Projeto Memória dos trabalhadores da Bacia de Campos
Depoimento de Carlos José Lopes Fontes
Entrevistada por Sérgio Ricardo Retroz
Local: Macaé/RJ
Dia: 05/06/2008
Realização Instituto Museu da Pessoa.net
PETRO_CB365
Transcrito por Ana Lúcia V. Queiroz
P/1 – Pra começar queria que você ...Continuar leitura
Projeto Memória dos trabalhadores da Bacia de Campos
Depoimento de Carlos José Lopes Fontes
Entrevistada por Sérgio Ricardo Retroz
Local: Macaé/RJ
Dia: 05/06/2008
Realização Instituto Museu da Pessoa.net
PETRO_CB365
Transcrito por Ana Lúcia V. Queiroz
P/1 – Pra começar queria que você dissesse seu nome completo, o local e data de nascimento.
R – Carlos José Lopes Fontes. Eu nasci em Campo de Goytacazes, dia 19 de janeiro de 1956.
P/1 – Qual a sua formação?
R – Minha formação é segundo grau técnico.
P/1 – Quando você entrou na Petrobras?
R – Eu entrei em outubro de 1980.
P/1 – Por que resolveu trabalhar na Petrobras?
R – Eu tinha experiência, trabalhava no Bradesco, tinha trabalhado na Shell. Tinha trabalhado no Bradesco em Campos e tava na Shell no Rio. Na Shell eu era contratado. E aí surgiu aqui um concurso na época para digitador. Embora eu até fosse programador eu fiz o concurso, passei. Ficava mais próximo da minha casa. A Petrobras, como todo mundo sabe, é uma empresa boa de trabalhar, já era naquela época. Esta foi a motivação minha: ficar mais próximo de Campos, que era aonde estava a minha família e ter uma situação mais estabilizada. Este foi o motivo principal. E dentro da área que eu conhecia. Teria muito a crescer e poderia com certeza crescer profissionalmente também.
P/1 – O que é ser programador em 1980?
R – Olha, rapaz. Eram poucas pessoas. Na época, o mercado, pra você ter idéia, entre a minha inscrição aqui e a minha admissão foram cerca de 27, 28 dias. Com uma semana recebi telegrama. Porque eram poucos profissionais nessa área de informática.
P/1 – Aqui o que tinha de equipamento pra você trabalhar?
R – Aqui existiam quando eu entrei três micro computadores Polimax. Na época existia reserva de mercado e só podia ter de fabricantes nacionais. Esses computadores, pra você ter idéia, eles tinha 64 K de memória principal. Hoje você fala em Giga, você compra na loja. Naquela época não. Você não encontrava loja nenhuma vendendo computador. Você comprava direto nos fabricantes ou representantes autorizados. Era offline, não era online. A gente pegava os discos, eram discos de oito polegadas, eram discos grandes, flexíveis, com pouca capacidade. Na ordem de um Mega de capacidade. Imagina mil registros de oitenta ___, que é o formato de cartão que eu trabalhei também. A gente digitava os documentos aqui. Era aqui no bloco A. Na verdade o computador era um móvel. Era uma TV Philco, um monitor, uma televisão mesmo, só que usando como monitor, a CPU era um móvel que ficava ao lado, vocÊ colocava os disquetes. Então era um bureau. E tinha impressora. Então, esses documentos eram enviados para o Rio, lá pra Petrobras __, mas ia alguém daqui, um técnico de contabilidade, na época, os principais sistemas eram os de contabilidade. E aí botavam esse __ no braço, levavam e processavam no computador lá na sede. Depois ele vinha com os relatórios debaixo do braço. Aí depois que foi evoluindo. Hoje gira em torno de mil empregados aqui.
P/1 – Agilizava o processo?
R – Sim, porque os documentos contábeis ficavam aqui. Então os técnicos de contabilidade tinham que apropriar os custos e faziam os pagamentos, né, fornecedores, etc. então esses documentos uma vez que saiam da contabilidade iam pro setor de informática digitar, preparar essas informações para irem pra sede em forma digital, meio magnético.
P/1 – Você lembra quando foram substituídas essas máquinas?
R – Naquela época eu tava entrando, era uma máquina nova pra mim, eu trabalhava com outros equipamentos. Então, pra você editar um arquivo daquele você não editava. Você simplesmente redigitava sei lá, quatro ou cinco horas de trabalho de novo. Aí eu que comecei esse processo, porque eu já era programador. Falei pra eles: “olha, é possível”, “Ah, mas não pode!”. Aí um dia eu fiz: “Tá vendo aqui Ferreira? Tá vendo aqui? Eu vou mudar pra Pereira”, “mas não vai ter problema isso quando a gente levar esses discos pro Rio?”. “Não, rapaz”. E aí eu comecei a fazer os primeiros programas aqui, locais. Antes todo esse trabalho era feito só lá na sede. Pela informática lá da Petrobras, no décimo quinto andar. Passado um tempo a gente passou a implementar, fazer relatórios de consistência e aí
quando chegava lá no Rio já estava tudo prontinho. Já estava tudo consistido, conferido. Essas informações passaram a ser depois transmitidas, e aí já passou a ser pelo menos offline. Não era online, mas você já transmitia os dados. Não processava; você só transmitia os dados. Aí depois é que começou, por volta de 82, mais ou menos, a chegar aqui modem de transmissão, no caso, controladoras. Aí já começou a ter mais pessoas trabalhando. Depois a gente começou a ver que existiam interesses dos engenheiros, de outras pessoas de outras atividades no uso dessas três máquinas. Então a gente fazia uma agenda de uso e o gerente geral falou pra mim: “na verdade a gente deixa essa turma usando, um dia vai sair alguma coisa boa por parte deles”. Aí tem várias histórias. E algumas pessoas, uma delas foi o Paulo Roberto, que hoje é gerente na TI, ele era um engenheiro recém saído de faculdade, mas já tava aqui e começou os primeiros, sem ser de dentro da TI, e aí mais a frente, quando cresceu um desses foi convidado pra ser gerente. O primeiro gerente, vamos dizer assim, de TI. Eu seria o primeiro supervisor. Eu queria que crescesse pra poder surgir oportunidades. Aí depois fui promovido a programador. Depois criaram outro prédio aqui, fizeram o primeiro prédio voltado pra TI. Aí chegou o momento daqueles minicomputadores, do Cobra, Cobra 500, nacional, usando o sistema operacional SODIS e MUMPS. Tudo é coisa antiga.
P/1 – O que é isso?
R – MUMPS é um sistema operacional. Sistema operacional? Quando você liga o computador você precisa ter programas, porque ali você tem o hardware. Então você tem alguns programas pra perguntar: que dia é hoje? Que seria pra vocês fazerem o login que vocês fazem hoje. Ali já tem programas que estão ali dentro. E esses programas são programas básicos. Sem eles você não conseguiria fazer nada na máquina. A menos que você os construísse. Mas hoje você não faz mais isso. Tem outros padrões. Aí você depois que vai construir os seus programas, as suas aplicações. Aí o sistema operacional vai carregar a sua aplicação dentro da máquina. Quando você disser que quer imprimir ele vai fazer com que a impressora imprima aquilo que você quer. Se eu quero salvar de um disco pra outro disco, coisas desse tipo. Então, o sistema operacional fica controlando as tarefas que estão na máquina e permitindo a interação com a pessoa.
P/1 – Quando tinha aqueles equipamentos grandes o pessoal que trabalhava em outros setores comentava alguma coisa desses aparelhos?
R – Na época, mesmo esses lugares onde tinha processamentos maiores, também não era coisa muito maior do que a gente tinha. Porque os recursos eram bem limitados. A capacidade de processamento. Teve um colega que tinha um vizinho que era operador de computador num CPD, e aí um dia ele foi lá ver o cara trabalhando e foi uma decepção. Porque imaginavam que o cara fazia uma porção de operações complicadas, que queriam dele um conhecimento muito grande. Mas na verdade o que ele fazia era conectar uma placa. E aquilo era o programa de folha de pagamento. Ele só fazia isso. E o resto, só em conectar e bater o enterzinho lá já começou. Então foi meio... Mas construir esse programa nessa placa, realmente naquela época era. Era linguagem de máquina, era ___. Você tava bem próximo da linguagem da máquina. Mas eu to falando de informática pra você. Não estou nem contando a história daqui. Sai um pouquinho. Aí depois vieram esses computadores, na época o conceito de pequeno, médio, grande porte hoje não dá pra fazer isso porque essas grandes máquinas hoje são maquininhas com menos capacidade de processamento que um servidor que você compra na loja. Aí começou a crescer. Aí que vieram os primeiros analistas de sistema, que foram admitidos lá pelo Rio de Janeiro. Aí começou a existir uma informática com uma estrutura maior aqui em Macaé. Isso por volta de 84, 85.
P/1 – O que mudou no cotidiano de trabalho em relação à este desenvolvimento?
R – Naquele início que eu falei antes era muito assim: a gente digitava as coisas, transmitia e depois transmitia os relatórios. Aí você tinha relatórios sobre produção de óleo e gás, tinha o contracheque, que era importantíssimo, não podia deixar de imprimir senão ninguém recebia. Aí começaram a surgir as primeiras aplicações locais. Tipo: Reajuste de contrato; então teve um daqueles engenheiros, por exemplo. Eu até fiquei um dia para ajudá-lo. Ele construiu um sisteminha, um programinha, até em basic, que fazia os cálculos pra ele reajustar o contrato. Existia outra aplicação que alavancou; que animou mais ainda. Depois essa pessoa que construiu até se tornou até gerente no ___. Existiam umas perfurações que a tomada de decisão: continua perfurando, não continua, faz não faz, necessitava de uma análise, construir uns gráficos. Pra tomar uma decisão. Com o uso do computador também, outra aplicaçãozinha simples, feita aqui em Macaé, o custo benefício, como sonda é coisa muito cara, se fala em mil dólares a hora, não sei qual o preço hoje, mas ela pagava o custo de TI, quase em todo __. Aí viram que realmente era um diferencial. Na época a companhia tava investindo. Aí a gente começou a ter localmente um CPD e aí começaram as primeiras aplicações. As primeiras foram mais voltadas para a área comercial, vamos dizer assim, controle de estoque, financeiro. Você tinha poucas informações de especialistas, pra área de reservatório, de exploração, até de produção. Produção era só controle de volume produzido, mas não.
P/1 – No relacionamento de trabalho. Você lembra de alguma coisa que te marcou com os amigos, com a equipe?
R – Relacionamento? Naquela época eram poucas pessoas aqui, então esses eventos, esses encontros, a gente se conhecia, sabia nomes, conhecia familiares. Característica de um lugar que tem poucas pessoas trabalhando. Mas era um clima muito bom. Tem muitas histórias, algumas coisas até cômicas.
P/1 – Conte, por favor, uma das cômicas.
R – Por exemplo: o operador ficava na console e aí, já era nessa época dessas máquinas mais novas, a gente já tinha os terminais nas gerencias. Que as pessoas usavam pra consultar, por exemplo, estoque de material. Treinando um operador fui lá num terminal, de lá liguei pra ele e perguntei pra ele: “você dá uma olhada, vê se tem algum bit caído no chão, tudo. O pessoal sabia que eu ia fazer a pergunta, aí ele olhou debaixo da cadeira, procurou e falou que não tinha nada caído lá. Mas é bit de computador, cair no chão. Então tinha coisas desse tipo. Aqui a noite um vigilante uma vez veio apavorado; disseram que alguém invadiu a Petrobras e eu tava me deslocando pra outro setor, atravessando a rua, o camarada veio apavorado, segurando na arma em minha direção. Eu percebi que alguma coisa estava errada e falei: “O que houve? Não. Eu estou trabalhando. Eu sou aqui do CPD. A gente trabalha a noite”. E tudo o mais. Aí ele acalmou, já tava quase puxando a arma pra me render. Tem muitas coisas! Por exemplo, uma que é interessante, nós compramos um no brake, vocês sabem o que é um no brake, né, em caso de queda ele vai segurar. Só que ele não atuava quando faltava luz. Nós tínhamos um gerente aqui que sempre que vinha uma comitiva ele gostava de mostrar o CPD, o CPD era curiosidade, sempre foi. Aqueles ledzinhos piscando, aquelas máquinas. Nós tínhamos um sistema de material que, se faltasse luz, esse era um sistema pesado, o no brake, que a gente já sabia que não tava atuando – embora estivesse tudo ligado a gente sabia que não segurava nada – o fornecedor estava em negociação com a Petrobras, ia fazer a manutenção. Começou a armar uma tempestade e a gente sabia que, com aquela tempestade, com certeza, ia faltar luz. E se faltasse luz o sistema ia cair e a gente ia ter que passar um utilitário chamado manut, que a gente chamava até de mamute, porque demorava muito tempo. Então, na verdade, o sistema só seria restabelecido lá pelas quatro, quatro e pouco da tarde. Aí eu tomei a seguinte decisão. Falei para os operadores, que eu era o supervisor da operação: “Vamos dar um shut down, vamos parar a máquina e diga pra quem tiver usando, passa mensagem pelo computador, pede pra encerrar a sessão. A gente desliga a máquina, porque se faltar luz a gente espera um pouquinho, depois que passar essa tempestade a gente não tem mais risco de faltar luz. Aí a gente restabelece o sistema e disponibiliza”. Isso era no horário do almoço. “Vamos fazer assim”. Tomei essa decisão. Beleza! Todo mundo desligou, chega esse gerente, e ele com a comitiva lá e os computadores todos desligados. Ele ficou meio zangado e assim que o meu gerente chegou ele falou e os dois entraram na sala. Falou: “__, o computador ta desligado, você mandou desligar?”. Eu falei pra ele: “rapaz, é que, ta vendo o tempo como é que ta, pode faltar luz”. Relatei pra ele que ia demorar. Aí o gerente falou: “mas você acha que vai faltar luz e para a máquina?”. Me deixou numa situação difícil. Aí deu um estrondo, um relâmpago, e faltou luz. Um olhou pro outro e falou assim: “muito boa a sua decisão”. Depois, meu amigo, quando faltasse luz eu não ia adivinhar mais nada. Vai desligar quando a luz faltar porque não vou ficar assumindo. Mas essa vez, por exemplo, São Pedro acho que me salvou.
P/1 – Que você achou dessa iniciativa de colher depoimentos de trabalhadores pra compor a história da Bacia?
R – A Petrobras no geral, nós somos muito nacionalistas. A gente sabe da importância que a Petrobras tem, a gente vê isso como cidadania. A gente vê como fomentar o desenvolvimento, a ação. Então nós antigos, principalmente, e aí até hoje eu falo pros que estão chegando, dessa responsabilidade. Hoje com certeza o país seria muito diferente se a Petrobras não tivesse crescido como cresceu; conseguisse a auto-suficiência, e também refino. Então agora são outros desafios. É um crescimento que vocês estão acompanhando aí. Então a gente tem um orgulho disso aqui. E a Bacia de Campos alavancou com isso. Ela foi aquele lugar que onde você furava vinha óleo, furava vinha óleo. Então a gente aqui ficou o tempo inteiro suportando essas pessoas à produzirem, descobrirem. Sem o uso da tecnologia da informação, com certeza, a Petrobras investiu nisso, hoje a gente tem aí sala 3D. Tem recursos hoje aí. Então pra gente isso aqui é um orgulho. E é uma coisa muito importante essa questão de você não só documentar, eu por exemplo tenho orgulho de dizer que trabalhei aqui. Porque foi aqui que eu construí meu patrimônio. Foi aqui que basicamente eu criei meus filhos A Petrobras é um mar de talentos. Como diz um colega. Então, isso de vocês estarem documentando os depoimentos nossos, eleva o moral das pessoas. As pessoas têm a oportunidade de formalmente mostrar o trabalho que eles fizeram, tem a oportunidade de externar coisas que eles fizeram. O empenho. Eu, por exemplo, vou aposentar. Mas já tenho um filho trabalhando, não aqui na Petrobras, mas numa prestadora de serviços. Então já é a geração nossa atuando aqui. No passado só tinham os mineiros. Hoje, não. Já tem uma tradição, uma cultura aqui na Bacia de Campos. Então, eu acho muito importante até para o moral nosso. E para que os novos entendam a responsabilidade que eles têm. Não só de manter, mas de descobrir até mais.
P/1 – Obrigado.Recolher