IDENTIFICAÇÃO
Meu nome completo é Aron Belink, eu nasci em São Paulo em 14 de outubro de 1963.
FORMAÇÃO
Eu estudei administração pública e geografia, na GV e na USP. Fiz junto.
Na verdade, eu fiz no comecinho, agronomia. Eu fiz dois meses de agronomia, que eu achava que a coisa tinha que ...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO
Meu nome completo é Aron Belink, eu nasci em São Paulo em 14 de outubro de 1963.
FORMAÇÃO
Eu estudei administração pública e geografia, na GV e na USP. Fiz junto.
Na verdade, eu fiz no comecinho, agronomia. Eu fiz dois meses de agronomia, que eu achava que a coisa tinha que vir pelo lado da terra, das pessoas, lá nos anos 80. Só que aí eu achei agronomia técnica demais e fui pra geografia.
ATIVIDADE ATUAL
Atualmente, eu sou um consultor autônomo, mas muito envolvido com ONGs e com o terceiro setor. Trabalho um pouco com a Akatu, um pouco com o Ethos, trabalho na EJA 26 000, trabalho no GAL, que é o grupo de articulações de ONGs Brasileiras de ISO 26 000, e em algumas empresas com consultoria, palestras.
TRAJETÓRIA PESSOAL
Minha primeira carteirinha de movimentos sociais é de 1973, eu tinha nove aninhos. Eu fui pescar com meu pai no rio Araguaia, ele gostava do interior, do mato. Ele era da cidade, mas sempre gostou da natureza e aí eu fiquei totalmente apaixonado pela natureza. Eu já gostava e convivendo lá com os índios, com o rio, com os bichos, com a floresta, eu fiquei com aquilo como uma coisa que já me falava por dentro e continua falando muito. E aí eu fui me engajando, comecei a me filiar a entidades, comecei a passar abaixo-assinado na oitava série, em 1979 pro Paulo Nogueira Neto, que até hoje está aí. Quer dizer, fui já a palestras, essa coisa toda e fui me envolvendo. Depois me envolvi em política estudantil, na época na GV; eu fui presidente do Centro Acadêmico, na época das Diretas Já. Aquela coisa de passeatas, se vestir de verde-amarelo, eu já estava nessa, que é a cidadania política. Quer dizer, eu fui mantendo essa carreira paralela. Quando eu estava na faculdade ainda, comecei a trabalhar na Pró-Juréia; a gente fundou a Pró-Juréia pra defender essa área que é do litoral sul de São Paulo. E fui me envolvendo nessa organização da sociedade, participei da fundação da SOS Mata Atlântica. Ao mesmo tempo, comecei a trabalhar em empresa. Eu tinha que ajudar a minha família e eu comecei a ser empresário, meio por acaso. Na verdade, eu sempre me voltei para as atividades ligadas à natureza, meio ambiente, cidadania. Mas aí fui ser empresário por acaso e como empresário por acaso me envolvi em várias causas, na época, no setor ligado ao meio ambiente. Minha empresa era de ar-condicionado. Fui mexer com a questão do buraco na camada de ozônio. Comecei a trabalhar junto com a Brava - soluções de ar-condicionado e ventilação. Eu era vice-presidente de meio ambiente da Brava. Participei da Eco 92 nessa condição. Nessa época, eu também conheci o PNBE; eu conheci o Emerson, o Hélio, o Oded, o Ricardo, o Sergio Mindlin, conheci essa turma toda. Participava do PNBE não como fundador, mas estava razoavelmente ativo e fui participando desse processo. Naquela época também, a agente fundou a Eco Press - eu e minha mulher. Ela é jornalista e a gente fundou uma entidade, uma ONG chamada Eco Press, que era uma agência de notícias ambientais. Ela foi fundada formalmente em 93 e informalmente desde 89, mais ou menos, ela já existia com a idéia de formar jornalistas e formar massa crítica pra o meio ambiente. E aí quando eu fiz 40 aninhos em 2003, eu cheguei à conclusão de que eu devia fazer aquilo que era a minha vocação e aí eu me desfiz da posição que tinha na empresa. Já vinha de uma mutação há certo tempo e fui trabalhar em tempo integral no terceiro setor. Comecei pela Akatu e venho me esparramando. Então, na verdade, é uma carreira de muito tempo nessa área, não é de hoje.
Atuo de uma maneira híbrida. Porque em certo momento eu trabalhei praticamente dedicado ao Akatu, de 2003 até 2006, mais ou menos. Trabalhei bastante focado na Akatu em alguns projetos, desenvolvendo a Escala Akatu, o Movimento Cuide, a parte de indicadores de consumo consciente, as pesquisas que a Akatu fez. Estive bastante envolvido na construção dessas coisas todas junto com o Hélio. E a partir de certo ponto, eu também vi que tinha algumas coisas que eu mesmo queria fazer e que não era exatamente o que estava na agenda do Akatu. Por exemplo, a participação da ISO 26 000, que era uma coisa mais focada na responsabilidade social, mais abrangente no foco do consumo consciente. Aí eu sensibilizei um pouco a minha relação com a Akatu; continuei com uma consultoria independente com a Akatu e com o trabalho voluntário na construção da ISO. Foi quando a gente articulou o GAL, o Grupo de Articulação das ONGs Brasileiras da ISO 26 000, que hoje tem, mais ou menos, umas 70 ONGs que participam intensamente da discussão e que surgiu com a proposta de dar essa caixa de ressonância entre o processo de responsabilidade social, a construção dessa norma internacional, que ainda está em construção, e o mundo do terceiro setor, onde se tem um papel muito peculiar. A relação do terceiro setor, da sociedade civil, com a responsabilidade social, com essa norma que acho tem um canal muito grande pra desenvolver. Então, eu acabo participando das duas formas.
ISO 26 000
A peculiaridade da ISO 26 000, do meu ponto de vista – e foi isso que me fascinou - é que ela tem a proposta de ser aplicável em qualquer tipo de organização. Ela se colocou tanto como uma coisa que uma ONG pode aplicar quanto um sindicato, quanto uma empresa grande ou pequena, comportando as diretrizes básicas da atitude socialmente responsável. E pra uma ONG isso tem um significado: por um lado de ser uma alavanca pra nossa própria causa. Então a minha causa, qualquer que seja ela, social, certamente pode se beneficiar com aquilo que a ISO 26 000 está propondo como atitudes socialmente responsáveis das empresas e da sociedade em geral. Por outro lado, eu, ONG, vou ser cobrado também a me comportar de acordo com essa lógica. Então, ao mesmo tempo em que ela dá uma ferramenta pra eu alavancar a minha causa junto a terceiros, ela é uma forma dos terceiros avaliarem como eu me comporto em relação a minha causa; isso entra como gestão pra mim. Ela tem esse sentido duplo que é muito importante. E ela tem de fundamental a proposta de ser uma construção multi-stakeholder, como se fala. Então de uma maneira que eu diria, mais ou menos, arbitrária, se estabeleceram seis conjuntos, seis segmentos sociais para serem os eixos da ISO 26 000. Você tem pessoas participando sob a bandeira do setor privado, do setor industrial, que inclui também serviços, do setor produtivo, do governo, de ONGs, consumidores, trabalhadores e a área do conhecimento, que são as consultorias, a academia. São seis grupos de stakeholders. E isso mundialmente. Hoje, há setenta e tantos países participando desse processo. Você forma uma rede extremamente mesclada e cheia de canais em que você está discutindo sobre várias bandeiras. Às vezes, eu sou brasileiro; às vezes, eu sou ONG; às vezes, eu sou eu mesmo. Quer dizer, às vezes eu estou vinculado ao grupo de uma determinada bandeira... Quando eu digo “eu”, na verdade, eu quero dizer todo mundo que está nesse processo. A gente acaba criando uma mescla de interesses, uma tentativa de formar um conjunto que é extremamente rico. Eu estou nesse processo já faz dois anos e meio e estou aprendendo barbaramente como se organiza o processo. Com isso, eu acho que a ISO 26 000, metade dela vai ser o documento e a outra metade vai ser o processo que vai se criar pra construir a própria norma. Eu acho que é uma coisa que vai merecer muito, muito, muito estudo, análise, é um aprendizado gigantesco.
INSTITUTO ETHOS
Primeiros contatos
Eu conheci o Instituto Ethos porque participava do PNBE. Um belo dia recebi um... Não era nem e-mail ainda, recebi uma cartinha ou um fax, um convite, informando que estava sendo criado, fundado o Instituto Ethos e tal. Eu já me interessei, achei que era uma coisa que estava na minha área de atenção e fui acompanhando. Assim sempre participando de uma maneira ou de outra.
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
O que eu tenho visto pelo mundo afora e também aqui, eu acho que no Brasil a gente está muito avançado. Eu acho que as empresas brasileiras e, certamente pessoas dentro de empresas brasileiras, elas claramente têm uma disposição e uma abertura pra isso muito grande. E é curioso a gente ver isso dentro desse contraste. Porque, ao mesmo tempo em que você tem empresas, e talvez setores dentro das empresas muito avançados e muito receptivos às idéias e muitos propícios a avançar, também tem empresas muito alheias. A gente tem o pior e o melhor dentro desse leque. Se a gente fosse pensar de uma maneira puramente quantitativa, eu diria que, obviamente, tem muitas empresas que são céticas, que estão longe, achando que isso é poesia. Mas comparando com o que a gente vê por aí afora, eu diria que o Brasil está bem, com muitas empresas que estão assumindo o discurso. Agora, o discurso e a prática são coisas que andam, que entram puxando um ao outro. Por exemplo, tem coisas que você começa a fazer ou passa a fazer porque você começou a falar. Mas o fato é que a gente vai gerando uma cadeia de comprometimentos, que se retro-alimentam e que vai crescendo e está começando a fazer certa diferença. Eu acho que a gente está começando, está tentando. Eu acho interessante, hoje, o momento em que a gente está e que nós estamos tocando no cerne de algumas questões. A coisa já foi indo pra superfície durante bastante tempo e estão começando a exigir algumas decisões e alguns aprofundamentos de algumas empresas, aquelas mais comprometidas, de que elas comecem a se questionar em alguma diretriz daquela coisa: eu vou atrelar a remuneração variável dos meus ativos a uma meta social e ambiental? E vai ser quanto? Vai ser um troquinho ou vai ser uma parte importante daquela meta? Porque agora você começa a ter conflitos de discurso, de estratégias declaradas de um lado e os mecanismos práticos de fazer as coisas, de acontecer, do outro, eventualmente sendo incongruente. Eu acho que essas incongruências estão eventualmente agonizando agora. Isso é fruto de um compromisso que vai crescendo. Você nunca vai chegar ao âmago se você não der uma bela descascada antes. Eu acho que agora em muitas empresas a gente já passou dessa fase da casca e já está chegando ao miolo da coisa.
AÇÕES DO INSTITUTO ETHOS
Eu acho que o Ethos teve um impacto fenomenal. Acho que a capacidade do Ethos em pautar seja imprensa, seja o discurso, sejam as propostas de outras instâncias da sociedade, é muito grande. Isso é uma coisa que vem um pouco de todo aquele DNA do PNBE. Eu lembro, na época, quando o PNBE estava se articulando - isso foi o começo dos anos 90, época de eleições de Fernando Henrique - a sensação que ficou foi muito presente; de que muito daquilo que o PNBE estava falando, fosse do país que temos pro país que queremos, ética na política - tinha uma série de bandeiras ali, de propostas... Porque quando o Fernando Henrique assumiu, elas viraram as propostas, praticamente, do governo. Então teve uma pauta de um grupo relativamente pequeno, mas muito articulado, muito consistente que foi rapidamente assimilada. E acho que isso foi até um dos motivos do PNBE ter se transformado e gerado o próprio Ethos, com as dinâmicas das políticas que eu acompanhei pela margem na época. Eu acho que ele tem uma eficácia muito grande seja nesse sentido de pautar a agenda, de colocar o assunto em vista de uma maneira muito precisa, muito hábil, muito ampla e ao mesmo tempo, e acho que isso é o grande mérito do Ethos, conseguir manter uma consistência técnica pra isso. Eu acho que o Ethos agregou muito e eu acho que um ponto importante é criar instrumentos concretos pra que isso possa também ser colocado em prática. Talvez não seja o instrumento que faz a coisa acontecer, mas ele dá uma concretude por ser um discurso que faz as pessoas chegarem perto e verem sentido nisso. O Ethos, sem os indicadores Ethos não seria o Ethos.
ISO 26 000
Não vai ser mandado selo certificado: ninguém vai ter selinho de ISO 26 000. Ela é um guia de diretrizes. Na medida em que ela seja aquilo que ela pretende ser, ou seja, fruto de um consenso global, de uma participação muito abrangente, ela vai servir pra nivelar expectativas, nivelar entendimentos. A gente hoje está vivendo muito esse momento que é típico das palavras desgastadas. A moda do desenvolvimento sustentável está passando; aí veio a moda da responsabilidade social, que está caindo um pouco; está chegando a responsabilidade socioambiental ou então a sustentabilidade. E as palavras vão sendo esvaziadas de seu significado, quer dizer, a moda que a gente enxerga. E se a gente não der consistência pro significado, a gente perde a capacidade de comunicação e de eficácia do que seria aquela ferramenta de que a gente está falando, aquele conceito. A ISO 26 000 vai ajudar a gente a nivelar expectativas, ou seja, as pessoas, no mundo inteiro, vão poder ter uma referência consensada sobre o que a gente quer dizer quando a gente fala responsabilidade social; o que a gente quer dizer quando a gente fala em sustentabilidade no âmbito da responsabilidade social das empresas e das organizações como um todo. E isso eu acho que vai ser muito poderoso em termos de você cristalizar e de você sedimentar o conceito pra poder construir em cima dele. Eu acho que tem um potencial aí realmente grande, uma rede articulada muito expressiva.
DESAFIOS
Tirando o desafio fundamental de salvar o mundo pela via da sustentabilidade, que eu acho que é o que todos nós temos aqui, que é o fundamental das coisas aqui... Eu acho que não é nem o mundo, eu acho que é a humanidade, porque o está em jogo somos nós e não o planeta; o planeta vai continuar muito depois da gente, ele estava aqui muito antes, não tem perigo quanto a isso. Mas eu acho que o desafio tangível do Ethos é exatamente colocar de uma maneira concreta essa contradição mais aguda que a gente está hoje. Eu digo que existem duas coisas que a gente precisa começar a enxergar, saber que as coisas mudaram: uma é quando os executivos começarem a ganhar em função de metas sociais e ambientais tanto quanto eles ganham em cima de metas econômicas, é transportar o triple bottom line para a remuneração do executivo; aí eu acho que a gente deu um passo. O segundo passo é o planejamento a longo e médio prazo das empresas; quando hoje uma grande indústria, grandes fundos de investimentos fazem projeções de 15, 20 anos pra um investimento, a variável da sustentabilidade está nas contas dele? Quer dizer, aquilo está entrando pra saber se tem um retorno ou não? Enquanto isso não entrar nessa conta, e o cenário for sempre um cenário de crescimento maior ou menor, mas sem ter um limite pensado pra isso porque a sustentabilidade demanda isso, eu acho que a gente ainda vai criar cenários que vão se realizar a longo prazo contra a sustentabilidade e não a favor. Eu acho que tentar tangibilizar isso é o grande desafio.
O terceiro desafio do Ethos, só pra acrescentar mais um, é conseguir que o conceito continue, que as palavras tenham valor. Não é crítica, mas eu ouvi a palavra socioambiental da boca da própria direção. Então eu acho que a gente tem, afinal de contas, tentar dar valor às palavras pra que elas tenham o peso que elas tenham que ter. Não é uma crítica à entrevista, é uma crítica à situação, eu acho que é fundamental.
MAIOR REALIZAÇÃO DO ETHOS
A grande realização foi colocar a responsabilidade social na pauta das empresas. Eu acho que isso é uma coisa que não aparecia, praticamente no vernáculo; não estava na agenda e hoje está. Então eu acho que essa é a grande contribuição e que ela deve se manter muito.
AVALIAÇÃO
Entrevista
Eu achei muito interessante. É uma proposta bonita no sentido de você conseguir sair daquele quadrinho de simplesmente escrever as coisas, pra coletar histórias de vida. Eu acho que é muito bonito a gente conseguir transmitir toda essa objetividade. É uma idéia muito boa pra você resgatar essas histórias todas. Acho que talvez eu quisesse deixar gravado. Uma coisa que me incomodou um pouco ontem, quando a gente viu o vídeo dos dez anos do Ethos, a memória toda, eu senti falta de um cara lá, o Emerson Kapaz, que foi um dos fundadores do PNBE, um dos fundadores do Ethos, uma das pessoas que muito trabalhou nisso e que sumiu. De certo tempo pra cá, teve aquele problema que muita gente viu, ouviu, estava na mídia, a questão dos deputados, do “mensalão”, das ambulâncias, teve aquele problema lá. E, assim, mesmo que o Emerson tenha pisado na bola, feito alguma coisa errada num momento na vida, talvez eu gostasse e gosto de acreditar que não foi bem assim, teve alguma coisa que não estava bem acertada. Mas de qualquer maneira, mesmo que estivesse errada, a gente não pode apagar da memória o que já foi. Eu lembrei daquelas fotos na União Soviética stalinista, que conforme os sujeitos iam sendo expurgados, as fotos iam sendo retocadas por eles não estarem no time anterior. Eu senti muito essa falta na história que foi contada ontem no vídeo dos dez anos. Eu acho que ali tem gente importante que da memória não deve ser apagada.Recolher