IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Natálio Stica. Nasci na Cidade da Lapa, no Paraná, no Natal, dia 25 de dezembro de 1952. FAMÍLIA Mau avô paterno veio da Itália com 11 anos, José Stica. Meu pai se chamava José Stica e minha mãe Joaquina Diniz Stica. Eles eram filhos de agricul...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Natálio Stica. Nasci na Cidade da Lapa, no Paraná, no Natal, dia 25 de dezembro de 1952.
FAMÍLIA Mau avô paterno veio da Itália com 11 anos, José Stica. Meu pai se chamava José Stica e minha mãe Joaquina Diniz Stica. Eles eram filhos de agricultores. Meu pai sempre trabalhou em uma olaria. Quando criança e até os 17 anos, também cheguei a trabalhar nessa olaria que ficava na cidade da Lapa. Minha mãe sempre ajudou em casa, no quintal, no trabalho doméstico. Criou oito filhos. Sua vida sempre foi de muito trabalho.
INFÂNCIA Minha infância foi, do ponto de vista da molecagem de criança, muito boa, porque eu morava do lado de uma olaria. Era o lugar onde fazíamos as bagunças de criança. Mas tive uma infância muito sofrida. Minha família era pobre. Eu e meus irmãos tivemos que trabalhar desde muito cedo. Era muito difícil e morávamos a uma distância de quatro a cinco quilômetros da escola. Íamos a pé estudar. Só mais tarde começamos a ir de bicicleta. Aos 17 anos de idade, saí da cidade em que morava e fui aventurar a vida em Curitiba, na capital do Paraná. Trabalhei como frentista de posto de gasolina. O combustível já me provocava desde de novo
SEMINÁRIO
Comecei a trabalhar na olaria aos 10 anos de idade. Fiz uma promessa de que, se minha mãe sarasse, seria padre. Fui para o seminário, onde fiquei um ano e meio. Não deu certo. Minha vocação não era de ser padre e voltei. Meu pai falou: “Já que você não quer estudar, vai trabalhar.” Trabalhei nesta olaria, até os 17 anos de idade. Depois, saí e fui para Curitiba tentar outra vida.
BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA Éramos oito irmãos. Meu irmão caçula faleceu em um acidente de carro. Tenho seis irmãos vivos. Não quero que meus filhos façam o que fiz Éramos terríveis Uma olaria é um lugar muito perigoso para brincadeira. Tem um elevador que trabalha com contra-peso. Quase matei minha irmã quando tinha seis anos de idade neste elevador, porque não conhecia o perigo dele. Pegávamos os cavalos que trabalhavam na fazenda ao lado da olaria e íamos andar a cavalo, molequinho, no pêlo. Descíamos com carrinhos em ladeiras Uma brincadeira mais perigosa do que a outra Nunca contei isso em casa
FAMÍLIA Nossa relação familiar era boa. Minha família era italiana e muito unida. Meu pai nos obrigava a ir à missa aos domingos, todos juntos. Trabalhávamos e íamos para a aula. No horário de jantar, todo mundo tinha que estar à mesa. Meu pai era muito duro, enérgico. Era o gerente da olaria onde eu era o empregado. Quando alguém reclamava que não agüentava fazer um serviço porque era muito pesado e dizia ao meu pai: “Ah, mas o teu filho não está fazendo esse serviço.” Meu pai me chamava e me mandava fazer. Mandava a pessoa ficar olhando e depois mandava embora, dizendo: “Você não serve.” Eu tinha que fazer para não deixá-lo passar vergonha. Ele era muito duro, mas isso acabou valorizado no resto das nossas vidas. Temos que acabar dando valor para esses valores que as pessoas, principalmente os mais antigos, tinham. Tenho três irmãos homens e três irmãs mulheres que continuam vivos. Mas éramos cinco homens e três mulheres. Todas elas trabalhavam. Minhas irmãs mais velhas lavavam roupa para fora, para ajudar na nossa sobrevivência.
EDUCAÇÃO / TRABALHO Meu grupo escolar era na cidade da Lapa. Morávamos na olaria, que era retirada da cidade. Esse trajeto era feito a pé ou mais tarde de bicicleta. Na escola fazíamos um círculo maior de amizades, porque tinham as crianças da cidade. Onde eu morava não tinha luz. Naquela época apareceu a televisão. Saíamos aos domingos, com a família toda, a pé, andando cinco quilômetros para chegarmos na casa de um amigo da cidade para assistir televisão. À noite, na nossa casa, tínhamos um rádio à bateria. Apagávamos o lampião para a sala ficar escura e, vendo a luz do rádio, imaginávamos as pessoas dentro do rádio
Fiz o ginásio na Lapa, depois fui para Curitiba onde fiz um curso supletivo. Comecei fazendo Eletrônica na Escola Técnica. Depois, na Siemens, trabalhei como Técnico em Eletrônica, o que me deu a sustentação para, mais tarde, entrar na Petrobras como Instrumentista. Mas teve um longo caminho antes disso.
Na olaria, passava metade do expediente trabalhando. Na outra metade, ia para a escola. Meu pai não queria que estudasse à noite, porque era muito perigoso. Em Curitiba, tive algumas dificuldades. Fui para Curitiba em janeiro de 1970. Cheguei a morar numa pensão, trabalhei de frentista de posto de gasolina. Trabalhava e estudava. Entrei no quartel, na base aérea. Fiquei dois anos na Aeronáutica, depois fui para São Mateus do Sul, na unidade da Petrobras, o Xisto. Queria trabalhar na Petrobras, tinha um sonho em trabalhar na Petrobras desde muito novo. Meu irmão mais velho trabalhou na Petrobras, aposentou-se na Petrobras. Em São Mateus do Sul, fui motorista de uma empreiteira, onde fiquei praticamente por um ano. Saiu um concurso de Operador na Repar, uma refinaria da Petrobras, em Araucária. Fiz o concurso, passei, fiz o curso. Quando já estava terminando o curso recebi um aviso de que estava eliminado, porque havia sido preso no quartel. Peguei várias cadeias, porque era muito rebelde, brigava, discutia, não aceitava as ordens que considerava absurdas.
SEMINÁRIO Fiz minha primeira greve aos 13 anos de idade Um pouco antes de sair do seminário. Um dos motivos porque voltei para casa. Talvez por isso tenha me tornado sindicalista. Fui para o seminário e fiquei lá durante um ano e meio. Fiz uma greve, porque, aos sábados, às 15 horas da tarde, os meninos que moravam nas proximidades iam para casa e, quem morava longe, como eu e outros seminaristas, tinha que ficar até as 18 horas, trabalhando ou estudando. Vi que isso não era justo e conversei com os garotos que ficavam. Propus a greve, onde pedimos estudo livre e que cada um fizesse o que quisesse. Meu pai escutava um programa chamado Repórter Esso. Escutava esse noticiário com meu pai no nosso rádio. Nesse programa, falavam das greves que ocorriam no país. Greve dos têxteis, dos metalúrgicos. Até 1964 tinha muita greve no nosso país, muita luta. Aprendi que, para reivindicar alguma coisa, tinha que fazer greve. No seminário, quando chegou o sábado e tocou o sinal para o pessoal ir embora, mostrei uma cartolina branca com uma cruz vermelha que havia feito. Escrevi: “Estamos em greve e queremos estudo livre” Colei numa daquelas réguas grandes de desenho que usávamos antigamente e botei na minha carteira, que era daquelas que abriam. Deixei o cartaz pendurado e guardei todo o material. Todo mundo que ficou guardou também. Chegou o Padre Luciano, que ainda é vivo, um alemão. Rasgou aquela cartolina. Me ergueu e perguntou se eu sabia em que regime estávamos Isso foi em 1965, logo depois do Golpe Militar de 1964 E eu disse: “Não sei em que regime estamos, mas sei que não é justo o que vocês estão fazendo. Estou vendo que aqui se prega igualdade, mas que não tem igualdade.” Foi a única greve da minha vida que deu certo, porque conseguimos o estudo livre. Mas isso custou caro para mim, porque, depois, me convenceram que não tinha vocação, que era melhor voltar para casa e acabei voltando. Tenho muitos amigos padres. Respeito, mas não tinha vocação. Sou muito crente. Creio em Deus, mas, para padre, não tinha esse potencial todo.
QUARTEL Minhas cadeias no quartel eram por coisas que achava injustas. Se viesse alguma ordem absurda, não atendia. Daí me davam detenção. Numa delas tive que fugir para fazer uma prova. Era a última. Se não fizesse, não passaria. Disseram-me: “Não, você não vai” Eu falei: “Vou” Fugi e fui. No outro dia, me perguntaram: “Foi?” Eu falei: “Fui” “Passou?” Falei: “Passei” “Então agora passará oito dias de cadeia.” Falei: “Passo, mas passo como homem e não como rato.” Aí fiquei mais oito dias. Por isso a Petrobras não me quis quando fiz meu primeiro concurso. Fui taxado como um líder negativo no serviço de investigação da Petrobras. Fiquei desesperado. Todo um sonho ruído... Comecei a trabalhar na Siemens, no ano de 1975 Tinha 22 ou 23 anos. Fiquei até 1976, quando abriu outro concurso para a Petrobras, para instrumentista.
JUVENTUDE E MILITÂNCIA Tinha muitos amigos e, mesmo sendo de uma família muito pobre, tinha amigos de diferentes classes sociais. Numa cidade do interior, como a Lapa, não havia alta sociedade, mas os filhos de famílias mais ou menos ricas. Tinha muitos amigos mais ricos quando estudava no grupo. Depois da aula, passava na casa deles para poder andar naquele jipinho de pedalinho. Nunca tive oportunidade de ter um jipe daqueles. Sempre fui uma pessoa que conseguiu ter boa comunicação. Sempre tive muitos amigos. Em 1968, começamos um debate no ginásio da Lapa, onde fiz parte de um grêmio estudantil. Estava na efervescência do regime militar, não podia falar nada. O grêmio estudantil tornara-se apenas um grêmio para fazer torneio de futebol, essas coisas. E comecei a querer discutir outras coisas. Fui entender o regime no qual vivíamos quando entrei no quartel, na base aérea, em 1971, onde eu fiquei até 1972. Destes dois anos, em um fui atleta. Tinha uma vida tranqüila, só corria e fazia exercícios físicos. O outro ano, passei na cadeia, porque comecei a discutir. Mas, ali, comecei a aprender um pouco mais. Brinco dizendo que quem me jogou para a esquerda foi a Aeronáutica, porque todas as quintas-feiras tínhamos uma aula que era uma verdadeira lavagem cerebral. Na época, estavam cassando o Carlos Lamarca e eles mostravam a foto do Capitão Lamarca e dos soldados e sargentos que o acompanhavam e diziam: “Olha, este é um ex-militar que está atacando os quartéis para roubar equipamento, munição e arma. Ele atira e depois pergunta quem é.” Pintavam uma imagem do Lamarca e aquilo começou a me intrigar. Era um soldado e pensei: “Por que um Capitão sairia do quartel para roubar um caminhão de armamento e se embrenhar no meio da mata para sofrer? Tem que ter um motivo para isso” A partir daí, comecei a buscar, com muita cautela. A Aeronáutica acabou me jogando para a esquerda, aprendi o que foi a luta do pessoal de esquerda no Brasil, que eram chamados até de terroristas. Um absurdo Comecei a fazer algumas amizades e isso me deu uma primeira base para começar a militância. Meu primeiro confidente, amigo, que me ensinou política, o Gilberto Carvalho, era nosso amigo no Paraná. Tem uma história de vida fantástica, hoje é Assessor do Lula. O Gilberto Carvalho começou a trabalhar em indústrias metalúrgicas e fundou a primeira oposição sindical dos metalúrgicos no Paraná, chamada “Chapa Zé Bigorna”, em 1979. Neste momento, eu já estava na Petrobras. Ele começou a me dar orientações e, na Refinaria de Araucária, fui a primeira pessoa que discutiu a mudança do sindicalismo no Brasil.
MUDANÇA PARA CURITIBA Não queria mais continuar na cidade da Lapa, porque o trabalho na olaria era extremamente pesado e sem nenhuma condição de melhorar de vida. Fazer telha, fazer tijolo, trabalhar amassando barro, além de pesado, não dá nenhum futuro. Falei para uma irmã que morava em Curitiba que precisava ficar alguns dias em sua casa até que arrumasse um emprego. Ela me deu guarida. Fui logo na primeira semana de janeiro de 1970, fiquei na casa dela uns dois, três meses até que consegui morar numa pensão. Trabalhava nos postos de gasolina e, dali para frente, toquei minha vida.
INGRESSO NA PETROBRAS Em 1976, fiz novo concurso para Petrobras. Passei e, na hora de fazer o curso, fiquei com medo de me cortarem novamente e perder o emprego, pois tinha que sair da Siemens. Fui até São Mateus do Sul, onde tem a Usina do Xisto e falei com os diretores da Petrobras, com o Oswaldo e tantos outros que conheciam meu trabalho. Disse: “Quero saber se posso fazer ou não, porque estou com medo.” Eles me indicaram ao senhor Palmeira, responsável pelo serviço de investigação da Petrobras no Paraná. Fui falar com ele, que me disse: “Você tem alguém na base aérea para quem eu possa perguntar sobre você, porque se eu mandar a sua ficha de cadeia, você não vai entrar de novo.” Dei o nome dos oficiais que me conheciam e todos, sem exceção, falaram: “Cadeia é coisa de criança, de bobagem.” Ele anotou tudo isso e falou: “Estou mandando essa ficha para o Rio, pode fazer o curso. Se você passar, está garantido. Com essa ficha você entra.” Fiz o curso com um medo danado. Sou muito católico e todo dia passava na Igreja Nossa Senhora do Rocio, ao lado do curso. Conversava com Cristo, “botava ele na parede”, dizendo: “Você tem que me ajudar, tem que fazer os homens entenderem que tenho que entrar na Petrobras. Quero entrar na Petrobras.” Todo dia, mesmo atrasado, eu dava um “oi” lá. E fui o primeiro colocado do curso de instrumentação. Foi isso o que me salvou, que garantiu minha entrada na Petrobras. Uma semana antes de terminar o curso, o Vitor, coordenador do curso, me chamou e disse: “Você teve cadeias no quartel?”. Falei que sim e pensei: “Tudo de novo.” Ele falou: “Mandaram te cortar. Porque você não me contou?” Eu disse: “Não te conhecia quando entrei aqui. Como ia contar?” Ele falou: “Mandaram te cortar, mas não se preocupe. Você foi o nosso melhor aluno, o melhor aproveitamento. Fizemos uma mesa redonda e mandamos dizer que não aceitávamos o corte. Seria uma injustiça e seria ruim para a Petrobras. Achávamos que você tinha que continuar e eles acabaram aceitando. Parabéns Você foi o primeiro colocado. Agora já é petroleiro.” Vibrei
IMAGEM DA PETROBRAS O meu irmão trabalhou na Petrobras. Para mim, que vim de um serviço pesado, ruim e sem organização, quando vi como funcionava a Petrobras, achei fantástico. Além do que, ouvira falar da luta pelo monopólio do petróleo. Tanto é que, depois que entrei na Petrobras, fui um ferrenho defensor da Empresa e do monopólio estatal do petróleo. Eu pude, durante uma época, viajar fazendo palestras em defesa do monopólio estatal do petróleo. No Paraná, levei o saudoso Eusébio Rocha, autor do substitutivo da lei 2004, para fazer palestras em todo o Estado, para defender o monopólio, pois havia interesse em quebrá-lo. Mais tarde, quando fui Vereador de Curitiba, demos um título de Cidadão Honorário para o Eusébio Rocha, pouco antes de sua morte. Tinha o desejo de trabalhar na Petrobras. Visto a camisa dessa Empresa, tenho orgulho de ser petroleiro.
TRAJETÓRIA NA PETROBRAS / INSTRUMENTAÇÃO Fui para a Instrumentação, um setor técnico, onde era instrumentista. No Rio Grande do Sul, tem uma brincadeira que diz que quando abriram as dez vagas para instrumentista montador, apareceram 20 gaúchos a cavalo, com a gaita nas costas, pensando que eram instrumentistas que tocavam. Mas não era. Instrumentista é o cara que faz a manutenção nos equipamentos, que mede pressão, temperatura, vazão, nível, tudo o que acontece em uma unidade. Numa refinaria, por exemplo, é o instrumentista quem faz a calibragem dos equipamentos.
SINDICATO Quando entrei na Petrobras, comecei a conhecer um pouco do Sindicato dos Petroleiros, porque vinham os diretores e entregavam, escondidos, um jornal do Sindipetro do Rio Grande do Sul. A gente estava numa época ainda sob muito olho em cima. Acabei me tornando um líder desde muito novo na Petrobras. Quando entrei em 1976, 1977, perguntava para os diretores porque eles vinham escondidos e eles diziam assim: “O carro está ali na frente. Atrás do banco tinha um jornalzinho, pegue escondido e traga”. No início ia lá, pegava escondido, botava embaixo da camisa e trazia. Depois pensei: “Não estou fazendo nada errado, por que eu tenho que entregar escondido?” E comecei questionar porque eles não faziam o jornal aqui, entre outras coisas mais. Comecei a ver que eles tinham muito medo. Comecei a participar das assembléias do Sindicato quando tinha campanha salarial e comecei a falar, a dar minha opinião e a discordar. Meu setor, a Instrumentação, pelo menos na Refinaria em Araucária, é o setor onde as pessoas mais participam da vida sindical. Eu levava todo mundo. Comecei a montar a primeira chapa de oposição no Paraná. Achei que a diretoria da época não funcionava e a gente tinha medo também. Fazíamos nossas reuniões escondidos. Tinha um setor, que hoje não funciona mais na Petrobras, porque é proibido usar o chumbo tetraelita, que misturava o chumbo com a gasolina para poder aumentar a octanagem da gasolina. Neste setor, o operador trabalhava completamente de branco, porque o chumbo tinha um componente que, se pingasse, fazia uma mancha cor de rosa e tinha que lavar rápido para não deixar pegar na pele, pois o chumbo penetra no organismo, vai para o sangue e nunca mais sai. Se acumular, mata ou deixa seqüelas. Por isto, era um setor em que todo mundo tinha medo de entrar, principalmente os chefes. Pensei que seria, portanto, um bom lugar para fazer as nossas reuniões. E, às vezes, durante o expediente, principalmente quando pegava serviço de manutenção para fazer, chamava mais um caldeireiro, um mecânico, que eram as pessoas de contato e nos reuníamos na hora do almoço ou na hora do serviço, para formar a nossa chapa. Lá, eu tinha certeza de que os chefes não iam. Uma chapa, para concorrer ao Sindicato, tem que ter um número mínimo de pessoas. Não chegamos a esse número da primeira vez, mas tinham umas 12 pessoas, estávamos organizados e ampliando cada vez mais. Só que, ao ampliar, começam a vir os conselhos. “Deixa disso. É perigoso.” Muita gente estava com medo e na época da eleição, quando fui convidado pelos dirigentes para fazer parte da diretoria, falei que não queria. Não podia dizer que estava formando uma chapa. Meus maiores companheiros aceitaram ir para a chapa do pessoal que estava no Sindicato. Entendo isso, porque não estávamos conseguindo formar uma chapa. Quando fui “bater o martelo” para registrar a chapa, todo mundo falou que já estava na outra chapa. Acabei ficando sozinho. Fui aconselhado por um técnico, um senhor muito coerente, muito participativo, para ir para a chapa do Sindicato, porque estava todo mundo de olho em mim e acabaria sendo mandado embora. Ele falou com os diretores e vieram provocar-me para eu fazer parte. Acabei entrando no Sindicato em 1981, como diretor de base. Fiquei três anos como diretor de base, mas não me acomodei, entrei na direção e continuei trabalhando. Tentamos trabalhar junto com o pessoal que perdeu a eleição, tentamos democratizar, mas não deu. Era uma outra mentalidade. Como diretor, comecei a formar uma chapa que foi um sucesso. Em 1984, ganhamos com uma chapa completamente pura, já filiada a CUT [Central Única dos Trabalhadores]. Ajudei na fundação da CUT no Paraná. Nosso Sindicato foi um dos primeiros de petroleiros a entrar na CUT, junto com o de São José dos Campos e com o de Campinas. Havia o Sindicato da Bahia, que depois da greve de 1983, acabou saindo. Essa greve foi um carro chefe para ganharmos a eleição no Sindicato do Paraná, para mudar a vida lá. Chamávamos de “pelegos” os diretores que tinham medo, que não queriam exercer seu papel. Tinham medo de entregar o jornal, de discutir, negociavam com a Empresa e não contavam a verdade na base. Uma vez, estava de férias e escutei, em um jornal do meio-dia, nosso presidente dizendo “Fechamos o acordo a bom termo.” Íamos fazer uma assembléia à noite para dizer se aceitávamos ou não a proposta. Quer dizer, havia toda uma falsidade e não podia concordar com isso. O sindicato dos petroleiros me deu uma condição de grande aprendizado na vida. Uma coisa é ser sindicalista e defender a sua categoria. Outra coisa é ser sindicalista de uma empresa estatal, de uma Petrobras. Ser da Petrobras é ainda mais difícil, porque que é uma empresa pública. Não é a mesma coisa que ser sindicalista da metalúrgica e discutir com o seu patrão, dizendo “eu quero isso” e acabou-se. Nós tínhamos que fazer a defesa dos trabalhadores e de uma empresa estatal, pública, do povo brasileiro, num momento que tínhamos o monopólio estatal do petróleo. Todos os que vinham pregar a quebra do monopólio se aproveitavam da situação. Então tinha que se ter um cuidado danado para fazer as coisas. Isso foi um aprendizado que hoje me dá uma condição de negociador e que ajudou muito na minha vida profissional. A relação que tenho com a direção da Petrobras é por conta do respeito que tinha e que eu dava, porque respeito não pode ser de um lado só, foi um dos ensinamentos que eu aprendi. Mesmo fazendo as várias greves que fiz, também fazia as defesas do monopólio estatal da Petrobras, da Empresa. Enfim, foi um grande aprendizado.
IMAGEM DA PETROBRAS Quando entrei na Petrobras, pode parecer egoísmo, pensei em mim. Pensei em uma empresa sólida onde ia trabalhar sem correr o risco de ser mandado embora por questões de oscilação do mercado, uma empresa em que, se fizesse meu serviço ficaria até me aposentar, como de fato aconteceu. Essa era minha primeira expectativa, mas, depois, comecei a aprender que não, que tinha um papel maior a fazer. A Petrobras é muito atacada e comecei a fazer a defesa da Empresa, a pensar no coletivo. Entrei como Instrumentista e saí como Instrumentista, não tive nenhuma promoção. Assumi o sindicato logo, sabendo que, no Sindicato, tinha minha carreira, de certa maneira, ceifada. Mas meu objetivo, já não era mais o meu objetivo e sim o de um conjunto, de uma categoria, defendendo sempre o que era melhor para a categoria, procurando fazer com que a Empresa fosse respeitada. Essa Empresa é o nosso orgulho.
SINDICATO Desde que eu entrei na Petrobras, com o espírito de liderança que já tinha, os diretores me procuravam para pedir para que entregasse aquele jornalzinho escondido. Comecei a levar o pessoal para o Sindicato. Foi uma coisa natural. O diretor de base trabalha na unidade fazendo seu trabalho normal e representa o Sindicato. Se tem, por exemplo, uma situação que coloca em risco os trabalhadores, como diretor do sindicato, tenho obrigação de ser o primeiro a dizer: “Isso não pode acontecer, temos que rever isso e já ligar para o sindicato, pedir para o diretor vir para negociar.” Tem uma situação em que a hora extra, numa parada de manutenção, termina às oito horas e demora mais meia para o pessoal sair. O diretor de base está lá e está vendo isso. Ele tem que levar para o Sindicato ou discutir com a diretoria para ver o que pode melhorar. Diretores liberados são aqueles que estão no comando do Sindicato, fora da unidade, na sede do Sindicato.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Lembro-me do caso de uma parada de manutenção. Parada de manutenção é quando você trabalha em turnos de 12 horas cada turma, o cronograma não pode atrasar. E minha equipe trabalhava até as 20 horas. Outra equipe entrava às 20 horas e ia até o outro dia. Estávamos fazendo um trabalho em cima de uma torre, uma troca de LI, que é um equipamento que mede nível. No painel tem um instrumento eletrônico que dá indicação e um que registra. Eu não lembro agora qual dos dois que estávamos para instalar, mas um estava funcionando. Nossa equipe tinha que subir na torre para instalar, mas já estava chegando perto das 20 horas. Cheguei com o rapaz que estava junto comigo para dar baixa na nossa permissão de trabalho e, quando ele foi dar a baixa, estavam ali o Operador Chefe e o Engenheiro. Um deles falou: “Não, este LI não pode deixar de ser colocado, você tem que terminar o trabalho, não pode ir embora agora. Vamos precisar dele hoje à noite.” Falei: “Sim, vocês vão ter ele colocado, o outro Instrumentista está chegando. Ele começa depois das 20 horas e vai continuar.” O Engenheiro que estava do lado se meteu no meio e falou para o rapaz que estava com a permissão: “Não, não É você quem vai fazer e pronto” Falei: “Não, não é ele quem vai fazer. Quem vai fazer é o próximo a entrar. Ele está indo embora.” “Não, ele não vai embora não.” Eu falei: “Vai embora sim” E começou a discussão. Ligaram para nosso chefe, que não era o Engenheiro Chefe do setor. E ele disse: “Não, vai ficar sim.” Mandou ficar e o rapaz ficou. Falei: “Então ninguém vai embora enquanto ele não for.” Estávamos em oito e ninguém foi embora. Segurei todos os instrumentistas, ficamos lá e não batemos o cartão. Ficamos esperando até ele terminar o serviço. Mesmo chegando o Instrumentista da noite, ficamos todos juntos. Lá pelas 21 horas, ele terminou e fomos embora. Tiveram que levar todo mundo em casa, porque ficamos esperando. No outro dia, fui conversar com o Engenheiro Chefe, que estava de férias, mas havia retornado para trabalhar. Falei: “Adriano, quero conversar com você na hora do almoço, com todos os Instrumentistas aqui e o Engenheiro substituto também.” Na hora da conversa, ele perguntou se estava tudo bem e eu disse que não, que havia faltado coordenação. Daí, o Engenheiro substituto disse: “Como faltou?” Repeti: “Faltou sim.” Contei a história e disse: “Isto não pode mais acontecer sob pena de ter aqui, neste setor, um movimento que vocês vão se arrepender. Porque, aqui, ninguém é escravo, aqui tem um regime de trabalho.” O Engenheiro Chefe nos deu razão, pediu desculpas para o pessoal e pagou hora extra para os oito que ficaram lá.
COTIDIANO DE TRABALHO A jornada de trabalho na Petrobras sempre foi tranqüila, de oito horas diárias, 40 horas semanais, mas, às vezes, trabalhávamos mais do que isso. Sempre trabalhamos uma carga horária maior. Isto acabou fazendo com que criássemos o chamado banco de compensação de horas-extras, porque brigávamos para não ter horas-extras e para ter um emprego garantido para todo mundo. Mas a carga horária só ultrapassava quando era uma emergência ou quando tinha uma parada de manutenção.
CUT – CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES Fui tesoureiro e vice-presidente do Sindicato do Paraná. Fui da Coordenação Nacional dos Petroleiros. Tínhamos, na época, 15 sindicatos de petroleiros no Brasil. Depois, passaram a ser 17. No começo, tínhamos três sindicatos filiados à Central Única dos Trabalhadores. Posteriormente, íamos ganhando sindicatos à medida que o tempo passava. Tínhamos o Comando Nacional dos Petroleiros, onde tinham representantes dos sindicatos filiados dos não filiados à CUT. Fui, por dois anos consecutivos, coordenador dos sindicatos filiados à CUT. Tinham outros diretores que formavam esse comando. Chegamos em um momento em que todos os sindicatos eram filiados à Central Única dos Trabalhadores e criamos a Federação Única dos Trabalhadores.
SINDIPETRO DO PARARÁ E DE SANTA CATARINA O Sindipetro
do Paraná e Santa Catarina é um sindicato muito respeitado, porque tiramos a base submissa, que mandou operadores e outros trabalhadores furarem a greve de 1983, em Campinas, contra a vontade destes trabalhadores. O Paraná, no cenário nacional foi, por um bom tempo, uma grande liderança dos petroleiros do Brasil. E, por isso, fui do Comando Nacional. Fizemos um trabalho com seriedade, nunca enganamos a categoria, sempre jogamos muito claro, mas jogamos muito duro. Nós fizemos uma greve em que enfrentamos o exército à baioneta. Essa tem uma história triste. O exército invadiu a refinaria numa ocupação, íamos ocupar o refeitório para fazer um protesto que acabou virando uma greve. O exército veio. Isso deve ter sido em 1988 ou 1989. E teve um episódio muito triste. O caso de um trabalhador, um senhor de idade, que era caldeireiro, o seu Savagim. Nós estávamos agrupados dentro da refinaria e o exército invadiu, os soldados com arma na mão, com baioneta. O filho dele era um dos soldados com arma na mão. Filho e pai, um de cada lado. Tiveram várias greves. Nós lutávamos com democracia, mas com rigor. Nós parávamos os trabalhadores entre a estrada e a refinaria, que dava um trajeto de mais ou menos um quilômetro e dizíamos: “Quem quiser entrar vai entrar, mas vai a pé, não vai de ônibus.” Era o tempo necessário para a gente falar na greve. Como se tinha medo de greve, a maioria furava, mas ia a pé para o trabalho. E para fazer isso a gente segurava os ônibus. Estava em cima de um caminhão de som coordenando o movimento, quando chegou o primeiro ônibus e falei: “Fechem o corredor, aqui ninguém passa.” Aí fechou aquele corredor humano e parou o ônibus. Vinha polícia, batalhão de choque com cachorro, mas éramos em número maior. Não passou ninguém, conseguimos fazer isso. Na época tinha uma diferenciação de ônibus. Hoje já não é mais assim. A Petrobras mudou muito, todos andam no mesmo ônibus. Antes, o ônibus grande era para os trabalhadores até o nível técnico e tinham os micro-ônibus para os chefes, os engenheiros. Era um absurdo Passavam pelo mesmo lugar, no mesmo trajeto, dois ônibus. Às vezes, iam com a metade da capacidade, mas era diferenciado. Acontecia isso na Petrobras, mas felizmente mudou. Uma vez, teve um desses micro-ônibus que era dos chefes e eles falaram que não iam descer, e ficaram lá. Falamos: “Não vai descer, mas não vai passar também” E eles começaram a dizer que não desciam, e eu falei: “Vocês vão descer sim, querem ver como vocês vão descer? Pessoal, eles não querem descer, vamos virar esse ônibus que eles descem já.” Aí chegou todo mundo em cima do ônibus, rapidinho desceu todo mundo. A partir disso, no outro dia, ninguém ficava dentro do ônibus, parava, descia, ia embora, furava a greve, mas ia a pé. Até hoje, na refinaria de Araucária, não entra ônibus se tiver qualquer movimento Se tiver uma definição: “Amanhã tem paralisação de duas horas”, param os ônibus, quem não quiser parar durante duas horas, vai a pé, mas não entra de ônibus, até hoje é assim.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS / GREVE GERAL Tem uma outra história interessante. Teve uma greve geral e nós defendemos greve geral para os petroleiros também. Tinha muita empreiteira trabalhando na área. Era um dia de neblina, estava fechado. Nunca vi na minha vida tamanha neblina como aquele dia. Não conseguia enxergar nada pela frente. Conhecíamos bem a região, então era fácil. Você ia devagarzinho dirigindo, mas havia carro parado nas ruas, por causa da neblina. Era inverno e deixei a turma na frente da entrada e falei: “Tem uma entrada nos fundos. Estou pensando em colocar alguém lá, embora ninguém deva entrar por lá para furar a greve, porque está com muita neblina e é difícil o acesso. Mas, por desencargo de consciência, vou levar alguns trabalhadores para lá.” Era a greve das empreiteiras que eu estava coordenando. Eu botei no carro do sindicato quatro pessoas e levei. Quando cheguei lá, nos fundos da refinaria, me desesperei. Eu vi um exército inteiro da Polícia Militar, parado, um esquema poderoso. Falei: “Vai ser por aqui a entrada hoje.” Na época, não tinha celular, não tinha como fazer contato, e pensei: “Agora não dá tempo de voltar para chamar reforço, vou ter que segurar aqui.” Não voltei, fiquei ali com aquelas quatro pessoas e com aquele número enorme de policiais militares. Fui até o Capitão e falei que tinha combinado com o Major do Comando.” Eu não tinha acertado nada Foi uma tentativa que fiz e que deu certo. Ele autorizou e nós cercarmos os ônibus e pedimos para o pessoal parar para quem quisesse descer, quem não quisesse ficaria dentro do ônibus. E me pediram para que eu não quebrasse o nosso compromisso com o Comandante, o Major, mas eu não tinha feito nada Foi a única saída que tive. Ele concordou que eu entrasse. Quando veio aquela comitiva, entrei na frente e o Capitão deixou parar o ônibus, não falou nada, mas deixou. Parei, entrei no ônibus e falei: “Bom, só tem quatro aqui, tem que descer mais gente para parar os demais.” Entrei no ônibus dos chamados “peões” de empreiteira, de trabalhador braçal. Cheguei e falei: “Vocês sabem que estão entrando pelos fundos da refinaria? Tinham que estar entrando pela porta da frente. Quem entra pelos fundos é rato. Vocês são homens ou são ratos? Quem é homem desce comigo, quem é rato, entra.” E desci. Foi uma fila, desceu todo mundo do ônibus, todo mundo desceu. O Capitão chamou toda a polícia, fez um “corredor polonês” para segurar. Veio um soldado, com uns dois metros de altura e me pegou com uma mão nas minhas costas e a outra na minha bunda e me jogou no meio do mato. Caí no meio do mato e não pude mais voltar, porque formou um “corredor polonês” e aí passou todo mundo, passaram todos, e acabou a greve. Voltei para frente da refinaria. Lá estava o grupo da frente e falei: “Vou liberar esse pessoal para entrar, porque agora não é justo.” Estava toda a
polícia também lá na frente e estava desesperado, com raiva. Imagine Fui jogado fora Subi no caminhão para liberar o pessoal e a polícia toda enfileirada. Para os poucos que ficaram, falei: “Aconselho vocês a entrarem. Vocês são os heróis. Entrem porque vai ficar ruim, vocês são poucos. E quero deixar o meu recado para a polícia...” Jamais devia ter feito isso, mas fiz no desespero. Falei assim: “Rui Barbosa tinha razão. Cabeça em que entra quepe não tem lugar para a inteligência.” Nem sei se Rui Barbosa falou isso, mas disse na hora E tive que sair fugido dali, porque a polícia queria o meu couro Nunca sofri nenhuma retaliação, até porque Dirigente Sindical tem uma garantia de emprego, não pode ser mandado embora. Estava no exercício do mandato e não era bobo. Fazia isso e depois dava uma sumida, ficava fora um tempo.
“VIENTO SUL” Fazíamos shows. Sempre tinha um conjunto que era ligado à luta. No Paraná, tínhamos o Viento Sul, um grupo formado por latino-americanos que viviam e tocavam nas ruas de Curitiba. Eram pessoas que nos davam força. Depois que a greve estava em andamento, tinham as equipes de mobilização. Fazer greve é mais fácil do que fazer um movimento de paralisação de 24 horas, pois sabemos que isso não leva a nada. Politicamente, estas paralisações servem para dar uma motivação para continuar a luta. Numa greve desse tipo era importante ter um grupo desses se apresentando, era importante ter alguma atividade para segurar o petroleiro e para a hora passar mais rapidamente. Numa greve, você trabalha dobrado, a hora demora mais para passar, é mais difícil.
GREVE DAS ESTATAIS No Rio de Janeiro tenho uma história interessante, onde acabei saindo naquelas frases da Folha de São Paulo. Estava no Comando Nacional e uma das nossas greves já estava no 35o dia. Estava para acabar, era a greve das estatais, estavam a Caixa Econômica e o Banco do Brasil juntos. Fizemos uma grande passeata de todas as empresas estatais na avenida Rio Branco. A passeata ia terminar em frente ao Triângulo das Bermudas: o Edise, o BNDES e o Banco do Brasil. Chamávamos assim porque ali sumia todo o salário. Estávamos no Comando Nacional dos Petroleiros Unidos para definir se a greve acabaria ou não, porque ela já estava acabando em vários setores. Falei: “Vou fazer o seguinte. Vou para a passeata, pego a passeata de onde ela estiver, vou até o final e quando chegar lá, se não tiver uma posição de vocês, estou entendendo que se mantém a greve. É isso?” “É isso.” Fui para a passeata. Cheguei no caminhão de som e anunciaram: “Está aqui o Stica, do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e do Comando Nacional. Ele vai falar da situação dos petroleiros.” Eu falei “Segura, que só vou falar no final.” Quando chegamos na frente do Edise, era a minha vez e pensei: “Vou ter que fazer um discurso radical, não tem outro jeito.” Falei: “Na Petrobras, vocês podem ter certeza que a greve continua.” Olhei para cima e falei: “Vocês, da Direção, que estão na janela, escutem o que vou falar aqui. Nós vamos despressurizar.” O discurso foi aplaudido e veio o coro: “A greve continua, a greve continua.” A imprensa inteira veio me perguntar o que era despressurizar. Estávamos parados há 35 dias. E falei: “A unidade está parada, os tubos estão cheios do petróleo e está mantendo a caldeira acesa para o vapor aquecer, para o petróleo não congelar. Se congelar, você nunca mais aproveita a tubulação, vai ter que cortar tudo, fazer uma refinaria nova Nunca deixávamos isso acontecer. Tanto é que sempre se mantinham os trabalhadores fazendo a caldeira funcionar. Mas falei que íamos parar tudo mesmo. Agora é a hora do tudo ou nada. Nós vamos “descompressurizar.” Inventei a palavra e ele quis saber o que era. E foi frase da Folha de São Paulo. Quando saí dali, fui para o Comando e informei que greve continuaria. Me mandaram para Duque de Caxias, pois estavam querendo parar a greve lá. Eu e mais um sindicalista de Aracaju, o Gilvan, fomos para Caxias. Chegando em Caxias, na Assembléia, tinha um diretor tentando mostrar que a greve estava acabando e, quando me deram a palavra, fiz outro discurso inflamado e foi unânime, todo mundo gritando: “A greve continua.” Voltei para o comando, cheguei de noite, já cansado, e falei para todos “A greve continua.” Me disseram: “Vá para o Paraná que a sua base acabou a greve.” Saí cedinho, fui para o Paraná, mas já não revertia mais. Não só o Paraná saiu da greve, várias outras unidades começaram a sair da greve. Não teve mais jeito, acabou a greve.
REIVINDICAÇÕES TRABALHISTAS A primeira coisa que move uma categoria é a briga pelo salário. Mas não só o salário. Queremos assistência médica, segurança no trabalho, condição de trabalho. A pauta que a gente trazia chegava a mais de cem reivindicações, às vezes, incluindo a defesa da Empresa. Por exemplo, começaram a aumentar a terceirização e tinham áreas que não podiam ser terceirizadas, porque eram muito arriscadas. O petroleiro tem que ter um treinamento muito grande. Havia momentos em que se cortavam pessoas e achávamos que não poderia cortar, porque era melhor ter uma pessoa a vida toda na Petrobras sem fazer nada, do que não ter essa pessoa e acontecer um acidente. Vou dar um exemplo: em 2000 teve um grande derramamento de óleo no Paraná, no Rio Barigui e atingiu o Rio Iguaçu. Porque que aconteceu esse derramamento de óleo? Vamos aceitar que houve falha humana, que teve erro, que teve tudo. Quando o terminal de São Francisco do Sul mandou petróleo e estava fechada a válvula do tanque que receberia na refinaria de Araucária, tinha uma válvula que era um by-pass, que não foi feita a manutenção, por falta de mão-de-obra ou por algum outro motivo, e que o flange, era um sanfonado, acabou arrebentando com a pressão e deu o vazamento de petróleo antes de chegar na cerca da entrada da refinaria, no mato. Se não tivessem tirado, por economia, um vigilante que fazia exatamente o serviço de ronda em torno da refinaria de hora em hora, de duas em duas horas, esse vigilante teria visto o vazamento muito antes, porque o petróleo vazou durante horas. Quando perceberam, o petróleo já estava no rio, já tinham milhões de litros. O vigilante teria percebido o vazamento e tinha chamado atenção. Se esse vigilante ficasse a vida toda rondando e nunca tivesse ocorrido nada, só nesse dia teria valido toda a sua vida de trabalho. Essas são coisas pelas quais a gente também brigava.
QUEBRA DO MONOPÓLIO Há histórias de sindicalistas que foram defensores do monopólio estatal do petróleo. Viajei o Brasil fazendo palestras, mostrando a importância do monopólio estatal do petróleo. Tanto é que até hoje quebraram o monopólio e quem é que segura o abastecimento do país? É a Petrobras. Quem garante o óleo diesel? É a Petrobras. Nós importamos óleo diesel, importamos petróleo para poder suprir a demanda de óleo diesel e, se sobra gasolina, vendemos mais barato para fora. A Petrobras não age só como Empresa, age como se tivesse o monopólio ainda. Estávamos certos na manutenção do monopólio e, felizmente, depois que Lula foi eleito presidente, segurou, porque não só acabariam com o monopólio, mas iam vender a Petrobras. A Petrobras ia ser privatizada, estavam esfacelando a Empresa. Graças à eleição do Lula é que seguramos essa Empresa para o povo brasileiro.
SINDICATO Entre 1988 e 1990, ou 1989 e 1991, fiquei no Comando Geral dos Petroleiros. No Sindicato, fiquei até 1992. Quando fui eleito vereador em Curitiba, me afastei do Sindicato. Cada ano tinha um Congresso do Comando Geral e, nesse congresso, escolhiam uma nova direção. Fui indicado pelo Paraná por dois anos seguidos, mas não dava, porque teria que viajar muito. Numa das greves, tive que fugir durante a noite. Estava no Rio de Janeiro e peguei um vôo para ir para casa. No outro dia, cedo, voltei para cá. Não dá para passar 20, 30 dias longe da família. Fui Tesoureiro só no nome, porque nunca exerci a função. O Amadeu, que era o Presidente, também fazia a Tesouraria porque, eu não gostava de ficar atrás de uma mesa. Era um Diretor que gostava de ir às unidades. Todo dia eu estava na área, estava na Repar, em São Mateus, no Sul, na Usina de Xisto, Paranaguá ou ia a São Francisco do Sul, em Santa Catarina, onde havia outro terminal. Eu ficava visitando as bases, eu gostava disso, ficava conversando com os trabalhadores. Representava o Sindicato dentro das unidades, era o meu papel. O Amadeu, coitado, se sacrificava. Além de ser o Presidente, ficava fazendo a Tesouraria para mim, porque nunca gostei dessas coisas. Assumia a função para preencher o cargo e para poder ser liberado.
CONQUISTAS DO SINDICATO Nossa maior vitória até hoje foi em relação ao pessoal que trabalha em plataforma e que fica confinado. Eles trabalhavam 14 dias no mar e tinham 14 dias de folga em terra. Se pensar do ponto de vista de horário de trabalho e horário de descanso, seria uma boa escala se estivesse em terra, mas não é. É no meio do mar. Imagine passar 14 dias no meio do mar, vendo água por todos os lados, numa ilha de ferro, com pressão, com tensão, com medo de uma explosão, como já tivemos, inclusive vidas foram ceifadas nas plataformas. Conseguimos mudar de 14 para 21 dias de folga, para quem estava em plataforma. Esse foi um grande avanço para os petroleiros. A manutenção da Petros foi uma vitória e conseguimos a manutenção da assistência médica para os petroleiros. Foram, até hoje, várias conquistas.
QUEBRA DO MONOPÓLIO O monopólio do petróleo sempre foi atacado. Foi muito atacado pelo Presidente Fernando Collor de Mello, por exemplo. Nos mobilizamos para evitar a quebra do monopólio quando foi votado em Brasília. Fazíamos palestras, a população já tinha esquecido a campanha “O petróleo é nosso.” No Paraná, levei inúmeras vezes o saudoso Eusébio Rocha, já com idade avançada, mas com uma garra, uma fibra. Percorremos várias cidades do Paraná em escolas, em Câmaras Municipais, fazendo palestras, pedindo assinatura de vereadores, de prefeito, fazendo abaixo assinado. Fiz palestras em sindicatos de outros estados e fizemos uma turnê em Brasília por todos os gabinetes dos parlamentares pedindo o apoio, mostrando dossiês, fitas, mostrando a importância da Petrobras para o Brasil, mostrando a importância do monopólio estatal do petróleo.
TRAJETÓRIA POLÍTICA Discutíamos inicialmente, no Paraná, que deveríamos ter um candidato a Deputado Federal, um petroleiro, para poder ter, em Brasília, alguém para defender o monopólio do Petróleo, para defender a Petrobras. O primeiro nome que surgiu na época, foi o do Presidente do Sindicato, o Amadeu. Achei que o Amadeu devia ir. Não tinha vontade de sair, se fosse eleito, de ir morar em Brasília. Minha família não iria para lá. Minha mulher é filha de militar, viajou a vida toda e reclama que nunca pôde fazer amizade sólida, porque sempre estava de lugar para outro. Ela falou que não queria isso para os nossos filhos. E como sabia que, se eu fosse para Brasília, tinha que ir sozinho, não queria ir. O Amadeu se candidatou em 1988, mas não fomos felizes. Não tinha dinheiro, não tinha experiência, nada. Foi uma candidatura muito apagada, não tivemos condição nenhuma. Em seguida, resolvemos fazer a candidatura a Vereador para, depois, tentar para Deputado Federal. Daí, surgiu meu nome e topei. Gosto de discutir política e pensei que até a eleição para Deputado, meus filhos já teriam crescido e eu poderia convencer minha mulher para ir para Brasília. Os petroleiros fizeram 90% da minha eleição. E antes disso, tinha sido candidato a vereador em 1988. Fui bem votado, mas só pelos petroleiros, porque não fiz campanha fora. Estávamos em greve e não ia fazer campanha. Ficava junto com os outros. Fui bem votado, mas fiquei na suplência. Era o terceiro ou quarto suplente. Não quis disputar as eleições para Deputado Federal. O candidato dos petroleiros foi o Amadeu. Disputei novamente como Vereador e, desta vez, fui eleito em Curitiba. Neste momento, me afastei do Sindicato, porque não iria fazer nenhuma coisa bem feita. Assumi o mandato em 1993 e, em 1994, teve eleição para Deputado Federal, para Governador. Meu nome foi indicado para Deputado Federal e aceitei. Deixei a Câmara Municipal com dois anos de mandato para ser candidato a Deputado Federal. Foi uma campanha paupérrima. Hoje, até rimos da campanha que fizemos, sem dinheiro, sem recursos, pedindo para cada petroleiro mandar uma carta para um amigo, para um parente pedindo voto para o Stica. Conseguimos 18 mil votos. Foi uma enormidade. Fiquei como primeiro suplente. Elegeram-se três Deputados pelo PT do Paraná, o Padre Roque, o Paulo Bernardo e o Nedson, que é prefeito em Londrina. Foi uma votação estupenda pelo tamanho da nossa campanha. Fiquei como primeiro suplente durante quatro anos no PT, porque ninguém interrompeu o mandato. Disputei a reeleição para Vereador, dobrei minha votação e, em 1998, concorri novamente como Deputado Federal. Já tínhamos perdido o monopólio estatal do petróleo e conclui que não tinha mais motivo para ir para Brasília. Comecei trabalhar para disputar um cargo de Deputado Estadual. Mas, na última hora, alguns petroleiros disseram: “-O Stica tem que ser nosso Deputado em Brasília. Nosso projeto é federal.” Me rendi e desta vez conquistei 28 mil e tantos votos. Fiquei como segundo suplente. O Paulo Bernardo ficou como primeiro suplente com uns 30 mil votos. Continuei como Vereador em Curitiba por três mandatos. Na verdade, por dois e meio, porque na metade do segundo já tinha cumprido o meu papel e queria ser Deputado Estadual. Fui eleito e bem votado. Uma vez tive a oportunidade de assumir a Vice-Presidência da Assembléia. Depois, fui chamado pelo Governador Requião para ser o Líder do Governo. O PT tinha ajudado a eleger o Governador e assumi o desafio. Hoje, sou líder do Governo Requião no Paraná. E não perderam a esperança de que eu ainda vá para Brasília Estou repensando, porque meus filhos já são adultos. Meu filho é Geólogo, tem 25 anos. Minha filha tem 23 anos, é Atriz e trabalha na TV local do Paraná. Meu caçula já está com 21 anos. Pode ser que, na próxima eleição, aceite a ajudar os petroleiros indo para Brasília. Mas, minha vontade é continuar Deputado Estadual. Já estou fazendo 52 anos nesse Natal, tenho que dar uma acalmada. Vai ser muito difícil.
PROJETO DE LEI Como vereador um dos meus grandes projetos, e que se tornou lei, foi a proibição do self-service em postos de gasolina. Começou uma onda no Brasil e começou por Curitiba. As companhias na época, a Shell e a Esso, começaram a investir pesado no self-service. Como fui frentista de posto de gasolina, sei que o frentista normalmente não tem uma outra profissão. Isso ia gerar um desemprego muito grande. Conversei com o Sindicato dos Donos de Postos. O Roberto Fregonese me ajudou muito, teve o entendimento de que não seria bom para os donos de postos, porque, se um posto tem a bomba de alto-atendimento e o seu, por exemplo, trabalha com frentista, você vai ter um lucro menor do que o concorrente porque vai pagar a mão-de-obra. Além disso, o concorrente poder vender um pouquinho mais barato do que você. Isso no primeiro momento, porque, depois, ou você fecha seu posto ou tem que adotar o self-service. A concorrência, além de desleal, geraria o desemprego. Começamos a fazer campanha contra. Havia inconstitucionalidade no projeto, porque se tratava de energia, era combustível e, portanto, a lei tinha que vir de Brasília. Nós mostramos que não era só uma questão da energia. Era, principalmente, de segurança. Temos a foto de uma senhora abastecendo o carro e, ao mesmo tempo, ensinando ao seu neto, que era uma criança e estava inalando os gases que saem do tanque enquanto está abastecendo. Jogávamos duro, botamos um caminhão de som em frente a um posto e fiquei em cima falando e o pessoal panfletando para quem entrava e saía do posto. Joguei um panfleto que era assim. De um lado, um frentista com o bico da mangueira e o bico da bomba na mão, dizendo: “Antes era assim.” E aí, do outro lado, estava escrito “agora vai ficar assim”, e o mesmo frentista com o revolver na mão porque estava desempregado. Mostramos o quanto representava o desemprego, as filas para os motoristas que iam abastecer no self-service, eles vendiam bem mais barato para fazer fila mesmo. E que aquilo era só o começo, e que depois ficaria tudo igual. E foi uma luta, uma luta mesmo e nós conseguimos fazer aprovar lá em Curitiba uma lei proibindo o self service. Depois eu mandei para vários deputados em Brasília e o Aldo Rebelo, do PC do B, fez e a lei foi aprovada também em Brasília. Depois, o presidente Fernando Henrique Cardoso entendeu e sancionou e hoje o self-service é proibido no Brasil todo. No Brasil, mais de 350 mil frentistas têm emprego graças a essa lei que começou com uma luta nossa.
LEIS SOBRE GÁS NATURAL Fiz várias leis com o gás natural. Por conhecer um pouco da área e, mesmo antes de termos o gás natural da Bolívia, fiz uma lei que garantia que os edifícios que fossem construídos tinham que ter tubulação tanto para GLP como para gás natural, para poder ter opção. A lei existe, mas não oficializaram. Hoje, estão arrependidos de não terem colocado minha lei em prática, porque há o gás natural e muitos não podem usar, porque não têm pronta a tubulação no próprio edifício. Também fiz a primeira lei, em Curitiba, do ônibus a gás natural que ainda não funciona, mas acredito que agora vai funcionar. Tínhamos a melhor lei feita para tancagem em posto de gasolina, com segurança, para não deixar vazar para o meio-ambiente. Todas as leis para as áreas que conheço, que trabalhei. Foram coisas que ajudaram meu dia-a-dia de político.
DIÁLOGO COM O SINDICATO Busco manter o diálogo com o Sindicato e com a categoria, mas estou em débito. Porque vamos, cada vez mais, entrando numa bola de neve. Quando era Vereador ainda tinha condição de fazer visitas nas áreas. Ia todo mês, religiosamente, fazia uma visita. Tirava três, quatro dias e ia. Agora, faz anos que não entro na área, porque minha vida se atribulou demais. Como Líder do Governo, nem se fale É uma loucura e “casa de ferreiro, espeto de pau”, a gente vai deixando os mais chegados. Estou em débito com a categoria, mas acompanho todos os movimentos. Estou junto, se há uma mobilização. Na
assembléia, procuro participar, tenho estado nos grandes momentos. No dia-a-dia, infelizmente não dá mais.
TRABALHO DE VEREADOR Atribuo as vitórias ao trabalho da minha equipe aos nossos objetivos. Realizei um mandato de forma diferente. Faz parte da cultura política do brasileiro acreditar que Vereador tem que fazer tudo, que vai resolver o problema do bairro. Que, se houver um pedido, o Vereador faz. A rigor, o Vereador não tinha que fazer essas coisas. Para isso tem o Secretário de Obras, de Educação, de Saúde. O Vereador tinha que fazer leis e fiscalizar o poder executivo, só isso. Só que a cultura não é essa. E quem não faz, não se reelege. Como era de oposição, para nossos pedidos saírem era muito difícil. Sempre trabalhei muito, cumpria meus mandatos trabalhando mesmo. Minha equipe trabalhava e trabalha bastante. E vinham os pedidos, o que aproveitava para reeducar as pessoas também. Por exemplo, vinha alguém e dizia: “Stica, quero que você faça isso, a minha rua está muito esburacada, a valeta está a céu aberto.” Fazia o seguinte. Encaminhava o pedido para Prefeitura e dava uma cópia para o solicitante. Posteriormente, mandava a resposta. Se a resposta da Prefeitura fosse negativa, prevenia que teríamos que chamar os moradores para uma reunião, para que fizessem a reivindicação. Às vezes, chamava 15, 20 pessoas na minha casa e explicava para eles como ia fazer. Quando chegava uma resposta negativa, ligava de volta e dizia: “Chame outra reunião, que agora temos que tomar outra medida.” Mostrava que o pedido tinha sido feito e que a resposta era negativa. Dizia que, a partir daquele momento, eram eles que tinham que dizer o que queriam, que eu ajudaria, mas que já tinha feito o que podia. Sempre sugeria que as reivindicações deveriam ser por etapas. Aprendi isso no sindicalismo. Orientava: “Tirem uma comissão, dois, três e me acompanhem, vamos até o Secretário para vocês falarem para ele o que precisam.” Íamos ao Secretário e eu apresentava os representantes dos moradores. Informava ao Secretário que eles não estão contentes com a resposta dada. A partir daí, começavam a discutir. Às vezes resolvia, outras vezes não. Se não resolvia, qual seria próxima medida? Chegava a propor queimar pneu, fechar a rua, se fosse o caso. Era uma maneira de ensinar uma outra cultura política. Quando conseguiam as reivindicações, eu era considerado herói. Era uma receita para ter voto. Essa foi a nossa maneira de trabalhar. Acho que deu certo, porque garantiu nossas reeleições.
LEIS SOBRE BEBIDAS ALCOÓLICAS Tenho um projeto polêmico, que vem desde quando era Vereador. Quando meu filho tinha 17 anos, eu estava fazendo um churrasco em minha casa. Ofereci uma cerveja para ele e ele não quis. Falei: “Você não quer porque sou eu quem está oferecendo ou porque você nunca bebeu?” Ele falou: “Uma cervejinha a gente toma.” Eu falei: “Mas você é novo para beber” “Ah, pai A gente sai aí nas nightseiras e paga consumação”. Ele falou que não iria deixar o dinheiro, então bebia 10 reais em coca-cola. Que não ia deixar os 10 reais sem pegar o troco de volta, então pedia uma cerveja que era um pouco mais caro. Pensei que essa prática de consumação mínima era errada. Consumação mínima obrigatória? Você obriga a consumir alguma coisa Fiz uma lei proibindo a cobrança de consumação mínima em casas noturnas e danceterias. E tenho dito o seguinte: casa noturna cobra a entrada, o ingresso, venda a melhor luz, o melhor show, e vende enfim, bebida. Quem quiser beber, que beba. Eu bebo. Se quiser, vou pedir um, dois, quantos whiskys quiser, mas sou eu quem tem que pedir. Mas estou tendo dificuldades. Os donos de casa noturna fazem um lobby danado e não consegui aprovar na Câmara. Agora estou brigando como Deputado Estadual no Paraná. Teve uma lei, que não vingou no Paraná, que era para proibir a venda de bebidas alcoólicas nas lojas de conveniências dos postos. Mandei essa lei achando que ia passar. Agora mudei para a proibição do consumo, não da venda. Porque na loja de conveniência o cara pára para abastecer, aproveita e compra uma cervejinha vai para casa beber. Só que os jovens, o que eles fazem hoje? Eles vão ao mercado, onde a bebida é mais barata, botam no carro o isopor com gelo, colocam a cerveja e formam aquela rodinha no posto. Jovens bebendo e bagunçando. Alguns pegam o carro acelerando, prejudicando quem mora próximo do posto, enchendo a cara e fazendo racha na noite. O que eu quero evitar? O consumo no posto de gasolina. Se ele quer beber, que vá ao barzinho e beba. Se ele quiser comprar para levar embora, que compre. Posto de gasolina não é lugar para ficar bebendo, fumando ao lado das bombas. Falta fiscalização. Só alguns postos levam a sério a fiscalização, a maioria não.
LEI SOBRE DISCRIMINAÇÃO Tem um projeto que fiz quando era Vereador. No Paraná, pelo menos, pegou. Tinha a mania de abrir jornal para ver os classificados onde diziam: “Emprego, há vagas, mas exige-se boa aparência”. Boa aparência? O que é boa aparência? Uma pessoa que está sem trabalho há um ano, desesperado, se vestindo mal, porque não tem condição nenhuma, às vezes tem os dentes mal tratados, o cabelo mal cortado? E boa aparência para quem? Um negro não tem boa aparência, porque é negro? Aos olhos de quem é boa aparência? Fiz um projeto acabando com o termo “boa aparência” e conseguimos. Nenhum anúncio hoje, pelo menos no Paraná, coloca essa exigência de boa aparência. Tínhamos uns absurdos como os elevadores sociais que as empregadas domésticas não podiam usar. Fizemos uma lei proibindo a discriminação do uso dos elevadores, que funciona até hoje. Fizemos um trabalho grande, principalmente, na área social. Sempre tive um trabalho com as comunidades, as associação de moradores.
SINDICALISMO
Existem dois tipos de sindicato: o da Petrobras e o sindicalismo de um modo geral. Se a pergunta for do sindicalismo de um modo geral, tem que dar uma reciclada. A relação capital-trabalho que aprendemos nos fins da década de 70, início dos anos 80, é outra, hoje. Vivemos em um momento de democracia, de negociação, de crescimento. Não tenho a receita, mas acho que temos que discutir qual é papel do sindicalismo no Brasil. Para os petroleiros está mais fácil. A direção da Empresa tem se pautado pela negociação. Na última greve, fui em uma das assembléias, em nome do Lula, pedir para parar a greve do Paraná. Havia encontrado o Lula em Londrina e ele me pediu para transmitir aos grevistas que havia um grupo querendo fazer terror e que o Governo negociaria tudo, que estava aberto para o diálogo, mas não daquele jeito. Disse ainda que o Governo ia endurecer com os petroleiros, que não ia privilegiar os petroleiros em relação aos demais, que o país estava num momento em que precisava crescer e o sacrifício teria que ser de todo mundo. E fui transmitir a mensagem na nossa assembléia.
RELAÇÃO PETROBRAS E SINDICATO A Petrobras evoluiu muito. Hoje o presidente é um sindicalista, o José Eduardo Dutra. Existem diretores que foram sindicalistas. Há uma facilidade para negociar, para conversar. É claro que a base, às vezes, extrapola. É exigente, mas, ainda assim, acho que a relação entre o Sindicato e a Empresa está indo bem. Está muito boa. Agora, a Empresa vai adotar a perspectiva da Empresa e o Sindicato a do trabalhador. Sempre haverá diferenças entre o papel do Sindicato e o da Empresa. A Empresa, com seu caráter democrático, tem que diminuir essa distância, essa diferença entre os dois lados fazendo com que se aproximem mais. E acho que estão conseguindo cumprir este objetivo.
SINDICATOS E CUT Em cada sindicato que não era da CUT, criávamos uma oposição e ajudávamos a oposição a ganhar. Assim, era mais um sindicato para ingressar na CUT. Ganhamos o Sindicato de Santos. O Sindipetro do Rio de Janeiro ganhamos com o pessoal da CUT. Fomos ganhando um a um, sempre aproveitando o pessoal da oposição que se formava, que nascia e dávamos todo apoio. Tínhamos prestígio. Uma vez, vieram de Duque de Caxias, às cinco horas da manhã, no hotel, nos acordar, para nos pedir que às sete horas estivéssemos na frente da Refinaria. Nossa oposição sempre foi muito séria. Os sindicatos da CUT sempre eram formados com pessoas de muita fibra, de muita garra e é por isso que ganhamos todos os sindicatos petroleiros. Todos, sem exceção.
FAMÍLIA Estou casado há 27 anos. O Juliano tem 25 anos e é Geólogo, sua adoração. Já tem sua empresa, fez um teste na Petrobras e passou. Está no quadro, mas agora que montou sua empresa, está seguindo sua vida. Aos oito anos de idade, chegou em casa e falou assim: “Pai, vou fazer uma greve na escola amanhã. Quero que você me dê uma faixa, traga a faixa de dois metros de pano, duas madeirinhas e um pincel atômico.” Ele escreveu: “Queremos visitar a Coca-Cola.” Uma professora prometeu levar a equipe para visitar a fábrica da Coca-Cola e não cumpriu, acabou esquecendo e eles cobraram. No dia seguinte, na hora do recreio, ele pegou a faixa junto com um amiguinho e a turma e saíram desfilando no pátio com a faixa. A Fernanda faz jornalismo, tem 23 anos. Já faz oito anos que é Atriz profissional, já com DRT. Desde novinha quis fazer teatro e já fez várias peças no Paraná. Hoje, ela trabalha apresentando um programa na TV Educativa do Paraná. Meu filho caçula está fazendo Arquitetura e Urbanismo. Esse parece que puxou ao pai. É o Presidente do Centro Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo da PUC do Paraná e leva muito a sério. Gosta e disse que quer ser político, ser vereador. Minha esposa é sobrinha do meu cunhado. O pai da minha mulher morava em Foz do Iguaçu e estava querendo vir para Curitiba, para os filhos poderem continuar estudando. Veio e ficou na casa do meu cunhado, onde morava quando era solteiro. Fiquei lá uns dias com ele, conheci meu sogro e fiz uma brincadeira: “Quando você vier para cá, vou namorar sua filha.” No dia que veio a mudança, fui ajudar e conheci minha mulher. Ela era muito linda, tinha 16 anos e tinha deixado um namoradinho em Foz do Iguaçu. Comecei a fazer umas visitas em sua casa e começamos namorar. Depois casamos e vivemos bem até hoje.
LAZER Nas horas de folga, sou piloto de automobilismo, mas agora não tenho muito tempo. Eu fui vice-campeão de kart no Paraná, em 1996. Esse foi meu sonho a vida toda. Quando era Soldado, na base aérea, ia fardado ao autódromo, para ver se dava moral para alguém me deixar pilotar, mas não dava certo. Aliás, boa parte das minhas cadeias durante a época do quartel era porque ficava patinando o carro na garagem, patinava o jipe, fechava as duas portas do hangar e punha o jipe. O automobilismo foi minha paixão a vida toda. Comprei o meu primeiro kart e o meu filho, o Juliano, também foi brincar comigo. Como era mais novo e mais leve, se deu melhor. Dizem que os filhos são melhores do que os pais e é verdade. Ele acabou sendo melhor do que eu na pista, então deixava ele correr. Depois comprei um carro, um Voyage velho e fui fazer corrida de carro. Não conseguia manter o kart, não tinha nem o patrocínio da Petrobras, mas seu kart, quem via, dizia que era cheio de patrocínio, porque o macacão do meu filho mandei fazer com a Petrobras, seu kart era abastecido com o Lubrax da Petrobras. Depois, aos 16 anos, ele veio correr de carro comigo. Não tinha carteira de motorista, mas já era piloto. Mas ele acabou parando. Queria levar muito a sério e não tínhamos condições. Eu continuei, consegui um patrocínio da Petrobras e, no ano passado, realizamos a primeira Copa no Mundo de gás natural, em turismo. Tem a de pick-up e fizemos a de turismo. Isso foi para alavancar a venda de gás natural no Paraná. Deu certo, começamos com dez carros e terminamos com 32 carros na pista. Ganhei duas provas. Numa delas, fui desclassificado, porque capotamos no treino e tivemos que alugar um carro para correr e este carro estava com o amortecedor fora do regulamento. Ganhei essa prova, mesmo tendo saído em último lugar. Mas fui desclassificado. Mas valeu por tudo. Ganhei mais uma depois. No ano que vem quero fazer o campeonato inteiro de gás natural. Vamos realizá-lo com o patrocínio da Petrobras, porque o campeonato foi um sucesso e aumentaram as vendas de gás natural. As pessoas começaram a ver que o carro a gás corre bem e é seguro nas pistas. Atingimos nosso objetivo. Sou um apaixonado por velocidade e também sou fascinado por pesca.
PROJETOS FUTUROS Já vi meus filhos crescerem e agradeço a Deus, todos os dias, pelos filhos que tenho. Eles são muito queridos. Daqui para frente, meu sonho é ter mais calma, por isso quero ser Deputado Estadual e não quero ir para Brasília. Não pretendo ficar na política por muito tempo. Não quero, um dia, dizer assim: “Ah Se eu pudesse voltar atrás queria fazer tudo que não fiz.” Ainda é cedo para parar, estou sendo muito útil na vida política, estou ajudando bastante, penso em mais um mandato e, depois, daí para frente, não tenho grande ambições. O que tiver que acontecer, vai acontecer. Quero pensar um pouco em mim, na minha família, quero poder curtir mais o meu lazer, minha pesca, que não tenho feito. Quero aproveitar um pouco a minha vida. Não tenho grandes sonhos, já tenho tudo. Se fosse pedir para Deus tudo que tenho, não teria tudo isso, porque não saberia pedir. Ele me deu mais do que mereço.
FAMÍLIA Sempre pautei minha vida com muita responsabilidade. Parei de fumar quando nasceu meu primeiro filho, porque disse: “Se não quero que meu filho fume, não posso fumar.” Foi muito difícil, mas larguei o cigarro e nenhum dos meus três filhos fuma. É sinal que deu certo. Hoje, de vez em quando, fumo um charuto. Quando fui a Cuba, acabei me encantando e acendo um charuto a cada mês, por exemplo, quando estou tomando um vinho. Mas o exemplo que dei foi bom. Nenhum deles fuma. É sinal que a gente tem que saber respeitar os filhos. E tenho certeza de que eles têm muito orgulho da minha história.
HISTÓRIA / CAUSOS / LEMBRANÇAS Numa das nossas viagens de Congresso, estávamos vindo de ônibus para o Rio de Janeiro e acordamos de manhã, antes de chegar na cidade do Rio. O ônibus parou e fomos tomar café. Desci e o lugar estava cheio de trança de alho com cebola. Falei: “Nossa Deve ser a terra do alho”. Eu gosto de alho e de cebola. Achei bonitas aquelas cabeças de alho meio roxas e resolvi levar. Achei tão barato que decidi comprar mais. Escolhi uma bem bonita. Quando a moça da loja trouxe, embrulhou num jornal e me deu aquele pacote cheio de tranças de alho. Na hora que peguei o embrulho, percebi que era tudo de isopor Neste momento, chegou o Gauchinho e me perguntou o que estava comprando. Não quis passar vergonha e fingi que já sabia o que era. Disse que era um enfeite para colocar em cima do fogão e ele resolveu levar um também Quando cheguei em casa, coloquei em cima do fogão. Ficou até bonito. Meu sogro elogiou quando viu. Falei que tinha comprado perto do Rio de Janeiro e que lá tinha muito alho. Imediatamente, ele pegou uma cabeça de alho e meteu a faca No outro ano, tivemos um outro Congresso e contei para a turma no ônibus. O Santa Rosa, que hoje é da Comunicação da Petrobras, me mandou um bilhete perguntando se continuo comprando muito alho Ele não esquece dessa história.
PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS Fiquei muito feliz por ter sido lembrado e convidado para participar do Projeto Memória. E mais feliz ainda, porque pensei que vinha dar um depoimento. Estou acostumado a dar entrevista na televisão e é tudo muito rápido, temos que sintetizar as coisas. Aqui, foi uma história completa e isso foi muito bom. Estamos falando de quem fez a Petrobras. A Petrobras é feita por seres humanos, por gente. A Petrobras é o que é pelos seus trabalhadores. Sou um grãozinho de areia desses trabalhadores. E fico muito feliz e emocionado com esse trabalho. Parabenizo a iniciativa e a direção da Petrobras, essa Empresa que é orgulho, não só para mim, mas para o povo brasileiro. Essa Empresa é a cara do nosso Brasil.Recolher