ano e meio no Texas. Nós éramos três. Mas, naquela época, já tinham dois ou três lá que tinham ido no ano anterior. Enquanto nós estávamos lá também chegaram mais dois ou três. Era um programa bastante intenso e extremamente puxado. Quase endoidei. Mas, no final, dá tudo certo.
FAMÍLIA Minha filha nasceu no Texas, nesse período, quer dizer, o curso não foi tão puxado assim. Deu tempo para fazer outras coisas. Teve uma série de fatos interessantes, porque a minha esposa tinha um problema e não conseguia engravidar. Aqui no Brasil, a gente não tinha conseguido identificar exatamente qual era o problema, apesar de ter ido a especialistas em Belém, no Rio, em Porto Alegre, em todos os lugares. Mas nos Estados Unidos a gente foi a um médico que identificou o problema, fez uma pequena cirurgia e resolveu. Sete meses depois, a dona Graziela estava nascendo lá.
Foi muito puxado. Foi uma gravidez de risco e teve que ser interrompida com sete meses. E sem parentes sem nada. Então, tive que conciliar as duas atividades [estudos e neném]. Quando se é jovem, tudo fica um pouco mais fácil.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
/ ÁREA DE GEOFÍSICA Do Texas eu voltei para o Rio, cheguei e fui mandado para Manaus. Tinha recém-aberto um distrito em Manaus, o Distrito de Exploração da Amazônia Ocidental. Aí eu já comecei a minha carreira gerencial. Fui para os Estados Unidos no início de 1980 e voltei em meados de 81. Fiquei um tempo ainda no Rio. No início de 82, eu fui mandado para Manaus como gerente setorial de Interpretação. Era uma área que, na época, estava com uma atividade muito intensa na região. Em 1976, eu não tenho essa data bem certa, tinha sido descoberto o primeiro campo de gás da Amazônia, o campo de gás em Juruá. E ele desencadeou uma atividade, criou muitas expectativas. Então, a atividade era muito intensa lá no Amazonas. Você tinha seis equipes sísmicas, seis sondas por ano. Era um período muito intenso. Quando a exploração é boa, quanto mais intensa, melhor. Porque os resultados se têm mais rápidos, se está certo ou errado, muda o rumo da interpretação, muda o modelo geológico. Mas é um período muito rico também. Depois, fui promovido a gerente setorial. Depois passei a chefe de divisão. E fiquei lá até final de 85, quando vim transferido de novo para o Rio, também como chefe de setor. Fiquei trabalhando num setor que cuidava da área da foz do Amazonas, uma área de mar, offshore. Eu passei um ano como chefe de setor e pedi para voltar, passar um tempo sendo técnico de novo, para ter uma chance de trabalhar em região de águas profundas. Fui trabalhar na Bacia de Campos, como técnico sísmico.
BRASPETRO - NIGÉRIA A experiência na Nigéria foi quando eu fui para a Braspetro, em 98, como gerente de exploração da Braspetro. Foi nessa oportunidade que eu tive a chance de trabalhar com as áreas de águas profundas na Nigéria, onde nós tínhamos dois blocos, e também em Trinidad e Tobago. Eram áreas interpretadas pela Braspetro aqui no Rio de Janeiro. Na Braspetro, eu fiquei relativamente pouco tempo, um ano e meio, quase dois anos. Mas isso já foi em 1998.
BACIA DE CAMPOS Mas, voltando para 85, eu fique até final de 91 trabalhando como intérprete na região de águas profundas da Bacia de Campos. Tive a oportunidade de trabalhar na região de Marlim, na região de Albacora, onde depois foi descoberto o Roncador, e na região do campo de Barracuda.
EXPLORAÇÃO OFFSHORE Para o geofísico, não tem diferença. As ferramentas são exatamente as mesmas em terra ou em águas profundas. Os métodos são os mesmos. O grande problema da região de águas profundas, na realidade sempre foi a questão da produção, de se implantar os sistemas de produção. Os regimes de pressões em águas profundas são muito grandes. Os equipamentos usados em águas rasas não se aplicam em águas profundas e foi todo esse desenvolvimento que a Petrobras fez. Mas, para o geólogo, para o geofísico em geral, não tem nenhuma diferença entre o trabalho em terra e o trabalho em mar. Tem uma diferença que é a qualidade do dado. A qualidade do dado marítimo, principalmente o de água profunda, tem uma qualidade muito melhor. O ambiente é menos ruidoso, então, a gente fala em qualidade, se vê as coisas com mais clareza nos dados. A interpretação, às vezes, é até mais fácil do que o dado de terra que tem uma tendência de ser de pior qualidade do que o dado de mar. Falando especificamente da questão do dado sísmico, o dado sísmico de terra é de pior qualidade de que o do mar. Por exemplo, o método sísmico detona uma carga. Em terra, se usa dinamite. No mar se usa um canhão de ar comprimido por questões ambientais. Então, tu geras, fazes uma frente de onda que se propaga pelo subsolo, é refletido nas interfaces das várias camadas que constituem a terra ali naquela porção. São refletidas e registradas em geofones ao longo de um cabo que é estendido na superfície. Então, quanto mais homogêneo o meio, menos distorce a frente de onda que se propaga em superfície, é mais fácil de reconstituir essa frente de onda, que é um dos procedimentos que se usa para gerar o dado que depois vai ser interpretado. Como a água é um meio muito homogêneo, ele distorce menos essa frente de onda. E é por isso que a qualidade no mar é melhor do que em terra, porque, em geral, a superfície em terra é muito mais heterogênea. As propriedades variam lateralmente e causam uma distorção dessa frente de onda que é mais difícil de reconstituir durante a fase de processamento do dado. Que é um passo fundamental para gerar as sessões sísmicas que vão ser interpretadas depois. Isso tudo é muito técnico. A gente nunca consegue explicar isso.
Existem no dado sísmico algumas características que permitem, eventualmente, identificar onde existe realmente petróleo. Através do próprio dado sísmico, tu chegas à conclusão: “Não, nesse ponto aqui realmente existe petróleo.” Mas para saber se aquela acumulação é comercial, se vai produzir em volumes que sejam comerciais, só furando o poço e perfurando. Em alguns lugares, nós temos certeza que vamos encontrar óleo ou gás porque o dado sísmico já te dá uma indicação quase que direta disso. Só que a gente nunca tem idéia se aquele óleo que vai encontrar é comercial, se aquela camada reservatório que tem lá vai produzir em vazões comerciais, ou seja, em volume suficiente que pague os teus custos operacionais. Hoje em dia, a gente fala em poços de terra onde a infraestrutura é muito barata. E tu já tens uma ampla infraestrutura nas nossas bacias onde nós produzimos em terra. Há poços que produzem oito, 10 barris de petróleo por dia, quer dizer, vazões mínimas. Mas ele é comercial porque, para produzir aquele óleo, os custos operacionais são baixos. Os investimentos feitos nas facilidades de produção são muito baixos. Já um poço no mar, para ser comercial, tem que produzir a vazões de seis mil barris de petróleo. Isso é um número cabalístico. Varia de lugar. Mas, vamos dizer, só para ter ordem de grandeza, tem que ter coisa assim de seis mil barris por dia para justificar construir uma plataforma dessa que a gente ouve falar aí todo dia. Um bilhão de barris? Um bilhão de dólares quase para construir uma plataforma. Sem pensar no resto das facilidades das linhas de produção, de tudo. Os outros equipamentos necessários para botar em produção. Um campo desse de água profunda, o investimento só para botar ele em condição de produzir são coisas de bilhões de dólares. Um, dois, três bilhões de dólares. Então, os poços têm que produzir um volume de óleo muito grande para justificar que pague todo esse investimento e ainda dê o lucro. Então no mar aí a gente fala em poço no mar, tem casos limites aí de poços custar 80, 90 milhões de dólares. Em terra, dependendo, tem poços mais rasos, fura poços 40, 50 mil dólares.
As ordens de grandeza são diferentes. A produtividade dos poços tem que ser compatível com cada um desses ambientes, desses custos que se tem para desenvolver a produção nessas áreas.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS A atividade terrestre, a atividade na floresta, por exemplo, talvez seja mais arriscada do que no mar. Mas a Petrobras sempre teve um programa muito forte de segurança, os níveis de acidentes na exploração são relativamente baixos. Mas, na sísmica em geral, os problemas mais sérios que se teve foram acidentes em operações apoiadas por helicópteros. No Amazonas, a gente teve alguns incidentes com índios. A gente chegou a ter mortes causadas por ataques de índios, na região do Alto Amazonas. Eram índios corubos, eles não tinham sido contatados ainda e a Petrobras, quando operava naquela região, tinha o apoio da Funai. E as pessoas que foram vítimas dos índios foram justamente dois ex-funcionários da Funai que estavam dando o apoio para a Petrobras. Não sei se eles viram que os índios se aproximaram do acampamento da Petrobras e começaram a fazer algumas danças. Eles interpretaram aquilo como uma atitude amistosa de aproximação e aí eles tentaram fazer o contato. Só que, na hora que eles chegaram perto, houve o ataque, com aquelas bordunas que eles usam. E os dois não eram nem da Petrobras, eram pessoas experientes que interpretaram errado a sinalização. Essa área, depois, a própria Funai interditou. A Petrobras teve que parar a atividade dela lá. Mas é uma passagem interessante do ponto de vista da atitude do ser humano. Quer dizer, eles se acharam experientes, viram uma sinalização, interpretaram errado e o fim foi trágico. Eu trabalhava em Manaus. Nessa época, eu já não estava mais, foi por volta de 84, 85. Eu trabalhava no escritório, era gerente.
COTIDIANO DE TRABALHO Na equipe sísmica, basicamente, trabalham os geofísicos e tem engenheiros eletrônicos que cuidam da parte da manutenção dos sismógrafos. Em termos de nível superior, são esses dois tipos de profissionais que trabalham. Mas uma equipe sísmica pode ter coisa de 500, 600 pessoas, porque exige muito trabalho braçal no campo. Por exemplo, lá no Amazonas, o trabalho de perfuração onde tu vais botar as dinamites que são usadas como fontes sísmicas eram realizados com trados manuais. Então, tem uma equipe de perfuração que fura, faz furos de dois metros onde é enfiada a dinamite que vai ser usada como fonte sísmica. E tem todo o trabalho do espalhamento dos geofones, em cabos que, às vezes, tem o comprimento de quatro, cinco quilômetros. Então tem que espalhar esses cabos, colocar os geofones. E tudo isso aí é feito de maneira manual. Embora no Amazonas a operação toda seja suportada por helicóptero, o helicóptero carrega o material e o larga em clareiras espaçadas de três, quatro quilômetros. A partir das clareiras, o transporte todo do material é feito pelos braçais. O transporte dos equipamentos também, do sismógrafo, tudo é feito manualmente. Então, é um trabalho muito duro. O geofísico em geral trabalha no acampamento base que, no Amazonas, é em balsas. São casas em cima de balsas, escritórios em cima de balsas, com ar-condicionado. Tem um certo conforto, não é tão duro assim. Mas, para quem está à frente da área, é duro. Operador de sismógrafo, o pessoal de topografia fica dormindo em barraca, comendo aquela comida braba.
BACIA DE CAMPOS / GAROUPA Os primeiros levantamentos geofísicos na Bacia de Campos começaram no final da década de 60, quando a Petrobras se lançou ao mar. Eu diria que foi um tempo bastante grande até a primeira descoberta, em 1974, se não me engano, que foi o campo de Garoupa. Mas, como a gente vinha falando anteriormente, a sísmica, o levantamento geofísico é o primeiro que chega, são os primeiros trabalhos feitos em uma área e são eles que suportam a atividade de perfuração. Então, o levantamento começou no final da década de 60 e depois se começou a furar os primeiros poços já no início de 70. Foram os primeiros poços exploratórios na Bacia de Campos. Mas, obviamente, tudo isso em água bastante rasa. Naquela época, os limites de exploração eram bem inferiores aos que hoje se atinge. Você trabalhava em águas de até 200 metros, que já eram consideradas, naquela época, águas profundas para a tecnologia disponível. Quando se entra numa área virgem, como se chegou na Bacia de Campos, que não tinha nenhuma informação ainda, é uma loteria, vamos dizer. Pode ser bom, pode ser ruim. Então, inicialmente, tem que se fazer uma quantidade de levantamentos básicos para realmente começar, a partir desses levantamentos, a tentar determinar o potencial. A expectativa dos primeiros poços que foram secos, a sessão das rochas que foram atravessadas, não era muito animadora. Mas no nono poço que se furou já se descobriu petróleo, aí mudou toda a expectativa. E veio crescendo a intensidade da atividade. Mas eu diria que até foi bastante rápida a primeira descoberta. Porque tem áreas que o número de poços perfurados até a primeira descoberta é bem maior do que nove. Nós temos áreas em que já furamos centenas de poços e ainda não descobrimos óleo, pelo menos comercial. E continuamos explorando. É uma atividade que exige, tem que ser otimista. Em termos mundiais, eu acho que o índice de sucesso que a gente considera, quantos poços se fura para achar uma acumulação, em geral, são 100 poços para achar 15 acumulações. O índice de sucesso é 15%. Se fura 100 poços e se acha 15, isso já é considerado um resultado razoável para a exploração. E em Campos até se descobriu bastante cedo. Como eu falei antes, o problema de Campos foi que sempre se estava atuando em áreas consideradas limites para as tecnologias de produção. Para a perfuração e a aquisição sísmica não têm muito impacto em relação à lâmina d’água em que se está atuando. Para perfuração tem algum impacto, mas, em geral, hoje em dia você fura até em lâminas d’água acima de três mil metros com bastante facilidade. O problema todo quando se fala de exploração e produção em águas profundas é justamente desenvolver e produzir campos em águas profundas. A exploração não envolve muito o impacto dessa questão da lâmina d’água.
EXPLORAÇÂO NO AMAZONAS A Petrobras, por exemplo, desde os seus primórdios, explora a bacia do Médio Amazonas. Tem algumas pequenas descobertas e nenhuma produção ainda. Embora não tenha atividade lá, durante praticamente toda sua história, 40 anos,
a Petrobras explorou a bacia do Médio Amazonas e não encontrou nada. Tem outras bacias da costa brasileira que também vem sendo exploradas desde o tempo que se começou a explorar em Campos, no final da década de 60, e continuamos explorando e ainda não encontramos nenhuma acumulação comercial de petróleo. Mas o que a gente tem que ter em mente é que essas áreas são imensas. A variedade de situações geológicas que se encontra ao longo delas também é bastante grande. E, à medida que tu vais avançando, vais fazendo a exploração, é que tu vais melhorando teus modelos geológicos. Modelos que vão te permitir realmente evoluir no conhecimento da bacia e chegar nos pontos onde está o petróleo, porque é um trabalho de detetive. Tu vais furando um poço, ele te dá uma série de informações que tu extrapolas daquilo ali. Vai para o próximo poço, confirma-se ou não se aquelas extrapolações estavam certas. Se não estavam certas, tu tens que refazer o teu modelo baseado nos novos dados que tu adquiristes e atualizar teu modelo geológico da área. A partir desse modelo, define quais são os novos poços que tu vais furar e assim vai. Cada vez definindo e testando modelos novos até que um dia aconteça a grande descoberta. E aí é felicidade geral. Tem geólogo, geofísico que nunca encontrou um campo de petróleo e passa a vida procurando. Já tive a emoção de encontrar campos de petróleo na Bacia de Campos, no Amazonas.
ATIVIDADE EXPLORATÓRIA / EMOÇÃO DO DESCOBRIMENTO Em Manaus, a gente fez várias descobertas. É emocionante, talvez tão emocionante quanto ter um filho. Quer dizer, tu vais, tu furaste o poço que a gente chama pioneiro, descobriu. Então, depois disso, para confirmar se é comercial ou não, tu tens que fazer novos estudos geofísicos, furar uma série de novos poços para comprovar, delimitar a acumulação que foi descoberta. Nesse período de delimitação, a emoção já não é tão grande, tu sabes que tem e só vais confirmar. Mas furar o poço pioneiro, ver se tem um intervalo que tem petróleo, preparar um teste e ver o óleo, aquela chama queimando lá em cima, é realmente indescritível. É uma emoção que não dá para descrever. E o interessante é isso, tem bons, excelentes geólogos, mas que trabalharam nas bacias erradas. Tem bacias mais fáceis, mais difíceis. Tem bacias que não têm petróleo de jeito nenhum e outras têm pela sua própria evolução geológica, varia muito. Então, também, a gente tem que ter sorte de ser designado para trabalhar em uma dessas bacias, na bacia certa, na hora certa, na conjuntura certa.
BACIA DE CAMPOS / BARRACUDA / MARLIM O momento mais relevante do período que eu trabalhei na Bacia de Campos foi o da descoberta do campo de Barracuda. Eu estava trabalhando diretamente relacionado com o grupo que estava cuidando dessa área. Comecei trabalhando na área do campo de Marlim, que já tinha sido descoberto na época que eu fui para lá, trabalhar como intérprete da Bacia de Campos, no final de 86. E eu comecei trabalhando no campo de Marlim justamente definindo as locações de delimitação do campo e aí depois dei as locações que resultaram na descoberta do campo de Barracuda. É muito bom. Dá mais ímpeto para continuar trabalhando. No trabalho de exploração se erra muito, como eu falei, se fura 100 poços para descobrir, achar óleo em 15. Então, a gente trabalha mais com o insucesso, a probabilidade maior é que se tenha insucesso. O exploracionista em geral trabalha com o insucesso. E tem que partir daqueles insucessos para buscar, programar o próximo poço para tentar atingir esse sucesso. Então, acho que tem que ter um espírito especial. O cara tem que ser otimista, achar que o próximo é que vai dar mesmo. Porque o pessimista, na exploração, não leva uma companhia para frente.
A gente acha que a estrutura tem, vamos dizer, 500, 100 quilômetros quadrados. Então, furou um poço pioneiro num determinado ponto daquela estrutura que tu achavas mais propício. Achou o óleo, então tu tens que furar para ver se realmente o petróleo está lá até aqueles limites que tu achavas inicialmente.
Então, tu furas outros poços, ditos poços de delimitação, que comprovam a extensão lateral da acumulação. E, nessa área que tu tens uma descoberta, tu continuas furando novas situações para achar outros campos. O primeiro poço que é furado, quando tu ainda não furaste numa área e encontra uma estrutura que tu achas que tem petróleo, a gente chama de poço pioneiro. Então, fura o pioneiro. Se achou o petróleo, fura os poços de delimitação, que são os poços que vão dizer até onde vai esse campo, qual é a extensão lateral deste campo. Mas o processo exploratório da área continua furando outras estruturas para achar outros campos, como na Bacia de Campos, que continua direto, não pára. E atualmente está indo para águas cada vez mais profundas, além de três mil metros de lâmina d’água. Deve haver cerca de 30 campos na Bacia de Campos – estou chutando totalmente. Eu não lembro de cabeça, mas é uma quantidade imensa. E se continua explorando. A tendência é ir cada vez em águas mais profundas. Vão se esgotando as oportunidades em águas rasas. Agora, até dois mil metros, o nível de exploração já foi muito alto e tem uma quantidade de descobertas, mas se continua. A atividade da Petrobras em águas profundas também é intensa em outras bacias, ao longo de toda a costa. Quer dizer, a Petrobras tem blocos exploratórios desde a bacia do Pelotas, lá no Rio Grande do Sul, até a foz do Amazonas. Especificamente, na Bacia de Campos é onde as atividades são mais intensas, pois foi onde se obteve mais resultados. E a atividade na Bacia de Campos está voltando para a parte de água rasa também, porque, inicialmente,
na parte de água rasa se achou muitas acumulações de um óleo pesado, petróleo pesado, que é muito difícil de produzir. Como no decorrer dos anos evoluíram muito as técnicas de produção de petróleo, hoje em dia já se consegue produzir esse tipo de óleo mais pesado que ocorria em água rasa. Então, parte desta atividade está voltando em função do avanço tecnológico na parte de produção de óleos pesados. Esse processo todo de feedback, vamos dizer, depende muito também da evolução tecnológica. Mas a perspectiva futura de achar novas acumulações ainda é em águas mais profundas da Bacia de Campos.
BACIA DE CAMPOS / BACIA DE SANTOS / MEXILHÃO A gente teve, recentemente, aquelas grandes descobertas de gás na bacia de Santos e no campo de Mexilhão, que está aí na imprensa. Tivemos boas descobertas na bacia do Espírito Santo. A Bacia de Campos tem um problema, pois o petróleo que a gente vinha achando lá é um óleo pesado, denso, mais difícil de produzir. Essas descobertas de gás foram muito promissoras e as descobertas na bacia do Espírito Santo são muito boas porque são óleo do tipo leve. É um óleo que tem mais valor de mercado e mais fácil de produzir. Então, isso ampliou bastante a fronteira de produção da Petrobras. Em outras bacias ainda não se tem produção no mar, com exceção da bacia de Sergipe e Alagoas, que, aliás, foi onde teve a primeira descoberta offshore no Brasil, o campo de Guaricema. Mas a produção lá se restringe à parte de águas rasas e a gente tem descobertas em águas profundas que estão em fase de desenvolvimento, na realidade, estão fazendo o plano de desenvolvimento da área.
POTENCIAL PETROLÍFERO A história geológica depende de particularidades, a formação do petróleo é uma anomalia. Quando a gente vê as grandes acumulações de petróleo, elas ocorrem em lugares especiais, elas não estão espalhadas por todo o mundo, por todas as bacias, ocorrem onde as condições, a história geológica daquele lugar favoreceu à produção do petróleo e à preservação. O petróleo se forma em profundidade e tende a se perder, subir para a superfície e escapar para a atmosfera. Só se existir algumas condições favoráveis em superfície que ele vai ficar lá preso ou trapeado, que é o termo técnico que se usa. Por que tem mais petróleo em um lugar que noutro? Depende da rapidez que se formou a bacia e quão profunda ela é. O petróleo se forma de matéria orgânica que se deposita junto com sedimentos e atinge uma determinada temperatura. Existem algumas bacias em que a camada de rocha que vai gerar o petróleo atingiu uma profundidade muito grande e aquela matéria orgânica toda, ao invés de gerar petróleo, é queimada, passa do estágio, passa do ponto. Então, não gera nada. Na Bacia de Campos, essa camada de rocha geradora chegou e está na condição ideal para gerar o petróleo. Então, é isso que diferencia as bacias, porque elas têm uma gênese. Existem bacias com a gênese igual, que tem a mesma rocha geradora, só que, em uma delas, essa rocha foi mais soterrada e passou do ponto, vamos dizer assim. Enquanto que, em outra bacia, essa rocha ainda está em uma condição favorável para a geração. Então, gera volumes grandes de petróleo no momento certo, porque também tem que esperar que se formem as estruturas. Não adianta gerar petróleo se não tem estruturas que armazenem esse petróleo, que retenham esse petróleo dentro da bacia. Então, há uma série de fatores. E na Bacia de Campos todas as condições ideais ocorreram no tempo ideal, porque a gênese de todas as bacias ao longo da costa brasileira faz com que elas sejam mais ou menos idênticas, porque se formaram e passaram pelos mesmos processos. Só que essas diferenças de timing e de quantidade de sedimento depositado variam um pouco e geram essas diferenças em potencial petrolífero. Há perspectivas de novas descobertas na Bacia de Campos, permitidas à medida que tu vais desenvolvendo a infraestrutura de produção. Hoje, esse desenvolvimento permite tornar econômica as acumulações menores. Se eu descubro uma acumulação pequena do lado de um campo grande que já tem uma infraestrutura instalada, é muito fácil eu produzir aquela nova descoberta com um campo já existente. Então, existem muitas pequenas estruturas que não foram furadas no passado porque não havia ainda estrutura de produção na Bacia, e hoje é viável explorá-las. Ainda há uma atividade muito intensa de exploração na Bacia de Campos. Além das águas ultraprofundas, que é uma nova fronteira, tem uma exploração muito intensa em torno dos grandes campos, buscando acumulações menores, que antigamente não eram economicamente exploráveis ou esgotáveis.
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA - RESULTADOS A tecnologia de produção evoluiu e vem evoluindo muito ao longo dos últimos 10 anos, particularmente. Eu acho que, em 85, no campo de Marimbá, foi a primeira vez que a Petrobras bateu um recorde de produção em águas profundas. A Petrobras botou em produção o campo de Marimbá, que tinha menos de 400 metros de profundidade. Acho que a lâmina d’água era de 383 metros quando o poço entrou em produção. Em 2000, a gente botou em produção o campo de Roncador, praticamente em dois mil metros. Quer dizer, então, no prazo de 15 anos a tecnologia evoluiu. Em 85, o limite era 400 metros por causa do limite tecnológico. E a Petrobras estendeu esse limite em menos de duas décadas para dois mil metros. Isso com base no trabalho do Cenpes. Aquele programa, o Procap – Programa de Desenvolvimento para Águas Profundas, recebeu uma série de prêmios internacionais da OTC. Eu diria que a tecnologia de exploração evoluiu, embora os métodos usados sejam basicamente os mesmos, mas evoluiu a tecnologia, a resolução dos métodos. E uma coisa que evoluiu muito na Bacia de Campos, do ponto de vista da exploração, são os levantamentos sísmicos 3D, que antigamente usava linhas 2D. Faziam-se perfis sísmicos espaçados de vários quilômetros e hoje em dia se faz perfis sísmicos espaçados 25 metros um do outro, o que dá uma densidade de informação muito grande. Uma qualidade de informação fabulosa, que permite reduzir bastante o risco exploratório. Então, com essa densidade de informação, se consegue diminuir o número de poços secos, corre-se menos risco. Do ponto de vista da exploração na Bacia de Campos foi isso. Porque esses levantamentos sísmicos de alta densidade, em geral, eram usados após as descobertas. A gente fazia uma grande descoberta e aí fazia o levantamento sísmico 3D para apoiar o plano de delimitação do campo. Hoje em dia já se faz antes mesmo de furar os poços, antes de se ter uma descoberta já está se utilizando essa tecnologia 3D para posicionar os poços exploratórios. Então, seria a grande diferença hoje em dia. Também está surgindo uma nova ferramenta chamada seabed logging que é um método eletromagnético que está sendo usado. E também, usado junto com a sísmica, ele permite reduzir bastante os riscos. Ele dá uma indicação quase que direta de onde tem petróleo em sub-superfície. Então, do ponto de vista tecnológico, a novidade é que a gente começou a usar esse seabed logging, que é o método eletromagnético. É o método geofísico também de exploração.
CENPES No Centro de Pesquisa, se busca desenvolver conceitos, do ponto de vista da exploração. Do ponto de vista da engenharia e da produção, é desenvolvimento tecnológico mesmo. No caso da Petrobras e da exploração, especificamente, o Cenpes trabalha desenvolvendo os conceitos, modelos geológicos, novas maneiras de interpretar os mesmos dados. Porque o geólogo, o geofísico, ele tenta interpretar o que aconteceu no passado, quais eram as condições paleogeográficas, como era a geografia na região daquela bacia, onde eram as regiões de praia, onde eram as regiões de talude, onde é que depositava matéria orgânica com maiores volumes, onde se depositavam os sedimentos que depois iam se transformar em rocha reservatório. E tudo isso nos permite escolher aquilo que eu falei: onde são os pontos mais favoráveis de se encontrar petróleo. Então, a gente trabalha com modelos, que a gente testa e vai desenvolvendo em cima das informações que a gente tem daquelas bacias. Uma maneira de fazer isso é ir estudar regiões onde afloram hoje rochas sedimentares parecidas com as que tem na Bacia de Campos. A gente chama de estudar afloramentos. Então, por exemplo, a gente tem um curso de campo, a gente faz isso na Espanha, nos Alpes, que é uma região onde tem afloramentos muito bons de rochas sedimentares que a gente parecidas com essas da Bacia de Campos. Então, a gente vai lá e consegue ver um afloramento em um barranco, as rochas que a gente só conhecia através da perfuração de poços. Tudo isso te permite montar um modelo geológico. E quanto melhor esse teu modelo, menor é o risco que tu corres e maior é a chance de encontrar petróleo. Então, um dos estudos que se faz no Cenpes é esse, com o conhecimento que a gente tem das bacias, com os conhecimentos que a gente tem de outras bacias de regiões de afloramento e aperfeiçoando o modelo que os intérpretes usam para posicionar os seus poços exploratórios.
E se faz uma série de outros estudos também. Porque, para ter petróleo, é importante que tenha uma rocha porosa em sub-superfície e existam condições especiais. Como é que se preserva a porosidade? Às vezes, há rochas que sofreram soterramento de dois, três, quatro quilômetros e a gente tem que saber se essas rochas preservaram ou não essa porosidade, que é onde o petróleo fica, no poro dessa rocha. Então, o Cenpes também desenvolve modelos que a gente chama de diagênese. São modelos que permitem dizer, em uma determinada área, qual é a chance de se ter um objetivo a cinco mil metros, esses modelos te permitem dizer: “Não, tu podes furar porque tu ainda vai ter porosidade, tem chance ainda de encontrar uma acumulação comercial. O poço que tu furar aí vai ter vazões comerciais.”
PROJETO MULTICLIENTES São esses tipos de estudos, de modelos, que são desenvolvidos no Cenpes. Do ponto de vista da geologia, desenvolve, aperfeiçoa modelos, usando toda a informação existente por aí. A gente usa os Projetos Multiclientes, que são projetos desenvolvidos por universidades e outros centros de pesquisa que atendem, inclusive, outras companhias de petróleo. Nesses Programas Multiclientes, são os clientes, as companhias de petróleo, que aportam recursos para que esses grupos de pesquisadores de universidades desenvolvam pesquisas em cima de um tema de interesse comum dessas companhias. A Petrobras mantém convênios com várias universidades brasileiras, em várias áreas. Na área de geofísica tem convênio com a Universidade Federal da Bahia. De Estratigrafia, na Universidade Federal de Porto Alegre. Campinas tem a parte de Geologia de Reservatório, Engenharia de Produção, Engenharia de Reservatório. A gente já teve convênios com a Universidade do Pará, de Ouro Preto também. Então, é uma maneira tanto de formar pessoal, capacitar o nosso pessoal, como também gerar núcleos de capacitação para formação de novas gerações de geólogos e geofísicos dentro do Brasil que já chegam na Petrobras com um nível de conhecimento bastante alto.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
A minha experiência gerencial começou em 82. Logo depois que eu voltei do curso de especialização nos Estados Unidos, fui mandado para Manaus, onde ocupei o primeiro cargo gerencial, como gerente de setor de interpretação das bacias do Amazonas. Lá em Manaus mesmo, fui guindado a gerente de divisão. Eu fui gerente de Exploração do Distrito de Manaus. No final de 85, voltei para o Rio, onde assumi o setor de Interpretação da Bacia da Foz do Amazonas, que trabalhava com uma área offshore. Passei um período, voltei para a área técnica. Fiquei de 86 até final de 91 trabalhando na área técnica. No final de 91, fui chamado para ser gerente de uma divisão de interpretação na Sede. Depois, de lá para cá, foram vários cargos, entre eles, um cargo de gerente de Exploração na Braspetro. Ainda estava sediado no Rio de Janeiro, quando tive a chance de trabalhar com essas áreas que eu falei da Nigéria e de Trinidad Tobago e outras áreas, como Equador, Líbia. A Petrobras atuou em um número muito grande de países. Depois dessa experiência na Braspetro, eu fui ser gerente em Sergipe/Alagoas. Fui para Aracaju no início de 2000, para ser gerente de Exploração na Unidade de Negócio de Sergipe/Alagoas, onde também passei dois anos. No final desses dois anos, foi criada a Unidade de Negócio de Exploração aqui na Sede. Foi um período em que houve uma centralização das atividades de novo no Rio de Janeiro. Então, em 2002, eu voltei para o Rio de Janeiro e fui trabalhar em um dos setores de interpretação, como gerente do setor de Interpretação na Bacia de Santos.
Em 2003, teve uma mudança, houve uma movimentação gerencial dentro da Exploração e eu fui designado para ser gerente do Suporte Técnico da Unidade de Exploração. É uma gerência que atuava dando apoio às áreas de interpretação, fazia parte de processamento sísmico, a parte de processamento e interpretação de métodos gravimétricos e magnetométricos. Não era uma área que trabalhava dando locações exploratórias, mas fazendo trabalhos especiais para os grupos de interpretação. Isso foi no início de 2003. Em outubro de 2004, fui designado para o Cenpes, para ser o gerente geral do E&P, a área de Pesquisa e Desenvolvimento de Exploração do Cenpes. Então, estou há três meses nessa área. É uma atividade de apoio aos grupos. O Cenpes, basicamente, desenvolve conceitos. Na área da Geofísica, especificamente, ele desenvolve algoritmos utilizados no processamento do dado sísmico, busca desenvolver tecnologias novas, modelos tecnológicos novos e tecnologias, principalmente na área de processamentos sísmicos novos. Então, fazemos pesquisa nessa área.
CENPES / DADO SÍSMICO No início da conversa, eu falei em qualidade do dado sísmico. O dado sísmico é adquirido no campo, ele passa por uma fase de processamento. E a qualidade do dado final que vai para o intérprete utilizar depende muito dos algoritmos que tu usas nessa fase de processamento. Então, é uma fase crucial. E a qualidade do dado final que tu obtém depende da qualidade, da precisão dos algoritmos de processamento.
DIVISÕES DO CENPES O Cenpes tem um esforço muito grande nessa área de desenvolvimento de algoritmos de processamento na parte sísmica. Tem uma área de Geoquímica também muito forte, na qual, utilizando parâmetros do petróleo que a gente acha, a gente busca identificar a rocha geradora a partir do óleo. E isso é importante para a gente calibrar os nossos modelos geológicos, saber que tipo de estrutura a gente tem que buscar. Porque aquele óleo que a gente descobriu está relacionado a uma determinada rocha geradora. A área de Geoquímica é muito forte no Cenpes também. A parte de Geologia é estrutural. No Cenpes, tem praticamente todas as especialidades utilizadas pelo pessoal da área de Exploração, mas todas voltadas para a parte de pesquisa de inovação e de definição de novos conceitos, que vai permitir evoluir no entendimento das bacias, ter melhores resultados da exploração e diminuir os riscos exploratórios.
BACIAS: BRASIL E ÁFRICA Tem semelhanças e diferenças entre as bacias brasileiras e africanas, porque basicamente se formaram pelo mesmo processo, ou seja, Brasil e África estavam juntos, em determinado momento se separaram. Desse processo de separação é que se formaram as bacias, os pacotes que depositaram são mais ou menos iguais. Mas, em função de diferenças locais, essas bacias não têm o mesmo potencial. Porque em algumas bacias houve condições de depositar mais matéria orgânica que em outras não tiveram. Um ambiente era mais redutor, outro mais oxidante, que são condições que preservam mais ou menos a matéria orgânica. Então não quer dizer que porque elas se formaram pelo mesmo processo, tiveram evoluções mais ou menos semelhantes que elas vão ter o mesmo potencial petrolífero. Isso depende muito de condições locais. E o petróleo, na realidade, é uma anomalia que ocorre quando todas as condições ideais ocorrem ao mesmo tempo. Às vezes, certas condições ocorrem, mas não ocorrem ao mesmo tempo de outras que também são necessárias para a formação de uma acumulação de petróleo. Então, petróleo é uma anomalia.
Mas o entendimento das nossas bacias é fundamental para se fazer exploração na África. E o conhecimento lá da África é fundamental para se utilizar aqui na exploração. Tem que se estar atento para o que está acontecendo de um lado e de outro. E a Petrobras explora dos dois lados, portanto, esse é um aspecto bastante positivo. Que conhecimentos gerados lá têm aplicação direta aqui e vice-versa. Hoje com computador essa transmissão é rápida, é muito fácil o técnico daqui acessar as informações de lá, hoje não tem realmente barreiras.
LAZER Eu acho que descanso nas horas de lazer. Todo mundo na Petrobras hoje em dia trabalha em uma carga horária bastante grande, tanto o pessoal técnico quanto o pessoal gerencial. A carga é, em geral, de 10 horas por dia, no mínimo. Eu gosto muito da atividade física, quando estou em casa, se eu não estou descansando, é porque eu estou dando uma caminhada por recomendação dos nossos médicos. Mas não tenho nenhum hobby, gosto da atividade física, o tempo que eu tenho é para caminhar, para fazer uma atividade no clube, nadar. E final de semana é no clube com os amigos – que são da Petrobras também – conversando sobre petróleo, para desespero das mulheres. Mas o próprio trabalho na Petrobras dá uma satisfação muito grande, até do ponto de vista dos relacionamentos pessoais. Porque, no meu caso, estou há 30 anos, todos os meus amigos são da Petrobras. Não tem outro jeito de ser, o clima dentro da Petrobras também é muito bom. Embora o nível de trabalho seja muito intenso, tu te sentes à vontade para fazer uma brincadeira com um, ter um relacionamento que não é puramente profissional. Então, é um ambiente relaxado. As pessoas se conhecem há muito tempo. Todo mundo conhece alguma história do outro e tem relações de amizade, isso torna a coisa menos pesada, menos estressante. Por maiores que sejam os problemas que tu enfrentas, tu tens um clima saudável, um clima favorável, bom dentro da companhia. Então isso torna a vida bem mais fácil. Baixa bastante o nível de estresse.
FAMÍLIA Minha filha é astrônoma, se formou no início do ano passado e já foi para São Paulo fazer mestrado. Está na USP, no IAG, fazendo mestrado em Astronomia. Ela tem 24 anos. E o meu filho fez 21 anos no final do ano e faz Propaganda e Marketing na ESPM, aqui no Rio.
IMAGEM DA PETROBRAS Vou dizer o projeto que eu não tenho: me aposentar. A Petrobras sempre te dá muitas oportunidades, mesmo que tu não as planeje. No início da conversa, eu falei que vou mais ou menos ao sabor do vento. Mas é uma Companhia que tem muito o que fazer. Se tu queres mudar de atividade dentro da própria Companhia, é possível. Não é porque eu entrei como geofísico que eu vou passar a vida inteira fazendo a mesma coisa. Nós temos muitos exemplos de pessoas que foram para a área de Planejamento, foram para a área de Ensino, enfim, que estão na área de RH, estão na área de Meio-ambiente. E como é uma companhia que está sempre crescendo, sempre com projetos cada vez maiores, cada vez mais desafiantes, lá dentro estão todos os desafios. É como eu digo, no meu caso, tu não planejas e as coisas acabam acontecendo, porque temos falta de gente. A gente passou um período longo sem contratar. Desde o início dos 90 que não se contratou, a complexidade das atividades aumentou muito. A complexidade do meio-ambiente onde está a Petrobras, a mudança da legislação do petróleo, surgiu a ANP (Agência Nacional de Petróleo), as restrições ambientais cada vez maiores. Então tudo isso tornou o ambiente mais complexo, demandando mais mão-de-obra, estudos mais aprofundados. Então, não falta desafio dentro da Petrobras. Então o único plano que eu vou te dizer é o plano que eu não tenho: de me aposentar. Já estou com 30 anos. Parece que passou muito rápido. E, agora, a intenção sempre é continuar na Exploração. Mesmo eu estando lá no Cenpes, estou ligado à área de Exploração, mas, como diz lá no Sul, “quando o cavalo passa encilhado, a gente sobe.”
Mas, se cair lá na frente, a Petrobras te dá todas as condições para não cair, te dá todo o apoio, a gente começa de novo. Mas, pessoalmente eu acho que já atingi um nível gerencial bastante alto. É bom de participar, é desgastante, é um nível de estresse alto, mas é bom participar desse processo todo. Porque a gente vê, os frutos estão aí. Isso é extremamente prazeroso. Eu entrei na Petrobras ela produzia, eu acho, 180 mil barris por dia. Era uma companhia bastante pequena. E em 30 anos a gente está no nível que está. Expandindo a atividade internacionalmente. Entrando novas áreas, novas fontes de energias. Então todo dia tem novidade, é uma coisa que não cansa ninguém lá dentro. Ninguém vai ficar no marasmo. Lá ninguém pode reclamar que não está motivado, que não tem desafios, porque acho que é uma excelente hoje em dia para quem estiver se formando, realmente hoje em dia é uma excelente oportunidade para fazer uma carreira prazerosa. De se realizar profissionalmente, porque do ponto de vista salarial eu não diria a mesma coisa, mas também ninguém morre de fome. Na Petrobras, eu acho que o nível salarial é compatível com o país e é o que tem que ser. Não pode estar se comparando com as grandes multinacionais, os níveis salariais são diferentes. Mas o contexto é outro. É uma comparação fácil, mas não é a melhor a fazer.
PROJETO MEMÓRIA Eu acho extremamente interessante saber não só a história, porque a história da Petrobras está bem registrada, se fizer uma pesquisa bibliográfica tem muita documentação muito bem feita. Todos os feitos estão aí registrados. E o que falta realmente são as pessoas que fizeram isso, porque isso tudo foi feito pelas pessoas. Obviamente, depende de uma série de coisas, depende da conjuntura, do cenário que está inserida a Petrobras. Mas não tem jeito, são as pessoas que fazem e isso normalmente não fica registrado. O que fica registrado, às vezes, é a passagem técnica, o relatório. O cara foi gerente, foi isso. Quer dizer, uma coisa muito fria e que não reflete o que são. Da onde vieram essas pessoas, por que e como chegaram, aonde chegaram? Quer dizer, eu acho fundamental o Projeto Memória. Para um novo que chegar na Petrobras realmente ver onde ele está entrando, exatamente como alguém que teve uma carreira de sucesso na Petrobras tanto tecnicamente quanto gerencialmente viveu. As coisas dentro da Petrobras dependem da tua competência e da tua dedicação. Eu diria mais da dedicação, porque quem supera os pontos fracos é com dedicação, né? E uma coisa é importante: a vida e a Petrobras são feitas do arroz com feijão. A gente não vive só de idéias brilhantes, de grandes sacações. Como já foi dito aí: é muito suor, precisa de muito suor, não adianta grandes idéias se não tiver com muito suor por trás. O que faz realizar é o suor, é a dedicação. E é uma companhia que precisa de uma dedicação do ponto de vista da disponibilidade pessoal. Porque exige movimentação. Em geral, muitas das atividades exigem que tu mudes muito de lugar, o que tem impacto na família e é uma coisa que tem que saber gerenciar. Mas, de novo, por mais problemas que cause uma mudança, o prazer que tu tens de chegar em uma área nova, de se realizar numa nova posição, conhecer gente nova. Gente que tu jamais imaginou que conheceria. Locais que tu jamais também imaginou que iria. Então, tudo isso compensa qualquer uma dessas exigências da profissão, principalmente de geólogo, de geofísico, a dedicação que a atividade de exploração exige, todo isso compensa. Ainda mais quando você acha um campo de petróleo então aí. Não achando petróleo é bom, então se achar petróleo, pelo menos num campo, aí a felicidade é plena.Recolher