IDENTIFICAÇÃO Meu nome é José Miranda Formigli Filho, nasci aqui no Rio de Janeiro, em 30 de março de 1960. FAMÍLIA Meu pai se chamava José Miranda Formigli e minha mãe Arlena Maria Pires Formigli, sendo que o meu pai já é falecido e minha mãe é viva. Os nomes dos av...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é José Miranda Formigli Filho, nasci aqui no Rio de Janeiro, em 30 de março de 1960.
FAMÍLIA Meu pai se chamava José Miranda Formigli e minha mãe Arlena Maria Pires Formigli, sendo que o meu pai já é falecido e minha mãe é viva.
Os nomes dos avós paternos são Luiz Formigli e Orminda Miranda Formigli e dos avós maternos Artur Rocha Pires e Helena Burgos Soares. Meu avô por parte de pai era filho de italianos, ou seja, meu bisavô e bisavó, pais dele, vieram da Itália, Florença. Ele foi Cônsul, se não me engano, em Pernambuco. Nesse período, o meu avô conheceu minha avó, na Bahia, no interior, se casaram e tiveram vários filhos, sendo que o caçula foi meu pai. E a minha avó morreu praticamente de parto, poucos dias depois do meu pai ter nascido. Meu pai foi sempre criado por pais de criação, a irmã da mãe dele, a tia e o tio, porque apesar do pai ter ficado vivo, ele não tinha muita infra-estrutura para cuidar de tantos filhos que eles tinham, cada um foi sendo criado por uma parte da família. Depois também meu pai ficou órfão do pai cedo, relativamente, com sete anos, eles se mudaram para uma cidade um pouquinho maior, lá ainda no interior da Bahia, um lugar chamado São Félix, que foi a primeira vez onde ele chegou a conhecer a minha mãe tempos depois. Bem, isso é pelo lado do pai. Pelo lado da mãe, meu avô paterno, ele era um comerciante de razoável sucesso no interior da Bahia, no recôncavo baiano, nessa cidade de São Félix, foi casado com a minha avó, Helena, ela também faleceu relativamente cedo, em termos de idade da minha mãe, ela era bem nova ainda e também estudou em colégio interno. Na verdade os meus pais voltaram a se encontrar, apesar de terem se conhecido muito tempo antes lá nessa cidade São Félix, eles vieram a se encontrar de novo quando minha mãe veio ser professora no Instituto Benjamin Constant de cegos. Ficando aqui, eles acabaram namorando, casaram, e isso foi em 1959, e eu nasci em 1960, sou filho único. Meu pai tinha vindo há muito mais tempo para cá. Meu pai, desde cedo, como eu falei, foi criado pela tia e pelo tio, o pai dele faleceu, eu acho que ele tinha uns sete anos e o tio também faleceu, ele tinha um pouquinho mais de idade. Ele foi para essa cidade de São Felix e começou a perceber que
tinha muita dificuldade de progredir sem ter muita infra-estrutura. Ele resolveu vir para Salvador, e como ele era órfão ele mandou uma carta, ele era bem novo, tinha uns 13, 14 anos, ele fez uma carta, para a Escola de Aprendiz de Marinheiro, em Salvador. Dizendo o seguinte: “que ele era órfão, que tinha sabido que na Marinha admitiam jovens para fazer ainda o ginásio e ele só tinha o primário, e que ele gostaria de ir”. O Comandante da escola leu a história dele, - naquela época as coisas não eram assim tão estabelecidas e burocratizadas quanto hoje: “Não, para fazer a Escola de Aprendiz de Marinheiro tem que ter um concurso público e tal.”, o cara viu que ele tinha o primário, viu que ele era órfão, precisava de alguém para cuidar dele na vida e o comandante resolveu colocar ele para dentro da escola. E aí ele entrou e passou vários anos na Marinha como marinheiro. Se não me engano ele ficou, passou a época da guerra, em Rio Grande do Sul, serviu em algumas bases ao longo da costa brasileira e, no final da guerra ele pediu baixa da Marinha e foi trabalhar na área de estaleiros como empregado. Ele tinha aprendido algumas técnicas da área de naval, a gente não pode falar de engenharia naval, ele sabia fazer reparos, essas coisas.
Isso ele já estava no Rio. Minha mãe ainda continuava
em Salvador. Nessa época então ele começou a trabalhar com desgaseificação de tanque de navio, que era um negócio relativamente novo e foi aí que ele, na carreira civil começou a ter uma melhora de vida.
No meio da década de 50, minha mãe, que já era formada professora, e também já tinha feito o curso de professora para cegos lá em Salvador, veio fazer um curso no Instituto Benjamin Constant, aquele que fica na Urca. E ela trouxe uma carta. Por que a mãe de criação do meu pai, que ainda era viva, falou para ela: “Ah, você está indo para lá? Ó, o Zeca – que era o apelido do meu pai – o Zeca mora lá no Rio, você está chegando lá, não conhece ninguém. Ah, você lembra do Zeca?”, “Me lembro, eu era pequena, ele era maior.”. Aí deu uma carta, ela quando chegou aqui foi morar em uma casa dessas assim que alugam vários quartos. Naquela época era normal, acho que ainda hoje é, interior é mais normal, talvez aqui no Rio a gente vai ficando tão acostumado assim na zona sul que a gente não sabe como que a vida é realmente. A gente tem uma visão de glamour da vida e, na verdade, a vida não é assim tão fácil. Bem, então ela veio, conseguiu esse lugar, encontrou com o meu pai, se gostaram, namoraram, casaram e eu nasci, entendeu?
FAMÍLIA / ORIGEM DO NOME O que eu sei do nome Formigli é que eles são oriundos de Florença. Se você entrar na internet, em um buscador, e botar lá Formigli, vai ver que tem uma razoável concentração naquela região do norte da Itália, ou seja, pessoas ainda vivas. Tem um site que é um fabricante de bicicleta de corrida. Tem um cara que aparece muito, é o Leonardo Formigli, pelo que eu vi é um especialista em inseminação artificial humana, tem vários artigos e tal, mas tem Formigli para todo lado, tem Formigli que é dono de vinícolas lá no interior da Itália, tem Formigli na Alemanha, tem Formigli nos Estados Unidos e aqui no Brasil a concentração dos Formigli’s é na Bahia. Como lá tinha muito mais filhos do que os meus pais, que só teve um, lá tem mais Formigli’s espalhados, alguns em Salvador, mais pelo interior e mais ainda ali no sul da Bahia, por Itabuna e Ilhéus, ali que você acha Formigli no Brasil.
FAMÍLIA Eu nasci no Rio, morei e moro até esse final de semana, porque a minha família continua morando em Rio das Ostras - a minha família que eu digo a minha esposa e minha filha – elas continuam morando em Rio das Ostras e esse final de semana a gente está fazendo a mudança para cá. Eu estou morando lá porque eu passei esse um ano e meio trabalhando aqui pela Petrobras, aqui no Rio, mas mantive a minha família lá e venho, moro com a minha mãe durante a semana, volto sexta-feira para lá e segunda-feira de madrugada venho para cá. Como a perspectiva é de ficar morando muito tempo agora, e esse esquema é bastante cansativo, aí eu combinei com a minha mulher e minha filha delas virem morar aqui no Rio. Mas desde pequeno até terminar a faculdade e entrar na Petrobras eu fiquei no Rio – então isso foi em 1983, eu tinha 22, quase 23 anos – depois aí pela Petrobras eu andei alguns lugares, casei e aí eu voltei a morar na minha mãe, em Copacabana, e agora eu estou me mudando para o Leblon.
INFÂNCIA / COPACABANA Morei na Rua Dias da Rocha, em Copacabana, onde até hoje minha mãe vive. É uma rua transversal, ali entre Nossa Senhora de Copacabana e Barata Ribeiro, e como não é uma rua que vai até a Avenida Atlântica, é uma rua razoavelmente tranqüila. Hoje, o [prefeito] César Maia fez o favor de fechar a rua e ficou mais calma ainda, o que na verdade até ajudou o local a ficar mais tranqüilo. Eu era filho de classe média média, significa que naquela época o padrão de vida de uma classe média média era muito menor do que o padrão de uma classe média hoje. Às vezes eu vejo as pessoas reclamando do custo de vida e a qualidade de vida pode ter piorado, mas o padrão dos bens financeiros, sem sombra de dúvida, elevou. Hoje é muito mais fácil uma pessoa ter carro do que na minha juventude, eu vim ter carro na faculdade, meu pai fez um tremendo de um sacrifício para me dar um carro. Eu estudava ali por perto mesmo, em Copacabana, minha distração preferencial e mais rotineira era praia, jogar bola ali na praia de Copacabana mesmo, apesar de eu nunca ter sido um bom jogador de futebol, mas eu gostava de ir. Ficava pescando na beira da praia.
EDUCAÇÃO Fiz o primário em uma escola bem ali próximo, Instituto Santa Filomena, depois fiz o ginásio também em uma escola próxima. O Santa Filomena acabou, essa outra escola ainda existe, do ginásio, é o Ginásio Guido de Fontgalland, fica atrás da Igreja São Paulo Apóstolo, perto da Rua Barão de Ipanema.
Depois eu fui para uma escola no Leblon, Santo Agostinho, fiz dois anos, o científico, naquela época se chamava ainda científico e eu fiz vestibular, passei para a faculdade de engenharia e a faculdade era na Urca, existe ainda.
AMIGOS DE INFÂNCIA
Eu não era muito de ficar em rua. Eu ia mais para a praia. Inicialmente minha mãe ou meu pai me levavam e, obviamente quando eu era pequeno, levavam e traziam e eu tinha que ficar com eles. Depois, passando o tempo, eu comecei a ficar na praia sozinho, mas tinha que atravessar a rua, aqueles negócios. Até uns, sei lá, uns nove, dez anos. Depois daquilo, aí não, eu ia e voltava, ficava lá na
praia e voltava.
Na turma do colégio tive grandes amigos. Esses amigos, a gente saía às vezes juntos, cinema, uma coisa dessa, eu nunca fui um camarada muito de turma, nem de eventos sociais constantes. Eu sou mais, tirando ver um esporte, praticar esporte mais ou menos, até hoje eu não sou muito chegado em grandes turmas. Isso não me ressente, mas eu comparo com outras pessoas que têm um círculo de amizades, um círculo social mais intenso e me dá curiosidade porque talvez fosse melhor. Mas também não faço a menor força para ir para aquele outro lado, então devo estar feliz do jeito que estou mesmo porque senão eu já tinha me incomodado, já tinha buscado uma solução.
LAZER
A primeira coisa é o seguinte, eu era um cara bastante estudioso, então as pessoas podem olhar: “Pôxa”, então eu me divertia uma boa parte do meu tempo lendo, isso sempre me agradou. Eu lia desde ficção científica passando por livros assim que descreviam batalhas, guerra, sempre foi um negócio que eu gostei muito. Eu sempre tive muito interesse de fazer cursos paralelos, então fazia curso de inglês, me formava em inglês e fazia curso de leitura dinâmica. Eu me lembro que a minha mãe chegou em uma época, isso eu não fiz por querer, ela me fez querer, foi um curso de datilografia. Eu sou agradecido a ela até hoje, porque eu digito super rápido. Eu me lembro que naquela época, a minha mãe foi daquela geração que fazer concurso no Banco do Brasil era um negócio importante, a minha geração não foi mais o concurso do Banco do Brasil, já tinham outras opções. Concurso do Banco do Brasil era um negócio fundamental, então ela olhava e dizia assim: “Bom, meu filho, se você não conseguir passar na faculdade, pelo menos você vai ter condições de fazer um concurso do Banco do Brasil.”. O concurso do Banco do Brasil, tinha que entender de datilografia, então eu fui fazer datilografia na Escola Remington, e fiz curso de leitura dinâmica, foi um negócio também legal, hoje eu percebo que eu consigo ler com bastante rapidez, fiz curso de memorização, fiz curso de tradução inglês. Também gostava sempre de cinema, sempre que eu podia ficava ali controlando as censuras para poder ir aos cinemas. Tinham cinemas que obviamente eram mais fáceis de você entrar estando a poucos anos da censura, tinha outros que era completamente impossível porque o cara tinha um controle grande. Aliás, como é até hoje, engraçado, eu percebo que aqueles cinemas de shopping o controle é muito mais rígido do que um cinema de rua. Eu sei por causa da minha filha. Então a minha distração era essa, eu gostava muito de ir à praia, gostava muito de pescar. Ia
para a praia assim, três, quatro horas da tarde e saía da praia oito, nove, dez horas da noite. Hoje provavelmente eu ficaria um pouco preocupado de ficar até 10 horas da noite na praia, mas naquela época era a coisa mais tranqüila do mundo, você podia vim para a casa, atravessava a rua, a areia ali da Praia de Copacabana inteirinha não havia o menor risco, hoje talvez as pessoas fiquem com medo, mas eu acho que ainda dá para fazer isso, quando eu passo ali no calçadão eu olho, eu vejo os caniços lá montados. Como classe média média tinha as férias do ano, então tinha aquele período assim que tirava férias e aí ia para São Lourenço, para Guarapari, e chegava nesses lugares já tinham pessoas conhecidas desses lugares, onde você se encontrava.
Bom, essa coisa foi crescendo e obviamente que os interesses vão se diferenciando, e aí já deixa de ser de infância, vira adolescente. Eu poderia chamar que eu fui um cara meio individualista, como chamaria, um eremita, mais quieto, mais isolado. Eu vim ficar assim menos isolado, já mais velho, acho que mesmo na Petrobras, até mesmo na faculdade eu era razoavelmente quieto.
EDUCAÇÃO Eu estudei em três escolas até a faculdade.
Foi um bom universo, eu guardo boas recordações das três escolas. Tanto guardo que a minha filha, ela está com 13 anos e está vindo para estudar no Santo Agostinho, que foi a minha última escola. Eu fiz o científico lá. Ela está vindo para o ensino fundamental. Nas outras duas escolas também gostei muito, uma sumiu, acabou.
As sessões de cinema que existiam no ginásio. Tinha no primário um negócio legal que era aula de música, que era um negócio legal. Não sei nem se hoje ainda existe isso, acho que já acabou, agora tem aula de informática. Não sei para que precisa ter aula de informática já que os garotos conseguem aprender tudo sozinho, muito mais fácil do que nós, e 99% deles têm um computador em casa. Bom, tinha aula de música e nessa aula de música, era legal, quando a professora de música, que era uma professora legal, conseguia mobilizar a garotada – garotada ali a gente está falando de garoto até nove, dez anos. Quando chegou no ginásio, que já é uma faixa etária mais complicada de 10 até 14, essa é uma boa lembrança que eu tenho, que eu estou te falando, tinha um auditoriozinho pequeno e tinham sessões de filmes. Eu me lembro que, hoje a gente olha para trás e vê: “Mas que filme vagabundo”, mas naquela época não tinha vídeo, a única forma de você ver um filme era no cinema ou na televisão, sendo que na televisão, eram filmes normalmente muito antigos. Essa velocidade que a televisão traz hoje, o filme que apresentou no cinema, não existia. Você via na década de 60, filmes de 40, 50, então eram filmes meio anacrônicos. Ali tinham essas sessões de cinema e eu me lembro, a gente pegava o filme acho que era algo a ver com Embrafilme, tinha uns rolos. Eu me lembro que uma vez a gente tinha uma programação onde os alunos mesmos podiam ir lá e escolher, a gente foi escolher, eu e um colega, em um lugar super empoeirado, ali perto da Casa da Moeda, perto da Praça da República, a gente escolheu um filme. Eu acho que era tipo um arquivo de filmes, se não me engano tinha a ver com a Embrafilme. E você conseguia pegar filmes super antigos, mas que me dava o poder que hoje você tem de ir à locadora e escolher, que naquela época não tinha. Então eu podia chegar lá, via uns filmes velhos, você podia chegar
e escolher o filme. Isso hoje, se eu falar isso para a minha filha, ela vai dizer: “Pô, pai, está ficando doido? Qual é a graça que tem isso?”. Tem vídeo, tem centenas de filmes para escolher, só que naquela época não tinha. Nesse auditório havia uma sessão semanal de filmes, isso daí também era um negócio legal na escola. As formaturas também eram legais, normalmente eram bem transadas e tal.
PROFESSORES Eu tenho boas recordações dos professores.
Do ginásio, eu me lembro de alguns professores que foram bem marcantes. Professor de matemática chamava-se Fernando Pinheiro, extremamente exigente, mas um camarada que sabia mobilizar a turma, que cobrava, mas ao mesmo tempo tornava as aulas atraentes. Conseguia caminhar bem nesse dilema, já que ao mesmo tempo que ele apertava a turma, a garotada gostava dele porque ele sabia tornar as aulas agradáveis. O Fernando dava aula de matemática. Tinha também uma professora de português excelente, Dona Diva, ela era advogada, dava aula e criou uma base excelente de português que eu diria que o que eu aprendi nos dois anos do ginásio que estudei com ela, provavelmente, representam 90% do que eu precisei aprender posteriormente de português até o vestibular. Teve também um professor de desenho muito bom, Antônio, era excelente também como pessoa, conseguia transmitir umas mensagens legais. E tinha um professor de história e de geografia que apesar de ser um camarada meio controverso e eu tive um problema com ele, eu reconheço nele a capacidade de tornar a geografia e história uma matéria extremamente atraente, para mim, pelo jeito que ele ensinava e pelo jeito que ele cobrava. Não era aquela coisa de decorar, exigia um raciocínio analítico dos fatos, isso é óbvio, agora eu olho para trás e vejo o que eu aprendi com ele. Com 12, 13 anos você não tem consciência de que está fazendo, nem sabe o que é raciocínio analítico dos fatos, que é você ver a história ou analisar a geografia, seja ela brasileira, seja ela mundial, e fazer uma relação de causa e efeito com situações do passado, com problemas presentes, avaliar porque que determinadas coisas teriam acontecido, então isso te desperta uma capacidade de fazer uma análise dos fatos que independe se é história ou geografia, isso serve para a tua vida. Eu acho que é mais importante do que você saber data a data, ano a ano, uma seqüência cronológica. Você tem a noção de uma evolução histórica, você tem uma noção de um cenário geográfico, mas o que eu acho que ele me deixou de maior conseqüência foi essa capacidade de analisar, que eu acho que não foi só para mim. Todos os alunos dele tiveram com certeza, o nome dele é Ibituruna, é um nome estranho mas inesquecível. Ibituruna Barbarise. Ele também era advogado, não sei se ele é vivo, mas foi um professor marcante. Isso foi tudo no ginásio, foi no Guido Fontgalland.
No Santo Agostinho eu tive também bons professores, mas eu fiquei só dois anos, no Guido eu fiquei cinco anos. Então a minha identidade com a escola foi muito menor, mas eu tive professores também marcantes. Eu tive um professor e geografia, que se chamava Políbio. Eu me lembro que ele nos levava para excursões aqui
pelo Vale do Paraíba, pelo Rio de Janeiro, aonde ele ia mostrando conceitos que ele estava ensinando de geografia, ele misturava geografia com economia, mostrava qual era a atividade econômica, o que o relevo facilitava ou dificultava uma determinada atividade econômica. Você aprender isso só lendo um livro é um negócio complicado, principalmente manter atenção de quem tem 15, 16 anos, não é um muito apetitoso, e o camarada fazendo essas excursões, até hoje eu me lembro. E casualmente no dia que eu fui inscrever minha filha aqui, estava falando com a coordenadora, que eu tinha estudado: “Olha o professor Políbio.”. Falei com o cara, o cara já está mais coroa, obviamente não se lembrava de mim, mas foi um cara marcante. Tem um professor de matemática também excelente, Joaquim, me deu também uma grande base para enfrentar o vestibular. Teve um professor de física que era bastante exigente, um cara que faz tipo de excêntrico? Orlandino o nome dele, mas esse eu não posso falar muito porque ele vai ser provavelmente professor da minha filha e, se alguma dia, a fita cai em mãos dele ele pode descascar na minha filha. Não, não acredito que ele faça isso. É, ele vai ficar: “Esse cara ainda se lembra de mim” Ele ainda está lá porque eu vi a placa com o nome dele lá na escola. Teve também um de português muito bom chamado Augustinho, que também continua dando aula . A matéria em si que eu gostava mais era matemática. Essa era a matéria que eu sentava com prazer de estudar, as outras matérias, vamos dizer assim, a menção aos professores está associada à didática dos caras, como eu também gostava de estudar, eu lia e, obviamente, eu gostava mais ou gostava menos dependendo do professor, quer dizer, o professor tinha uma grande influência. A matemática eu gostava provavelmente com
qualquer que fosse o professor, mas eu acho que eu tive sorte, a grande maioria dos meus professores de matemática, foram muito bons. Se eu tivesse que escolher uma matéria, seria matemática. Agora os professores, esses aí que eu mencionei, todos eu acho que foram bons, mas eu acho que os do ginásio sem dúvida foram mais marcantes dos que os do científico.
PRÉ-VESTIBULAR Saí no segundo ano do Santo Agostinho, e fui fazer o vestibular, o cursinho do vestibular no Bahiense, porque esse vestibular do IME e ITA, ele tem uma
turma especial porque ele é diferente, o currículo é diferente, então se você não fizer uma escola, um cursinho especial, você não consegue passar, você não aprende. Eu sabia que eu queria fazer engenharia, eu escolhi fazer o IME e o ITA simplesmente pela dificuldade da matemática e porque o desafio, de ser muito difícil me atraiu. Eu fiz a prova para o Bahiense, passei, ganhei uma bolsa e consegui fazer o terceiro ano lá e no final passei no vestibular. Eu fiz aqueles exames psicotécnicos para você escolher, teste vocacional era o nome. Quando eu estava no científico eu fiz isso, aí deu que eu poderia ser prioritariamente advogado – você vê que eu fui escolher engenheiro – dava que eu podia ser um advogado, mas na verdade dizia assim: “Você tem um grande leque de escolha, mas talvez seja melhor ciências humanas, advogado.”. Eu olhei para aquilo: “Ah.”. Eu quero fazer um negócio que me demandasse mais do que a turma normal.
VESTIBULAR Me lembrei de um fato. Eu fiz o vestibular do Cesgranrio, naquela época era o Cesgranrio, era unificado, eu fiz o vestibular no segundo ano, você podia se inscrever – acho que ainda pode – você podia se inscrever mesmo não tendo o terceiro ano. Depois dava bode se você quisesse continuar, você tinha que ter mandato de segurança, uma confusão danada, e ficava brigando para poder cursar sem o terceiro ano. Mas eu fui fazer de teste, eu passei para a UFRJ, para
Engenharia. Aí eu disse: “Puxa, então se eu no segundo ano já passei, eu tenho que arrumar um negócio diferente. Porque ficar no terceiro ano estudando para de novo fazer a mesma prova, “não vai ter graça, não vai ter um negócio desafiador, não vai ter uma coisa diferente para eu fazer.”. Aí eu soube desse negócio de IME, eu não sabia muito bem como era, não me agradava muito ir para o exército, não me agradava muito estudar em uma escola do exército, mas eu vi que não era muito complicado. Eu tinha um colega que estudava comigo no Ibeu, um negócio de inglês, e ele era aluno do IME: “Não, lá é tranqüilo. A parte do exército não é muito complicada, você vai conseguir acompanhar legal, os caras não enchem muito o teu saco, o pessoal do exército lá dá uma maneirada.”. Eu fui fazer uma entrevista, na verdade eu fui conhecer o Bahiense e entrei, teve lá uma audiência, uma entrevista com o professor do Bahiense, que era o dono do Bahiense, o Norbertino. Ele tinha um hobby, foi a primeira vez que eu vi aquilo. Era uma sala grande, era ali na Praça Ana Amélia, no Centro, eu nunca vi tanta gaiola de passarinho. Você começava a falar, nós éramos uns cinco ou seis, subitamente você tinha que parar porque os passarinhos começavam a cantar e eles entravam, todos cantando simultaneamente, parava todo mundo de falar esperando o passarinho se exaurir, ali devia ter dezenas de passarinho. Todo mundo parava e ficava esperando, abaixava, aí a gente voltava a conversar.
Então esse camarada, ele era uma figura, ele andava de chapéu. Porque ele chegou a dar umas aulas de geometria descritiva. E esse cara fez uma propaganda danada do curso dele e eu tomei a decisão de fazer a prova. Fiz a prova, passei, na verdade era uma prova mais para ver se ganhava bolsa ou não. Ganhei a bolsa, fiz o ano inteiro, foi um ano puxado, realmente o estudo lá era muito puxado porque tinha que se preparar para o vestibular no final do ano e tinha muita matéria, muito mais matéria do que eu tinha estudado, até o segundo ano científico. Foi um bom desafio.
OPÇÃO PROFISSIONAL Eu em um determinado momento, quando eu estava no ginásio, eu cheguei a pensar em ir para o Colégio Naval, que é em Angra dos Reis. É, por influência
involuntária do meu pai. Não que ele quisesse que eu fosse para o Colégio Naval, mas como eu ouvia as histórias dele, eu achava aquilo legal. Gostava de ler livro de guerra, imaginava um mundo na cabeça. Mas aí ele mesmo: “Não, meu filho. Se você realmente quiser fazer isso, vá para a Escola Naval, que a Escola Naval já é aqui no Rio.”, “Tá bom.” Durante o científico eu vi que minha praia não era a carreira militar. Cheguei a conclusão: “Carreira militar não é o que eu quero.”, mas como, quando eu resolvi entrar nessa faculdade do Exército, como eu vi antes que era um negócio razoavelmente leve: “Então vai dar para eu fazer.” Minha mãe, simplesmente, acompanhava meu desempenho na escola, mas ela nunca foi influenciadora de qual carreira eu deveria seguir. E meu pai também me dava uma força em termos de reconhecer e de me ajudar por conta dessas coisas que eu gostava de estudar. Apesar de ser um razoável sacrifício, sempre me manteve em escolas particulares, eu sei que aquilo na hora de fazer as contas do final do mês fazia uma diferença. Minha mãe não trabalhava, como a maioria das mulheres da geração dela, ela tinha parado de trabalhar depois que casou. Obviamente o orçamento familiar era bem restrito. Passei esse um ano estudando ali na Praça Ana Amélia, era completamente diferente da escola, um colégio mesmo ele tem toda uma regra de horário, disciplina. O curso não, o curso é uma bagunça em termos de disciplina. Só a aula, começava à uma hora da tarde, saía às oito, nove horas da noite, tinha aula também dia de sábado, era pesado o estudo, tinha que estudar de manhã pra caramba em casa e tinha que estudar domingo. Chegou na época do vestibular, fiz vestibular, passei, só que aí entrou um fato marcante na minha vida que foi o exame físico para entrar no Exército. Eu passei para o IME, nem fiz o ITA, porque o ITA é São José dos Campos, da Aeronáutica. Fiz prova da PUC também porque a prova da PUC era mais ou menos na mesma época, fiz, passei, e fiz o vestibular de novo do Cesgranrio porque o Bahiense botava pilha para a gente fazer até para ele poder na estatística dizer que tinha passado mais gente, passei de novo, mas eu não ia mais fazer o Cesgranrio. Aí tinha um problema, qual era o problema: eu fiz vestibular, passei e como todo cara muito estudioso, a conseqüência é que eu não era, apesar de gostar de ir à praia, nessa época daí eu já não ia mais em praia, não ia mais em nada, eu não conseguia ter um desempenho minimamente aceitável em termos de atividade física.
INSTITUTO MILITAR DE ENGENHARIA – IME No mês de dezembro de 1977 eu tive que me preparar para fazer uma prova física. A prova física era um teste de Cooper, ou seja, você tinha que correr 12 minutos e tinha que fazer uma pontuação mínima em função da tua idade. O Exército tinha lá uma escala que dizia assim: “Se você tem até 17 anos, tantos quilômetros valem não sei quantos pontos”, vamos supor. Tinha que fazer um número X de abdominais em um minuto e tinha que fazer barra. Os abdominais eu fazia legal, a corrida fazia ali, mas fazia, agora, cadê que eu fazia a barra? Pior do que esse mês só quando meu pai ficou doente, mas antes disso, depois dessa doença do meu pai, esse foi aquele mês assim tenebroso. Eu comecei a correr na praia, ali no calçadão, entrei em uma academia de ginástica, tudo isso em um mês, já pensou? Fui lá no dia fazer a droga da prova. Tinha 50 e poucos caras. Eu era gordo, esse era o problema. Eu pesava uns 80 quilos, só que eram 80 quilos, por incrível que pareça eu cresci depois que eu emagreci porque depois desse negócio todo, ainda cresci mais, devia estar confinado. Essa época foi terrível. Eu fui fazer a prova e novamente tem aquelas pessoas que você guarda. Tinha um tal de Coronel Gilberto que era o cara que estava com aquela prancheta. Dos 50 tinham vários que tinham feito colégio militar, colégio naval, então esses tinham um bom preparo físico porque eles tinham que estudar e eram obrigados a fazer as coisas, mas tinham os outros que eram os estudantes normais, civis. Da minha turma passaram mais dez e desses dez, a grande maioria era também igual a mim, toda sofredora. Fiz o abdominal, tranqüilo. Fiz a corrida, e eu nunca me esqueço, o cara ficava assim, coisa no Exército tudo tem que ter gente demais. Tinha um Sargento para cada aluno, e o Sargento que cuidou da gente era, você lembra daquele massagista Santana do Vasco?
Ele era massagista do Vasco, era baiano e era Sargento do Exército, as pessoas não sabem, mas ele era Sargento do Exército e era massagista do Vasco. Ele criava uma imagem nele de macumbeiro. Então quando o Vasco entrava, quando era o Flamengo ele fazia um negócio, obviamente tinha todo um folclore, ele fazia aquilo para chamar a atenção e tal. Esse cara foi o cara que ficou marcando o meu tempo.
Ele ficava: “Cara, vai correr, vai perder agora”. Até aí tudo bem, e chegou a hora da barra, chegou a hora da barra e eu fiz uma barra, uma, uma barra Ah eu falei que era Coronel, mas não era Coronel não, era Major – Major Gilberto. Ele adotou uma barra e eu, com 17 anos, só tinha que fazer uma barra. Com 18 anos você tinha que fazer três barras, com 17 anos você tinha que fazer uma barra. Fiz o mínimo, cheguei em casa radiante, feliz da vida. Fiz o exame médico, o exame médico foi tranqüilo, estou lá esperando começar as aulas e recebo um telegrama – aquela época ainda existia esse troço telegrama – recebi um telegrama dizendo que eu tinha que comparecer urgente no Exército. Fui lá no Exército, no IME, na Urca, chegando lá está o Major, olha para mim: “Você vai ter que fazer segunda época porque você não passou.”, eu disse: “Como não passei?”, “Não passou, você tem que fazer três barras.”, “Não, eu tenho que fazer uma barra.”. “Quem é você para saber o que você tem que fazer?”, “Como não sou eu? Está aqui ó, aqui o regulamento: quem tem 17 anos tem que fazer uma barra. Eu nasci no dia 30 de março de 1960, – eu tinha feito o negócio em dezembro – estamos em dezembro de 1977, então eu tenho 17 anos.”, “Mas a sua ficha aqui está dizendo que você nasceu em 1959.”, eu disse: “Ó, está aqui minha carteira de identidade.”, “O que interessa é o que está na ficha”, “Pôxa, Major, brincadeira” “O que está na ficha está errado”, “Não, mas eu quero que você faça de novo.”. Bom, esse é o Exército. Tive que fazer uma segunda época, só que eu me lembro que essa foi a única vez que meu pai foi em uma escola comigo. Meu pai foi junto. Fazer a segunda época de barra que ele queria que eu fizesse três barras. E eu sabia que não ia fazer três, eu fiz uma Meu pai foi lá comigo e disse para ele: “Major, eu sou o pai dele e está aqui a carteira de identidade dele, está aqui a certidão de nascimento, se o Exército colocou aí que ele é de 1959 isso é um erro do Exército. Meu filho não tem culpa disso.” O Major olhou para o meu pai: “É, vamos fazer o seguinte, ele vai fazer só porque eu estou pedindo, mas não precisa, ele já está passado.” Esse é o Exército, são os próximos cinco anos nisso. Bem eu entrei, e vi que aquilo não era o Exército. Esse é o estereótipo do Exército, mas eu estudei no Exército, eu não tenho nada a reclamar, pelo contrário. Fiz os cinco anos lá no IME e tenho excelentes recordações. Qualidade do ensino, organização, os professores, a infra-estrutura não era a melhor porque já naquela época o Exército já estava começando a ter problemas em termos de verbas, mas o que eu percebi foi que a organização e o comprometimento dos professores valia a pena em tudo. Aquele Major, personificava aquilo que se a gente for ver em um programa de televisão, em um filme, é aquilo que a gente imagina o Exército, mas o Exército está longe de ser só aquele Major Gilberto. Eu continuei sendo um bom aluno, a diferença é que lá a competição era grande porque tinha uns 50 caras que tinham feito uma prova difícil, que tinham passado, e eu te diria que no conceito generalizado, todos eram ótimos alunos. Eu diria o seguinte, na verdade você tinha competição só no vestibular porque o vestibular tinha um número de vagas e tinha que passar, só podiam passar 50. É óbvio que os 50 primeiros iam passar, então você tinha na verdade que torcer para estar entre os 50 primeiros. Lá dentro não, lá dentro os 50 conseguindo tirar as médias, os 50 iam se formar, sem problema nenhum. E foi o que aconteceu, só teve um cara que foi reprovado ao longo do tempo e lá reprovado é jubilado, você sai, não pode repetir o ano.
Reprovado em prova, em matéria. E lá você não pode repetir, não tem crédito, não é esse sistema, como na universidade que a gente vê aqui fora que você não passa, continua, faz depois, lá não. Lá era o seguinte, não tinha esse negócio de escolher matérias eletivas, você tinha que fazer todas aquelas matérias. E se você repete é obrigado a sair, essa é a regra deles que eu imagino seja mantida até hoje. A diferença é que hoje o IME é misto, na época que eu estudei era só masculino. O Ricardo Beltrão também foi de lá.
JUVENTUDE Não passavam de paqueras, namoros muito rápidos. Como vou te dizer? Eu nunca tive uma grande paixão muito jovem e não tendo essa grande paixão muito jovem eu também me dava ao luxo depois, na faculdade e depois mesmo de formado e trabalhando na Petrobras, eu evitava namoros de longa duração. Também não vou dar uma de tão gostoso assim, não posso criar um gênero. Isso eu faria se fosse um cara extremamente boa pinta e tal, o que eu não sou, mas eu nunca fui um camarada assediado, como alguns colegas meus eram, pelas mulheres. Mas era um negócio que eu conseguia ir administrando, eu não tinha uma paixão e ia passando o tempo e acredito que as meninas também iam passando o tempo comigo. Isso a gente ia levando por um bom tempo, era uma troca de interesses.
Eu nunca tive uma paixão platônica.
Eu comecei a ter alguns namoros mesmo, com mais duração, já formado. Nunca sofri por um amor platônico. Eu sempre transformei-os em algo concreto antes deles se tornarem platônicos, ou então abandonava, não podia ficar insistindo, e ficar naquela coisa meio encantadora, meio poética. Posso até estar transmitindo uma imagem de um cara muito realista. Simplesmente eu não sofria, o que algumas pessoas certamente vão dizer que é uma grande perda na minha vida, talvez fosse, mas eu não sofria de amor não correspondido. Quando eu percebia que não ia rolar, buscava outra praia e conseguia administrar dessa forma. É um estilo.
ESTÁGIOS
Nos cinco anos, o estudo era organizado, tinha que ter método, quer dizer, tinha que ter uma rotina de estudo. A partir do terceiro ano fiz estágio na Antônio Noronha, que era uma empresa de consultoria de engenharia, responsável pelo projeto da ponte Rio-Niterói. Depois eu entrei na Promon. Eu tinha um professor da faculdade que era de lá e falei com ele que gostaria de fazer um estágio, ele me arrumou um estágio e eu trabalhei naquela obra da usina de Angra II, fazendo os projetos. Eu fiz Engenharia Civil, fiz um estágio, durante as férias com mais alguns colegas, foi muito legal, lá em Itaipu na época da obra de Itaipu, então era um negócio muito bom, você com 20 anos ter oportunidade de ficar em um alojamento de obras, em uma obra de uma barragem daquela. Éramos uns cinco ou seis que conseguimos ir. Existia um consórcio de empresas, essas grandes construtoras, existe até hoje, Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa, elas se juntaram porque a obra era tão grande que uma só não fazia. E era uma cidade o canteiro de obras de Itaipu. Era muito organizado o estágio, a gente ficava em um alojamento, tinha nesse alojamento a peãozada, estagiários, engenheiros e você ficava cada semana – se não me engano era um mês – você a cada semana ficava com um tipo de atividade e aí você ia conhecendo todas as fases da obra, o que era muito legal, você via na prática coisas que você só ficava imaginando na escola. Isso foi muito bom.
Durante o quinto ano, eu estava na Promon, nessa obra da usina de Angra, mas era só o projeto, e aí apareceu o concurso da Petrobras, mas eu devo confessar que a minha vida estava montada para continuar na Promon porque eu já tinha negociado com o chefe do departamento que ele iria deixar eu fazer uma pós-graduação. Como eu gostava de estudar também isso para mim era legal, trabalhar e poder continuar estudando. Eu já estava fazendo um curso de análise matricial de estruturas à noite, na UERJ, quer dizer, eu conseguia conciliar as três coisas: estudava no IME, o quinto ano, fazia o estágio na Promon e estudava à noite lá na UERJ. Por isso que não dava para ter amor platônico.
INGRESSO NA PETROBRAS No final do quinto ano teve o concurso da Petrobras, vários dos meus colegas foram fazer e eu fui no bolo: “Vamos fazer?” Eu falei: “Vamos”. Meu pai não era muito favorável a eu entrar na Petrobras, ele achava que: “Pôxa, meu filho, será que esse negócio é um emprego bom mesmo? Você se preparou tanto, estudou tanto. Será que a Petrobras é um lugar que vai te demandar o que você estudou?” E eu: “Não quero ir para a Petrobras, eu quero continuar na Promon.” Aí fiz o concurso, passei. Só que vários colegas meus passaram também. Eu fiquei na dúvida e fui falar com esse cara que tinha me arrumado o estágio, para ver o que ele achava. Eu já tinha até dado a minha carteira de trabalho para mudar de estagiário, porque eu já era formado. E ele disse: “Como teu chefe eu te diria que quero que você fique. Agora, se eu fosse teu pai, diria que você devia sair.” “É mesmo? Por quê?” “Ah, esse negócio de usina nuclear é complicado, esse negócio pode mudar.” E não deu outra. Então, eu decidi que ia para a Petrobras. E ir para a Petrobras significava morar em Salvador, fazer esse curso de engenharia de petróleo – o mesmo que o Beltrão fez, o mesmo que o Zé Roberto fez, só que eles são mais antigos do que eu. Aliás, o Zé Roberto e o Beltrão também são do IME, mas eles entraram dois anos antes. Quando eu fui pegar minha carteira de volta na Promon, dada baixa para entrar na Petrobras, que eu cheguei no meu andar não tinha ninguém, as pranchetas estavam todas vazias. Eu disse: “Ué, o que houve?” O governo tinha decidido parar a usina Angra II e todo mundo tinha sido mandado embora. Quer dizer, por uma semana, eu podia ter perdido o emprego da Promon e não ter optado em entrar na Petrobras. Fiz a escolha certa, por sorte.
CURSO DE ENGENHARIA DE PETRÓLEO Primeiro, fui fazer o curso de Engenharia de petróleo em Salvador. Realmente, foi uma grande mudança na minha vida, também particular, porque até então eu sempre tinha morado com os meus pais, no mesmo apartamento. Fui morar em Salvador, toda aquela ansiedade e uma certa preocupação. A Petrobras te dava uma condição, você chegando lá tinha dez dias de hotel onde podia procurar um apartamento para alugar. Como tinham vários colegas meus de faculdade que tinham passado também, a gente procurou pessoas com afinidade para formar grupos para alugar apartamentos. No nosso caso, especificamente, nós ficamos em quatro em um apartamento alugado de uma sala e três quartos, sendo que um dos quatro tinha previsão de casar ao longo do ano. Nós alugamos um apartamento em um bairro muito bom chamado Barra. Na época, era o melhor bairro. Obviamente que, aos 23 anos, com dinheiro, morando bem, aquele ano foi inesquecível apesar do estudo puxado na Petrobras, mas a gente já vinha de um ritmo, e o ano foi tranqüilo. Esse ano de Salvador foi um ano também para guardar como solteiro, vamos chamar assim. Foram aqueles anos para você guardar, para não ter saudade da vida de solteiro depois.
Era o seguinte, cada um tinha o seu carro, cada um estava ali em uma cidade, que tinha uma característica próxima ao Rio, por ser praia. Na verdade, Salvador é um lugar maravilhoso até hoje de se viver. A gente criou toda uma relação legal com pessoas do local e da própria Petrobras, mas muito mais do local onde a gente conhecia muita gente e freqüentávamos lugares legais. O período do Rio foi um período onde, como eu falei, eu era bem mais introspectivo, estudava mais. Chegando lá eu continuei estudando, mas comecei a ter essa possibilidade de experimentar algumas coisas que me agradaram bastante, experimentar que eu digo com mais assiduidade. Isso foi muito bom: passeio de escuna, micareta, carnaval. Isso durou então um ano, no final do ano de 1983 existia uma divisão da turma. Em função das suas notas você tinha opções.
ESCOLHA DA ÁREA Isso foi uma das coisas mais mal feitas que eu já vi, porque a decisão se você faria perfuração e produção foi um “X” feito na hora da sua inscrição, que você não sabia nem o que era perfuração nem produção.
Antes do curso, no concurso. No Clube Montanha, foi onde eu fiz minha inscrição para a Petrobras. Tinha lá dois quadrinhos: perfuração e produção, mas se você perguntasse: “O que é perfuração e produção?”, a moça: “Não sei.” Eu botei lá produção, e botei produção por um motivo, como eu gostava desse negócio de engenharia de estruturas eu imaginava que na produção eu ia ter oportunidade de projetar, não trabalhar, mas de projetar jaquetas, plataformas e por isso eu botei produção. Colegas meus botaram perfuração, e aquilo no chute. Aquilo foi decisivo na vida. Era um negócio de louco. Eu fiz a produção. E as matérias se encaminhavam diferentemente, são poucas matérias comuns mas eram bastante diferentes, até o esquema do curso era diferente. O pessoal da produção estudava direto, 11 meses. O pessoal da perfuração estudava três meses, depois ia fazer um estágio aonde já tinha unidade, aonde tinha sonda, ficava lá no campo trabalhando um ano, depois voltava para continuar o curso. Você no fundo, por causa de um X você tomava rumos completamente diferentes na tua vida. A gente vê, o destino, ele às vezes é uma coisa que você não consegue prever, aquilo ali, ninguém previu nada, a menos que você tivesse um irmão ou alguém conhecido que soubesse o que era. A gente botou aquele X ali na maior, no chute. Mas eu gostei da produção. A minha primeira opção era vim trabalhar embarcado em Macaé, morar no Rio de Janeiro. Porque ganhava mais e tinha 14 dias de folga. Na época era 14 por 14 e era perto do Rio. Eu queria voltar a morar no Rio apesar de eu gostar de Salvador e porque a gente via já que Macaé estava com uma atividade crescente.
Durante o curso tinha matérias e você ia acompanhando. A produção estava crescendo e a maior parte disso estava vindo da Bacia de Campos e do Rio Grande do Norte, que naquela época também estava crescendo, mas nem se comparava com Bacia de Campos. Você via o Shigeaki Ueki, o presidente da Petrobras na época, falar: “Ó, nós vamos construir mais uma plataforma, nós descobrimos mais um campo.” O país dependia muito de petróleo e que a Bacia de Campos era aquilo que estava sustentando o crescimento. Aliado a isso você podia ter 14 por 14. Ótimo, você podia ter 14 dias de folga e ganhava quase o dobro se você ficasse interno, a escolha, pelo menos para mim, era óbvia, eu era solteiro, não tinha problema de família. Só que na divisão eu não vim para Macaé, eu fui para o Rio Grande do Norte e o que alegaram para mim foi: “Apesar de você ter tido uma classificação boa”, e era verdade mesmo, havia uma divisão entre
“os caras”, que acabaram o curso pelas unidades”. Eu entendo perfeitamente a Petrobras e acho que ela está certa. Então eu fui parar em Natal. Hoje eu vejo o Rio Grande do Norte como um ótimo lugar, mas naquele momento
eu não queria ir. Então já fui para Natal com a decisão de arrumar uma maneira de sair de lá. Chegando, eu aluguei também um apartamento com mais três colegas, um excelente apartamento, era o melhor prédio de Natal, na rua Deodoro de Petrópolis, – agora eu esqueci o nome do edifício – era um edifício maravilhoso. Procurei trabalhar em uma atividade que me permitisse ter chance maior de vir trabalhar em Macaé, e fiquei na dúvida entre completação de poços e avaliação de poços. Enfim, eu fui para a completação de poços e comecei a trabalhar embarcado no mar. No estágio eu tinha passado por várias atividades e tinha trabalhado também em terra e não gostei. Além de em termos particulares ser bom para mim, por causa dessa minha intenção de ir trabalhar em Macaé, eu não gostei de trabalhar em terra. Então, comecei a trabalhar na completação.
TRABALHO EMBARCADO A gente tinha feito um curso de salvatagem em uma piscina lá do SENAC, ou seja, como é cair no mar, esse tipo de coisa, problema de plataforma. Chegando lá na plataforma o helicóptero pousava em uma plataforma central e a gente tinha que ir para uma sonda que estava montada em uma plataforma pequenininha que ficava assim a alguma distância. Tinha que ir de barco porque o helicóptero não pousava lá. Eu me lembro que pela primeira vez eu tive que andar em um negócio chamado cestinha, é um cone onde você tem uma bóia desse tamanho, uma bóia menor em cima e aqui tem umas cordas de náilon e esse troço se fecha, então o guindaste pega você, bota a tua mala ali dentro, segura pelo lado de fora e vai. Eu cheguei, disse: “Como que é?”, o cara falou: “A plataforma que você vai é aquela lá.”, “Aquela lá? E a gente vai como?” “Você vai ter que pegar o rebocador, uma lancha” –
o pessoal chamava lá de lagosteira – “você tem que pegar uma lanchinha aqui, vai para lá e o cara vai te pegar. Chegando lá você vai se apresentar ao engenheiro Samuel.” “Tá bom, e como é que eu chego na lancha?” “Você vai pegar essa cesta.” “Cesta?” “É cesta.” “Mas como é, eu entro na cesta?” “Não, você não pode entrar na cesta, você tem que ficar do lado de fora da cesta.” “Do lado de fora da cesta?” “É, do lado de fora da cesta, porque se entrar na cesta e o troço cair você vai afundar, então tem que ficar do lado de fora para poder escapar.” Nunca tinha feito um treinamento, esse negócio foi meio complicado, mas acabou que deu certo. Depois das barras isso era pinto. E não tinha Major Gilberto. Eu peguei, desci na tal da lagosteira, complicado porque o grande problema é que o barco move, então aquela cesta não é fixa, ela não tem um tamanho fixo. A cesta fica pendurada no cabo do guindaste, do lado de fora. A cesta é o meio de transporte, é o seguinte: a lagosteira está do lado da plataforma, no guindaste da plataforma tem um cabo, tem uma cestinha, você sobe nessa cestinha, um guindaste vem e te deposita na lagosteira, aí você sai. O cara deixa a cestinha, você vai. Chegando lá tem um outro guindaste com outra cestinha na outra plataforma e vai lá e pega. Esse é o mecanismo até hoje usado. Como não tem escadinha para subir e descer a lancha não consegue chegar até o prédio. É assim até hoje, cansei de usar isso e se usa isso até hoje. Chegando na sonda, tudo era novidade. O Samuel, que hoje é um grande amigo, me recebeu muito bem, me ensinou muitas coisas, me deu um suporte legal e vi que era aquilo que eu gostava mesmo de fazer.
COMPLETAÇÃO DE POÇOS E eu fui trabalhar na área de completação de poços. A completação é o seguinte: o poço é perfurado, ele é revestido e é deixado em uma condição em que você tem que equipá-lo com uma série de equipamentos que forma a coluna de produção para te permitir produzir o poço através de uma árvore de natal, que é um conjunto de válvulas – que um dia, alguém deve ter achado que aquilo parecia uma árvore de natal, e na verdade é a tradução do nome inglês. O nosso trabalho é colocar esses equipamentos dentro do poço, fluir o poço, às vezes você tem que fazer uma estimulação no poço se ele não estiver respondendo adequadamente, tem uma série de alterações aí. Então isso é completação, só que isso tem uma gama de atividades imensa. Você pega várias situações, o poço às vezes dá problema, você tem que fazer uma pescaria no poço. Fazer uma pescaria é o seguinte: se quebra algo ou se cai algo no poço que não era para cair, você tem que tirar aquilo de lá, e essa operação chama-se pescaria porque vem do inglês é fishing. Então é como se você estivesse tentando tirar um negócio de dentro de um tubo que pode ter três, quatro, cinco mil metros. Você não vê nada, você faz tudo na base de ferramentas, de indicadores na superfície que te indiquem o que está acontecendo lá embaixo. Qualquer peça que caí, às vezes você não consegue nem botar coluna de produção no poço. Pode cair desde uma pecinha pequenininha, mas pode quebrar uma coluna, isso é um grande problema. Claro que a gente faz de tudo para isso não acontecer, mas acontece. Se uma pecinha, ficar em uma posição que me cause problema, temos que pescá-la.
Se ela for para o fundo do poço e não me causar problema, eu deixo ela lá. Mas às vezes uma besteirinha assim é catastrófica.
TRANSFERÊNCIA PARA BACIA DE CAMPOS Com o pessoal do Rio Grande do Norte, os supervisores, foi um período profissionalmente muito bom. Eu fiquei lá muito pouco tempo porque tinha o objetivo de voltar para Macaé. No meio do ano de 1984, eu descobri que tinha uma pessoa em Macaé querendo ir para o Rio Grande do Norte. Eu perguntei ao pessoal de lá: “Me diz uma coisa, se eu arrumar uma troca vocês fecham negócio?” E os caras: “Fechamos, sem problema. Se você for e alguém vier no teu lugar, tá tranqüilo.” Eu consegui arrumar uma pessoa, o nome dele era Manoel, e a gente combinou que no final do ano podia trocar – nessa época de Natal, Ano Novo, podia trocar. Ele era do nordeste e queria voltar e eu queria descer, só que ele era muito mais experiente do que eu. Então o pessoal aqui de Macaé ficou assim: “Pôxa, tal, mas...” O cara já tinha algum tempo, estava doido para voltar, e se liberou. O meu primeiro chefe foi o Iwao Jouti. Quando chegou no final do ano eu vendi o carro que tinha lá, me livrei dos móveis e voltei a morar no Rio de Janeiro. Comecei a trabalhar embarcando na Bacia de Campos, era uma diferença brutal. Eu cheguei na Bacia
de Campos em dois de janeiro de 1985. Peguei o ônibus com um cara chamado Danilo Oliveira. Por que eu te digo isso? Porque eu tinha falado com o Danilo pelo telefone e me lembro que era no dia dois de janeiro que deveria me apresentar lá. Então peguei um ônibus no Rio de Janeiro e me encontrei com um amigo que também estava indo para lá e ele disse assim: “Aquele ali é o Danilo.” “Ah, aquele que é o Danilo? A gente se falava pelo telefone.” Então aquilo também marca. A gente quando está chegando em um lugar, normalmente você guarda as pessoas que te recebem, para o bem ou para o mal. As pessoas nunca se lembram de você, mas você que está chegando se lembra delas. Eu passei uns três dias no escritório, sabendo como eram as atividades. Embarquei e era uma outra realidade. Apesar de ser plataforma, como no Rio Grande do Norte, as plataformas da Bacia de Campos são muito maiores, em termos de tamanho. Os poços em si das plataformas fixas, em termos profissionais, eram bem similares, não tinha dificuldade, mas os poços submarinos eram bem diferentes.
TRABALHO EMBARCADO Eu trabalhei no Rio Grande do Norte embarcado e também embarcava no Ceará. Durante esse ano que eu fiquei lá, eu mantinha moradia em Natal e, às vezes, o meu embarque, os 14 dias, era nas plataformas do Ceará. Eu tinha que ir para Fortaleza e embarcava de lá. A lâmina da água no Rio Grande do Norte era em torno de 20, 30 metros e no outro lá entre 40 metros. As plataformas são menores, não são muitos poços, e os campos também são menores. Todas eram fixas. Já aqui na Bacia de Campos, o meu primeiro embarque foi em uma plataforma fixa, foi Pampo, e foi um negócio engraçado. Eu me lembro que falaram assim: “Você vai embarcar na plataforma de Pampo. Então é SM11, era uma sonda modulada 11.”. Você ia para o aeroporto de Macaé – que inacreditavelmente continua exatamente igual como era, para você ver como às vezes a infra-estrutura não acompanha, é o mesmo prediozinho que na época novinho, isso em 1985 é até hoje. Você pode imaginar pelo movimento, como cresceram as coisas, como é difícil administrar a quantidade de gente que embarca e desembarca em um aeroporto com as mesmas dimensões. Eu cheguei dentro do helicóptero – o helicóptero daqui também era maior do que o de lá – e quando a gente desce em uma plataforma que na verdade era um Flotel, ou seja, era uma plataforma hotel, ela só serve de acomodação. Que estava ancorada ao lado de uma plataforma fixa que era Pampo, só que eu não sabia que aquilo lá era Pampo. O piloto desceu: “Safe Jasmínea.” Safe Jasmínia era o nome do Flotel. Eu estou lá sentado, o pessoal saiu, quem era dali sabia que, aquele pessoal que estava desembarcando ali era para Pampo. Eu não sabia, estou lá sentado. Porque o helicóptero não vai só em uma plataforma, às vezes ele vai, leva, sei lá, 12 passageiros, ele leva seis para uma, pega alguns ali, depois vai, pega, deixa outros, ele vai pingando na Bacia. Eu fiquei e, por sorte, o número de pessoas para entrar era igual. O que aconteceu? Não saiu um, que era eu, porque eu não sabia que era ali. Aí ficou uma discussão, o piloto reclamando que não era possível que o cara não ia poder desembarcar, o cara reclamando que queria desembarcar, que o cara não ia ficar lá, ele já estava há 14 dias. Até que o piloto saiu conferindo um a um e disse: “Você está indo para onde?” Eu disse: “Eu estou indo para a Pampo.” “Pô, cara, Pampo é aqui.” Como eu ia saber que era
Pampo?
O flotel era uma plataforma de uma empresa norueguesa. Então Safe Jasminia. Bom, e aí eu disse: “Puxa vida Já cheguei aqui errado.” Chegava, você tinha que subir, tinha uma escadaria lá em Pampo monumental para você chegar no alojamento. Cheguei no alojamento, tinha um colega meu –
casualmente, como eu estava fazendo primeiro embarque, nos botavam junto de outra pessoa para você aprender alguma coisa – o Orestes era o engenheiro e eu fiz o embarque com ele e depois de lá me transbordaram, me mandaram para uma outra plataforma que aí já era uma semi-submersível para trabalhar em um poço submarino. Aí sim era completamente diferente, e aí eu me encontrei lá com um outro cara que também conhecia, que também tinha estudado no IME, que tinha entrado na mesma turma que eu, o Orlando Ribeiro. Se ele estivesse aqui no Brasil, provavelmente, teriam dado o nome dele para você entrevistar, porque ele é um cara bastante enfronhado nessa área de águas profundas. Ele está atualmente na Petrobras, em Houston. Eu comecei a entender como era esse negócio de submarino. Eu me lembro que conheci pessoas com as quais até hoje
tenho uma amizade, fora do trabalho nem tanto, mas dentro do trabalho, sabe aquelas pessoas que você tem toda uma história. Tem um rapaz chamado Zé Renato, trabalhava na CBV, na época, hoje é a FMC, que era do equipamento, da
árvore de natal molhada que estava sendo instalada. O primeiro poço submarino foi completado em 1978, era o RJS38, Enchova. Eu acho que o Danilo trabalhou nesse poço, não tenho certeza, mas o Zephyrino Machado com certeza trabalhava envolvido na interligação desse poço. Desde 1978 até 1985 muita coisa já tinha acontecido. Então a lâmina d’água que em 1978 era uma novidade, que estava ali em 120, 180 metros, já não era mais para nós nessa época, em 1985. Quando eu cheguei estava em 200 metros de lâmina d’água. Era o máximo.
Para cada sonda tinha um equipamento de mergulho. Então você tinha mergulhadores saturados na plataforma, em cada sonda tinha isso. Essa sonda era uma sonda SS1, era Zefir II o nome da sonda, de uma empresa, que hoje se chama Diamond Offshore, que continua trabalhando, não a sonda, mas essa empresa continua tendo vários contratos aqui com a gente.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Aconteceu um negócio interessante. Talvez o Iwao Jouti não se lembre. Ao desembarcar, eu estava fazendo uma coisa, porque você tinha que fazer toda uma papelada, uns relatórios. Tinha o Danilo e um outro cara chamado Eduardo Ueta, um japonês. O Danilo embarcava, mas como ele era um dos mais antigos, tinha um rodízio no escritório. Porque ninguém queria morar em Macaé, a verdade era essa, tinham poucas pessoas que queriam morar permanentemente em Macaé. Todo mundo queria embarcar, mas ficar em Macaé era um castigo, então as pessoas faziam rodízio. Existe até hoje, várias gerências lá em Macaé fazem isso para não sobrecarregar. Então você chega diz: “Você vai ficar aqui seis meses ou você vai ficar aqui um ano ou você vai ficar dois anos depois vai voltar a embarcar.” O cara monta um esquema provisório e depois volta para sua terra natal. Acho que o Danilo morava em Niterói, já nessa época. Eu me lembro que ele ficava muito na supervisão interna porque já era bastante experiente, comparado conosco. Eu estava sentado e passou o Mozart que era o chefe da DIRCRES - Divisão Regional de Completação, Restauração e Estimulação de Poços. O Iwao Jouti era o chefe do SEOCRES - Setor de Operação de Completação, Restauração e Estimulação. O Iwao Jouti é uma referência na área de completação do mesmo jeito que o Zephyrino é uma referência na parte de lançamento de linhas. Nessa época, o Iwao trabalhava interno, não trabalhava embarcado como hoje. Não sei se comentaram aqui que ele não é de muita conversa – no trabalho, ele é um cara muito seco, muito fechado. Mas ele estava lá. Eu me lembro que tinha um setor de projetos no Rio chamado SEPRON - Setor de Projetos e Sondas de Produção - e esse setor tinha um chefe chamado Edmar Branco, cujo apelido era Campeão, porque ele chamava todo mundo de campeão. Então as pessoas passaram a chamá-lo de Campeão. Era uma figuraça Era uma pessoa completamente diferente, já mais coroa, da geração do Zephyrino Machado, da mesma turma. Ele já faleceu. Eu me lembro que o grande medo do pessoal de Macaé era que mandassem alguém para o Rio, que o Edmar passasse a querer o cara e começasse a encher o saco do pessoal de Macaé para fazer a transferência. Eu nunca me esqueço desse Mozart, que também não dava a menor conversa, era uma pessoa extremamente seca. Aquilo me incomodava porque a gente desembarcava e o cara mal falava, dava um grunhido: “Hum.” Ele chegou, olhou para o Iwao Jouti, que também não era de falar muito: “Preciso mandar alguém para o Rio.” Aí um olhou para o outro: “Tem que mandar, vamos mandar.” Eu percebi que eles fizeram algum tipo de comunicação entre eles, que me olharam: “Formigli, você vai” E aí? Eu vim para trabalhar com esse Edmar por um período, para fazer uma especificação de árvore de natal molhada. Eu tinha tido um embarque de seis dias e não entendia nada. Por que eles me escolheram? Era exatamente pelo seguinte: “Esse cara não manja nada, vai para lá, e não vão gostar dele e vão mandá-lo de volta rapidinho. Não tem o risco de quererem ficar com ele.” Eu cheguei aqui, me apresentei ao Edmar. Conheci duas pessoas que trabalhavam com o Edmar e que também tiveram muito a ver com os projetos dessa parte de equipamento submarino. Apesar deles não terem embarcado muito, mas eles foram pessoas que estiveram numa fase de projeto na Petrobras, e eles embasaram o que veio depois com relação aos equipamentos para águas profundas: o Luiz Eduardo Carneiro, que atualmente trabalha na BR, e é uma pessoa
brilhante, e o Airton Viegas, que hoje trabalha no Rio Grande do Norte. Os dois faziam esses projetos de árvore de natal. Quando eu cheguei e me apresentei, eles me olharam e disseram: “Nunca ouvi falar de você. Qual é o seu nome?” Eu disse: “Formigli. Eu acabei de chegar do Rio Grande do Norte.” “Do Rio Grande do Norte? Você vai trabalhar aqui com a gente durante dois meses fazendo projeto de árvore de natal molhada.” “Só embarquei agora durante seis dias.” Aí eles olharam um para o outro: “Mandaram um cara
que não manja nada disso só para não ter o risco. Puxa vida, essa é fogo.” Livraram-se de mim em Macaé, porque não tinha chance de quererem ficar comigo; chego no lugar e o cara diz: “Você não entende nada daquilo que vai trabalhar aqui durante esses dois meses.” Eu disse: “Tô ferrado Não vou conseguir fazer nada aqui dentro.” Mas, felizmente, tanto o Carneiro quanto o Airton, tiveram paciência comigo. Eu estudava os catálogos, e a gente começou a trabalhar junto fazendo a especificação das árvores. O Edmar foi com a minha cara e eu voltei a embarcar, mas ele sempre ficava com aquele negocinho: “Pô, Formigli, não quer vir morar no Rio? Vem trabalhar aqui com a gente” “Não, eu quero trabalhar embarcado porque ganho mais, por que vou querer? Eu quero trabalhar embarcado para ganhar mais, tenho 14 dias de folga, não quero.” Eu trabalhei assim durante um ano e tanto, quase dois anos. O Danilo veio transferido para esse mesmo setor e o Zé Roberto veio transferido porque cuidava desses projetos. Nessa altura, o Carneiro já tinha ido para o Rio Grande do Norte para ser chefe da divisão. Eu vim para cá porque resolvi, achei que era legal mudar.
SETOR DE OPERAÇÕES / VIDA EM MACAÉ
Eu vim em 1986, para cuidar de projetos de equipamentos submarinos. Eu fui colega tanto do Zé Roberto quanto do Danilo, fazendo esses projetos, a gente trabalhava juntos, e ia muito com o Edmar a Macaé, porque a gente tinha que discutir o projeto com o pessoal de lá. Eu já conhecia antes, na verdade, o pessoal pelo período do meu embarque e, em um determinado momento, que eu tinha conhecido ele aqui, passou a ser o chefe da divisão de completação lá em Macaé e, surpreendentemente, o Irany e o Carneiro me convidaram para ser o chefe do setor de operações, ou seja, para ficar no lugar que um dia tinha sido do Iwao Jouti e que antes tinha sido de um engenheiro chamado Irany Varella.
Eu me mudei para Macaé em 1987. No início, eu ficava de segunda a sexta em Macaé, e passava sábado e domingo no Rio, onde tinha toda a minha vida social montada, Eu ia para Macaé só pelo trabalho. Mas eu comecei a gostar de Macaé. Na verdade, comecei a gostar porque comecei a namorar minha atual esposa, lá em Macaé. Ela trabalhava na Petrobras, está aposentada, mas ela trabalhava na Petrobras. E, obviamente, muda todo o referencial social, você sai do Rio e passa a gostar de Macaé. Eu comecei a ter oportunidades de trabalho em Macaé, era uma atividade em grande expansão, o que era chamado águas profundas a cada momento era mais profundo, e aquilo que era profundo antes virava corriqueiro. Eu trabalhava em terra, mas antes trabalhei embarcado, naquele período de dois anos, entre 1985 e 1986. Eu fiquei muito pouco tempo no Rio. Nesse período, eu passei a embarcar muito em plataformas, descendo essas árvores de natal molhada, instalando esse tipo de equipamento.
DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO / EQUIPAMENTOS Eu acho que o grande lance foi quando a gente resolveu abrasileirar projetos que eram feitos com uma visão de atendimento a demandas do Mar do Norte. Naquela época, o Golfo do México não tinha muita tradição em completação submarina, o forte disso era no Mar do Norte, tanto do lado inglês quanto do lado norueguês, mas principalmente do lado inglês. Os equipamentos eram concebidos com determinados tipos de configuração, voltadas para as características deles lá, onde tem condições terríveis de mar durante o inverno, e tem condições excelentes durante o verão. E aqui a gente não tem as tempestades que existem lá, mas em compensação não tem durante o ano um mar de almirante como eles têm durante o verão. Então, você tem um mar mais encapelado, aqui também tem uma agitação de mar pior no inverno nosso, mas não chega aos pés do Mar do Norte. O que acontecia era o seguinte: eram equipamentos muito pesados e rebuscados. A gente começou a perceber que não precisava de equipamentos tão complexos. Começamos a simplificar. O que em um primeiro momento, para os projetistas – porque essas empresas todas eram empresas estrangeiras – era uma heresia, eles não entendiam por que a gente estava simplificando o negócio que, a princípio, deveria se tornar mais complexo porque a estávamos indo para lâminas d’água mais profundas. E a gente botou na nossa cabeça assim como uma filosofia: “O que pode ser simples vamos fazer o mais simples possível, porque tem chance de sucesso maior.” A gente via que o negócio muito rebuscado tinha tanto componentezinho que acabava falhando algum e se algum componente daqueles falhasse, ferrava tudo. A gente resolveu fazer o seguinte: equipamento que dava para mergulhador fazer, vamos fazê-lo amigável para mergulhador, e equipamento que é para fazer sem mergulhador, que é chamado diverless, nós vamos fazê-lo mais simplificado porque tem algumas coisas que botam nesses equipamentos que são tão complicadas que só fazem aumentar a sua chance de quebrar. Eles tinham um sistema de controle multiplexado, que era um negócio todo eletro-hidráulico, uma série de válvulas solenóides. E a gente começou a fazer um controle hidráulico direto muito mais simples e que não dava tanto problema. Tinha uma operação que a é conexão das linhas flexíveis com a árvore de natal molhada, é uma operação que a gente chama de pull in, em inglês mesmo. Então essa operação vivia dando problema, você não conseguia fazê-la diverless, aí você tinha que descer. Ela era pretensamente projetada para ser sem mergulhador, nessa época não tinha robô. Tinha só um robô que via, ele não tinha braço. Então eram feitas ferramentas hidráulicas que deveriam funcionar sem a presença do ser humano nem do robô, acontece que não funcionava e isso demorava um tempão, as durações das completações eram imensas. Foi concebida a idéia de fazer o seguinte: “Pôxa, se é difícil fazer a conexão lá embaixo, vamos fazer a conexão da linha na árvore aqui em cima, e vamos descer tudo junto. Isso foi uma revolução. Porque ninguém imaginava que isso era possível: “Como é que vai conectar aqui em cima?” “Vamos passar a linha ali por debaixo da sonda, vai subir.” Na sonda existe um troço chamado moon pool, é piscina da lua, porque você olha lá embaixo uma água azul. Algum dia, um americano ou um inglês achou de chamar aquilo de moon pool e é assim que a gente chama, mesmo nas sondas brasileiras. Ali no moon pool você conectou tudo e você tinha que descer a árvore com a sonda e tinha que ter aqui um barco que ia apagando a linha simultaneamente. Isso foi um achado, ninguém tinha bolado isso antes. Isso aí virou o máximo, tanto que essa tecnologia passou a ser utilizada em vários lugares, na África e tudo o mais. Outras empresas passaram a adotar esse conceito. Só vamos complicar onde for necessário, essa foi a nossa
primeira filosofia. Segundo: a operação de pull in vamos fazer na superfície porque é causa de maior tempo perdido, então vamos faze-la no seco, porque a probabilidade de dar problema depois é mínima. Uma outra grande coisa que a gente passou a fazer que os estrangeiros tinham, e alguns ainda até hoje têm, nós passamos a utilizar sondas de posicionamento dinâmico, DP. Os caras sempre queriam usar a sonda ancorada e nós fomos indo para águas profundas e a ancoragem estava ficando complicada. Simplesmente, a gente teve a coragem de dizer assim: “Vamos acreditar no posicionamento dinâmico, ele não foi projetado para isso? Ele vai funcionar” E a gente fez algumas adaptações nas ferramentas para conviver com essa possibilidade de você ter uma perda de posicionamento, como os sistemas de destravamento rápido e uma série de coisas que foram desenvolvidas para garantir segurança. Graças a Deus, o desempenho disso tem sido excelente. Então isso também foi outro, uma outra sacada. Isso eu não diria que foi sacada, isso eu diria que foi coragem. Uma outra decisão que desde o início a gente teve e que isso no início tinha uma resistência muito grande dos fornecedores, é que a gente procurava padronizar o máximo as interfaces, com isso você tinha intercambiabilidade. Os fornecedores reclamavam: “Vocês vão cercear o desenvolvimento tecnológico.” E a gente dizia: “A gente vai fazer um desenvolvimento tecnológico onde é preciso.” Fazer desenvolvimento tecnológico em uma coisa que está funcionando adequadamente e que não vai me trazer nem preço mais barato nem tempo de sonda mais baixo, ou seja, produtividade; vou fazer aquilo mais simples, o feijão com o arroz. Com isso a gente ganhou uma escala muito grande porque a logística das nossas operações ficou muito mais fácil, esse também foi um grande achado, isso hoje é motivo de admiração de uma série de outras empresas que não tomaram essa decisão e que sofrem por isso.
PROFUNDIDADE DE LÃMINAS D’ÁGUA Eu diria que foi assim: 200, depois a gente foi para 320, 380, e aí a gente ficou muito tempo nos 400. Aquilo ali nos deu um embasamento legal, depois nós fomos para 700, e de 700 para 1000 foi mamata. Depois a gente foi a 1800 e a gente viu o seguinte: Se você olhar para uma árvore de natal molhada, para um equipamento, você não vai ver diferença mais, praticamente, entre 2000 metros até 400 metros hoje, porque dentro dessa visão de padronização a gente tem algumas classes de árvore, mas o lay-away, os formatos são bastante semelhantes. A gente tem algumas árvores diferentes, são as árvores horizontais que são árvores que têm um diâmetro interno maior e que permitem poços de grande vazão. Em relação à pressão, muda os atuadores, mas não é nada drástico.
Um leigo olhando para a árvore não vai conseguir diferenciar facilmente.
ROV - Remote Operated Vehicle Outra coisa também que a gente fez e eu diria que foi bastante arrojado foi quando a gente começou a fazer interfaces para o robô, para o ROV – Remote Operated Vehicle. A gente procurou facilitar as operações do robô. Uma coisa é o mergulhador: o ser humano tem um braço para fazer isso, a mão dele faz isso. Mas o robô tem algumas limitações, óbvio, ele não é igual ao ser humano. Então, a gente tinha que fazer a interface do que tinha na árvore para aquele robô ir lá e atuar o mais fácil possível, porque senão ele não conseguia, dava uma trabalheira danada. A gente investiu muito nisso, e o pessoal do Cenpes foi fundamental, eles tinham uma cabeça para planejar essas operações melhor do que a nossa da operação. Porque na nossa cabeça a gente queria fazer logo o negócio, e se você queria ter um cara para parar, para pensar, para ver como ia fazer, era a turma aqui do Cenpes.
CENPES – PROCESSO PARA DESENVOLVIMENTO TÉCNOLÓGICO Se você olhar o processo tecnológico da Petrobras, ele foi engenheirado por um cara chamado José Paulo Silveira, que é um cara polêmico dentro da Petrobras por questões ideológicas, mas não vem ao caso. Vamos falar da competência dele de planejar como deve ser um processo de desenvolvimento tecnológico. Esse cara conseguiu, na década de 80, bolar isso e até hoje é o que a gente usa. E isso foi copiado por uma série de outras empresas. Um cara bom para falar disso para é o Guilherme Estrella, porque ele trabalhou com o Silveira no Cenpes. O Estrella é um camarada que passou muitos anos no Cenpes, conhece bem esse negócio e essa é uma faceta que extrapola água profunda. Isso, na verdade, é um sistema tecnológico, no qual a Petrobras se sustenta muito, até porque essa é a única forma de uma empresa, de um país que não tinha na época uma indústria desenvolvida, para enfrentar desafios tão grandes. Então tinha que ter um processo bem estruturado de desenvolvimento tecnológico porque senão aquele negócio não decolava, ia ficar só comprando o que os outros trouxessem. Para você virar agente de modificação, você tem que ter um planejamento do que vai fazer e tem que ter muito bem estabelecido um ciclo: planejar, executar, avaliar, corrigir, e se for o caso e voltar de novo. Esse ciclo tem que estar rodando. O Silveira bolou esse negócio todo. Então, a gente aplicou em águas profundas essa metodologia. E essa metodologia passa nitidamente pelo Centro de Pesquisa, mas só tem cabimento se estiver totalmente interligado às demandas da operação. Então você não pode imaginar que dentro do Centro de Pesquisa só tem pesquisadores. É o que a gente chama de blue sky project, quer dizer, o cara olha, voa, porque se não estiver ligado ao que a operação está precisando, aquele negócio vai ser um monte de projeto de prateleira. E a operação mesmo não vai mais procurar o Centro de Pesquisa, para ela vai ser melhor: “Não, eu vou chamar um fornecedor, porque esses caras não me trazem nada de concreto para resolver meus problemas.” Então esse processo de desenvolvimento tecnológico passa por: “Vamos ver o
para onde a Empresa está indo. É lâmina d’água de 3000 metros, então precisamos nos preparar para 3000 metros.” E ao mesmo tempo: “Operação, quais são os problemas que você estava enfrentando em 1000 metros?” “São esses.” Então, eu tenho que bolar agora uma carteira de projetos de água profunda que atenda a 3000 metros, resolvendo os problemas que eu já estou enfrentando nos 1000 metros. É claro que nesse processo é degrau a degrau, step by step. Então você faz isso de 300 para 700, de 700 para 1000, para 2000, e à medida que você vai rodando, a sua capacidade de perceber futuros problemas
vai se tornando mais rápida, e com isso o projeto acaba podendo dar pulos. Coisas que você desenvolveu para 1000, apenas mexendo em resistência dos materiais, em resistências mecânicas, em propriedades mecânicas dos materiais, muitas vezes você consegue dar um pulo para ir para 2000, 3000. Esse processo, que roda até hoje no Cenpes, para Procap 3000 – deve ter vindo aqui o Jacques Saliés – vale também para todos os outros programas tecnológicos do Cenpes, não só para o E&P, não só para Exploração e Produção, mas para Refino também, que trabalha da mesma forma. Bom, a gente focou muito em completação,
PERFURAÇÃO Mas não se pode esquecer o seguinte: na perfuração, eu diria, houve também um grande desenvolvimento. O pessoal da perfuração ia na frente, tendo desafios em termos de fundação dos poços, porque os poços ficavam meio que balançando. Então, eles desenvolveram uma série de técnicas como o cimento com umas micro-esferas de vidro para poder ficar uma pasta leve, e desenvolveram revestimentos de tal maneira que se fizesse uma fundação legal no poço, ele não ficava balançando, foi uma outra coisa. Desde o início a gente tinha preocupação de que o poço exploratório pudesse vir para a produção porque a gente queria economizar o dinheiro quando chegasse na produção. Muitas empresas diziam assim: “Não, isso aqui é exploração. Se precisar na produção a gente fura outro poço.” “Pô, vamos tentar fazer uma economia nisso.” Então a perfuração foi na frente e também desbravou um negócio legal. Tem pessoas que tiveram um papel crítico, como o Virmondes Alves Pereira, que é uma referência, e também o Duque, que agora é diretor de serviços. Eu o conheci lá em Macaé, quando trabalhava na completação, e ele na perfuração. Ele também é uma referência. O Humberto Maia Neto, que está atualmente no Espírito Santo, é também um cara muito bom nisso e o Emanuel.
EQUIPAMENTOS SUBMARINOS Tem a parte de linhas que também se desenvolveu muito, que contou com o Beltrão, o Zephyrino Machado, além dos manifolds, que também a gente tem uma série de histórias. Eu trabalhei na completação até 1994, aí em 1995, a gente resolveu criar em Macaé a Divisão de Engenharia Submarina, que juntava linhas, manifolds. E eu passei a trabalhar nessa divisão, instalando linhas, umbilicais, maniflods também em lâminas d’água desafiadoras. Em 1998, eu vim para o Rio para trabalhar em uma gerência de projetos de instalações de superfície e navais e ancoragem. Esqueci de falar, um outro breakthrough, em termos de água profunda, que foi a ancoragem utilizando um equipamento chamado cabo de poliéster. Isso foi um negócio que, na época em que a Petrobras começou a usar, a indústria
achou que não ia dar certo. Hoje todo mundo usa, todo mundo copiou. Com isso se conseguiu baratear e diminuir o raio de ancoragem, aproximando a cabeça dos poços. O que faz com que se economize em linha flexível e aumente mais produção dos poços. Foi um achado. Isso foi desenvolvido por uma equipe de engenheiros de Macaé, o Rogério Diniz , o Komura, o Otávio e outros. Aqui no Rio tem um cara brilhante que trabalha no Cenpes, o César Del Vecchio.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / GERÊNCIA DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Eu fui chefe com 27 anos. Atualmente estou como gerente-executivo de Engenharia de Produção. Essa área vai desde reservatório, toda a parte do estudo de reservas, caracterização de reservatórios, engenharia de reservatórios, passando pela engenharia de poço, perfuração, completação, estimulação, fluido, e ainda pega a parte de processamento de óleo e elevação e escoamento. Tem uma parte de práticas operacionais, tem uma parte de sistemática de implantação de projetos e tem uma parte toda ligada a engenharia naval, engenharia submarina, que é o meu link com o que fiz lá atrás, e a parte de instalações de superfície e manutenção. Eu pego todo o processo de produção, com exceção da exploração, desde o reservatório até o que a gente chama de offload, até a entrega do óleo para um navio tanque transportar para algum lugar.
DESAFIOS ATUAIS Tem um “gargalo”, que eu vejo hoje, que é o seguinte. A gente avançou muito nessa parte submarina, nessa parte naval de reservatórios, na parte de poço, de tecnologia de poço a gente avançou pra caramba. Mas eu acho que a gente agora está em uma situação onde o processamento do óleo - eu não diria que é um problema da Petrobras, é um problema da indústria. O processamento ficou muito, eu não diria convencional, mas ele não deu um salto. O nosso desafio é investir em tecnologia nessa área para se conseguir minimizar os equipamentos que a gente bota na planta. Se eu conseguir minimizar os equipamentos teremos uma economia – a gente está trabalhando nisso, mas tem um risco tecnológico grande, ou seja, pode ser que não dê certo. A gente quer tentar pegar essas plantas de processo que ficam na superfície e jogar para o fundo do mar, tirar a plataforma da jogada. A economia será brutal, mas isso tem um risco, pode ser que não dê certo. Estamos trabalhando na pesquisa. Estamos na fase de pesquisa, começando a testar alguns protótipos, algumas coisas, mas não tem nenhum projeto hoje pronto. Não estamos já dizendo assim: “Nós vamos desenvolver o campo tal com tudo submarino.” A gente ainda não se sente com embasamento tecnológico para fazer isso. Na verdade, não só nós, nenhum lugar do mundo fez isso ainda. Tem um tempo aí, um horizonte. Selecionar um desafio é complicado porque, por exemplo, a gente agora vai perfurar poços na Bacia de Santos que são muito mais profundos do que os da Bacia de Campos, com formações mais duras, com depressões maiores de temperatura, e isso será um novo desafio. O desafio é aonde se achar o óleo, onde a exploração achar o óleo. Por isso existe o Procap. No fundo, no fundo é o seguinte: o cara da exploração nos diz assim: “Pode ser que nos próximos cinco anos eu ache petróleo em tal lâmina d’água e as características das formações são essas.” Eu tenho que trabalhar antes dele achar petróleo, desenvolvendo tecnologia, senão o gap que vai existir entre a descoberta do petróleo e o
desenvolvimento da tecnologia para a produção será muito grande. Mas a Petrobras é uma empresa que, felizmente, sempre investiu em tecnologia para poder estar na frente, e a gente tem que estar ali correndo e se preparando. O grande problema que, graças a Deus existe – quer dizer, é um negócio meio esquisito, mas é assim mesmo – é que a velocidade em que a exploração está descobrindo frentes novas, aumentou muito, mas isso é um problema bom para resolver, pior se eu não tivesse achado petróleo em condições, não diria difíceis, mas em condições diferentes, e eu tivesse simplesmente produzindo a mesma coisa que eu já produzia antes. O teu desafio, ao mesmo tempo, é um complicador e é um motivador da Petrobras. A gente trabalha meio com metas, mas que não podem ser metas apenas numéricas, isso é uma cultura. A meta tem que ter uma certa quebra de paradigma ou uma quebra de limite, é isso dá vontade de
continuar, dá tesão, mais ou menos, é essa a palavra. Se ficar todo mundo fazendo a mesma coisa, se perde aquela vontade de modernizar, de experimentar coisas novas. E é isso que eu acho legal
DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO Uma coisa que eu acho que todos os técnicos da Petrobras podem deixar assim, ter uma tranqüilidade, é uma cultura que tem gerencial na Petrobras. Eu não falo isso porque sou gerente agora. Todos os meus gerentes, vários dos nomes que eu falei aqui – o Carneiro, o Irany, o Tadeu –, todos sempre tiveram a coragem de nos incentiva a arriscar. Nunca foi assim: “Eu quero ter risco zero na implantação de um projeto.” Sempre foi: “Tem risco, mas tem chance de funcionar? “Vamos” Isso faz com que a velocidade de implantação de tecnologia na Petrobras seja muito grande, porque se fosse ficar testando para ter que implantar o projeto, ia demorar muito. Esse lance que eu falei da ancoragem, com um cabo de poliéster – o que a gente chama de perna atirantada, taut leg –
foi uma quebra de paradigma que a gente estabeleceu nos projetos de Marlim desde o primeiro momento. Quem estivesse de fora e olhasse: “Como é que esses caras vão fazer isso?” Fizemos e deu certo. Os manifolds com conexão vertical foi um outro negócio também que, a gente fez com o lay-away. O lay-away é a conexão em um tubo, só que a gente começou a ver: “Quando faço isso, eu tenho que ter a árvore, a sonda que está descendo a árvore e o barco na mesma hora. Logisticamente, isso dá trabalho, vamos arrumar uma maneira de fazer isso separado.” “Mas se eu fizer separado eu perco essa vantagem.” Aí a gente desenvolveu um outro método, que é o da conexão vertical, e funciona legal. Foi a gente que implantou a primeira leva de manifolds, acreditando que isso ia funcionar. E funcionou. Isso são demonstrações de que se o técnico da engenheira tem uma solução, trabalha nela, e mesmo que não tenha sido exaustivamente testada, gerencialmente a Petrobras acredita: “Vamos fazer para ver porque vai dar certo.” Isso acaba tem do um efeito multiplicador, porque vamos querer fazer mais para poder implantar. E esse efeito multiplicador é muito importante. Eu acho que isso é uma característica cultural da Petrobras.
HISTÓRIAS /CAUSOS / LEMBRANÇAS Teve um problema em um poço, o Pampo 3, quando trabalhava embarcado como fiscal. Era um poço submarino que a gente estava fazendo uma operação com um flextubo, que é um equipamento que vai por dentro da coluna de produção e quando a gente estava fazendo a limpeza do poço, houve um problema na bomba da sonda. É um negócio que não se consegue prever, controlar. Mas ficou preso. A gente ia perder o poço porque não ia ter como recuperar aquele monte de coluna, tinha um monte de coisa presa. Mas a gente resolveu fazer uma operação super arriscada, que era tirar o pedaço da coluna de produção que ficava da cabeça do poço, lá embaixo, até a sonda, mantendo o tal do flexitubo por dentro sem quebrar. Quem é do ramo consegue entender a complicação. Eu ainda me lembro que era uma sonda SS27, uma sonda super antiga, mas que tinha uma equipe nota 10. A gente viu como ia funcionar. O meu chefe em terra era o Irany Varela, e eu expliquei para ele: “Bom, ou faz isso ou perde poço.” A gente nunca tinha perdido um poço. Para a gente aquilo era emblemático, não podia perder. A gente começou a fazer a operação e foi tirando tubo a tubo; tinha um tubo preso dentro e tinha que tirar esse tubo por fora lentamente, desconectar, e aí tinha que segurar por baixo. A gente bolou um sistema para prender – era um negócio que não existia em lugar nenhum – mas a gente bolou aquele troço todo lá na sonda. Fomos fazendo. E eu nunca me esqueço que no último tubo, só faltava um tubo, o maldito do conector de cima quebrou e sumiu o tubo ali. Pôxa, perdemos coisa Aquilo não podia ter acontecido. Se aquele troço tiver caído para dentro do poço, ferrou A gente ia perder tudo. Aquilo foi uma ducha de água fria, porque a gente tinha passado, sei lá, umas 10 horas naquela aflição, tirando cada tubo e no último acontece aquilo. Aí tiramos, desconectamos, quando a gente puxou, lá estava a pontinha do tubo encostada, e o cara: “Olha a ponta do tubo aqui” Ao invés de ter caído, ele ficou preso ali, ninguém sabe por que, mas ficou ali. E foi uma alegria danada, conseguimos pescar aquilo e aí conseguimos salvar o poço. O Irany, engraçado, lembra disso até hoje, ele estava em terra, eu estava embarcado. E isso foi uma operação que marcou, um negócio diferente, nunca mais eu fiz aquilo. Provavelmente, poucas situações devem ter sido iguais àquela e era um negócio totalmente improvisado. Não existiam ferramentas para enfrentar aquilo. Foi uma situação nova.
HISTÓRIAS /CAUSOS / LEMBRANÇAS Teve outras situações. Por exemplo, teve um tubarão enfiado na árvore de natal. Um tubarão martelo se enfiou na árvore. Ele mordeu e rompeu a linha. Foi uma trabalheira danada Foi em Marlim. O peixe é atraído, às vezes, pelo equipamento porque o robô tem luz, e isso atrai o peixe. O tubarão morreu preso, nunca mais conseguiu sair.
HISTÓRIAS /CAUSOS / LEMBRANÇAS Eu falei de operação de pescaria. Teve um caso onde a gente tentava pescar um negócio que tinha dentro da coluna de produção e não conseguia. Para a pescaria você usa um arame. E aí o cara chegou e disse assim: “Esse troço está com cheiro de peixe.” O que tinha acontecido? Era uma moréia. Enquanto a gente estava descendo a árvore, ela entrou no buraco, e na hora que a gente desceu a árvore ela ficou presa lá dentro. Cadê que a gente conseguia ter acesso a ela? Tinha que tirar pedaço por pedaço do peixe.
HISTÓRIAS /CAUSOS / LEMBRANÇAS Outro caso, ali no template de Bonito, SS8, onde tinha muito camarão e o camarão vinha para cima da lâmpada. Para enxergar o que você queria fazer era preciso enganar o camarão. Você subia com a lâmpada e o camarão ia lá para
cima, aí você descia correndo para olhar – porque tinha uma TV com a lâmpada para você olhar. Tinha alguns segundos até o camarão descer de novo, e por aí vai. Existe algumas fotos e alguns filmes disso. Seria legal buscar isso daí. Por uma incrível coincidência, estou contando essas histórias. Eu vou fazer uma apresentação em um seminário sobre essa parte submarina em Houston, no mês de março. É um seminário bem operacional. O organizador é um americano, ele me conhece já de muito tempo e me chamou. E o título é: “Subsea Tieback for Achieving Success: the devil is in the details”. Então o título é exatamente esse: o diabo está nos detalhes, porque o que a gente já teve de situações em que você tem milhões e milhões de dólares envolvidos e, às vezes, por causa de uma bobagenzinha você tem uma despesa ou, ao contrário, aquilo é que faz dar certo. E eu também fiz um e-mail para vários colegas, alguns que há vários anos eu não encontro, tentando lembrar de casos – isso que eu estou falando para você é caso – e agora começou a chover. Eu mandei esse e-mail no final de semana e agora o correio está chovendo porque está todo mundo lembrando dos casos que cada um passou. Então vai ter ali uma coletânea de casos atípicos que tenham a ver com esse tema: “The devil is in the details”, quer dizer, o diabo está nos detalhes. Isso é claro, às vezes você tem uma operação imensa e por causa de um detalhezinho você perde tudo ou tem um grande prejuízo. Em breve a gente vai ter um banco de situações insólitas.
LAZER / FAMÍLIA Eu não mudei muito em relação ao que eu era aos 20 anos. Eu sou bastante caseiro. Felizmente, a minha mulher também tem hábitos parecidos com os meus. Minha esposa é Lucimar Formigli e minha filha é Lilly Lima Formigli. Eu tenho o hábito muito grande de ler, esse é o meu hobby. Leio coisas técnicas e literatura em geral. Adoro ir ao cinema e a minha esposa também; a gente vê muito filme. Gostamos, obviamente, de ir também a uma praia. Entre uma praia e uma serra, sou muito mais uma praia. Minha família está se mudando esse final de semana para cá. Eu tinha voltado a morar com a minha mãe. Ela teve uma paciência monumental. Depois de velho voltar a morar na casa da mãe é um negócio meio complicado. Ela tinha a vida dela e passou a me sustentar durante a semana. O final de semana eu passava com a minha família em Rio das Ostras, a gente mora em Rio das Ostras. Neste final de semana, estaremos nos mudando para o Leblon. Eu espero que consiga aqui no Rio ter a mesma tranqüilidade que tinha lá em casa. Essa é a minha atividade fora do trabalho. Você vai dizer: “Pô, mas esse cara faz pouca coisa fora do trabalho”
Mesmo dentro de casa, eu ainda tenho uma ligação muito grande com o trabalho em termos de ler, de estudar, de aprender. Mas, obviamente, eu leio outras coisas e saio com a minha mulher e a minha filha. Graças a Deus, os hábitos delas são parecidos. Eu não sei se elas sempre tiveram aquilo ou acabaram se adaptando ao meu estilo de vida. A gente fez umas certas concessões de ambos os lados e hoje a gente vive feliz dessa forma.
PROJETOS FUTUROS Eu não diria que é um sonho, diria o seguinte: em termos profissionais, a Petrobras sempre foi uma empresa, aqui no Brasil, de uma única Bacia, a Bacia de Campos. A gente agora está espalhando isso, estamos indo para outras realidades. Eu acho legal poder passar por esse processo de transferir o que a gente aprendeu na Bacia de Campos para outras Bacias. Tem impressão de que é tudo igual, mas não é, tem muitas coisas diferentes. É a mesma coisa de construir um prédio, não é tudo prédio, tem vários tipos de prédio, e é isso que a gente está fazendo. Agora a gente vai ter um horizonte muito maior do que tinha antes obviamente com surpresas boas e ruins ao longo do tempo. E a gente tem que se preparar para as ruins e comemorar as boas. Profissionalmente, para mim, quero conseguir pesquisar e antecipar esses problemas. Eu me sinto muito feliz de estar na posição atual porque tenho a oportunidade de ajudar a Petrobras a enfrentar isso. A minha atividade permite isso. Apesar de até hoje eu ainda ter vontade de sair do Brasil, acho que deve ser um negócio legal, ter uma oportunidade de trabalhar fora, experimentar como é, não sou igual a alguns colegas que têm isso como uma meta. Pode ser uma boa oportunidade desde que seja um lugar atraente em termos profissionais. O que eu acho também é o seguinte, eu estou ainda relativamente novo, não consigo me ver aposentado tão cedo, ainda que pudesse em termos de idade e tal, mas ainda vai demorar bastante. Então, provavelmente, em breve, podem surgir oportunidades até mesmo em outra área de negócios. Hoje eu estou no upstream, mas pode ser no downstream, pode estar em outra atividade, como o Carneiro, como o Tadeu, como caras que migraram para outras atividades, o que eu acho legal. A Petrobras te dá essa possibilidade. Bom, esse é o lado profissional. No lado pessoal, eu espero sinceramente continuar com a paz que eu tenho em casa, essa paz é
fundamental. A minha mãe fala um negócio: “A gente só dá o verdadeiro valor às coisas quando as perde.” Às vezes, a gente não tem a dimensão do quanto aquilo é importante, aquilo te ajuda. Eu fico fazendo um exercício: “Se eu perder essa paz vai ser uma coisa de louco.” Porque tudo isso que eu consigo me dedicar ao trabalho, eu não vou poder se eu também tiver que me preocupar com outros sérios problemas fora. Então, essa paz é um negócio crítico. E paz aí é o bem-estar em termos de saúde e harmonia em casa, que é o suficiente e é o que eu desejo. Acho que é importante ver a minha filha ter uma perspectiva de vida, onde ela possa ser independente. Acho que como pai ou mãe, o ter sucesso na educação do filho é conseguir que ele possa ser independente e não precisar de você. Não ter que ficar ao seu lado só porque ele é dependente de você – isso eu acho que como pai gostaria de ter os filhos perto. Mas, ao mesmo tempo, só vou me sentir bem sucedido se eu perceber que a minha filha pode tocar a vida dela independente de mim. Se eu perceber que ela está junto simplesmente porque ela depende de mim, eu acho que não tive sucesso. Isso é um negócio importante. Paz significa toda essa tranqüilidade em casa. Agora vindo morar no Rio tem um lado novo de trazer minha mulher e minha filha para cá. A minha mulher estudou aqui, não é um grande problema, mas para minha filha é uma coisa nova, sair de
um lugar menor, e vir para cá. Por outro lado tem um benefício de estar ali perto da minha mãe. A minha família é muito pequena: só eu e a minha mãe, o resto das pessoas está na Bahia. A gente é muito distanciada. Então hoje é essa tranqüilidade que eu procuro.
PROJETO MEMÓRIA Eu não acredito que alguém tenha te dado uma resposta dizendo que a Petrobras errou e que não tenha gostado. É impossível. O jeito de vocês conduzirem a entrevista, deixando a gente, pelo menos a mim, bem à vontade, imagino que aos outros também. A iniciativa da Petrobras é mais uma daquelas que a gente não tem nem idéia do que a empresa está fazendo. Fui surpreendido quando você ligou e perguntou se queria ser entrevistado. Não tinha a menor idéia de que isso existia. Eu tinha ouvido falar nos 50 Anos para algumas pessoas. No caso específico, o Alfeu Valença comentou comigo todo feliz que tinha sido entrevistado. Eu disse: “Pô, legal” Mas pensei que fosse focado nos ex-presidentes da Petrobras. Então eu acho a iniciativa excelente, isso bota a auto-estima lá em cima. E é um registro de uma empresa que tem uma característica intrínseca de uma ligação imensa com o seu corpo de empregados. Tem empresas que são muito impessoais, mas a Petrobras é uma empresa movida à gente. Os empregados da Petrobras, com raríssimas exceções, todos têm um orgulho imenso. Eles reclamam, brigam, esperneiam, mas no fundo todos têm o objetivo de melhorar. Eu acho que essa iniciativa é mais uma daquelas que a gente é surpreendido. De repente, a gente descobre que alguém teve uma idéia e que a empresa está implantando um negócio. Eu nunca poderia imaginar estar fazendo isso aqui. Fiquei super feliz e fico mais feliz ainda porque não é um negócio isolado. Eu percebo que falando podemos ter aí uma teia de gente que se deixar não tem fim. Eu que a agradeço a você e a toda a equipe aqui. Foi muito legal. Muito obrigado mesmoRecolher