IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Josmar Tadeu Inácio, eu sou jornalista e sou paulistano convicto, nessa cidade maravilhosa que pode oferecer a todos o acolhimento. FAMÍLIA O meu avô, Marcelino Inácio, era jongueiro da cidade de Guaxupé. Meu avô foi filho de escravo e por muit...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Josmar Tadeu Inácio, eu sou jornalista e sou paulistano convicto, nessa cidade maravilhosa que pode oferecer a todos o acolhimento.
FAMÍLIA O meu avô, Marcelino Inácio, era jongueiro da cidade de Guaxupé. Meu avô foi filho de escravo e por muitos anos ele contou a história da frente negra de Guaxupé. E acabou sucedendo que o meu pai, como filho mais velho, acabou se tornando um músico de uma orquestra aqui em São Paulo. E o neto, que passou a chamar Josmar Tadeu Inácio, que sou eu, acabou a pesquisa enveredando para o lado das manifestações populares como o jongo, lundu, congada, "moçambique". E engraçado que aconteceu uma coisa na minha vida. Eu me dou muito bem com instrumentos de percussão, aprendi sozinho, foi dom. Engraçado, que eu sempre quis aprender a tocar instrumentos de corda e encontro muita dificuldade. Inclusive através da Universidade Livre da Música, da Pauta Musical, eu sinto dificuldade e acabo largando o curso. Mas na percussão é uma coisa que vem de gerações anteriores e que dá muito certo. Eu acredito que com os meus netos também vai acontecer o mesmo. Mas eu atribuo isso aos antepassados, onde a raça negra, ao mesmo tempo em que era prejudicada, tinha um jogo de cintura pra suavizar um pouco essa sensação de descaso que o negro sofria aqui no Brasil.
ATIVIDADE ATUAL Hoje eu sou jornalista e faço um voluntariado. Há oito anos, eu sou voluntário de uma favela em Heliópolis. Eu comecei com uma rádio comunitária dentro da favela, que pra mim foi muito importante. De dois anos pra cá, eu comecei a aprender a fazer justiça restaurativa, onde a gente aprende a acolher as pessoas, seja o réu, ou seja, a vítima. A gente aprende a equilibrar as duas partes numa forma de ouvir para compreender, criar uma cultura de paz. Porque, na verdade, a gente tem que diminuir um pouco essa violência que ocorre nos grandes centros e, também, que a mídia impõe dentro da nossa casa. Você tem que andar com tranqüilidade. Mas a mídia diz que você tem que andar com muito cuidado, que qualquer pessoa é um estranho e pode acontecer o pior. Na verdade não é isso. Todos nós somos carentes, a gente precisa se acolher. Nós somos semelhantes, portanto eu acho muito interessante. Acabei de sair de uma palestra do educador Mário Portela e ele dizia dessa importância de que como a gente vive melhor, porque somos ímpares e a gente aprende a ser mais humilde a partir do momento que a gente acolhe o outro.
Eu me sinto muito melhor dentro da favela de Heliópolis do que na Granja Viana. A verdade é o seguinte, eu aprendi a lidar com esse público, essa comunidade de pessoas muito simples, mas muito acolhedoras. Eu me lembro do início da Orquestra do Baccarelli, onde os meninos da orquestra do Baccarelli queriam mostrar um pouco do que sabiam. E graças ao Baccarelli, essas crianças tiveram oportunidade pra se destacar. Eu fico muito feliz aqui, inclusive de dizer que o Adriano Costa, um menino de 15 anos que há dois anos atrás estava no ostracismo, é um menino persistente, perseverante. Ele, durante seis, sete horas, ele tocava um instrumento de contra baixo acústico, que é o pai do violão. E esse moleque tinha muita dificuldade dentro da favela pra se deslocar com esse instrumento grande dentro da favela. Enquanto isso, os companheiros, que eram do pagode, ficavam nas esquinas e achavam que ele era um burro de carga, porque quando ele passava: "Meu, olha o tamanho do instrumento que o cara carrega". E todo mundo não valorizava ele. E Deus é muito justo porque há um ano e meio atrás, o maestro Zubin Mehta esteve aqui em São Paulo, foi convidado pelo Baccarelli pra conhecer o espaço dentro da favela da orquestra do Baccarelli e ele ficou lisonjeado pela performance desse garoto de 15 anos. E ele falou: "Eu quero esse menino; vou levar pra Israel". Hoje, Adriano Costa, faz parte da orquestra filarmônica de Israel. Isso é uma das coisas que não sai na grande imprensa. As coisas bonitas que têm em São Paulo são mais difíceis de sair. Mas a gente fica muito feliz por ter acontecido isso. Outras coisas que têm lá dentro: tem um pedreiro que fez uma casa nos moldes de Gaudi; tem a lavanderia comunitária, que inclusive a Ana Maria Braga é a madrinha. As pessoas vão lá, agendam pra poder lavar a roupa. Porque é tudo muito próximo uma casa da outra, são casas de alvenaria e posso lhe dizer: são 135, 136 mil pessoas que moram dentro da favela de Heliópolis. Poderia ser considerado um bairro, uma cidade e as pessoas vivem muito bem. Inclusive eu posso citar um caso aqui que diziam que o PCC estava atacando em São Paulo. Engraçado que tinha mais segurança dentro da favela do que nas avenidas principais de São Paulo. Porque é um povo muito ordeiro, é um povo muito profissional e eles não querem encrenca com ninguém. Eles só querem ter oportunidade de estar mostrando alguma coisa. É uma comunidade em que os próprios governantes não dão muita atenção. São poucos aqueles que dão atenção pra comunidade de Heliópolis.
SUSTENTABILIDADE Para mim é muito importante essa questão da sustentabilidade. As pessoas têm que saber que ser sustentável até o ser humano tem que ser. Uma relação a dois, a gente tem que ser sustentável, porque se a gente não passar pela sustentabilidade, a gente vai acabar se definhando. E a coisa mais importante é que as pessoas têm que saber que reciclar um produto, seja ele plástico, seja ele borracha, não é só fazer isso dentro de casa. Porque na verdade eu escuto falar, ou então como “caminheiro”, andando 25, 30 quilômetros, seja em cidade, ou no caminho do sol, no caminho da fé, ou no circuito das frutas, a gente encontra casas suntuosas de às vezes 800 metros quadrados, com aqueles muros elevadíssimos e inclusive com arame farpado, cercando como se fosse uma fogueira. E aí, perguntando pra alguns, eles acham que a casa deles é do muro pra dentro, só que ele esquece que do muro pra fora também pertence a nossa casa. E na verdade a mãe terra é o globo e a gente tem que aprender a respeitar a sustentabilidade. A natureza está mostrando aí em vários países o que acontece, as geleiras. Então as pessoas têm que ter essa consciência de que sustentabilidade é muito mais do que a sua própria casa. Ou então: "Ah, eu não jogo toco de cigarro aqui dento de casa." Mas na rua, ele joga. Isso é uma coisa rara: “Não, papelzinho de bala aqui não. Minha casa, olha pra você ver, minha casa é maravilhosa". Mas no lado de fora, se ele está num ambiente, ele acaba jogando um papelzinho. Ou ele vai fazer uma compra, ele compra em excesso e isso vai prejudicando cada vez mais o planeta. E essa questão da responsabilidade social, também é muito importante porque as pessoas já estão aprendendo a se conscientizar. Inclusive hoje as pessoas estão muito mais atentas às empresas que fazem um retorno através da responsabilidade. Então eu só compro um produto determinado se essa empresa faz uma responsabilidade social, então isso já é uma conscientização. Ainda é um trabalho de formiguinha, mas eu acho que num período tão próximo, a gente já pode falar um pouco mais com tranqüilidade com relação à sustentabilidade. E eu fiquei sabendo de uns dados ontem: que 40% das famílias já praticam algum tipo de ação social, fiquei muito feliz de saber isso. Quarenta por cento das famílias, é muito bonito. Porque, por exemplo, na favela de Heliópolis antigamente as pessoas jogavam tudo, descartavam tudo no muro do vizinho. E isso acarretava uma série de problemas, inundações. E isso hoje não. Tudo é recolhido. Inclusive uns produtos em saquinhos separados, reciclados. E a coisa mais importante, que foi muito simples que eu vi, principalmente, nas pessoas de mais idade, onde elas não carregam sacola de plástico, é sempre aquela sacolinha de sisal, que elas vão buscar o leite, o pão. Que é uma coisa que a gente já tinha isso, há 30 anos atrás e que está voltando novamente. Essa é uma forma também de ajudar a natureza.
Na verdade, pra sustentabilidade é a questão do consumo. As pessoas hoje, elas estão muito mais envolvidas nessa questão de respeitar a natureza. Porque se começa a comprar tudo muito supérfluo, você acaba deixando em casa e você não dá a mínima para as coisas. Então não tem necessidade de você comprar um produto de alta tecnologia, você tem que comprar um produto que satisfaz você dentro de casa pelo tempo que você fica dentro de casa. É o seguinte, nós somos ciganos. A gente vive oito horas no trabalho, três horas dentro da condução e aí pra você conseguir passar oito horas dentro de casa vendo televisão, escutando som, MP3... Ninguém vai. Então, você tem que aprender a diminuir. Eu acho que as pessoas estão muito mais atentas, que a coisa mais importante hoje é você estar compenetrado numa música diferente. Isso dá a vida pra você, você não se envolve tantos nos seus problemas de sofrimento. A questão de você estar lendo um livro, que é muito importante pro conhecimento – hoje, o conhecimento não tem profissão, você tem que ser polivalente, você tem que aprender um pouco de cada coisa... A mesma coisa é religião, aprenda um pouco de cada coisa, desde que satisfaça você. Tudo que é bom vale à pena se a alma não é pequena. Então a pessoa acaba sendo mais acessível, sendo mais tolerante, ela aprende a acolher melhor às pessoas. E isso acaba ajudando a comunidade.
COMUNIDADE DE HELIÓPOLIS Acesso à informação Hoje a comunidade tem vários acessos, porque está sempre sintonizada no que está acontecendo. Tem a rádio comunitária lá dentro. Eu acho até salutar porque a gente tem um programa saúde, que inclusive era vinculado à faculdade de saúde pública da USP. Então essa questão também do conhecimento: tem pedagogos, educadores, médicos, que estão sempre falando sobre um determinado tema e eles vão buscar isso também lá fora. Eu acho que não basta ter só um computador na sua casa, mais um aparelho que vai ficar entulhado na tua casa. Se você não tiver um computador, usa o do Telecentro, usa do amigo, usa da escola. Você aprende a mesma coisa. A coisa mais importante é você poder buscar o conhecimento, ir atrás. Porque ninguém vai poder descobrir você dentro de casa. Então, na verdade, o encontro como esse daqui, uma conferência internacional, que mesmo se a pessoa não puder fazer a inscrição, mas que venha como ouvinte, tem muita coisa importante aqui. Tem aqui a exposição, palestra, cada uma melhor do que a outra. Então eu acho que é uma coisa valiosa, o Instituto Ethos está de parabéns Eu conheço muitas ações do Instituto Ethos e eu acho que estão melhores a cada vez. A gente está sintonizado no Instituto Ethos, numa responsabilidade, numa sustentabilidade. Porque as pessoas ficam: "Ah, a novela da Isabela, Isabela, Isabela", todo dia a mesma coisa. Meu, desliga a televisão e vai procurar um outro tema. Eu não me conformo com isso porque já estava se tornando uma situação crítica, várias famílias não conseguiam mais ligar a televisão porque era a Isabela, 24 horas. Não é possível que isso exista, é esse tipo de coisa. E a sociedade não precisa disso, a sociedade precisa de tranqüilidade. Eu indo à Praça da Sé, muito tranqüilo, seja qualquer hora, em qualquer lugar da minha cidade, eu vou muito tranqüilo. Porque eu aprendi a conversar com as pessoas, aprendi a respeitar e a cumprimentar também. Quando você fala bom dia, você está desejando o bem pra outra pessoa, que é coisa mais importante: “O cara falou bom dia pra mim, eu acho que aquele cara é louco". Não, ele não é louco, não. Ninguém fala bom dia, ninguém olha pra cara do outro. Você entra no ônibus, as pessoas se escondem. E não é só São Paulo, não. Eu tenho uma vivência em outros estados e eu fico impressionado com o estresse das pessoas. Com tudo isso que existe aqui na minha cidade de São Paulo. Eu vou daqui pra qualquer estado e me sinto muito bem, com a maior tranqüilidade. Não sou de falar mal de São Paulo, não. Eu acho que São Paulo tem muita coisa boa que pode ser mostrada, mas que a grande mídia não mostra, esconde. Então as pessoas, precisam se abrir mais, descobrir novos horizontes.
CONFERÊNCIAS ETHOS Não só novos horizontes, como novos modelos de vivência, mudança de paradigma que é uma coisa muito importante pra essa questão da sustentabilidade. As conferências são importantes porque a gente aprende a ser mais amigo, com as pessoas, é outro nível. Toda vez que eu encerro uma correspondência, eu digo lá: "Eu desejo prosperidade". E tem algumas pessoas que falam: “Ele é diferente, ele deseja prosperidade". Eu digo que prosperidade não é só dinheiro não. Prosperidade é você sair de cabeça erguida, é você estar sorrindo para as pessoas. E isso é legal. Ontem, eu vi uma situação que me chamou atenção porque o João Dória Júnior, que abriu a Casa Cor agora, na semana passada, ele é um cara muito perseverante. E ele aprendeu a tratar melhor as pessoas. E, às vezes, a distância, a gente fica com aquela ojeriza: "Ah, porque ele está na TV, ele é isso, ele é aquilo". Mas olha, no tratamento ele é totalmente diferente, é mais um paulistano que aprendeu a ter uma forma diferente de tratar as pessoas. Às vezes, a gente nem olha na cara, sai correndo, não cumprimenta. Depois encontra no ônibus: "Ah, eu conheço aquele cara, mas não sei de onde." E aqui no Instituto Ethos a gente se sente como numa família e isso é muito importante pra mim e pra minha comunidade.Recolher