IDENTIFICAÇÃO Meu nome é George Luiz Rocha da Câmara. Nasci em Parazinho, no Rio Grande do Norte, em 30 de setembro de 1959. INGRESSO NA PETROBRAS Ingressei na empresa em 1985, sendo que o concurso, para ingresso, foi um ano e meio antes, em julho de 83. Interrompi a faculdade para ...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é George Luiz Rocha da Câmara. Nasci em Parazinho, no Rio Grande do Norte, em 30 de setembro de 1959.
INGRESSO NA PETROBRAS Ingressei na empresa em 1985, sendo que o concurso, para ingresso, foi um ano e meio antes, em julho de 83. Interrompi a faculdade para me submeter a esse processo, em Natal. Como a Petrobras foi muito exigente, ela esperou, submeteu a turma a um embarque de 15 dias, para saber se tinha alguém preguiçoso, e a exames e tal. Fomos para Aracajú, em 1º de janeiro de 84, fazer o curso, o estágio. Só com 80% do estágio concluído, é que a gente foi admitido. Então ficamos, de 31 de julho de 83 a 1º de fevereiro de 85, ou seja, exatamente 1 ano e meio, nesse processo. Todo o processo foi seletivo, classificatório, eliminatório. A gente, uma turma de 30, foi fazer curso em Aracajú e 10 foram eliminados, no final de 6 meses. Então foi permanentemente eliminatório.
SINDICATO TRAJETÓRIA SINDICAL Quando voltei para Natal, para trabalhar,em Guamaré, passei a participar do movimento sindical. Aí o tempo ficou difícil. Consegui, ainda assim, concluir a faculdade. Vai fazer 20 anos, agora, em junho de 2003, que entrei no Centro Acadêmico do curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Agora a gente vai se reencontrando com as datas. Cheguei em Natal em agosto, setembro de 85, o congresso foi subseqüente, em junho, eu já estava dentro, participando.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Profissionalmente, para mim, foi uma coisa muito positiva. É uma área muito complexa, trabalhar com gás, com processamento de gás. Foi uma novidade o volume de conhecimento, para trabalhar naquela área, uma UPGN, lá de Guamaré, que processa gás, separa gás de cozinha, gasolina e tal. Posteriormente, as unidades se ampliaram. Então, foi uma coisa muito rica do ponto de vista profissional e do ponto de vista político. Eu não sabia, que ia acabar sendo o presidente do sindicato, algum tempo depois.
Era um processo de acúmulo de muitas lutas do movimento sindical brasileiro. A década de 80 foi um pouco isso. Os metalúrgicos no início da época de 80, os bancários nomeados e os petroleiros, no final. Pegamos um pouco esse movimento, não tinha um dia, que a gente não aprendesse muitas coisas, com as lutas. Desde luta da CIPA, do local de trabalho, por uma boa alimentação, jornada digna, condições de trabalho mais favoráveis, as lutas mais gerais, as greves e tal.
Aprendemos muito. Era uma faculdade de política no dia-a-dia, pela vida, pelos interesses conflitantes, muitos dos quais eram administrados e outros não, e que nos ensinou muito nesse processo. O movimento sindical patrocinou esse volume de conhecimentos, não só para mim, como para vários colegas.
SINDICATO TRAJETÓRIA SINDICAL Em 88, perdemos a eleição para o sindicato. Ficamos na oposição e fui eleito, logo em seguida, delegado sindical do Pólo Guamaré. Nesse mesmo ano, tivemos o enfrentamento, organizando lutas. A gente, em vez de desembarcar, ficava escondido na área. O chefe dizia que tinha de encontrar o delegado sindical para tirar ele da área e tal. Era aquela briga de gato e rato. No final do dia, a gente conseguia ganhar uma punição, uma suspensão, uma advertência. Era sempre assim. Como era um trabalho coletivo, às vezes, a gente nem estava presente, mas o trabalho era feito, era um trabalho de equipe. Então, 88 foi muito isso.
A greve de 88, em novembro, a greve dos 4%, do TST, 11 dias de greve. Foi um momento muito marcante, para mim, particularmente. Foi o primeiro movimento que dirigi, estava na linha de frente em Guamaré, uma área aqui no Estado do Rio Grande do Norte, de uma importância muito grande do ponto de vista político e econômico. No sentido político, de dar mais barganha para o movimento sindical.
Guamaré processa todo óleo que vem do campo terrestre e todo gás que vem do mar. Ele é gargalo de garrafa nos dois sentidos, somos o maior produtor de petróleo do Brasil, em terra. O que vem de Mossoró, o que vem do Alto do Rodrigues, tudo passa em Guamaré. Só vai para os navios, para ir para o refino, passando pela tancagem de lá. Todo gás, que vem dos poços do mar, só é transformado em gás de cozinha, gasolina, em Guamaré Então, é uma área duplamente importante. Porque mesmo não tendo um número grande de trabalhadores, era de um grande potencial e, sem dúvida, essa área estando coesa, aumentava o nosso poder de barganha, numa mesa de negociação local ou nacional.
SINDICATO SINDIPETRO RN Passamos por um amadurecimento: acúmulo de forças, de experiências, num processo de luta crescente, de reivindicações, sempre no sentido de avançar. Ano a ano, nós buscávamos avançar mais um pouco ou conquistar mais alguma coisa, nos acordos coletivos, o que também nos trouxe uma experiência rica, para um tipo de ação. A partir do ano 90, quando teve a implementação de um projeto no País, que atacou duramente o Estado brasileiro, as estatais, particularmente a Petrobras, os direitos sociais dos trabalhadores, nós passamos a ter outro tipo de enfrentamento. A resistência contra demissões, as retalhações, vários tipos de perseguição, que se refletia no dia-a-dia, no chão da fábrica. Então, postura gerencial passava a ser de confronto, não só com os dirigentes sindicais, com os militantes, mas, também, com as pessoas em geral que questionavam uma situação adversa. Então foi um novo ambiente.
Esse ambiente, também, nos deu muitas lições, mas um outro tipo de lição. Como você enfrentar uma conjuntura adversa, resistindo para não perder direitos. Se aquela conjuntura anterior nos colocava para avançar, conquistar aquilo que nós entendemos como uma coisa digna, a conjuntura subseqüente, de Collor para cá, nos obrigou a aprender outras coisas, aprender como não perder, como preservar. Sair num acordo coletivo com aqueles direitos preservados.
É como se você invertesse os valores. Agora, o acordo coletivo é como se fosse a Petrobras querendo tirar direitos. Esperar 1º de setembro, não era esperar para a gente avançar alguma coisa, era para evitar que tirassem algumas coisas.
Realmente, isso trouxe um novo tipo de enfrentamento, um novo tipo de lição para nós. Desse período de 90 para cá, coincidentemente, tem início no Rio Grande do Norte um movimento da empresa, a chamada qualidade total. Nós não éramos contra fazer as coisas com qualidade, claro. Quem não quer fazer tudo com esmero? É da natureza humana fazer, bem feito, o que faz. Nós, evidentemente, não vamos remar contra a natureza humana. Mas, passou-se a idéia de que a qualidade era uma propriedade do empregador, do patrão, e que nós, trabalhadores, tínhamos que ser convencidos de entrar na linha daquela qualidade. O Sindipetro do Rio Grande do Norte, muito cedo até para enfrentar isso, constituiu um grupo, para estudar essas questões desde a sua origem. No caso, aqui, na UFMG, a partir da Fundação Cristiano Antônio, que nós enfrentamos a idéia do Godói, do Vicente Falcão de Campos, elaborando junto já com a FUP, que se
começava a criar. Saindo da FENAPE, da FUPEI e indo pra FUP, a gente também fazia um pouco esse debate em nível nacional. Então, a gente enfrentou, da base da empresa, mesas redondas e tal. Você tinha um enfrentamento, nesse campo, de tudo que era idéia. Predominantes eram as idéias, que vinham de cima para baixo para você ser convencido, no bom sentido, até à força, para implementar aquela política. Então foi muito difícil, porque, aí, veio o corte de postos de trabalho, ataque aos direitos, muitas transferências, muitas perseguições. As perseguições eram tamanhas, que você nem reclamava se você era agraciado, com algum tipo de transferência. “Está aqui, vá não sei para onde”. Ninguém nem reclamava, porque estava tão ruim o clima, que ninguém sabia o que era pior, ir embora ou ficar naquele clima.
Para nós, por exemplo, que trabalhávamos em turno, na unidade como a UPGN. Antigamente quando você tocava uma cigarra, qualquer sinal luminoso ou sonoro de indicação de uma anormalidade, tinha um impacto na nossa cabeça. Tinha cinco operadores naquele turno da noite. Quando passou a ter um operador ou dois, aquele tipo de toque já te causava uma impressão, quer dizer, já te refletia, instintivamente, adrenalina no sangue, toxina no sangue, você já tinha outro tipo de reação. Então, você também tem um impacto na sua saúde física, mental.
Tudo isso então, dentro do dia-a-dia, do local de trabalho, passou a ter essa feição da luta de classe. Você tira uma foto de alguns colegas nossos, de antes e depois, passados 5 anos. O semblante das pessoas, é como se tivessem passados 15 anos. Por ter enfrentado essa angústia no local de trabalho; as inseguranças em relação à família; mudança de regime de trabalho; tirar o regime de turno, para as pessoas passarem a não ter mais aqueles postos de trabalho... Tudo isso, foi um clima de muita tensão. O enfrentamento, que havia numa mesa de negociação, com muitas dificuldades, havia, também, na sociedade. Um grau de dificuldade. No chão da fábrica, também se manifestou de várias formas, com perseguições das mais diversas. Você vê os gerentes se aproveitando de uma situação, de uma diretriz: “olha, aqui trabalham dez pessoas, basta que fiquem sete”. Aí o gerente, “não, vou deixar só quatro”. Alguns oportunistas cresceram com isso.
Enfrentamos algumas idéias contrárias, de pessoas que achavam que defendiam, honestamente, melhor a empresa daquele jeito. Você até respeita, porque você vai para o convencimento, você é convencido ou convence. Mas, quando é uma postura desonesta, de alguém se aproveitar disso para fazer carreira, não importando quantos trabalhadores perdem trabalho, as condições de vida de um trabalho digno... Isso gerou uma angústia muito grande nos colegas. A gente ficou, assim, muito irmanado. Estou falando de 90 para cá, quando tiveram demissões no governo Collor, quando o nosso sindicato, juntamente com os outros sindicatos, fez a greve nacional em junho de 90. Essa greve, não só, não conseguiu fazer retornar o pessoal, como produziu retaliações, demissões de dirigentes sindicais. Tudo isso passou a ter um certo impacto, um impacto psicológico na categoria. A implementação desse modelo de qualidade total, a gente, analisando melhor, pode constatar porquê que veio para uma área tão jovem. No Rio Grande do Norte, a Petrobras é uma categoria jovem. Na Bahia, por exemplo, até mesmo Sergipe, Rio de Janeiro, Cubatão, tem neto, o pai é aposentado da Petrobras, o avô foi da Petrobras, três gerações... Olha, em algum caso até
bisneto. Quando você incorpora o amor à empresa como se fosse o amor à dignidade, você aprendeu, teve condição de vida digna, nesse contexto, nesse universo, é um impacto muito grande se atacar direitos. Como a nossa categoria era mais jovem, crescendo a produção de petróleo, crescendo o potencial de geração de emprego - ainda que não gerasse emprego, porque está mais terceirizando e tal -
não tinha esse vínculo histórico e cultural com a Petrobras. Olha “O Petróleo é Nosso”, nos anos 50,
é uma coisa que se confunde com o Brasil, até a cor e tal. É exemplo da engenhosidade do brasileiro a Petrobras ter dado certo, então é esse o componente. Mas, não tem o componente interno intrínseco com a sua vida, laboral, profissional e como cidadão. A gente avaliou, naquela época, que foi mais fácil implementar esse modelo numa área como essa, do que numa área onde ele iria ter mais resistências, até familiares. Você puxa uma greve para enfrentar uma situação. O filho faz a greve, porque está ali defendendo o pai, o avô, o filho dele que vai nascer, quer dizer, há um vínculo, laços de solidariedade, que ajudam. Quando você perde isso, fica mais difícil.
Foi um pouco isso que a gente viu, até passarmos a enfrentar uma nova situação, que é começar a lutar para acumular. Produzir uma nova realidade, que a gente enaltece, com esse resultado eleitoral de 2002, em que a Petrobras se reencontra com a história. Se reencontra com uma possibilidade, uma esperança, com as condições de abrir um novo caminho, de se reencontrar com aquela trajetória, que surgiu há 50 anos atrás. Veja só, na nossa atividade sindical, nesses últimos 15 anos, de 88 para cá, são duas marcas muito definidoras que existem. É você saber separar a hora de lutar: Petrobras enquanto patrão, Petrobras enquanto patrimônio do nosso povo. Com a mesma desenvoltura, que a gente foi aprendendo a lutar pelos nossos direitos, a gente também foi aprendendo a lutar pela empresa.
Do mesmo jeito que posso fazer uma greve, supostamente, contra o patrão, no outro dia,nós podemos estar na rua defendendo aquela empresa. A mesma empresa que ,naquele dia, você fez a greve contra. Você pode estar, indo para a rua, botar bandeira na mão, gritar, falar, usar aquela lição para defender a empresa, enquanto patrimônio do povo. Esse é um aspecto. Um exercício, dado a condição da Petrobras, dado às particularidades da empresa,
que não é difícil de visualizar. Quando você reivindica salário, você reivindica do ponto de vista de fortalecer um modelo que respeita o trabalhador, respeita as estatais, dá suporte à soberania do país. Então, se confunde um pouco. Você tem essa luta e a vida nos ensinou a fazer isso, de certa maneira. Uma outra coisa é o perfil da categoria, também. No Rio Grande do Norte, mais do que nos outros estados, por questões objetivas, ser um sindicalista é ser capaz de representar uma categoria de perfil heterogêneo. Vai de uma contratada do pé de uma sonda, em condições sub- humanas de trabalho, a alguém que trabalha numa área superior, num ambiente de trabalho de condições confortáveis.. Grandes geólogos, engenheiros, técnicos e tal. Ter essa capacidade, respeitar a heterogeneidade, representar legitimamente esses interesses sem frustar, porque quando você representa alguém que está num pólo, você pode estar deixando de representar em outro.
Como é que se resolveu isso? A diretoria do sindicato tem um pouco esse perfil, e o conjunto dos trabalhadores tem um pouco essa versatilidade, de você ir de um ponto ao outro, respeitando as particularidades. Se você chegar, por exemplo, num pé de uma sonda, com o carro do sindicato limpinho e com uma roupa de cidade, o cara diz “olha rapaz, o sindicato parece que não faz nada e tal”. Fazendo apologia com a falta de higiene, quando você chegava com a farda suja de óleo, o carro sujo, “rapaz, o sindicato está igual a gente aqui”. Vai chegar com o carro sujo, a farda cheia de óleo, aqui na sede em Natal, o pessoal logo vê que tem um peixe fora d’água. Esse exemplo, mostra um pouco a diferença de perfil e o desafio de você representar bem. Então o sindicato sempre teve, até por força das circunstâncias, a tarefa de se capacitar para isso. IMAGENS DA PETROBRAS Sou vereador há
2 anos e 5 meses aqui em Natal, pelo Partido Comunista do Brasil, PC do B. Em junho agora, estarei fazendo 20 anos de partido. E a grande referência nossa, na sociedade, não é como advogado, é como petroleiro. É produto daquele crescimento da luta dos petroleiros na sociedade, pelo papel que joga a empresa na economia do Estado, na sociedade e, a categoria petroleira, pelo espaço que conquistou, também, nesse cenário. Então, quando escrevo um artigo no jornal faço questão de colocar petroleiro, porque é um pouco essa marca com que a gente é visto. Também a nossa atuação, como vereador, está calcada num tripé: produção legislativa, fiscalização do poder e participação popular. Nos três casos a gente atua muito com a categoria petroleira. Vez por outra, vou num pólo industrial de Guamaré, numa área do Alto do Rodrigues, em Mossoró, nós nos relacionamos muito bem com a categoria e muitas de nossas leis, têm uma produção significativa, não são de minha cabeça, são de colegas petroleiros, de outros ambientes. Uma rua, uma escola, um bairro, uma empresa, uma universidade, que acabam trazendo idéias, que a gente transforma em leis, em resoluções. Há essa relação.
O meu lazer é feito no clube da Petrobras, gosto muito. Meus amigos são os petroleiros, é lógico que nós temos outros amigos. Meu primeiro requerimento aprovado esse ano, em fevereiro de 2003, foi uma homenagem aos 50 anos da Petrobras, no dia 3 de outubro, numa sexta-feira, às 10h da manhã. Para nós, é uma honra fazer parte da categoria e dessa empresa, que foi capaz de enfrentar a tempestade neo-liberal, essa tragédia social, e estamos vivos. ENTREVISTA Eu queria parabenizar o Sindipetro São Paulo. É muito bom, a gente, ser pioneiro. A campanha “O Petróleo é Nosso” em 93 - quarenta anos depois da de 53, “O que é bom para o Brasil deve continuar com os brasileiros” - foi um projeto nosso, aqui, do Rio Grande do Norte. Eu era diretor do sindicato e, o projeto, foi produzido pela diretoria do sindicato com alguns colaboradores. Imagino a sensação de vocês. A gente se sentiu tão importante, em oferecer aos outros sindicatos, aquela idéia.
Ver que hoje, passados 10 anos, nos 50 anos da empresa, eu tiro o chapéu para essa iniciativa do Sindipetro de São Paulo. Nos dá orgulho de ser petroleiro, ver você fazendo um trabalho tão belo como esse, um trabalho de resgate político, histórico, cultural, que a própria empresa só tem a ganhar. A categoria tem muito que se orgulhar disso.Recolher