IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Danilo Oliveira. Nasci no dia 18 de janeiro de 1952, em Salvador, Bahia. FAMÍLIA Não tenho a menor idéia do nome dos meus avós, nem paternos e nem maternos. Quer dizer, eu tenho alguma idéia do nome, mas não sei se é do pai da minha mãe ou do pa...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Danilo Oliveira. Nasci no dia 18 de janeiro de 1952, em Salvador, Bahia.
FAMÍLIA Não tenho a menor idéia do nome dos meus avós, nem paternos e nem maternos. Quer dizer, eu tenho alguma idéia do nome, mas não sei se é do pai da minha mãe ou do pai do meu pai. A única avó que conheci foi a mãe da minha mãe, que conviveu conosco até os meus 8 anos de idade, quando ela então faleceu. Seu nome era Adelina. Mas não sei seu nome completo. Nós a chamávamos de Mãezinha Adelina.
Meus pais eram muito mais velhos do que eu. Inclusive, meu pai nem conheceu seu pai. O nome dos meus pais é Octaviano Oliveira e Dilce Oliveira. Meu pai era muito pobre, nasceu no interior da Bahia. Começou a trabalhar em fazenda, como roceiro, vaqueiro. Ainda jovem, resolveu exercer a atividade de garimpeiro. Teve um pouco de sorte na Chapada Diamantina. Progrediu um pouco e chegou a ser industriário, dono de algumas serrarias e fazendas ainda na área da Chapada Diamantina. E, minha mãe, Dilce Oliveira, nunca exerceu atividade nenhuma. Cuidar de sete filhos já era uma atividade grande. Ela era dona de casa mesmo.
INFÂNCIA Meus três irmãos mais velhos chegaram a morar em Andaraí, que era a capital da Chapada Diamantina na época. Mas, a partir do quarto dos sete filhos, sendo que sou o quinto, todos nasceram em Salvador. Minha infância foi em Salvador. E, esporadicamente, uma ou duas vezes por ano, durante as férias, íamos para Andaraí passar as férias escolares. Foi uma época inesquecível. A fazenda era muito grande. Tinha 15 ou 16 quartos. Ia pai, mãe, tio, tia, sobrinho, prima. Aquilo ali enchia. Nessa época, meu pai já tinha uma condição financeira estável, tipo classe média. Morávamos num bairro residencial, meio popular, o Barris.
BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA Brincávamos muito na rua. Nela passava bonde, era um lugar cheio de ladeiras. Hoje, Salvador é cheia de avenidas e vales.
Naquela época, esses vales eram roças. E costumávamos sair de casa e descer até estas roças, que tinham muitas árvores frutíferas. No final do vale passava um riacho. Guardo boas recordações. Não lembro de brincadeiras com o meu pai, porque ele era muito mais velho do que eu. Meu pai, quando eu tinha 10 anos de idade, já tinha mais de 50. E, naquela época, uma pessoa de 50 anos já era considerada velha. Eu, hoje, com 53 anos, não me acho velho. Mas, naquela época, uma pessoa de 50 anos era um senhor e, por isso, ele não brincava comigo. As minhas brincadeiras eram com colegas e com meus irmãos. O meu irmão Deli, que era mais velho do que eu, teve muita influência na minha carreira profissional, porque praticamente segui seus passos, inclusive, na Petrobras. Em termos de brincadeiras, brincava com os irmãos mais velhos.
FAMÍLIA Minha mãe exercia a autoridade em casa. Ela era a dona da casa. Meu pai não reclamava, só olhava. O seu olhar era o suficiente, mas quem cuidava de tudo em casa era a minha mãe. Quem dava puxão de orelha, beliscão. Quem dizia: “Não sai hoje” Meu pai era o chamado católico não praticante e minha mãe é católica praticante. Hoje, ela está com 82 anos e ainda vai à missa todo domingo, todo dia santo, atua na igreja, visita comunidades carentes que precisam de ajuda. Até os 13, 14 anos, fui criado dentro desse ambiente. Fiz primeira comunhão. Estudei meu curso primário em um colégio de padre. Já no secundário, estudei num colégio protestante. Ainda segui, durante alguns anos, essa influência de minha mãe, mas acabou sendo por pouco tempo.
ENSINO FUNDAMENTAL Fiz meu curso primário numa escola que ficava na esquina de casa. Estudei no Instituto Nossa Senhora da Salete, que tinha freiras bastante rígidas. A escola era no cume de uma colina e abaixo tinha o vale e a roça. E, muitas das vezes, quando ficávamos de castigo, fugíamos pela roça. No outro dia, recebíamos mais castigo Eu era bom aluno em termos de aproveitamento, mas era muito levado. Eu me lembro que, em toda a época de comemoração da Nossa Senhora da Salete, havia uma imagem de Nossa Senhora numa colina e tinham os carneirinhos com os nomes dos alunos. A colocação dos carneirinhos perto da Nossa Senhora dependia do seu comportamento. As meninas lutavam para chegar perto. O meu carneirinho nunca passou do nível inferior Eu tomava vinho do padre na igreja, ia ao claustro das irmãs, que era um local proibido, matava aula para ir chupar manga, quebrava vidro jogando bola no pátio interno. Ainda assim, eu era um bom estudante. Desde aquela época, havia o bom estudante e aquele que colava. Várias vezes, eu tirei zero, porque estava dando cola e diziam que era eu quem estava colando.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Tem um caso de um colega meu que quase morreu. A freira que tomava conta da roça estava atrás da gente. Ela cuidava dos porcos, das galinhas e tinha estendido um arame para secar a roupa lavada. Nós viemos correndo e este colega bateu o pescoço no arame. Foi muito grave, não pegou na artéria carótida por sorte. Isso assustou a gente.
ENSINO MÉDIO No ginásio, fui para o Colégio Dois de Julho. Eu já estava mais maduro. Tinha 11 anos de idade. Digo mais maduro, porque meus pais me criaram com muita independência. Quem decidiu em que colégio estudar fui eu. Naquela época, que ainda se fazia exame de admissão, fiz concurso para o Colégio Militar e outro para o Colégio Dois de Julho. Passei nos dois e decidi ir para o Dois de Julho. Aos 11 anos de idade, eu já saía. Aos 12 anos, saía andando dos Barris para a Fazenda Garcia que ficava a dois quilômetros de distância.
Hoje, acho que meu filho não faria isso Andar dois quilômetros, com 12 anos, no meio da cidade com a pasta do colégio Em Niterói, com 15 anos de idade, nós levávamos meu filho à escola. Das duas vezes em que ele foi sozinho, perdeu o tênis e o relógio. Foi assaltado.
Eu já estava mais maduro e já sabia a importância do estudo. Sempre fui mais comportado nessa fase. Dos 11 aos 18 anos de idade, fiz todo o estudo secundário, ginásio, científico, no Colégio Dois de Julho. Com relação aos estudos, era sempre bem comportado. Não me lembro de nenhum fato como os do primário. Reservava a bagunça para a noite
JUVENTUDE Nunca me dei bem com bebida. O carnaval da Bahia era um fato esperado e todo mundo brincava e bebia. Eu, no primeiro gole, passo mal, como até hoje. Hoje, minha vida é um gole de cerveja, um copo de vinho e uma dose de whisky. Mais do que isso, já podem me encostar em um canto, porque me sentindo mal. Os meus colegas eram todos da rua e mais velhos. Todos eram freqüentadores desses locais famosos da Bahia. E não tinha esse negócio de idade. Não tinha que ter 18 anos para freqüentar o ambiente noturno. Saía com eles e ia pra farra, mas sem beber. Íamos para cabarés. Cada um tinha a sua namorada. E o resultado disso foi que, aos 15 anos, tive uma tuberculose.
ESPORTE Nunca pratiquei esporte. Até hoje, nunca pratiquei esporte algum. Gosto mais de jogos de mesa. As pessoas ficam admiradas: “Você parece um atleta A vida toda sempre com um corpo de atleta” Nunca fui para uma academia. Quando fui praticar esportes, arrebentei o joelho e o cotovelo. Arranjei uma bursite. Por necessidade médica, vou ter que fazer musculação. E me pergunto: “Mas como, se eu não gosto de academia?” Arranjei um tal de pilates, para ver se melhoro. É um tipo de musculação com alongamento, que eu detesto. Mas, para sair do sedentarismo...
MODA A moda era ridícula. Quer dizer, passado um tempo qualquer, coisa de moda fica ridícula. Eu tenho umas fotos onde estou vestindo umas calças boca de sino, com a chamada nesga, calça marrom e vermelha, quadriculada. Na minha época de adolescente, na chamada época dos “Hippies de Arembepe”, a moda era essa. Bata, camisão, camisa com “macho”, com aquele gancho de puxar atrás. As calças eram as famosas calças com nesga.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Eu não sabia e não tinha idade para dirigir. Nessa época, eu tinha entre 15 e 17 anos. Roubava a Rural de meu pai e meu colega, que tinha carteira, dirigia. Geralmente, éramos em dois ou três. Passávamos nos cabarés, pegávamos umas duas ou três garotas. Íamos na sexta-feira e voltávamos no domingo. Sempre gostei de música. Sempre tinha um no grupo que tocava violão. O mais tocado era MPB e, na época, Beatles. Mas a própria música baiana sempre foi muito forte na Bahia, e até hoje é difícil a entrada de música estrangeira. E mesmo a música brasileira, para entrar na Bahia, é difícil. A preferência do baiano é pela música baiana, depois pela brasileira e, depois, a estrangeira. Tocava muita MPB, Caetano, Gil, João Gilberto, muita bossa nova. E ainda Beatles, Queen, Pink Floyd.
OPÇÃO PROFISSIONAL Nunca houve, em casa, alguma expectativa para que eu seguisse alguma carreira. Meus pais sempre deram independência a todos os filhos. Mostravam sempre a importância do estudo. Meu pai, inclusive, dizia que não tinha o primário, mas que, o que aconteceu com ele, conseguir vencer na vida sem estudo, não ia acontecer com a gente. Ele sempre deu independência e escolha pra gente. No máximo, fazia algum comentário sobre as nossas escolhas. Comecei a tocar piano com quatro anos. Aos 11 anos, decidi parar e ele disse: “É isso mesmo o que você quer? Então, pára.” Decidi ir para o Colégio Dois de Julho e ele perguntou: “É isso mesmo que você quer?” Decidi ser professor: “É isso mesmo que você quer?” Meu pai queria que eu fosse fazer a Escola Militar. Mas, já no exame de admissão, achei a Escola muito autoritária. No exame de formação o tenente gritava: “Todo mundo em fila, para a sala”. Não gostei dali e desisti logo.
ENSINO MÉDIO O Colégio Dois de Julho era uma escola particular. Na época, meu pai estava bem financeiramente, não tinha problemas. Todos nós estudamos em escola particular. A universidade foi pública.
ENSINO SUPERIOR No período de escola, não tinha nenhuma noção do que ia estudar. Igual a hoje. Nenhum dos meus filhos sabe o que irá fazer. Fui influenciado pelo meu irmão.
Meu irmão mais velho era engenheiro e o outro irmão também, e já trabalhava na Petrobras. Ele me disse: “Faz Engenharia. Qualquer coisa você muda”. E foi o que fiz. Fiz Engenharia e passei o curso todo dando aulas. Eu não tinha a menor idéia de qual especialização de Engenharia iria fazer. Eu sabia que teria emprego, era a época do “Milagre Econômico”, em 1972, 1973. Era se formar e garantir emprego. E, por coincidência, no ano em que terminei a faculdade, apareceu o concurso da Petrobras. A Petrobras tinha acabado de descobrir óleo na Bacia de Campos. Foi uma grande descoberta, tanto que a minha turma da Petrobras foi a maior até então. Foram 107 engenheiros contratados. Fiz concurso, passei e disse: “É aqui que eu vou ficar.”
PRIMEIRO TRABALHO O primeiro e único emprego que tive como engenheiro foi na Petrobras. Antes, eu só dava aulas no Colégio Dois de Julho e num cursinho pré-vestibular.
INGRESSO NA PETROBRAS Meu início na Petrobras foi muito bom. Primeiramente, pelo contato com 107 pessoas de todo o Brasil. Tinha gente do Amazonas ao Rio Grande do Sul. E era engraçado porque tinha gente que tinha passado no concurso somente para vir para o carnaval da Bahia às custas da Petrobras. Fomos admitidos no dia 21 de janeiro de 1976 e, um mês depois, seria o carnaval. Como a primeira prova seria no carnaval, a demissão só viria depois. Porque, se você tirasse certa nota, seria demitido. Teve gente que só veio pra isso. Acabou o carnaval, foi demitido Foi até um aprendizado cultural. Até então, eu só havia saído de Salvador uma vez. Minha vida toda sempre foi em Salvador. Tinha vindo uma vez passar umas férias no Rio de Janeiro. Fiquei por uns 15 ou 20 dias. Conhecer pessoas de outros estados foi fantástico. Fiz amizade com vários deles e, nas férias, viajava para outros estados. Foi um aprendizado de relacionamento pessoal.
ESPECIALIZAÇÃO EM ENGENHARIA DE PETRÓLEO Esse curso na Petrobras era muito puxado. Um ano de curso. Era horário integral, começava às 8 horas e terminava às 17 horas, tinham provas mensais de várias matérias. Era preciso atingir certo nível, sendo que, abaixo daquele nível, você seria demitido. O salário era muito bom para a época. Lembro que comecei a trabalhar em janeiro e, em setembro, comprei à vista um Puma zero quilômetro, o melhor carro da época. Era muito dinheiro. Eu não queria perder aquilo, e não perdi.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Gosto muito de viajar, de coisas novas. O meu irmão que trabalhava na Petrobras contava casos, que eram iguais a uma aventura. Na época em que eu fazia o secundário, ele já trabalhava na Petrobras. Ele viajava para Aracaju, para Alagoas, para a perfuração na Bacia de Campos e tinha um carro da Petrobras para poder se movimentar. Aquilo me agradava. Tanto que, quando entrei na Petrobras, em 1976, a minha primeira escolha foi ir para o exterior, já que tive a oportunidade de escolher, de acordo com a minha classificação, onde iria trabalhar. A Petrobras já tinha atividade no Iraque, na Líbia, e escolhi ir para esses lugares. Infelizmente, não deu certo, porque surgiu a Guerra Irã – Iraque. Tive que modificar essa opção. Mas as histórias que ele contava, me atraíam muito: as suas improvisações, as descobertas e coisas técnicas. Tudo aquilo foi me cativando.
CURSO DE ENGENHARIA DE PETRÓLEO / A TURMA Depois do carnaval, pouquíssimos alunos se desligaram do grupo, depois da primeira leva de demissão. A Petrobras precisava realmente daqueles engenheiros. A demanda era muito grande e a turma era boa. A partir daí, quando a pessoa tirava nota baixa, tinha uma segunda chance. Não me lembro direito, mas acho que só um ou dois se desligaram do grupo depois disso. Um quis sair mesmo, porque teve problemas com a família. O outro, porque não teve jeito, não conseguiu se recuperar. Éramos um grupo muito unido. Até 20 anos atrás fazíamos encontros. Depois, nos separamos, alguns se aposentaram, outros já se foram. Paramos de nos encontrar, mas estamos tentando organizar um encontro de 30 anos para daqui a dois anos.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Escolhi trabalhar na Braspetro Internacional, mas quando fui fazer estágio, em 1977, rompeu a Guerra Irã X Iraque. Inclusive, meu irmão também não foi. Ele trabalhava no Iraque. Ele já estava lá ou estava indo. Não lembro. Ficou quase um mês em Paris aguardando, pensando que seria uma guerra curta. Depois, teve mesmo que retornar. Já com todas as coisas no navio, apartamento alugado, teve que desfazer tudo. Mas não foi frustrante, porque a atividade era justamente o que eu esperava. Cada dia uma coisa nova. Entrei no estágio em janeiro de 1977. A cada 15 dias, era movimentado em Catu ou no campo.
BACIA DE CAMPOS Em agosto de 1977, a necessidade de engenheiros na Bacia de Campos era tão grande que fui transferido sem concluir o estágio. A partir daí, foi uma festa Viajava todo mês para Vitória. Embarcava por 15 dias. Solteiro, com dinheiro no bolso e folgando por 15 dias. Cada folga passava num lugar: Rio Grande do Sul, Florianópolis, São Paulo, Ceará. Cada folga era em um lugar diferente e cada embarque era uma coisa diferente. Cada embarque era um aprendizado e, a cada folga, uma nova diversão. Morando em Salvador, embarcava em Vitória somente para pegar as diretrizes do embarque. Embarcava, voltava para Vitória, fazia os relatórios e ia pra folga.
BACIA DE CAMPOS / PRODUÇÃO OFFSHORE As plataformas todas eram estrangeiras, americanas. A tripulação era americana. Os brasileiros eram, somente, os de nível mais baixo. E tínhamos nós, da Petrobras. Aprendi inglês na raça, porque o curso que eu tinha de inglês era só do secundário mesmo. Aprendi inglês embarcado. A atividade era, literalmente, uma descoberta para todos. A atividade de produção no mar era nova para todos, inclusive, para a tripulação americana. Eles eram técnicos de perfuração. E nós, a partir de 1977, estávamos trabalhando com equipamentos de produção. Cada embarque era novidade. Recebíamos o material com os catálogos e íamos aprender ali, na hora, trabalhando na sonda. Não existia nenhuma autoridade que soubesse aquilo. No nosso curso, em Salvador, não havia essa parte de produção. A Petrobras já iniciou isso com o mais novo sistema que existia no mundo e quebrando recordes.
Os sistemas que, em 1977, foram colocados em prática para produzir para a Petrobras, eram novos no mundo todo. Vinham consultores de fora para nos orientar e quando o consultor via o equipamento, dizia: “Também não conheço, vamos ficar juntos aqui”. Havia uma cooperação muito grande. Quando há o desconhecido, a união em torno do mesmo objetivo levava todo mundo a procurar o melhor conhecimento e contornar todos os problemas encontrados. Tínhamos várias companhias de serviço e, se falhava alguma coisa, todo mundo sentava em torno da mesa com os catálogos e programas para tentar descobrir onde era a falha. E tinham equipamentos de quatro, cinco, seis companhias. E íamos testando, verificando o caminho. Todos tínhamos uma certa consciência do pioneirismo do trabalho. E o trabalho dava muito errado
COTIDIANO DE TRABALHO / BACIA DE CAMPOS Eu me lembro particularmente de um poço, o Garoupa-8, que quase ocasionou a minha demissão e a de outro engenheiro, porque fizemos muita besteira. Pelo nosso desconhecimento e dos outros também. A gente tentava acertar, mas, às vezes, só piorávamos as coisas. Realmente, quando foram investigar, a gente tinha feito algumas coisas indevidas. Um diretor pediu as nossas cabeças. Mas aquilo foi contornado, porque todos os nossos superiores hierárquicos, o chefe de setor, chefe de divisão e o superintendente assumiram a responsabilidade do pioneirismo e fizeram o diretor constatar que não cabia uma demissão naquele caso.
COMUNICAÇÃO E PIONEIRISMO As comunicações, na época, eram muito difíceis. Não tinha telefone nem fax. A comunicação era via rádio. Chamava-se uma central de rádio que fazia a comunicação e nem sempre se escutava as instruções. Uma sonda parada era muito cara, custava centenas de dólares por dia. Então, tomávamos as nossas decisões e nem sempre eram certas. Mas era sempre com a melhor das intenções.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / BACIA DE CAMPOS Eu havia sido transferido para Vitória. A opção de morar em Salvador era minha. Como eu tinha folga, optei por morar em Salvador. Só fui morar em Macaé, porque o distrito DISUD se mudou de Vitória para Macaé, entre 1979 e 1982, não consigo precisar bem. Eu já havia me casado em 1979 e, quando me separei, em 1982 ou 1983, fui morar em Macaé. Cheguei lá com as primeiras descobertas todas feitas. Garoupa, Enchova, Cherne, Bonito. Já estavam iniciando o desenvolvimento da produção. Existiam dois sistemas: o Sistema Antecipado de Garoupa e as primeiras Árvores de Natal Molhadas para Enchova. Comecei a trabalhar nesses dois sistemas. Sempre focando esse ponto, o equipamento submarino. Eu e mais três ou quatro engenheiros fomos direcionados para aprender tudo o que se referia a equipamentos submarinos. Trabalhava com completação de poço, ou seja, preparar um poço para produção, que envolve várias técnicas, desde o reservatório do poço e da plataforma. Praticamente, dediquei um ciclo da minha vida para pesquisar, aprender, projetar, desenvolver e fazer manutenção de toda essa área de equipamentos submarinos, principalmente, a chamada Árvore de Natal Molhada que, desde o início, foi a maneira que a Petrobras escolheu pra desenvolver seus campos. Porque um campo offshore, pode ser explorado via plataforma, como os primeiros campos da Petrobras no Nordeste e na fase rasa da Bacia de Campos. As plataformas fixas são dessa época. Só que uma plataforma fixa precisa de um período de construção. Quando cheguei, elas já estavam em construção, mas não se trabalhava nelas, porque o trabalho de construção era todo em terra. A minha parte era equipamentos submarinos. Estava sempre voltado para esse tipo de coisa: Árvore de Natal Molhada, manifolds. Nessa época, trabalhei com o Sistema Antecipado da Garoupa, um sistema muito avançado.
SISTEMA DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE GAROUPA O Sistema Antecipado de Garoupa foi um sistema de produção contratado pela Petrobras. Ele consistia em transferir para o ambiente marinho toda a tecnologia de superfície em terra. Pegava-se uma Árvore de Natal terrestre, que era colocada dentro de uma cápsula com espessura de uma parede, enorme, em um ambiente não marinho, ou seja, estanque, como se fosse um submarino. Essa cápsula era submersa e acoplada à cabeça do poço. Era a mesma tecnologia de terra colocada dentro de uma cápsula estanque. A dificuldade era encontrar as pessoas para trabalhar nesse ambiente, porque elas tinham que ser um misto de mergulhador e técnico na especialidade daquele serviço. Não era fácil. Às vezes, se encontrava um bom técnico que não tinha coragem para ir lá. E esse sistema era muito caro, porque precisava de um barco dedicado que mantivesse essa cápsula. A Petrobras desativou este sistema em 1983 ou 1984. Como os campos estavam perdendo a produtividade, foram sendo abandonados. Esses poços são muito antigos e pararam de produzir.
BACIA DE CAMPOS: DIMENSÃO Trabalhava na área de produção que tem uma interface com a perfuração, onde se avalia os poços. Trabalhava preparando os poços para produzir campos já descobertos há algum tempo e acompanhava a atividade de perfuração e exploração adjacente. A gente acompanhava cada descoberta. E tínhamos noção do que representava, porque conhecíamos os volumes dos campos que estávamos trabalhando. A cada momento que ouvíamos falar, por exemplo, na descoberta Albacora em 1984 ou 1985, sobre os volumes de bilhão de barris. Falávamos: “Aqui tem trabalho para a vida toda”
Na época, para mim e para muita gente que embarcava, o melhor trabalho era embarcado. Porque, para certas pessoas, e eu me incluo nessas pessoas, o novo é um desafio, é o que estimula. Não me imaginava sair de um regime de embarque, para trabalhar em um escritório. Escritório deve ser maçante. A mesma coisa todo dia. E, a cada descoberta, significava trabalho. Tinha a vida pela frente e queria me aposentar aqui. E, assim foi o decorrer desses anos todos. Mesmo depois de vir para a terra e trabalhar ligado a equipamentos submarinos, acompanhei o desenvolvimento e o trabalho no suporte tecnológico, para preparar a Companhia para desenvolver esses campos. A Petrobras sempre foi assim, de 180 metros, 200, 300, 400, 500, 1000, 1500, 2000, 2500 metros, sempre foi o upfront da tecnologia. Sempre batendo os recordes. Íamos para o exterior, na época, para aprender, discutir os assuntos. Às vezes, podia parecer algo do tipo “A Petrobras quer bater recordes, quer ser a melhor”. Mas não é questão da gente querer. É que as descobertas que fazíamos eram sempre em águas profundas. E ninguém vai fazer descobertas pra deixar lá, deitada eternamente.
PROCAP 1000 Quando foi criado o PROCAP, ele direcionou o foco da Companhia toda. Era o Cenpes, a Engenharia, a área de Produção. Todos com o mesmo objetivo: capacitar e desenvolver equipamentos que permitissem a Petrobras viabilizar, não apenas a descoberta, mas também a produção daquele óleo. Foi um momento que marcou a estratégia da Empresa, que passou a investir de uma maneira sistematizada na Bacia de Campos, capacitando a Companhia para isso. Porque,
nos campos, nós utilizávamos tecnologias estrangeiras. Até 300 metros, a gente importava os equipamentos e, a partir desses equipamentos, é que fomos produzindo nossas modificações, fomos produzindo para águas mais profundas, mas às vezes utilizando equipamentos que não eram próprios. Por exemplo, no poço de Piraúna, que era de 400 metros, foi utilizado um equipamento feito para 300 metros. Ir para 400 metros de profundidade, já foi uma ousadia, uma adaptação. Foi uma maneira que a Petrobras encontrou, baseada na experiência passada, de estender sua tecnologia para águas mais profundas.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu deixei de embarcar em 1985, por opção. Cansei de embarcar, já estava casado novamente e não dava mais para continuar embarcando. Teve alguns acidentes de helicóptero que mexeram com a minha cabeça, teve um acidente em Enchova. Algumas coisas me posicionaram para mudar e escolhi vir para o Rio.
PROCAP / INTEGRAÇÃO DOS TRABALHOS
O trabalho da Empresa, na época, era organizado desta maneira: exploração, perfuração e produção. Tinha a engenharia que fazia as instalações de grande porte, plataformas, dutos rígidos e refinarias. E tinha o Cenpes. A gente sentia que esses órgãos trabalhavam até competindo entre si. Não participei dessa junção, mas, a partir da decisão da implantação do PROCAP, houve uma coordenação única dos projetos com o foco em águas profundas. Esses órgãos passaram a trabalhar juntos, forçados pela estrutura matricial do PROCAP.
Houve uma troca de pessoal, inclusive. O PROCAP foi criado em 1986. Em 1988, fui para o Cenpes, já dentro dessa estratégia de movimentação de pessoal e de maior integração. A partir do PROCAP e com o seu desenvolvimento, foram vencidas essas barreiras de competição entre os órgãos. A Petrobras começou a trabalhar integrada num único objetivo. Às vezes, o E&P tinha um projeto, a Engenharia tinha outro e o Cenpes tinha outro ainda. Cada um partia para uma direção para resolver o mesmo problema, não trabalhavam integrados, não discutiam. Mas a competição é boa e até hoje existe. Cada um quer ser melhor que o outro, pelos mesmos projetos, embaixo de uma única orientação. E foi assim desde o primeiro contato. Acho que isso resultou em um ganho muito grande. A movimentação de pessoal foi também uma boa solução, retirar o pessoal que embarcava e colocá-los no projeto, e do projeto, colocá-los no gerenciamento da atividade, fazendo um rodízio.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Até a data em que saí, em 1985, eu tinha trabalhado em todos os campos descobertos na Bacia de Campos. Trabalhava preparando os poços para produção. Principalmente aqueles em que tinha que ser descida a Árvore de Natal Submarina. Sem falsa modéstia, quando saí de lá, podia dizer: “Se tem alguém no mundo que entende de Árvore de Natal, vai entender igual a mim. Mais do que eu ninguém entende”. Eu tinha aqueles livros e minha tábua de embarque. Embarquei em todas as plataformas da Bacia de Campos. Participei na instalação de quarenta e duas Árvores de Natal, de todos os fabricantes, de todos os tipos fabricados até então. Participei de modificações de equipamentos. Estive durante cinco meses, nos Estados Unidos, dentro da fábrica da Vetco-Gray, participando de testes de montagem de equipamento. Na época, em que deixei de embarcar, realmente entendia do negócio.
ÁRVORE DE NATAL MOLHADA Um poço tem o fluxo de petróleo que sai do reservatório e chega na superfície. A partir daí, ele tem que ser controlado e direcionado. Em terra, é muito fácil fazer isso, basta se colocar flanges e arruelas, tubos e as válvulas. Mas, no fundo do mar, isso tem que ser feito remotamente.
Então, a Árvore de Natal nada mais é do que um conjunto de válvulas que direcionam esse fluxo de óleo ou de gás, mas direciona também o fluxo de água ou gás que se injeta no poço para facilitar a produção. E tem um acoplamento hidráulico com a cabeça do poço. Então, ele tem que vedar, não pode haver vazamento e tem que exercer um controle total do poço. E tem que durar 20 anos que é o seu tempo de vida. São cerca de oito válvulas. Para movimentar essas oito válvulas, há uma série de linhas eletro-hidráulicas, de sensores de pressão, de êmbolos hidráulicos para travar, destravar, testar, e as ferramentas que levam isso para baixo e o instalam remotamente. Começamos a trabalhar com um equipamento pronto que veio dos Estados Unidos. As fábricas tradicionais eram americanas. Esse equipamento chegou aqui e começamos a trabalhá-lo e a adaptá-lo. Até hoje, somos o maior instalador de Árvores de Natal do mundo. Praticamente, um terço delas estava aqui no Brasil. Hoje, talvez, haja um pouco menos, porque há muita atividade na costa oeste da África e no Golfo do México, em águas profundas. E, praticamente, todos os técnicos da Petrobras, têm essa experiência de instalações dessas Árvores, não só eu. Há uma equipe de técnicos que trabalham com isso há 20 anos em Macaé. Eles conhecem o equipamento. Se fecharem os olhos e começarem a segurar, armam e desarmam com facilidade. Para eles sugerirem e fazerem as adaptações é muito fácil, muito simples.
CONHECIMENTO TÉCNICO A Petrobras é diferente de uma empresa como, por exemplo, a empresa Majors ou qualquer uma das que tenha atuação mundial. Elas têm muita atividade no Golfo do México, no Mar do Norte, na Malásia, na Austrália. A atividade é dividida e os técnicos são regionais. A nossa atividade não. Ela é toda concentrada na Bacia de Campos. Então, todo o conhecimento está ali concentrado nos técnicos, que apóiam esse trabalho na Bacia de Campos. Então, se você pegar uma companhia dessas, ela tem um grande projeto no Golfo do México, no Mar do Norte, na Indonésia, mas são projetos totalmente separados. E, muitas vezes, essa transferência de conhecimentos não se dá. Levamos grande vantagem nesse ponto. Por mais que se realize workshops, encontros freqüentes, por exemplo, uma Shell no Golfo do México é diferente de uma Shell na Inglaterra, que é diferente de uma Shell na Noruega ou nas Filipinas. É difícil colocar esses técnicos em contato para trocar conhecimento. O conhecimento é no dia a dia.
PADRONIZAÇÃO DOS EQUIPAMENTOS Essa concentração na Bacia de Campos, de certa forma, favoreceu a Empresa, por ser contínua. É uma atividade que vem desde 1977. No Mar do Norte, tem um projeto hoje e outro daqui a seis anos. No Golfo do México, tem um projeto hoje e outro daqui a quatro anos. Tanto que os projetos são totalmente diferentes de um para o outro, dentro da mesma companhia. Na Petrobras não. A Petrobras se dá ao luxo de comprar um equipamento que pode ser usado em qualquer campo. Serve para qualquer um, porque adaptamos, fizemos uma padronização na qual o equipamento pode ser intercambiado. Não importa, hoje, tirar uma Árvore no campo de Marlim para botar uma nova, pois ela vai encaixar perfeitamente. Conseguimos fazer essa padronização e isto é um ganho enorme.
EQUIPAMENTOS SUBMARINOS Quando trabalhava na Bacia de Campos, se dizia que a produção estava limitada à profundidade em que o mergulhador podia ir, isto é, em torno de 300 metros. As plataformas poderiam ir até 500 metros, porque tinham sistemas de cabos guias e ancoragem até essa profundidade. Como as análises das sísmicas indicavam que poderia haver óleo em profundidades maiores, foi se desenvolvendo uma tecnologia para perfurar essas profundidades. Surgiram navios com posicionamentos dinâmicos. O que é um posicionamento dinâmico? É um navio que não precisa de ancoragem. Ele passou a ficar estacionado no local com ajuda do chamado thrusters, que nada mais é do que hélices posicionadas, via satélite ou via um equipamento fixo em algum lugar, em várias direções no casco. Ela estudava uma posição e se mantinha fixa naquela posição para perfurar o poço. Esse foi o primeiro avanço nessas unidades de perfuração. E a produção precisava acompanhar. Antes, usávamos cabos e guias para levar o equipamento até o fundo do mar. Mas os cabos guias eram coerentes com os sistemas fixos de ancoragem. Com o posicionamento dinâmico, que não tem mais uma ligação entre a unidade e o fundo do mar, eles instalavam um poste embaixo, com um cabo fixo na unidade. E, por esse cabo, é que eram enviados os equipamentos. Esse era o chamado cabo guia. Como a unidade não era mais posicionada fixa por meio de âncora, ela ficava solta, girando, e não se podia mais usar esse cabo guia. Então, equipamentos com funis guias começaram a ser desenvolvidos. A ferramenta era colocada embaixo por meio de um grande funil e esses equipamentos desciam e eram guiados – por esse funil – para os lugares onde você queria encaixar. Surgiram os equipamentos chamados sem cabos guias. Daí em diante, começou a se adaptar os equipamentos para as profundidades. Então, as válvulas eram compatíveis com 300 metros, foram adaptadas para 500 metros, depois, para 1000, para 2000 e para 2500 metros. E foi-se, também, avançando na utilização de veículos de controle remoto. Antigamente, você tinha uma TV somente para observar. Com a necessidade, se foram colocando máquinas com manipuladores, tanto web quanto rotativos, movidos de forma eletro-hidráulica. E se passou a ter a imagem e a possibilidade de manusear equipamentos no fundo do mar sem uma ligação física rígida. Isso foi facilitando o projeto dos equipamentos.
Hoje, praticamente, temos uma ligação física, rígida. Podemos descer, com cabo, o equipamento e deixar todo o trabalho de manuseio ou guia e atuação com esse equipamento de atuação remota. Logicamente, por trás disso, tem um grande avanço de eletrônica, de transmissão de imagem, fibra ótica, além de vários tipos de comandos elétricos. Para trabalhar em ambiente marinho e mergulhando na água, você tem que ter grande confiabilidade nessas conexões elétricas e eletrônicas. Esse desenvolvimento foi apoiando essa nova concepção de equipamentos.
ÁRVORE DE NATAL MOLHADA Participei da instalação das Árvores de Natal Molhadas no Gabão e no Golfo México. Na época, a Petrobras estava muito isolada aqui no Brasil. Nós fazíamos as coisas baseados no nosso próprio conhecimento. Com a abertura dos contratos de risco para as companhias que vieram para o Brasil, eles demonstraram interesse de ver nossas operações. Pedimos em contrapartida que, se tivessem operações com Árvores de Natal Molhadas no exterior, que fossemos avisados e que possibilitassem aos nossos engenheiros irem lá acompanhar. Tive essas duas oportunidades. A Elf, no Gabão, trabalhava com Árvores de Natal Molhada também, apesar de ser em águas rasas. Eles iam fazer sua manutenção. Nessa época, por volta de 1979 ou 1980, nunca tínhamos feito manutenção, só tínhamos instalado. Tivemos esta oportunidade e fui escolhido para ir. Foi uma viagem inesquecível Por incrível que pareça o presidente do Gabão, na época em que eu fui, é o mesmo de hoje, o Omar Bongo. Fiquei embarcado por quinze dias numa plataforma francesa e vi a programação e tudo o que foi feito na Árvore. A retirada, os itens que foram verificados, quem eram os técnicos que estavam a bordo. E isso eu trouxe de volta para o Brasil.
A mesma coisa ocorreu no Golfo do México. A Shell também tinha interesse e nos convidou. Eles iam fazer uma intervenção numa cápsula submarina do Sistema Antecipado de Garoupa. Então, fui eu e meu chefe, o Mozart da Costa Freitas. Passamos 30 dias nos quais íamos aos escritórios da Shell em New Orleans e embarcávamos para ver as operações. Tivemos a chance de comparar os programas que eles faziam com os programas que nós fazíamos, de conhecer os itens de atenção na hora da manutenção.
PETROBRAS / INTERCÃMBIO DE CONHECIMENTOS Na época, tínhamos uma posição de liderança na área de implantes marinhos e não tenho queixas a fazer da maneira que fui recebido. Fomos recebidos da melhor maneira possível. Eles ficaram surpresos com a nossa idade, porque a indústria de petróleo é uma indústria que trabalha com gente. Na época, o que eu encontrei no Golfo do México, era o que a Petrobras é hoje. A média de idade é 45 anos de idade. Na época, eu tinha cerca de 30 anos. E, praticamente, todo o corpo técnico da Petrobras tinha 30 anos. Porque quem era antigo na Petrobras, continuou trabalhando em terra e, quem era novo, voltou-se para essa parte de equipamentos submarinos. A gente pôde discutir de igual para igual, como hoje. A Petrobras é muito respeitada nessa área. Eu acredito que não pode ou não existe fórum referido a equipamentos submarinos ou águas profundas que não conte com a presença da Petrobras. Eles chegam a dizer: “Se não tiver a Petrobras, perde o sentido”. Desde daquela época, eu sentia que eles queriam realmente discutir. Várias vezes, aqui no Brasil, fomos retirados das plataformas para vir a encontros com pessoas que vinham da Noruega, Estados Unidos, Inglaterra, para trocar experiências. Com isso, assinamos vários acordos de troca de tecnologia. O que fazíamos era passar a nossa experiência com equipamentos submarinos e pedir outras que não conhecíamos. É muito interessante conhecer o seu igual em outra companhia e tratá-lo olho no olho. Uma coisa é ler um artigo que essa pessoa escreve, a outra é discutir com ela e receber pessoalmente o conhecimento, as particularidades que jamais são transmitidas em trabalhos ou papéis escritos ou mesmo em apresentações. Nessas discussões, em cima da mesa, com projeto aberto, é que você capta os detalhes e a importância de cada operação. A Petrobras passou, de uns tempos pra cá, a perceber a importância dessa troca. Viagem ao exterior, na Petrobras, era quase um prêmio, uma raridade. E, a partir dessas discussões, ficou claro para todos os gerentes e técnicos que essas discussões têm contribuições a dar e são importantes. A Petrobras passou a incentivar mais esses encontros. A transmissão de conhecimento é simplesmente conversa. Até o chope de noite pode ser a hora em que é passado aquele conhecimento que pode fazer a grande diferença.
SATISFAÇÃO PROFISSIONAL Pessoas que convivem comigo, inclusive meus filhos, têm a exata noção do que é ou do que foi a Petrobras para mim. Quando me aposentei, minha filha disse que queria ter um trabalho igual ao meu. Eu perguntei: “Mas, igual ao meu como?” Ela:
“Não sei. Um trabalho que eu goste como você gosta do seu”. A minha realização no trabalho é muito grande e não consigo imaginar como é que uma pessoa pode se queixar de ir para o trabalho. Durante toda a minha vida, sempre fui para o trabalho com a satisfação do que ia fazer ou do que estava fazendo. Em nenhum período de minha vida na Petrobras, tive qualquer dúvida de que estava fazendo, o que eu queria e gostava, o que me realizava. Tanto que a aposentadoria, para mim, foi muito difícil. Ainda trabalho com petróleo e tenho muito contato com a Petrobras. Estou num lugar em que me sinto muito bem. Estou fazendo um trabalho ligado à exploração, à produção submarina.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Para sair de Macaé foi muito difícil, porque estavam precisando de gente por lá. Na época, eu quase tive que ameaçar, dizendo que, se eles não me transferissem, eu iria embora. Eu estava recém-casado no Rio de Janeiro e não queria mais embarcar. Eles tinham me deixado em Macaé, no escritório. Aproveitaram a minha experiência para dirigir, gerenciar as atividades de preparação dos poços para produção. Pedi para vir para o Rio e eles não quiseram deixar. Daí, falei: “Vou embora, porque tenho outra proposta de uma firma”. Com isso, o gerente me transferiu.
No Rio de Janeiro, fui colocado na equipe de divisão de completação de poços, encarregada do desenvolvimento de equipamentos submarinos. Eu fazia a programação das unidades plataformas, na intervenção dos poços e cuidava da aprovação dos projetos trazidos pelas companhias de serviços.
EQUIPAMENTOS SUBMARINOS / CAMPO DE MARLIM / PRÊMIO OTC Nessa época, já havia, pelo menos, duas ou três companhias de serviços instaladas no Brasil, porque foram atraídas pela enorme atividade de compra da Petrobras. Eles instalaram as suas fábricas e traziam os projetos já nacionalizados para a gente comentar, fazer análises e aprovar. Eu era um dos encarregados desse trabalho. E passei de 1986 ou 1987 até agosto de 1988 trabalhando com isso. Foi a época da descoberta de Marlim e Albacora. Com a necessidade de ter equipamentos com a capacidade de ir até 1000 metros de lâmina de água, a Petrobras assinou vários acordos com essas companhias para desenvolver essas Árvores de Natal e todos os acessórios. Fui o coordenador desse acordo de cooperação tecnológica com a antiga CBV, que, hoje, é a FMC do Brasil. Essa Companhia foi a primeira fabricante de uma Árvore para mil metros de lâmina d’água, que foi aquela instalada em Marlim e que resultou, depois, no prêmio OTC [Offshore Technology Conference] dado a Petrobras. O prêmio foi dado não só para o que se referia à parte submarina, mas para toda a instalação do Campo de Marlim em águas profundas.
DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIAS No princípio, a Petrobras adaptava a tecnologia de 150 metros para avançar para maiores profundidades. Adaptávamos um equipamento usado em 150 metros, 200, 300 metros e fomos levando, aqui e ali, para a lâmina de águas mais profundas. Assim, atingimos uns 500, 600 metros. Mas, a partir daí, esse conceito não se aplicava mais.
PROCAP 1000 / PADRONIZAÇÂO DE EQUIPAMENTOS SUBMARINOS Para 1000 metros de lâmina de água, precisávamos de um impulso tecnológico que possibilitasse esse avanço e isso tudo foi inserido no PROCAP 1000. Foi o primeiro PROCAP. Esse desenvolvimento deixou de ser uma adaptação. Ele tinha que ser alguma concepção nova. Surgiram os conceitos. Assinamos o acordo de cooperação com todos os quatro fabricantes. E cada um tinha um conceito, uma tecnologia, a sua opinião de como ia funcionar melhor. Por exemplo: um acreditava que o funil deveria ser pra cima; para o outro, o funil era pra baixo; outro utilizava a chaveta pra orientar; e mais outro, um pino. Cada um, também, tinha o seu coordenador. Fomos discutindo para chegar a um consenso do que fazer, de quando instalar. Cada um com uma tecnologia e um conceito diferente, e a Petrobras foi desenvolvendo com todos os equipamentos necessários. E a partir dessa Árvore de mil metros surgiu a padronização do equipamento. Porque passamos a interferir na criação do equipamento desde o início. Nós podíamos participar ativamente com cada companhia, dirigindo o desenvolvimento do equipamento e não apenas trazendo o existente. Com esse conhecimento adquirido e, diante da perspectiva de grande utilização de Árvores de Natal Molhadas, é que chegamos ao novo passo. A Petrobras decidiu ter o seu projeto. O diretor e os gerentes pensaram assim: “Estou utilizando a capacidade dos meus técnicos, estou gastando o meu HH [homem-hora] e dando o melhor do meu conhecimento para desenvolvimento de cada uma dessas companhias”. Essas mesmas companhias que existem hoje: a Cameron, a FMC, a ABB e a Statoil. Algumas apenas mudaram de nome, mas são essas quatro. Sempre foram as quatro empresas. A Statoil, antes era National. A FMC sempre foi FMC, mas era CBV aqui no Brasil. A ABB era a Vetco-Gray. A Cameron sempre foi a Cameron. São essas quatro que dominam o mercado em termos de equipamentos submarinos.
PROJETO PARA ÁRVORE DE NATAL Os gerentes da Petrobras decidiram utilizar esses equipamentos para produzir em águas profundas. Foi até engraçado quando um gerente ligou para mim ao decidirem sobre o projeto próprio. Ele disse: “Vamos ter o projeto. Vamos colocar uma pessoa da Engenharia do Cenpes para desenvolver esse projeto. Danilo, quem é a pessoa que você indicaria e que mais entende desse problema para viabilizar esse projeto?” Eu não tive dúvida: “Olha, depois de mim, é o fulano”. Daí, ele perguntou: “Você estaria disposto?” E eu falei: “Olha, não é o que eu queria não, porque eu gosto muito do que estou fazendo aqui. Não sei se lá vai ser interessante, porque o Cenpes é um ambiente muito devagar, de pesquisa, de engenharia. Não haverá novidades. Não estou muito a fim não”. Mas ele insistiu muito.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / CENPES Então, fui para o Cenpes, que não era tão monótono como eu pensava, tanto que passei 10 anos lá. E, de novo, gostei do que estava fazendo. Fui para lá com a missão de desenvolver o projeto da Árvore de Natal para 1000 metros da Petrobras. Atuei fazendo desde os testes das pessoas que íamos contratar, já que eram necessários vários projetistas, afinal a gente tinha a concepção, mas não tinha quem colocasse isso na prancheta – na época, era prancheta, não era AutoCAD. Ao final, contratamos uma equipe de oito pessoas, entre técnicos projetistas, desenhistas e outro tanto de engenheiros. E montamos o projeto.
ENCONTRO DE ENGENHARIA SUBMARINA Conseguimos organizar, pela primeira vez, um Encontro de Engenharia Submarina. Fomos para Nova Friburgo, fizemos o Encontro num hotel com todos os técnicos de Engenharia Submarina. Foram apresentados projetos que eram relevantes para a Empresa. E explicamos qual seria finalidade do projeto da Árvore de Natal e, quando saímos de lá, todo mundo atuava em torno do mesmo objetivo.
ÁRVORE DE NATAL PARA ÁGUAS PROFUNDAS Conseguimos desenvolver o projeto em três anos. Saímos do zero, fizemos o projeto, construímos aqueles equipamentos que eram necessários para fazer protótipos para testes, visitamos fábricas pequenas e fabricamos equipamentos. Testamos e conseguimos assinar com a Statoil – na época, ainda norueguesa – a fabricação do protótipo. Eles construíram o protótipo da Árvore e, depois disso, vieram para o Brasil. Hoje eles têm até uma fábrica de Árvores de Natal em Curitiba. Sabíamos que o projeto daria certo por conta da nossa experiência. Você faz uma concepção baseada apenas em sua própria experiência. Logicamente, eu não estava sozinho nisso. Contratei projetistas que já tinham trabalhado em outras empresas brasileiras também, que já estavam aqui no Brasil. Engenheiros que já tinham alguma experiência de atuação no campo. Fizemos um descritivo conceitual para, a partir daí, começarmos a colocar o projeto no papel. E fomos montando. Priorizamos os equipamentos básicos, daqueles que exigem movimento, travamento, selamento, para fazer o desenho. Escolhemos o fabricante e fomos para uma fábrica. Eles fabricavam e nós testávamos se estava realmente vedando, fechando, travando, para continuar o projeto do equipamento. Porque tem o hardware, o desenho da caldeiraria, que é como um equipamento qualquer de alta precisão é fabricado. Então, qualquer fábrica sabe fazer. Você faz um desenho, estuda as interferências e sabe se vai funcionar ou não. Mas travamento e vedação, alta pressão, gás, você já precisa de um teste mais específico. Então, com as regras de teste do American Petroleum Institute, ou com outras normas, desenhamos e projetamos. E fizemos o teste.
EQUIPAMENTOS SUBMARINOS Fui para o CENPES, em 1988, para ser especificamente o coordenador desse projeto. Em 1991, assumi a chefia do Setor de Engenharia Submarina. E por aí passaram todos os projetos do PROCAP voltados para lâmina de água profunda relacionados com a
parte submarina. Porque PROCAP não é só equipamento submarino. PROCAP é poço, é perfuração, é instalação de superfície. Tudo o que for relativo à necessidade de produção, à ancoragem, tubulações. Minha parte era a de equipamentos submarinos. Outro projeto importante, nessa época, foi o Bombeio Centrífugo Submerso, cujo desafio era colocar uma bomba elétrica num poço submarino, o que nunca tinha sido feito no mundo. Porque Bomba Elétrica Centrífuga de poço de terra era comum. Mas colocar isso num poço submarino é diferente, porque tinha o desafio de transmitir a eletricidade para diversos componentes que eram encaixados. Tem o poço, depois a interface do poço no fundo do mar, a Árvore de Natal, a ferramenta da Árvore de Natal e tem a plataforma. Todas essas conexões eram feitas remotamente embaixo da água e em alta potência. O coordenador do projeto era um engenheiro do setor, o José Eduardo Mendonça, que com muito afinco levou a cabo essa missão. E, nós colocamos, pela primeira vez no mundo, uma Bomba Elétrica Submersa funcionando. Esta tecnologia, hoje, está sendo estudada e será aplicada no campo de óleos pesados no Espírito Santo. Levamos praticamente 10 anos para partir do protótipo e encontrar uma utilização que viabilizaria a produção de um campo. Porque, até então, os campos que descobrimos não necessitavam especificamente daquela tecnologia. Mas sabíamos que aquilo seria necessário. E dirigimos essa oportunidade.
CENPES A forma de trabalhar do Cenpes é elogiada por todos os visitantes de outras empresas que vêm para cá. É um trabalho muito integrado com o campo, muito objetivo, sem perder de vista sua função de centro de pesquisas. Existe uma parcela de projetos chamados Blue Sky, que estão ali para o cientista aplicar e ver, primeiro uma descoberta, para, depois, verificar seu uso. Os projetos do Cenpes estão voltados para a utilização e para a necessidade específica da Petrobras como agente de Exploração, Perfuração e Produção. É um trabalho muito integrado. E acho que um dos motivos disso é o abandono do estilo antigo de especialidades para o cruzamento com matrizes. Existem os gerentes dos grandes projetos, chamados projetos de companhia, que passam pelo Cenpes, pela Engenharia, pela Exploração e Produção, pelo campo. Pessoal é recrutado e todos trabalham referenciados por um ente que não seja desses quatro principais. E esse tipo de trabalho tem resultado, tem boas inovações.
DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIAS A tecnologia, não só na área de petróleo, mas em todas as outras novas descobertas, como posicionamento, GPS [Global Positioning System], formação on-line, internet, tudo isso facilita o trabalho, porque você não está mais sozinho. Antigamente, você ia na plataforma e tomava as decisões. Você tinha o problema, idealizava a solução e você mesmo a implementava. Às vezes, no máximo, conseguia um contato via rádio ou por telefone. De qualquer maneira, os contatos eram muito raros e as decisões eram tomadas por duas ou três pessoas. Hoje, você tem um acompanhamento total on-line. Você é capaz de perfurar um poço e estar no edifício sede visualizando a broca, vendo em qual posição ela está e podendo dizer: “Vai mais para o nordeste, para oeste, inclina.” Isso é uma facilidade incrível. Ninguém poderia imaginar que se poderia, em tempo real, fazer um estudo e, ao mesmo tempo, uma aplicação desse estudo. Hoje existem instrumentos que você coloca na ponta de uma broca quando está perfurando e que te dão a posição exata da broca. Você tem uma Sísmica 3D e a coloca num campo 3D, naquela formação que você quer atravessar e vê literalmente a broca entrando na formação, vê se ela está passando acima ou abaixo daquela formação que você quer e corrige na hora aquelas coisas.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL /SERMAT Passei dez anos no Cenpes participando dos projetos. Por ser da Diprex, que era Divisão de Projetos de Explotação, não só participei dos projetos da área submarina como de todos os outros projetos dos outros setores. Setores de linhas, de estruturas, de ancoragem. Então, peguei um feeling de como é o desenvolvimento dessas coisas. Idéia de custo, idéia de projeto, idéia de necessidade. E, ao final de 1998, com a nova estruturação da Petrobras, fui convidado para ir para o Sermat. Fui trabalhar, de novo, com as coisas que pautaram o meu desenvolvimento na Empresa. Desenvolvendo fornecedores de novas tecnologias. Só que, agora, 2500 metros era o limite.
EQUIPAMENTOS SUBMARINOS A maioria das empresas já era brasileira, mas havia também, nesse conjunto, empresas internacionais. Continuamos no mesmo diapasão. Sempre procurando utilizar a experiência da Petrobras, aplicando à necessidade de profundidade de 2500 metros, desenvolvendo a tecnologia e, às vezes, até um novo fornecedor. Quer dizer, se a gente visualizava um certo equipamento que tinha o domínio de uma única companhia, incentivávamos outra companhia para que iniciasse aquele desenvolvimento para ver se atingia um estágio de competitividade.
A nossa parte eletrônica ainda é muito dependente do mercado externo. Eu diria que, basicamente, eletro-eletrônicos são importados. E um pouco equipamento de materiais compósitos, esses novos materiais mais resistentes do que o aço, que são de fibra de carbono, são importados.
Já temos um estaleiro para montar plataformas. Mas, por exemplo, grandes máquinas, grandes equipamentos cujo uso é esporádico, não são fabricados no Brasil. Não compensa ter uma fábrica para isso, pois geralmente há uma fábrica que supre mundialmente esses equipamentos. Enfim, basicamente, temos uma tecnologia bem avançada. Para equipamentos submarinos, eu diria que produzimos 90% do que usamos.
ÁRVORE DE NATAL MOLHADA - CUSTOS Uma Árvore de Natal não é tão cara. Ela é baratíssima. Cerca de um milhão e 300 mil dólares. Em 1977, 1978, era esse o preço que a gente pagava. Se você fizer uma desvalorização do dólar, vai ver que pagavam uma fortuna naquela época. E, hoje, elas são muito mais sofisticadas. As especificações ficaram mais apertadas. Cada vez mais se restringe a possibilidade de falha. Falar em vazamento, hoje, é inconcebível. Então, o rigor no controle de equipamentos é muito grande. Temos, praticamente, vazamento zero. Se você pensar que um equipamento desses pode chegar a ter um peso de 25 toneladas e sete metros de altura, então, um milhão e 300 mil dólares é um preço razoável. E seu tempo de vida é de 20 anos. Pessoalmente, eu não vejo perspectivas de seu preço ficar mais barato. Esse é um preço histórico, que vem se mantendo há anos e estamos sempre adicionando requisitos. Os fabricantes estão, cada vez mais, melhorando sua produtividade, a sua linha de fabricação. Os fornecedores estão se tornando cativos. Isso tem sido crucial para a manutenção do preço. Se o dólar baixar pode ficar mais barato, mas não acredito em uma redução de preço, por causa da própria natureza do equipamento e da necessidade de sua renovação constante. Sempre tem um upgrade. Mesmo que consigam reduzir o preço, quando se coloca um novo equipamento, este mantém o mesmo patamar. E acho que não é tão caro. Levando em conta que está sempre tendo renovação.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / E&P Eu estava no Sermat e a Petrobras teve uma reformulação geral. Pedi para um gerente: “Cansei de fazer isso daqui. Eu quero voltar para a área de E&P.” E pedi uma vaga: “Me dá uma vaga na área de completação da unidade que vai ser criada em Vitória? Quero uma vaga de E&P”. Ele disse: “Tem uma na UN-Vitória”. Respondi: “UN-Vitória eu não quero, porque é lá em Vitória”. Aí, resolveram não criar mais a UN-Vitória e criaram a UN-Rio. “A UN-Rio eu já quero”. E ele disse: “Haverá um lugar para você”. Na hora em que liguei para este gerente para perguntar: “Onde está a minha vaga?”, o diretor tinha acabado de ligar para ele pedindo uma pessoa que tivesse experiência da Companhia para ser assistente. Ele havia respondido para o diretor que não tinha um assistente em vista. Nesta hora, liguei para ele. Daí, ele consultou o diretor, que me convocou. Quando eu cheguei na diretoria, ele perguntou se eu queria ser assistente.
COTIDIANO DE TRABALHO Quando cheguei na diretoria, o trabalho era completamente diferente. Trabalho na diretoria é papel. E a função do assistente é assessorar o diretor, porque ele não consegue ler a quantidade de papéis que chegam para ser aprovados. A minha função era ler aquela papelada e dar um parecer. Fazia um resumo do que chegava para que o diretor tomasse a decisão. Como a diretoria é colegiada, o diretor de E&P toma decisões referentes à área internacional, gás, energia, financeira, serviços, tudo isso. Chegavam matérias de todos esses lugares. Então, esses quatro anos, para mim, foram de um aprendizado gerencial da Companhia como um todo. E me deu uma certa cancha para lidar com presidentes, diretores, pessoas que geralmente procuram a diretoria para propor negócios, esclarecer problemas de relacionamento de Companhia, fazer queixas e até trocar conhecimento com o diretor. Me deu, ainda, o conhecimento de todos os negócios da Companhia. Nas áreas de energia, de gás, eu tinha total desconhecimento, mas tinha que fazer um parecer. Por exemplo, se havia uma venda de gás para uma distribuidora, eu analisava os contratos, fazia as observações. E assessorar o diretor é sempre uma responsabilidade de nível bem alto. E, graças a Deus, trabalhei com duas pessoas ótimas, que tinham maneiras de trabalhar completamente distintas. Isso até foi bom para mim. O modo de pensar de um e de outro. E você tem que trabalhar com muito discernimento. O diretor é uma figura muito carismática na Petrobras. Para você emitir uma opinião contrária a dele, você tem que ter certos cuidados sobre como dizer isso. Essa parte foi muito boa, ter que desenvolver o lado político por meio do trato com o diretor e com os que estão abaixo dele também. Você lida com todos da Companhia que demandam alguma coisa. O diretor passa essas demandas para o assistente. Aprendi muito. Foi muito bom.
BACIA DE CAMPOS E A ECONOMIA BRASILEIRA Eu diria que, em certa época dos anos 90, a Bacia de Campos foi a mola do país. Porque, às vezes, só se via trabalho efetivo, desenvolvimento, dispêndio de investimentos feitos pela Petrobras. Naquele período de estagnação da economia brasileira, a Bacia de Campos sempre esteve crescendo. Ela nunca parou de crescer e a Petrobras também não. A Bacia de Campos, para mim, foi o ponto de desenvolvimento brasileiro. Se alguém falar no desenvolvimento brasileiro, tem que falar da Bacia de Campos como um ponto, se não o principal, um dos principais focos do desenvolvimento brasileiro. É daí que nós, provavelmente, vamos tirar auto-suficiência. Foi daí que desenvolvemos tecnologias em parceira com praticamente todas as universidades brasileiras e com centros de tecnologia, tanto estatais, como de outras companhias. A Petrobras teve a habilidade de trazer para o Brasil vários fabricantes internacionais. A Bacia de Campos, sem dúvida, é um pólo de desenvolvimento brasileiro. Talvez o mais importante das últimas duas décadas.
BACIAS DE SANTOS E ESPÍRITO SANTO Quando saí da Petrobras em setembro de 2004, o diretor se regozijava porque estava saindo da Bacia de Campos. Houve descobertas na Bacia de Santos, na Bacia do Espírito Santo. Há poucos dias, houve outra descoberta na Bacia do Espírito Santo. Isso é muito bom para diversificar e ampliar o desenvolvimento brasileiro para outros estados. Com isso se amplia o desenvolvimento que foi conseguido na Bacia de Campos para outros pólos. Provavelmente, o Espírito Santo, daqui a uns 10 anos, será quase tão grande quanto a Bacia de Campos. A Bacia de Santos crescerá com o desenvolvimento de gás. Isso vai alavancar esses Estados e, em torno deles, uma nova economia se desenvolverá. A Petrobras focou realmente, nos últimos 20 anos, a Bacia de Campos. E é possível que, agora, com as descobertas de novos modelos que a Geologia está desenvolvendo para essa lâmina de água para 2500 metros, provavelmente será a vez de novas bacias.
APOSENTADORIA / TRABALHO NOVO Depois de 29 anos, quase 30 de Empresa, achei que já tinha tempo para me aposentar por tempo de serviço. A iniciativa privada também estava necessitando de mão-de-obra. Com várias companhias vindo para o Brasil e mesmo com companhias brasileiras entrando no campo de E&P, avaliei, junto com minha mulher, e achei que estava na idade adequada para trilhar novos caminhos. Então, fiz a opção de me aposentar, mas continuo trabalhando na área de Exploração e Produção, em uma companhia que é sócia da Petrobras em alguns campos. Estou juntando as especialidades que adquiri ao longo desses anos. Sou gerente de projetos. Na verdade, é um projeto de desenvolvimento de um campo de gás na Bahia, que é o Campo de Manati, que envolve conhecimento de equipamentos submarinos. Será um poço de conhecimentos submarinos, onde será necessária a construção de Árvores de Natal Molhada, de plataformas, gasoduto e estação. Vou usar a minha experiência na diretoria como também de negociador de contratos. Aproveitei as diversas fases da minha vida.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Fui homenageado há um ou dois meses atrás em um seminário sobre conhecimentos submarinos. Me deram uma placa pelos relevantes serviços de engenharia. E uma das minhas funções era contar casos interessantes. A minha resposta vai ser a mesma: “Não posso contar em público. Vou ter que contar no jantar, porque apesar dos casos serem engraçados, sempre envolvem alguma coisa que alguém não quer ouvir”. Tem que ter essa sensibilidade de não ferir suscetibilidades na hora em que você está contando um caso. Porque tem sempre alguém que é o protagonista. E, se eu contar um caso aqui, todo mundo vai saber sobre quem estou falando. Prefiro não contar esses casos, mas depois, se quiserem...
LAZER Faço questão de ter tempo para lazer. Tenho um grupo que joga pôquer todas as quartas-feiras, há mais de 10 anos. É mais do que o pôquer. Queijos e vinhos com pôquer. Ontem foi dia Essa é uma diversão que eu gosto muito. Pelas companhias, pelas piadas e pelo divertimento.
Jogo tênis para tentar manter a forma. Afinal, tenho que fazer alguma coisa. E decidi jogar tênis.
Gosto muito de cinema. Só no controle remoto, na hora em que passo os canais pelo controle remoto, digo o nome do filme, os atores e o diretor. Minha esposa diz: “Como é que você conhece todos os filmes?” E eu digo: “Todos não, mas grande parte eu conheço”. É uma diversão que eu tenho. Desde que me entendo por gente, gosto de cinema. Até meus 14 ou 15 anos de idade, eu anotava todos os filmes que assistia. E houve um ano em que bati o meu recorde, assisti a 303 filmes Ainda hoje, adoro assistir aqueles filmes antigos que passam na TV a cabo. Vejo os mais recentes também. E não tenho nem DVD nem vídeo cassete. Geralmente, assisto a quatro ou cinco filmes por semana.
PROJETOS FUTUROS Quando escolhi ir para essa empresa, na qual trabalho atualmente, tinha outras opções. Eu podia ir para uma empresa do exterior, poderia trabalhar numa companhia de serviços aqui no Brasil e tinha essa companhia. O exterior foi inviabilizado, porque ficava muito caro para eu ir sozinho trabalhar. Minha mulher ia depender de chegar lá e o custo de instalação é muito alto. E eu não quis trabalhar na companhia de serviços, porque achava que era uma coisa muito flat. Ela é uma companhia grande, já está aqui há muito tempo e não sei se minha contribuição faria essa empresa crescer ou, simplesmente, faria com que ela se mantivesse em seu nível. Mas essa companhia em que fui trabalhar é nova, está iniciando o trabalho de E&P e tem uma perspectiva de crescimento muito grande. Achei que isso seria um desafio para mim. Quero que essa companhia cresça e quero crescer com ela. Esse é o meu objetivo de curto prazo, para quatro ou cinco anos: colocar essa empresa como a terceira do Brasil.
PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS Acho que a memória é imprescindível. As pessoas que dão esse depoimento vão falar da Petrobras e posso ter certeza de que vão falar bem da Companhia. É uma maneira de preservar. Até me considero muito novo para estar dando esse depoimento aqui. As pessoas mais velhas, e que já devem ter prestado seu depoimento, viram toda a transformação da Companhia. Da terra para o mar, de águas rasas para águas profundas. Porque eu só vi a parte de mar, das águas rasas às profundas na Bacia de Campos. Isso é importante para os que chegam. A gente tem até o sentimento de que os novos não vestem a camisa, não têm o comprometimento com a Empresa, como os que tinham antigamente. Porque, para maioria do pessoal que vocês vão entrevistar aqui, a Petrobras foi o primeiro e único emprego. E essa juventude que está aí não consegue ver isso. Eles conseguem ver você progredindo em um lugar e outro. E poderão, a partir dessa memória, ver que a Petrobras, pode significar um lugar e outro. Você tem ampla escolha de atividade e de atuação. E se essa história não se preservar, não passará para os outros. Para os que virão, os que estarão aí no futuro, verem como foi que essa Companhia cresceu e se tornou o que é e tenho certeza que será ainda mais. Foi muito bom. Obrigado a vocêsRecolher