Projeto: Acervo - Memória dos Brasileiros
Depoimento de Aldo da Cunha Rebouças
Entrevistado por Karen Worcman e Cláudia Leonor
São Paulo, 23/04/2007
Realização: Museu da Pessoa
MB_HV001
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Paulo Ricardo Gomides Abe
P/1 – Então,...Continuar leitura
Projeto: Acervo - Memória dos Brasileiros
Depoimento de Aldo da Cunha Rebouças
Entrevistado por Karen Worcman e Cláudia Leonor
São Paulo, 23/04/2007
Realização: Museu da Pessoa
MB_HV001
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Paulo Ricardo Gomides Abe
P/1 – Então, a gente vai começar perguntando uma coisa muito simples, o seu nome completo, local e a data do seu nascimento.
R – Aldo da Cunha Rebouças, meu nome completo. E eu nasci em Peixe Gordo, lá no Ceará, e vim para São Paulo já com doutorado fora da USP. O que me virou dificuldades de entrosamento com os colegas e os alunos. E eu vim para resolver o problema da água na USP e fundei um Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas na USP.
P/1 – Então, antes do senhor chegar na USP e fundar esse centro, vamos voltar lá para o Ceará. Qual era o nome da cidade que o senhor nasceu?
R – Peixe Gordo.
P/1 – A cidade se chamava Peixe Gordo?
R – Peixe Gordo.
P/1 – E como era o nome dos seus pais? Eles também nasceram em Peixe Gordo?
R – Nasceram em Peixe Gordo. Ele era da região, e ela era vizinha quase à casa que ela ficou, de uma via a outra.
P/1 – Ah, é?
R – É. Papai colocou a casa em uma duna, e que descia a duna e via lá em baixo a casa da mãe dela, a casa da Dona Sinhá, que era minha avó.
P/1 – Então a Dona Sinhá morava em Peixe Gordo lá perto da praia, que ela morava?
R – Perto da praia. Peixe Gordo fica no Vale do Jaguaribe, perto da praia no Ceará, já fronteira com o Rio Grande do Norte. Quando você chega lá, tem ______ do Tibau, que é uma espécie de promontório de cabo que vira areia branca, tibau. E tibau a gente tira com a maré, areia branca a gente __________, marés de tibau. Porque quando chegava na ponta da pedra, já estava a maré batendo que você não podia passar. Então tinha que ficar em Tibau. Ficava um dia todinho lá esperando a maré descer até o caminhão poder passar.
P/1 – Era um caminhão que tinha que passar pela maré?
R – Caminhão.
P/1 – E como era o nome do seu pai e da sua mãe?
R – Era João Cunha Rebouças e Maria do Carmo Rebouças.
Eram dois nomes que eram muito conhecido na região, e papai era um médico, engenheiro, e fazia de tudo. Juiz, e tudo.
P/1 – Ele era tudo isso? Juiz, médico...
R – Era tudo.
P/1 – E engenheiro?
R – Juiz, médico e engenheiro. Ele fazia de tudo. Quando muita gente vinha a cavalo pela estrada do Peixe Gordo, e quando chegava na frente da minha casa descia o Fulano que estava brigando com o outro, que estava sentado: "Ah, você aí, está tomando conselhos com..." (risos) O meu pai era juiz na hora, era juiz. Ele dizia assim: "Não, eu estou aqui por questão do meu filho que ele caiu do cavalo, caiu do coqueiro e quebrou um braço." Ah, era médico. O outro descia do cavalo e ia ajudar o vizinho que era médico, papai era médico então. Ele dizia assim: papai era um homem de tantos instrumentos, que ele gostava muito de ler. Ele ficava na varanda só lendo, só lendo, só lendo, física.
P/1 – Física que ele lia?
R – Física. Lia muita física.
P/1 – O senhor lembra o tipo de livro, um livro importante que o senhor...
R – FTD. A coleção FTD ele lia toda a coleção. E quando ele me colocou no colégio que eu fui para o colégio em 50, então ele passou a ler o meu livro do colégio.
P/1 – Mas ele estudou fora de Peixe Gordo? O que é que ele...
R – Ele estudou fora de Peixe Gordo, e estudou muito no Recife.
P/1 – Em Recife.
R – Em Recife, que era capital do Nordeste na época.
P/1 – Ele tinha muitos irmãos?
R – Tinha, ele tinha 18 irmãos. 18 irmãos e irmãs.
P/1 – Todos filhos da Dona Sinhá.
R – Todos filhos da Dona Sinhá, mas era de João Pedro Cunha. Que era inimigo do pai de mamãe.
P/1 – Ah...
R – (risos)
P/1 – (risos)
R – Era inimigo do pai da mamãe.
P/1 – Como é que foi então que ele conseguiu casar com a filha do inimigo?
R – Ah...
P/1 – O senhor precisa contar essa história.
R – Essa história, essa história foi muito engraçada. Porque papai logo cedo saiu, despegou da família dele e foi estudar em Aracati, em Mossoró, em Recife. Se formou por lá e voltou para Peixe Gordo. E quando chegou em Peixe Gordo ele não tinha mais condições de voltar para a casa dele. Porque os filhos, os irmãos dele eram todos analfabetos. Então ele não tinha condições e ficou fazendo aquele negócio de trambique de engenhos.
P/1 – Que é que é trambique de engenhos?
R – Desenvolvendo os engenhos de cana-de-açúcar. E arranjou uma licença para produzir açúcar, e deu para o pai da mamãe. Que era quem tinha o engenho de açúcar mais próximo dele. Daí surgiu o namoro dele com a mamãe dentro do engenho de açúcar. E o pai dela já se aproveitou dele para mandá-lo para fazer o curso fora em Aracati e companhia, que era uma cidade importante na época. Que foi capital do Ceará e que foi, e que tinha umas enchentes muito violentas, que o Jaguaribe era a foz do Jaguaribe.
P/1 – Aracati é na foz do Jaguaribe?
R – No Jaguaribe, do Rio Jaguaribe. E o Rio Jaguaribe descia como um louco do interior através das estruturas geológicas, que são rifts, vales, que significam vales profundos. Em 1911, o americano fez uma consultoria lá na região e marcou vários locais de barragem. Mas era um topógrafo, um americano. Era um topógrafo. E ele só via o boqueirão onde podia construir a barragem, nada geológico, nada, nada. Isso aí não passava pela cabeça, não, em 1911. E montou-se a rede hidrométrica do Brasil lá pelo Nordeste. Onde tinha maiores dados, mais longos dados desde o desenvolvimento de Fortaleza tinha um pluviômetro que registrava as chuvas que ocorriam na capital. E Fortaleza foi considerada a cidade mais limpa dos trópicos porque o seu excremento era jogado nas dunas, e como elas não voltavam, retornavam, aí cidade ficava limpa. O lixo era todo jogado nas dunas, e como as dunas eram impermeáveis também não voltavam na cidade. Aí a cidade era considerada a capital dos trópicos, Fortaleza.
P/1 – Isso no início do século? 1911.
R – No início do século.
P/1 – Mas aí, quer dizer, esse americano bolou essas bacias e isso não impedia as enchentes, é isso?
R – É, exatamente. Ele construiu as barragens e não impediu as enchentes. E a Barragem de Orós chegou a ter quatro bilhões de metros cúbicos de água, uma das grandes barragens do mundo. E quer ser ufanista. O cearense ufanava porque tinha a maior barragem do mundo, até que surgiram as enchentes que a Barragem de Orós foi construída na década de 50. Mas quando chegou Juscelino ela quase que estourou, porque o rio passava por cima. Eles fizeram umas plantações, fizeram lá um negócio e Orós não sofreu nada, a cidade de Orós. E tinha um processo muito político da barragem. Muito politizadas as barragens.
P/1 – Nessa época que ela foi construída.
R – Foi construída. Aí Juscelino terminou Orós e era previsto uma usina hidroelétrica lá em Orós. Porque Orós tinha mais de 11 metros da altura, 14 metros de altura, a a barragem de Orós, uma barragem em arco. A primeira que foi feita na região. E o Ceará se ufanava porque tinha uma barragem de arco do mundo, mas não soube aproveitar nada.
P/1 – Isso não mudou muito toda a parte de irrigação e de seca, nada?
R – Nada. E aí a irrigação era feita dentro lá em Lima Campos, na cidadezinha de Lima Campos, que ficava a Barragem de Orós, já através de um canal que trazia água de um afluente do Jaguaribe e despejava no Jaguaribe, e que já tinha uma barragem, e que seguia para o Jaguaribe. E descarrega em Orós. E já foi ______ da Sudene.
P/1 – Então agora vamos voltar de novo lá para trás. O seu pai estava trabalhando em engenho de açúcar. Mas eu tenho uma pergunta: por que é que com tantos irmãos analfabetos e no meio do Ceará, o que é que fez com que seu pai fosse estudar fora? Quem mandou ele? Por que é que ele acabou se formando em engenharia? O que é que aconteceu?
R – Ele se formou, ele na verdade, ele não terminou os estudos, não. Ele se formou e ele criou o gosto pela leitura, e lia muito livro, que ele lia tudo, que daí transformou-se em juiz, e você sabe como é que é. No interior o juiz é o homem que decide a sorte das pessoas.
P/1 – Então ele virou o doutor da região, é isso?
R – O doutor da região.
P/1 – E ele tinha dinheiro ou ele era pobre? Como ele era?
R – Ele era pobre, paupérrimo, e só tinha a casa que ele construiu e que já era uma casa muito avançada para a época. Porque ele tinha os banheiros integrados, e tinha sanitários integrados, e tinha todas as coisas hoje que a gente quer em uma casa de campo.
P/1 – E ele que construiu essa casa?
R – Ele construiu a casa.
P/1 – E nessa casa que o senhor nasceu?
R – E nessa casa que eu nasci. E é a casa mater hoje, casa mater. De um condomínio que a gente tem lá. Que a gente estabeleceu condomínio. ________ não chegaram nem a dividir as terras, se fosse dividir ia ficar um coqueiro para um...
P/1 – (risos)
P/2 – (risos)
R –
(risos) Ia ter outro. Então não dividiram _____ fundos porque a lei não permitia. E a gente vendeu o córrego e a lagoa do sal que tinham terrenos maiores, e ficou com o terreno do engenho que era um terreno menor. E ficamos todos os 16 filhos, 17, dentro desse terreno. E aí foi feita uma divisão: parte comum e parte geral. E os filhos hoje estão na parte geral, e os filhos de _______ estão na parte comum.
P/1 – E todos contribuem, não?
R – E todos contribuem. E isso está uma confusão. (risos)
P/2 – (risos)
R – E todos contribuem mas contribuiu porque quis, pagou a luz porque quis, eu não pedi. Ah, não é fácil, não.
P/1 – Imagino.
R – _________
P/1 – Mas então ele conheceu a sua mãe, filha do inimigo...
R – Inimigo, exatamente, e se bandeou para o lado do inimigo, e ficou trabalhando com o inimigo, que era o pai de mamãe. E desenvolvendo os engenhos, e foi para Aracati e fez estágio lá em Aracati. E lá conheceu muita gente também, como o, como chamaríamos? Era o Jesuíno, e como o Pedro Correa, e como o Doutor, como era o nome do doutor? Era, e tinha uma mulher que era, colocava apelido em todo mundo.
P/1 – Ah, ela colocava apelido em todo mundo?
R – Em todo mundo. Era uma mulher que ia na porta e só colocava: "Ah, olha aquele." _____________________ parece um rato, parece um gato. E aí saía, ele, era como era o nome dela? Ai, hoje eu falei o nome dela. Hoje eu falei o nome dela, agora está escapando.
P/1 – Deixa, não tem problema, quando o senhor lembrar o senhor volta. Mas e os pais dele então cortaram relações com ele? O pai dele? Ele mudou de família?
R – Cortaram. Mudou de família.
P/1 – E aí como, o senhor é o primeiro, segundo, terceiro irmão?
R – Eu sou o segundo.
P/1 – O senhor lembra do nome de todos os seu irmãos?
R – Todos os 16 sei.
P/1 – Então o senhor pode dizer?
R – É Maria Edite, que é a mais velha. Aldo, Jaime, Aldenor, Aldenir, Maria do Carmo, Arimatéia, Giselda, Margarida, Gilson, Algerildo, Tadeu, Aldenor e Ari. Porque foram 17, Ari e Anedite. Anedite que foi já composição de nomes Ana, Edite, Anedite.
P/1 – E essa coisa de A, é por quê?
R – O A é porque é a primeira letra do alfabeto. Aldo, Jaime, Jaime já foi lá atrás. Mas Aldo, Aldenor, Aldemir a primeira letra do alfabeto. Aldo, Aldenor, Aldemir e Maria do Carmo e Giselda, Margarida, que era nomes comuns na região. E que eles usavam o alfabeto para marcar os nomes.
P/1 – E todos nasceram nessa casa que ele construiu.
R – Todos nasceram nessa casa que ele construiu.
P/1 – E como era então o dia-a-dia nessas casa? O que o senhor lembra? Eram 18 crianças, a sua mãe, o seu pai. Quem mais morava na casa?
R – Moravam as empregadas.
P/1 – Tinha muitas empregadas?
R – Muitas. Muitas. (risos)
P/2 – (risos)
R – Muitas. Maria Cazuza, que era encarregada da lavagem de roupa. E tinha cada um com uma especialidade. Maria Cazuza que era encarregada da lavagem de roupa. E tinha Maria José, que era encarregada da gente. E tinha Maria das quantas lá, que era encarregada de outro setor. E tinha Maria Josefa que era encarregada de outro setor. Eram seis, sete empregadas, e mamãe administrava tudo.
P/1 – Quer dizer, ela cuidava da...
R – Cuidava de tudo, da gente. Muitas vezes a gente fazia as lições do colégio, da escola, porque meu pai montou uma escola no sítio dele porque dizia que esses garotos ou você aprende a ler ou não vão ter futuro nenhum. Porque ele não tinha futuro nenhum. Ele disse: "Eu não vou arrumar terras só para deixar para vocês, porque vocês vão no fim rasgar os sacos, e rasgar as chitas, e rasgar, se rasgar, e eu não quero deixar nenhum bem. O meu bem é, o bem que eu vou deixar é na cuca de cada um." E eu saí para fazer o colégio, minha irmã foi já para o colégio de freiras, ser freira. Maria Edite foi freira, irmã de caridade. Jaime foi ser marista. Com isso ele abriu as portas para a gente, porque os maristas vinham muito passear lá em casa e voltavam com os burros cheios de mantimentos. Eles descobriram uma maneira de, papai compensava o meu internato lá no Colégio Marista em Aracati com os mantimentos que ele fornecia, e o colégio ficava tranqüilo. (risos)
P/2 – (risos)
P/1 – (risos)
R – Das despesas. Eu fiquei no colégio em Aracati, eu era o diretor de esportes e diretor da parte social. Então quando eu ia lá a Fortaleza, buscava um filme, trazia, passava para o diretor do colégio. Ele tinha que ver antes. Porque quando passava aquelas cenas de beijos era "tic, tic, tic, tic" (risos) ele passava as cenas de beijo ele colava um durex na máquina e passava aquilo sempre tremido. Ele dizia assim, ele dizia: "Para, para, para, essa cena de beijo está..." Ele ia assistir toda cena de beijo punha, ele passava durex. _____________
P/2 – Era um colégio religioso?
P/1 – Marista.
R – Religioso, colégio marista. Irmão marista. Que fazia aqueles cineminhas. Eu vi outro dia um filme que apareceu muito, que era, parecia esse filme era eu escritinho. Era, era aquele filme do Cinema...
P/1 – Paradiso?
R – Paradiso. Cinema Paradiso, eu me achei, me identifiquei muito com aquele cinema. Porque era exatamente o que eu fazia. Eu ia lá e embarcava o filme e trazia, lá em Fortaleza. Trazia o filme para Aracati e chegava tinha que submeter ao diretor. Ele fazia a censura do filme. (risos)
P/1 – Mas isso o senhor tinha que idade?
R – Eu tinha o que? Eu voltava de Areia Branca, que eu estava, eu fui primeiro para Areia Branca. Areia Branca é um porto no Rio Grande do Norte que fica, a gente vê o porto lá de casa. Que fica a pequena distância lá na ____ do Mel, no Rio Grande do Norte. Eu fui lá para Areia Branca, na casa de uma prima. Foi bom, que era muito boazuda. (risos) E que mais ela era meio embarcadista. Ai meu Deus, quando eles estão levando para ___________ e eu vinha a pé de Areia Branca para casa. Muitas vezes eu vim a pé.
P/1 – Quanto tempo levava?
R – Levava um dia de viagem. Eu vinha a pé nas férias e na semana Santa.
P/1 – Mas então o senhor estudou em casa até que idade mais ou menos, o senhor lembra?
R – 11 anos.
P/1 – Até 11 anos.
R – 11 anos.
P/1 – E tinha, qual era o, em casa como funcionava a escola em casa? Tinha um professor, dois?
R – Tinha um professor.
P/1 – Um professor.
R – Um professor, ___________ que era encarregado de fazer o mixing.
P/1 – Ele dava aula para todo mundo?
R – Todo mundo.
P/1 – Quem tinha uma idade, outra, outra, tudo junto?
R – Tudo junto.
P/1 – Como funcionava isso?
R – Funcionava na base da palmatória. (risos) E na base da máquina de costura. Que mamãe mantinha a gente, a gente só tinha que, só podia brincar na areia depois que fizesse a lição. Então mantinha a gente sob cabresto mantendo aquele ____________ papai.
P/1 – Mas assim, ele dava aula todos os dias?
R – Dava todos os dias.
P/1 – De manhã?
R – De manhã e a tarde.
P/1 – Ah, o dia inteiro?
R – Dia inteiro, todos os dias, dia inteiro.
P/1 – E o senhor gostava daquilo?
R – Não, não gostava, não. (riso) A tabuada eu fazia assim: "Dois vezes dois, cinco." A mamãe ficava brava: "Esse moleque ele sabe, ele sabe." Ela dizia: "quatro." Quando ela dizia quatro, dois, dois é quatro, ela ficava radiante de alegria. Mas eu sempre, eu fui muito travesso.
P/1 – E os seus irmãos também, eles eram aplicados? Tinha alguns que...
R – Não, era muito aplicados. Jaime era muito aplicado, e a Maria Edite era muito aplicada. Tanto assim que eles foram para os colégios de Aracati...
P/1 – E o marista.
R – O Marista de Aracati, o Jaime foi primeiro, e o colégio das freiras. Porque durante o período quando eu vim no fim do ano, os maristas estavam lá em casa fazendo férias. Eu entrei em contato com eles e fui para Aracati já para o segundo ginasial.
P/1 – E lá o senhor ficou interno então, no Colégio Marista?
R – Fiquei interno.
P/1 – Sozinho ou com seu irmão, ou com vários irmãos?
R – Sozinho com o Jaime. Com o Jaime, com um irmão.
P/1 – Os outros irmãos depois foram estudar também no Colégio Marista?
R – Foram. Tarcísio, Gilson, Adenildo, Tadeu, Aldenor, foram todos estudar no Colégio Marista. E todos foram padres, foram seminaristas.
P/1 – Quantos viraram padre então?
R – Ninguém.
P/1 – (risos)
P/2 – (risos)
R – (risos) Só usufruíram das benesses da igreja. Ninguém virou padre.
P/1 – Ninguém virou freira também?
R – Ninguém virou freira.
P/2 – Mas sua mãe queria que alguém fosse religioso?
R – Ah, queria, queria. Mãe do interior gosta do filho religioso, porque tem aquelas mordomias a mais. Eu tinha tanto problema com o padre que lá em casa a gente hospedou os padres que moravam na região. A gente hospedava as igrejas que meu pai construía, ele hospedava todos os funcionários do engenho. Ele hospedava todos os funcionários da construção civil. Tudo que tinha que passar na _________ do meu pai ele absorvia.
P/1 – E, mas o senhor achava os padres, qual o problema que o senhor teve com os padres?
R – O Padre Marcondes, que era um velho, e que tinha um cavalo muito bonito.
E ele chegava às três horas da manhã e dizia assim: "Aldo, vai ver o meu cavalo se ele está comendo milho." Eu ia lá, via o cavalo do padre, ele estava comendo milho coisa nenhuma. Eu voltava: "Ele está comendo, está comendo, está comendo. Está lá muito bacana, bonito o cavalo." O Padre Marcondes, ele construiu a igreja de Manibu, a Igreja de Peixe Gordo, a capela de Melancias, a capela, todas as capelas da região praticamente ele construiu.
P/1 – E o seu pai ajudou?
R – O meu pai era o pedreiro, ajudou tudo. De Ibicuitaba, que era uma cidadezinha, que era uma vilinha na época, desde o começo do século. Ibicuitaba, que tinha um cajueiro que ia até a praia. E lá tinha muitos comunistas. Que no tempo da guerra sofreram muito. E papai dava cobertura a esse povo. Papai era muito democrático, era muito social. Era difícil de entender o velho. Porque ele conosco era rígido, mas com os outros ele era folgado. (riso) Com o povo já era folgado, mas com nós era rígido.
P/1 – Ele era muito bravo com vocês?
R – Muito bravo conosco.
P/1 – Ele batia em vocês?
R – Batia muito. Eu levei uma surra porque eu cheguei, vinha de Andamexa, foi uma herança que ele teve lá do pai dele, de Andamexa para Peixe Gordo. E eu cheguei molhado em casa. Ele disse: "Tomou banho na Rombada." Rombada era um riacho que passava na frente da praia que a gente chamava Rombada. Ele disse: "Tomou banho na Rombada, venha cá." Eu cheguei, ele tirou o cinturão e me largou o cinturão. (riso) Cinturão é aquele puxa assim, o cinto. Eu disse: "Não, não vou apanhar mais." Os primos, os que moravam ao lado, o Aureliano e o Aurélio, eram irmãos, e eram gêmeos. E os primos ____________ eu dei um castigo nos primos. Desses de brigar muito com os primos. Até hoje eles lembram da surra que eles levaram no corredor, corredor da praia. Que aí eu vinha de carro, em um jipe, e pelo corredor da praia. Eles ficaram aquele espantado.
P/1 – Mas por que o senhor bateu nos seus primos, eu não entendi?
R – Porque eles gozaram na surra que eu levei do papai.
P/1 – Entendi.
R – É. Eles me gozaram.
P/1 – E a sua mãe também era brava desse jeito?
R – Não, não, minha mãe era daquelas de colocar panos mornos em tudo que dizia respeito aos filhos.
P/1 – E nessa época depois então o senhor foi estudar nos Maristas e de lá o senhor foi para Areia Branca, é isso?
R – Não, eu fui primeiro para Areia Branca, depois fui para os Maristas. No segundo ano é que eu fui para os Maristas. Eu já fui para os Maristas com o primário completo. Que era a condição que papai estabelecia: "O primário vocês vão ter aqui. Quando vocês tiverem com 11 anos, 10 anos aí vão para os Maristas." E assim foi até o Gilson, Algenildo. Tadeu, Aldenor, é, Algenildo. Algenildo que é o décimo da lista, ele é dez. _____________
P/1 – E os outros sete, o que é que aconteceu com eles?
R – Os outros sete? Os sete primeiros?
P/1 – Os sete últimos.
R – Os sete últimos foram se formando mas já nas casas dos outros. Como eu fui a Recife e passei no vestibular, eu chamei todo mundo que tinha condições de ir ao colégio para colocar na Sudene. Coloquei na Sudene ou nas companhias da Sudene. E Giselda...
P/1 – Os seus irmãos, o senhor chamou para botar na Sudene.
R – Na Sudene.
P/1 – Para poder estudar e trabalhar.
R – Estudar e trabalhar. A Giselda, Maria Margarida. Margarida saiu muito cedo para casar. Foi a primeira que casou lá em casa, Margarida. Já era a quarta.
P/1 – Qual era o seu irmão ou seus irmãos prediletos, ou irmã? Com quem o senhor realmente se ligou?
R – Maria Edite, Giselda, Tadeu e Aldenor, foi que eu mais liguei.
P/1 – Mas por algum motivo especial ou pela idade?
R – Talvez pela idade, porque foi os... Até o Aldenor foi mais ou menos pelo convívio. Depois não convivi mais, eu não tinha mais condições de conviver com os mais novos. Eu já estava...
P/1 – Já estava saindo.
R – É, saindo.
P/1 – E aí quando o senhor foi para Recife, o senhor foi fazer vestibular, o senhor fez vestibular para quê?
R – Para Geologia.
P/1 – E por quê?
R – Por quê? Porque a Petrobras oferecia uma bolsa de estudo, porque pagava para você estudar. E eu no começo, eu fui para Fortaleza, fiz o científico em Fortaleza. Terminei o científico e fiz o CPOR. Um coronel do CPOR é que me trouxe a notícia de que se estaria dando alguma bolsa de estudos para você estudar. Então eu vim em busca da bolsa, ter essa condição de estudo, de estudar. Passei em setembro, terminei o CPOR, e vim transferido para Recife. Fiz o cursinho, fiz o cursinho, estudei só, que eu não tinha dinheiro para pagar o cursinho. E estudei só e fiquei morando, almoçando nos maristas.
P/1 – O senhor morava com os maristas nessa época?
R – Eu morava com os maristas. Morava atrás do colégio deles, mas quando terminava as aulas eu já sabia: era hora de eu ir descer e caminhava e vinha, fazer o circuito do quarteirão e vinha, entrava no colégio.
P/1 – Por que, me explica melhor isso.
R – É porque eu tinha que almoçar todo dia nos maristas.
P/1 – Mas o senhor não podia mostrar que estava lá dentro?
R – Não.
P/1 – Por quê?
R – Porque eles tinham uns problemas de não darem muita bandeira. Você tem que ficar mais ou menos escondido, porque o meu protetor não era bem visto no maristas. Então tinha Associação dos Antigos Maristas, que eram alunos que tinham uma casa e eu fiquei vizinho a essa casa. Isso já por força do Irmão Daniel.
P/1 – Então o senhor ficava mais ou menos escondido, fazendo vestibular, estudando sozinho nos maristas lá em Recife. E nessa época o senhor já saía com amigos, namorava, como é que era a sua vida? Quantos anos o senhor tinha essa época?
R – Eu tinha 18 anos de anos.
P/1 – Isso, então como é que era a sua vida no Recife? O senhor saía à noite?
R – Saía muito à noite.
P/1 – Que é que o senhor fazia de noite?
R – Fazia muita coisa, muita arruaça. Porque eu fiquei com seis bolsas de estudo, no fim eu tinha a bolsa da Capes, que era da campanha do CNPQ. Eu tinha a bolsa como remuneração da universidade como assistente do professor francês. Eu falava francês. Ele me escolheu como assistente dele, eu falava francês. Tinha cinco professores franceses, dois hindus, quatro alemães e cinco americanos que ensinavam...
P/1 – Isso é na Universidade de Pernambuco?
R – Universidade de Pernambuco.
P/1 – Em Geologia.
R – Geologia, isso aí.
P/1 – Não tinham brasileiros então.
R – Não tinham brasileiros, não. Os brasileiros só usavam, só. Só depois começaram a fazer a mudança dos currículos que nós tínhamos a parte básica, os alunos braseiros atuavam. Depois vinha a parte especializada que era só estrangeiro. Eu falava francês, falava inglês, e com isso eu pude selecionar. Eu tinha cinco bolsas no fim da história.
P/1 – Então o senhor não tinha problema. O senhor tinha dinheiro, o senhor estudava e tinha o dinheiro da bolsa.
R – Das bolsas.
P/1 – E o senhor falava inglês e francês por quê?
R – Porque no Marista eu falava francês. Toda quinta-feira eu falava francês. Francês, obrigavam, só pode ficar aqui quem fala francês. E tinha uma discriminação muito grande, todo mundo falava francês. Todo mundo enchia o peito. E eu falava francês porque eu achava bonito demais.
P/1 – (risos)
R – (risos) Francês e eu me arrependo muito de não ter falado mais inglês.
P/1 – Mas o senhor acabou aprendendo inglês também, não?
R – Aprendi também.
P/1 – Nos maristas também.
R – Mais fora, mais fora. Que eu vim para cá era tudo inglês aqui. Eu vim, há 30 anos atrás eu fiz o Cel-Lep e fiz aquele outro curso, um curso básico de inglês na, como chamaríamos essa, Cultura e Civilização Inglesa, aí aprendi muito inglês e aprendi que 75% das palavras do inglês são de origem latina. E eu falava latim, e então foi. (riso) Deslanchei, porque 75% das palavras em inglês são de origem latina.
P/1 – Aí pronto.
R – Aí pronto.
P/1 – Acabou o medo.
R – Acabei o medo e avancei, avancei. Fiz os níveis do Cel-Lep, e que eram muito bons os laboratórios na época, lá nos Jardins, na Cidade Jardim, que era muito bons. E já recebi convites para fazer, ensinar inglês na Cultura Inglesa. Recebi convite para ensinar inglês. E eu não, esses convites surgiram assim de um papo com uma mulher que era inglesa, e que ela surgiu assim espontaneamente. Eu falei: "Não, eu não falo mais inglês do que francês." E eu voltei ao francês porque o francês dava mais status na época, lá no Nordeste.
P/1 – Mas então vamos voltar a essa época da juventude da faculdade, que o senhor começou a fazer Geologia, então.
R – Geologia.
P/1 – E o senhor gostava de Geologia, o senhor achou aquilo interessante?
R – Era interessante relativamente. Porque eu fazia Geologia mas sempre com complexo de engenheiro. E a Escola de Geologia era vizinha da Escola de Engenharia. Eu namorei com a uma nutricionista da Universidade de Recife, que era amiga, que era de Limoeiro do Norte. E que já era uma forma, então eu me entrosei muito com o Nelson La Franca dos Anjos, que era o presidente do centro, e eu fazia o restaurante universitário. Consegui abrir um portão entre a escola e a Faculdade de Engenharia, que todo mundo que trabalhava na escola ia comer no restaurante da Engenharia. E era através do amor, que eu consegui isso lá.
P/1 – Do namoro?
R – Namoro.
P/1 – Muitas namoradas o senhor teve?
R – Não, eu tive três namoradas mais ou menos. Ave Maria. (risos)
P/1 – Conta das namoradas, então.
R – Das namoradas é a Margarida. Margarida que era o nome da minha irmã, e eu dizia: "Margarida, você tem que ser como minha irmã." Ela ficava brava. (riso) Porque eu falava assim: "Você tem que ser honesta como minha irmã." Ela ficava brava demais. Porque minha irmã era a única casada, era a Margarida. E hoje o Francisco Margarida, o Belarmino ainda me... Hoje agora, eu estive em Recife fui receber um prêmio lá, ele disse assim, o Chico estava no prêmio, ele disse: "Rapaz, você lembra que eu pulei muita cerca com medo do seu pai?" Eu disse: "Me lembro, me lembro." "E lembra que naquela cerca encontrei seu pai e você que me protegeu?" "Me lembro, me lembro, me lembro." "E eu não apanhei do velho porque você se meteu na frente." Eu digo: "Me lembro, me lembro, me lembro."
P/1 – (risos)
R – (risos) O Chico Belarmino, de Margarida, foi o primeiro namorado que eu vi na minha irmã, e ele contou com a colaboração muito minha.
P/1 – Para namorar.
R – Para namorar.
P/1 – Então, depois da sua namorada Margarida o senhor teve a nutricionista?
R – Eu tive a nutricionista, e depois tive uma outra que era médica, que era, que agora encontrei com ela aqui, que ela está fazendo a Residência aqui no hospital. Eu disse: "Você, fazendo Residência aqui, em São Paulo? Você não precisa voltar às bases?" Ela está fazendo Residência aqui na USP, no HU.
P/1 – E depois como o senhor conheceu a...
R – A Suzana?
P/1 – É.
R – A Suzana foi a quinta namorada que eu tive, eu acho. Que teve a Margarida, teve a Suzana, foi...
P/1 – Quinta.
R – ...a quinta namorada que eu tive.
P/1 – E como é que foi que o senhor encontrou a Suzana?
R – Ela chegou no colégio eu pensei que era freira. Chegou na escola eu pensei que era freira. Tamanho era a roupa, a saia comprida, e se vestia como freira. Eu digo: "Opa, em que ano você está?" Ela disse: “Eu estou aqui para procurar um marido." Eu digo: "Aqui não.
P/1 – Ela estava procurando um marido?
R – Era. "Aqui não." Ela saiu e eu passei a paquerá-la.
P/1 – E o senhor achou ela interessante assim?
R – Achei interessante.
P/2 – Ela estudava na faculdade?
R – Ela estudava na faculdade.
P/2 – O que é que ela fazia?
R – Ela fazia Filosofia. Era Filosofia. Ela fazia e fazia Filosofia na faculdade e trabalhava em um banco, no banco que o irmão tinha achado um emprego para ela. Eu desenvolvi com a Suzana, foi muito formidável a Suzana. Ela hoje tem um empenho muito grande, desdobra toda para me atender. E eu acho que eu fiz a escolha certa.
P/1 – Mas na época o senhor ficou muito apaixonado? Ela era difícil? Como é que foi esse início de namoro?
R – Ai, ______________. Na época eu fiquei muito apaixonado, mas eu digo: "Essa daqui que vai ser." Quando eu tinha muita vergonha de contar para o meu pai, e com a família, se ela não desse muito certo na família.
P/1 – Por quê? Ela não era o tipo que o seu pai achava bacana?
R – Quando eu levei ela disse, ele disse assim: "Olha, essa daí eu acho que vai dar certo." Eu fiquei mais ________.
P/1 – E isso demorou quanto tempo até o senhor casar com ela?
R – Seis anos. Seis anos de namoro. Seis anos de namoro.
P/1 – Muito, não é?
R – Muito tempo. Eu terminei a Geologia e ela era minha namorada. Eu fui viajar para fazer a volta a América do Sul, retornando aqui São Paulo, Rio, é, eu fiz todo o itinerário da América do Sul, toda ______ da América do Sul, fazendo uma missão da Unesco. Porque o meu é aquele negócio, o meu diretor o Doutor _______________ virou diretor de Nantes, na verdade Nantes na França. Ele disse assim: "Você vai continuar na Oceanografia." Eu fui à água para achar terra. O busca fundo era sempre o aparelho da, de busca fundo, que quando ele chegava em um ponto eu dizia para o marinheiro que eu tinha que me vestir de oficial da reserva porque eles não aceitavam ordem de civis no navio. Eu tinha que vestir a farda de oficial de Marinha da reserva da Marinha.
P/1 – E o senhor foi da Marinha, no CPOR, o que o senhor fez foi a Marinha?
R – Não, eu fui do Exército como base. Mas eles reconheceram e determinaram que eu devia fazer todos os comandos com a farda. Então quando eu ia, que há um movimento do navio, se movimentava os segmentos capazes que era registrar dois pontos no continente, e amarrava o ponto com o fim em triângulo. E marcava o ângulo. E a gente calculava depois aonde que distância da costa estava.
P/1 – Era um mapeamento então da costa que o senhor estava fazendo.
R – Da costa.
P/1 – E lá o senhor já tinha um especial interesse pela água ou não?
R – Já tinha especial interesse pela água.
P/1 – Por quê?
R – Porque na Sudene eles tiveram, eu fiquei até março nesse roteiro da Unesco. Quando chegou em março, eles encerraram a missão aqui no Rio. Eu fiquei na Marinha durante mais um mês e eles ficaram estudando a maneira da me contratar. Eu notei que a coisa era muito difícil. Fui para a Sudene. Fui para Recife.
P/1 – O senhor estava voltando, o senhor estava fazendo o mapeamento do litoral.
R – Do litoral. Voltei do Rio e fui para Recife. Cheguei lá em abril, em junho eu estava trabalhando na Sudene.
P/1 – Como?
R – É o seguinte, eu falava francês. Quando eu fui entrevistado pelo superintendente, ele disse: "Você vai para o grupo do Jaguaribe, homólogo de uma missão francesa de 65 mil, você vai fazer um estudo do Vale do Jaguaribe no Ceará." Eu fui dirigir essa missão francesa, porque eu falava francês.
P/1 – Mas já dirigir, só porque o senhor falava francês?
R – Eu acho que pesou muito esse fato. O fato é que eu entrei em junho, julho a março eles me ________ em março, abril, maio e junho. O ano inteiro. De, como chamaríamos, de apoio logístico. Eu me instalei...
P/1 – Lá em Recife.
R – Em Recife. Então apartamento, não sei o quê. Era o meu dia-a-dia que eu freqüentava sempre a casa dela.
P/1 – Então o senhor estava namorando ainda nessa época, não estava casado.
R – Não.
P/1 – E ela morava sozinha, sua namorada?
R – Não, ela morava com a mãe, que era brava que só ela. (risos)
P/1 – (risos)
R – Como toda sogra é brava, com medo. E aí o pai dela teve um enfarto, teve um AVC. Um AVC que é Acidente Vascular Cerebral, acho que é AVC. E ficou paralítico. Eu assumi mais ou menos que tinha que casar com ela. Seu Davi praticamente assumiu também que eu tinha que casar com ela.
P/1 – Aí o senhor pediu a ela para casar...
R – Eu pedi para casar e ela aceitou. E nós fomos em frente.
P/1 – Mas o casamento como é que foi? O senhor avisou para o seu pai? O seu pai gostou da ideia, ajudou? Pagou alguma coisa?
R – Ajudou, pagou todas as despesas do casório.
P/1 – Pagou? Mas foi uma festa grande, como é que foi?
R – Não, foi relativamente grande. Eu chamei o Gasparini para ser o meu padrinho, que era um que era o chefe da missão francesa. Eles é que apitava mais. Fui e casei nos maristas. Porque, no Colégio São Luis, ficava próximo da casa dela. E ela sabia onde ficava esse colégio. E depois fui para a França fazer o meu, estudos superiores, mestrado.
P/1 – Mas calma, espera aí. O senhor casou e entrou na Sudene.
R – Não, eu entrei na Sudene e casei.
P/1 –Ok. E aí na Sudene qual era a sua função?
R – A função era _______ ou chefe substituto do grupo do Jaguaribe.
P/1 – Do rio? Aquele que...
R – Do grupo do Jaguaribe. Que o do Rio eu tinha abandonado o Rio, eu viajei para Recife sem comunicar ao Rio.
P/1 – Mas o que é que fazia a Sudene nessa época assim, exatamente?
R – Fazia estudos e visava muito mudar o modelo de Dnocs. Mas gerou-se completamente pelo Dnocs e acabou repetindo tudo que o Dnocs tinha feito.
P/1 – Que modelo era esse, o senhor pode explicar melhor?
R – O modelo da Sudene era desenvolvimento sustentável regional. Onde se fazia a busca de poços era a seguinte: a Dnocs mandava a máquina lá para a fazenda e ficava lá. E o chefe da máquina tinha filhos e tinha que constituir família tudo. Enquanto aquela máquina estava lá ele estava lá.
P/1 – A máquina é que fazia o poço?
R – Era o poço.
P/1 – Então a Sudene mandava a máquina para uma fazenda.
R – Para a fazenda.
P/1 – E aí...
R – Não, o Dnocs mandava a máquina para uma fazenda, era o Dnocs que fazia esse cambalacho dentro do Departamento Nacional de Combate às Secas, Dnocs.
P/1 – Dnocs era uma pessoa?
R – Era um órgão.
P/1 – Ah, Dnocs, o órgão, tá. Então o Departamento mandava a máquina para uma fazenda...
R – Ia para lá, esquecia, abandonada e só vai retornar quando o fazendeiro chutava...
P/1 – Se enchia da máquina.
R – Se enchia da máquina. Chutava a máquina. Chutava geralmente o pessoal. E muita gente, e a Sudene fazia o seguinte, fazia um mapeamento da área e entrava o geólogo, e depois ______________ riachos que estariam encaixados naquelas falhas, estudo geológico, e fazia um levantamento da população que estava em torno do poço. A seis quilômetros a gente fazia um raio em torno do poço, e a Sudene fazia todo o levantamento de quantas pessoas e não sei o quê. E determinava _______ do poço. A gente tinha que furar um poço que desse para aquela área.
P/1 – Vazão para aquelas pessoas ali.
R – Para aquelas pessoas, para aquela área, para aquelas pessoas. Sei que era muito, eu fui e contestei esse, a Sudene, e por isso fui jogado fora. Fora do trabalho que eles fizeram, eu não tive aumento nenhum. Eu comecei a entrar na universidade.
P/1 – Ah, então o senhor teve dificuldades na Sudene?
R – Muitas.
P/1 – Nós estamos em que ano, o senhor lembra?
R – Nós estamos em 50 e poucos, 58, 59, 60, 62, 63, 64. Eu fiz um zoneamento no Nordeste e fiz a primeira avaliação do Brasil. E já constatei que as águas do Brasil eram muito abundantes. Mas estava sendo operada de uma forma muito estranha. Porque perdurava o conceito de que o tratamento era muito caro.
P/1 – De que o tratamento era muito caro?
R – Era muito caro.
P/1 – Então esse conceito ele fazia com que a política fosse feita como?
R – A política era feita, era a cidade que se evoluía muito a população urbana, e não havia nenhum conceito de tratamento onde o senhorio do, o senhorio que é hoje o morador do apartamento se vangloriava do fato dele não ter o seu esgoto ligado à rede, deixando ao escravo a disposição dos rejeitos. E que jogavam, os escravos jogavam isso no rio mais próximo. Ou no riacho mais próximo, isso ainda perdura hoje.
P/1 – Quer dizer, tanto os fazendeiros quanto na cidade a ideia não era tratar a água, é isso?
R – Não era tratar a água, porque o rio, todo corpo d'água tem a capacidade de autodepuração. Ou seja por diluição ou seja quimicamente. Porque nós temos muita energia aqui solar. O Brasil é um país tropical porque essencialmente o sol nunca se põe nesse país. Tem muita energia solar. Então essa energia solar gera a vida. E a vida é altamente confortável para fazer o tratamento das águas de forma que todo corpo d´água, subterrânea ou não, tem uma capacidade muito grande de autodepuração. E essa autodepuração é que faz com que o modelo dos Estados Unidos não se aplique aqui. Não são válidos para aqui. Porque nos Estados Unidos a chuva cai na forma de neve. E a neve funde com a terra, e a ______ é mais profunda. Aqui ela é superficial, nada cai em forma de neve, só cai na forma de água. E a água escoa e vai para o rio, cola no rio. Daí gera as enchentes. E você vai ver que nós passamos várias vezes no Jaguaribe em uma cidadezinha que tinha um curral que é, chegamos lá, o cara chegou do curral diz assim: "Ai, me ajude, ajude, ajude que a minha vaca vão morrer de fome e de sede." Eu levantei as vacas dele, coloquei nas tipoias - que era um saco amarrado - e no dia seguinte ele chegou: "Olha, as minhas vacas vão morrer hoje afogadas." (risos)
P/1 – Mas eu queria entender melhor essa coisa do tratamento. Quer dizer, nos Estados Unidos o modelo é qual, de tirar água do fundo?
R – Água do subsolo.
P/1 – E aqui no Brasil?
R – O modelo é água superficial. A água que escoa pelos rios, _______ pelos rios. O Brasil tem cerca de 102, 103 mil metros cúbicos por segundo de descarga no Oceano Atlântico. E o Oceano Atlântico nunca existiu, não existiu sempre esse Oceano Atlântico. O Brasil tem hoje uma topografia geral de planaltos porque ele foi objeto de uma deriva continental muito importante. Saiu da África e veio para cá. Daí a Cordilheira dos Andes ter subido. Porque na medida que o lençol é empurrado ele encontra um ponto de apoio e sobe. Daí a Cordilheira dos Andes ter subido no Terciário...
P/1 – Quer dizer, na realidade o continente saiu da África, derivou até aqui, encontrou o...
R – Encontrou o Pacífico...
P/1 – E aí saiu a Cordilheira dos Andes.
R – Surgiu a Cordilheira dos Andes. E surgiu todo o cinturão de fogo que o mundo hoje apresenta. O Japão, Cordilheira dos Andes, Himalaia e companhia. Porque houve um afastamento dos continentes, então surgiu o Oceano Atlântico.
P/1 – Entendi. E isso então faz com que o Brasil tenha uma situação especial com a água?
R – Especial.
P/1 – Mas é uma situação boa?
R – Boa, muito boa. Que nós temos cerca de 50 bilhões, milhões de litros d´água, bilhões de litros d´água por cabeça. E que hoje em dia é considerado uma fortuna no mercado internacional.
P/1 – Mas na Sudene, a Sudene nesse momento ela não tinha nenhuma visão de acabar com a seca, com o tratamento nada?
R – Não.
P/1 – era simplesmente esse uso dos poços, é isso?
R – Dos poços. E para a população mais desassistida que era os pobres. Por isso que eu vejo o Nordeste... Porque hoje no Nordeste o problema não é seca, é cerca. Cerca, cerca. Não é seca, é cerca. É o cercado, é a propriedade do Fulano que fica lá ilimitável, e o Bueno criou uma política que era assim desapropriação da __________ da barragem ___________. Ele dizia assim: "Toda água do Nordeste é de uso comum, contanto que tenham que ser um caminho de uso comum, acessível. Olha, ninguém estabelece isso, nem cumpre a lei.
P/1 – E nessa época o senhor contestou isso e o senhor foi, que problema o senhor teve na Sudene, o que é que aconteceu?
R – Eu tive o problema de ter que tirar férias sem remuneração e ficar lá em casa, em Peixe Gordo, de férias.
P/1 – Ah, é, o senhor foi para Peixe Gordo tirar férias.
R – Tirar férias. E durante muito tempo eu fiquei lá, escondido em Peixe Gordo, tirando férias. (risos)
P/1 – (risos) Mas isso tem a ver com a ditadura militar?
R – Ah, tem, tem muito a ver. Porque 64 era o período áureo dele.
P/1 – O golpe foi em 64. E o senhor estava na Sudene nesse momento?
R – Estava, estava. Estava na França...
P/1 – E o que acontece..
R – Estava na França. Eu fui para a França, eu entrei em novembro, em março eu fui para a Sudene e só saí em 71.
P/1 – Na Sudene? Na França? Espera aí, eu estou agora me confundindo.
P/2 – Ele se afastou.
R – Eu me afastei e fui para, quando a Sudene, seu Ari veio me levar, eu fiquei na França fazendo estudos superiores na França. Com diploma em estudos superiores. E aí é que eu _______ o mestrado nos Estados Unidos. Eu fiz o estudo e o diploma de estudos superiores na França sobre uma região que é _______ água subterrânea, que era a Alsácea. Que tinha sido dos alemães já durante o começo do século até a segunda guerra mundial.
P/1 – Então o senhor começou a estudar como eles tinham usado essa água no subsolo. E que conclusões, ou que percepções o senhor tirou desse estudo que fez o senhor repensar o uso no Brasil?
R – É que nós temos muita água. E o maior reservatório do mundo hoje é o subterrâneo. O maior reservatório do mundo é o subterrâneo. Mas esse passou despercebido dos geólogos que na época não tinha no Brasil ainda a mentalidade que nós temos hoje de reconhecer esse manancial. E você ia ver na Alsácea em Mulhouse, que é uma cidade perto de um milhão de habitantes que era abastecida por poços. E várias cidades na Europa são abastecidas por poços. E enquanto no Brasil não era.
P/1 – No Brasil eram barragens, represas.
R – Represas. Era tudo que a engenharia pegava era represa, represa, represa. Ninguém agarra a água que ficou por baixo. Fora _______
P/1 – E lá então o senhor percebeu que tinha essa...
R – Que tinha esse manancial aqui que a gente podia fazer muita coisa com ele. E sobretudo no Recife e na Paraíba, que eram os dois estados que ficavam mais ao norte, e que eu estava em Pernambuco. Recife é uma cidade muito litorânea e muito vulnerável às águas de superfície. E vai sofrer muito com essa subida do nível do mar. E vai desaparecer talvez do mapa. Recife, Salvador, toda população talvez do Brasil é litorânea. Somente no interior tem São Paulo, e tem Brasília e tem as capitais do Centro-Oeste. Agora, que estão surgindo agora. A maior população do Brasil, 90% está vulnerável a essa variação de clima que hoje em dia estão proporcionando, essa variação de _________. A mudança de _______ é preciso proteger o meio-ambiente e a água, sob pena de a gente não ter o que comer muito em breve, e submeter o mundo a um processo de empobrecimento muito grande se não cuidar dessa água. E, sobretudo, se não perder essa visão de que a água é cara para tratar. Na realidade tem que ver que a água é muito fácil de ser tratada, e os mananciais têm uma capacidade muito grande de autodepuração. E que no Brasil não encontra em canto nenhum, nem aqui em São Paulo, um posto de gasolina que vende água mineral.
P/1 – Por quê?
R – Vende água mineral, porque o posto de gasolina nos Estados Unidos é considerado como perigo. Aqui não. Ele é considerado como uma dádiva. Porque vaza a gasolina e entra no solo, e essa gasolina não aparece em fase livre no subsolo, porque ela é depurada, é diluída pelas águas que são abundantes no freático, sobretudo.
P/1 – O senhor está cansado. Está, não é?
R – Estou cansado.
R/2 – O Aldo, você contou aquele fato em 63, ele disse: "Não, eu vou lhe contar uma notícia muito boa." "O quê?" "Eu vou para a Sudene, não quero ir para a Marinha." Foi quando ele foi para a Sudene, que ele já tinha feito. Na Sudene foi quando ele foi para a França, formou a Bacia Escola, foi quando ele fez o estudo do Vale do Jaguaribe, foi por ele que veio a missão francesa, foi pelo fato dele falar, e além do fato dele ter conhecimento. E foi através dele que a Sudene formou a Bacia Escola. Com a Bacia Escola vieram todos os colegas que eles tinham que acabaram de se formar em Geologia. Ele formou um grupo. E na Bacia Escola foi quando ele foi para a França fazer o mestrado, os estudos superiores. Passou lá um tempo, então voltou para a Sudene. Quando ele voltou, trouxe mais técnicos franceses, o Gaspari, como é que se diz aquele, o Garroux. E Similé foi que era o chefão do grupo, foi quem disse: "Vamos, você quer fazer a tese de doutorado?" Foi quando ele foi para a França, a gente já estava casado. Foi em 60 e, casamos em 65, quando foi em 71 ele disse: "Topa ir?" Eu digo: "Vamos." Vamos para a França, com as três crianças pequenas, lá ele fez o doutorado. Mas nessa época ele já tinha saído da Sudene quando ele foi para a França. Ele saiu, terminou o projeto, e como foi convidado a ser o superintendente da Sudene mas ele não quis, porque ele só quer fazer ciência. E superintendente da Sudene é um cargo político, e ele disse: "Não, cargo político eu não quero. Eu quero é ciência." Porque ele viveu para a ciência, viveu na ciência e para a ciência. Então foi quando ele terminou, ele foi para a faculdade e lá na Universidade Federal de Pernambuco ele era professor, lá era o posto mais alto. Então foi para a França fazer o doutorado, que na época a universidade bancava tudo. Se ele te chamar ele tinha bolsa, porque ele foi como, fazer, se especializar e fazer o doutorado. Quando a gente voltou da França, foi com as três crianças. Ele fez lá o doutorado, recebeu menção. Lá na França ele recebeu o convite para ser professor da USP.
P/1 – Vamos parar aí porque eu acho que ele está cansado, não é? Cansou. Também eu fiz ele contar a história dos irmãos. Mas eu acho que se o senhor topar a gente marca, que a gente faz a segunda parte. Agora que ele começou a contar mais as ideias.
R/2 – As idéias, a parte científica, não é?
P/1 – Não, porque a parte da infância dele é muito divertida. (risos)
R –
(risos)
P/1 – Mas eu acho que agora ele está cansado. Porque...
R/2 – Ele está cansado, eu estou percebendo que já está...
P/1 – É, eu também estou sentindo. Mas aí a gente combina para voltar para fazer a segunda parte.
R/2 – Tudo bem, é melhor fazer em partes.
P/2 – Vai render muito mais.
R/2 – Muito mais.
P/2 – Vai, vai.
P/1 – É, porque começa já dessa, a gente faz assim: quando a senhora voltar a gente grava rápido primeiro a senhora, contando a trajetória inteira, que essa parte a gente não... É boa ideia?
P/2 – É.
P/1 – E depois a gente explora as idéias com ele.
R/2 – Ele falou essa parte da Marinha?
P3 - Falou que a Marinha não aceita civil dando ordem...
P/2 – Falou do uniforme.
P/1 – É, ele teve que por a farda. A gente não tinha entendido que ele não gostou disso, mas eu entendi que ele teve que por a farda.
R/2 – É, exatamente, ele não queria estar de farda, porque ele disse que não queria ter ordem de ninguém. (risos) Então e ia viver no navio, a história dele...
R – Eu vim para o Rio e tinha uma colega...
R/2 – Tinha que ficar no Rio, ele não queria, queria ficar morando no Nordeste. Tinha esse detalhe. E a gente ainda estava namorando. Quando depois, na Sudene foi na época da Sudene que nós casamos. Na época que ele estava na faculdade, na universidade que era professor titular lá, foi que a gente foi para a França para ele fazer o doutorado.
P/1 – Então na segunda etapa a gente tinha que explorar um pouco essa período da França e a chegada em São Paulo, e uma parte mais sobre o mundo hoje assim....
(FIM DA PARTE 1)
(CONTINUAÇÃO - PARTE 2 - São Paulo, 23/04/2007)
P/1 – A gente acabou a entrevista do senhor na semana passada, a gente estava começando a falar da atuação do senhor na Sudene.
R – É, exatamente.
P/1 – E a questão da água que...
R – Da água, e que eu sou um grande especialista da água, e recebi agora um título de Professor Emérito da USP, em homenagem à água, no dia 26 de maio passado. E agora vai um irmão, esse Tadeu, receber também um título de Professor Emérito na Universidade de Sergipe.
P/1 – E deixa eu perguntar para o senhor. O senhor vai para a França fazer o mestrado na França.
R – É.
P/1 – Por que é que o senhor escolhe a França para fazer o mestrado?
R – Primeiro porque a língua era fundamental. E eu cheguei lá e eles tinham colocado um curso de língua instrumental francesa. Eles dizem assim: "Língua instrumental francesa, você fala francês. Então você já vai para um estágio superior, muito acima e que concede visitas." Eu visitei então o presidente da companhia, do Sindicato das Cidades na França. Eu visitei um agricultor na Bretanha, porque eu ressaltei sempre que meu pai era um agricultor. E que papai era um agricultor construtor. Que fazia, papai era ________ no meu depoimento, papai não chegou a se formar. Ele estudou muito mas não chegou a se formar. Engenharia, Física, Química. Ele conhecia muita Química, muita Física, e muita Engenharia mas não chegou a se formar.
P/1 – Mas o senhor desde criança se preocupa com a questão da água?
R – É.
P/1 – O que é que chamava atenção quando o senhor era criança?
R – _______ as águas na casa. Para nós tomarmos banho, a gente chegava, a gente tinha que bombear água. Enquanto bombeava, tinha água, quando parava a bomba, não tinha água. A gente precisava tomar banho com a bomba funcionando, e era bomba manual. E a gente ia para a praia, e quando voltava tinha que puxar as bombas para fazer a água para circular na casa. A casa tinha duas caixas d’água em cima e que eram dos banheiros. Para funcionar os banheiros. E que papai fez uma casa em 1935 mas já moderníssima. E era muito visitada, era muito visitada por todos os que faziam as casas, por todos os que casavam que faziam as casas nos terrenos da mulher, geralmente, geralmente. E eles faziam, iam sempre lá em casa buscar as _______ das casas. Meu pai construía as casas, a casa dele em Tibau. Tibau, papai construía as casas de veraneios para os ricaços de Mossoró.
P/1 – Mas nessa época já tinha o problema de escassez da água?
R – Tinha, já tinha o problema de escassez da água. E as águas surgiram quando nós tínhamos um irmão que era marista, que era padre, ele chegava e sabe, mamãe, quando ele chegava, mamãe logo se virava para ele e dizia: "Azor, está aqui a sua espingarda de chumbo, ninguém usou até aqui." Ele saía atirando, atirando, atirando e matando todos os passarinhos da região. Matava, matava, matava. Ele chegava com aquele saco de passarinhos e jogava na cozinha.
P/2 – Para quê?
R – E não tinha nem fim, porque o passarinho uma vez morto não tinha nenhum interesse para ele. Eles, a empregada despenava os passarinhos, e preparava as ___________ e a gente tomava como aperitivo antes da janta. Era isso que o Azor fazia. Aldenor é um solteiro desesperado. Porque ele casou, foi o único que casou duas vezes. E ele sempre muito _______ ganhador de dinheiro, fazedor de dinheiro. E era dos padres. Eu digo, esse aí era ali de Limoeiro do Norte, onde ele ia para o seminário, ficava lá. Ele levou o Gilson que era depois dele e levou o Tadeu, e levou uns quatro lá para o seminário. Mas quando ele saiu, saíram todos. Quando o Aldenor saiu, debandou. O Aldenor foi o último a vir para a casa, que eu casei em 65 com Suzana, dezembro de 65 eu casei com Suzana. Em janeiro de 66, nasceu o meu primeiro filho: André. Nasceu André, (risos) ________, e ele hoje é geólogo como eu. Ele se tornou geólogo na USP. E eu era professor na USP, mas ele fez mestrado em Geologia. Quando ele foi fazer o mestrado, eu disse para a Maria, que era uma húngara: "Você vai ser orientadora do André." Que eu não queria orientar meu filho. Que eu era diretor do Centro de Pesquisa de Águas Subterrâneas na universidade, e não queria que meu filho ficasse assim maltratado, ou congestionado, não tivesse espontaneidade, que ele sempre foi muito espontâneo, com a minha presença. Eu disse: "Maria, você vai..." E eu coloquei todas as mulheres do instituto para tratar da água. Tinha a Aurélia, que chegou da Alemanha falando alemão, e eu encaixei no Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas. E tinha a Doroti, que é hoje, é uma italiana que trabalha na Cetesb, então eu encaixei na ______, e a Maria, eram as minhas três vedetes. (risos)
P/1 – (risos)
R – ______, da água.
P/2 – E nesse instituto, o tipo de pesquisa era exatamente o quê?
R – Era geologia e água. Geologia e água. Hoje eu falo, eu tenho três livros publicados O Uso Inteligente da Água, que é um, eu escrevi o livro, foi publicado, O Uso Inteligente da Água, A Água, como é que chama o outro? A Água Capital Ecológico, Recurso Renovável, Uso e Conservação, mostrando que o Brasil é muito rico de água. E esse livro eu fiz porque ninguém contava dados sobre água aqui no Brasil. Todos os dados sobre água no Brasil estavam no exterior. Então eu fiz tupiniquim, para a turma ter acesso à bibliografia tupiniquim. Eles hoje adoram água, economizam água, e fazem uso inteligente da água, que chama-se Águas Doces no Brasil: Capital Ecológico, Uso e Conservação. Está na terceira edição. A quarta edição vai ser em inglês. Porque os Estados Unidos não têm um resumo sobre o país como tem o Brasil. Muitas coisas que os Estados Unidos não têm. Eles não têm o respeito que a gente tem aqui pela água. E o nosso respeito pela água cresceu porque, embora o rio seja muito abundante, a água dos rios correndo, eles têm um processo muito difícil de recarga. E no Nordeste esse processo é levado ao extremo. A irregularidade climática daqui é muito grande. O sol no Brasil não se põe nenhuma hora, nenhum minuto.
P/2 – E por que é que isso dá uma dificuldade de recarga?
R – Porque, os primeiros _______ do Brasil são muito antigos, os _______ do Brasil são muito antigos. E são fraturas, ou suturas geológicas que é onde a água se encaixa. Você tinha os blocos de rocha que você desenvolve um poço de um metro e a pele _______ seco. Joga um metro para cá, ele dá água. Porque a função do poço é conectar as fraturas que tem a água. Se ele de novo o metro ele cai, sai da fratura, ele não pega nenhuma fratura não vai ter água. Por isso que os poços não podem ser analisados por causa da água que eles oferecem. Eles não podem fazer o rio e a água, porque o rio freático, o freático que a conhece muito, pelo menos fala-se muito em freático, o freático aqui no estado de São Paulo, ele se estabelece nos terrenos alterados das zonas das salinas ou no mangue ___________ salinas. E nas zonas de fraturas mais amplas onde se tem as rochas ainda no seu estado original. Ou nas fraturas, no fraturado, o Nordeste não tem isso. O Nordeste do Brasil é pelado, seco. Porque toda água que cai lá, e cai de uma hora para a outra. Um dia chove 100 milímetros, um dia, 100 milímetros de água, é a lâmina de água que se forma, se não houver escoamento nenhum e nenhuma perda é 100 milímetros. É muita chuva. E isso cai em um dia. Isso na Califórnia representa um ano. Daí um californiano ter sido trazido para Recife ele chegou, ficou espantado com isso. Ele disse: "Aqui tem água demais." Porque Recife é uma planície cheia d’água, com rios. Os rios descem naquela tectônica, ______ a parte da Geologia que estuda o deslocamento das rochas. É a tectônica de levantamentos. E aqui nós temos a bacia do Paraná, que é riquíssima em água, é o maior reservatório nosso. De água, é o Guarani.
P/1 – Aquífero Guarani.
R – Aquífero Guarani, existente pela Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil. ___________________. E São Paulo vai aqui de Minas até a Argentina. A Argentina é um sistema só. E é uma camada muito espessa _________ de espessura, e arenitos. Quando a água circula pelos poros do arenito. Mas aqui em São Paulo é a região onde pode mais explorar esses poços profundos, até dois mil metros. Em Presidente Prudente, quando eles fizeram os poços lá, foi com a irrigação do Bauru Basalto, mas eles têm __________ Basalto, _________ Basalto caiu na Guarani. Então a água veio, subiu
e chegou na boca de cima do poço, de cima do nível do terreno. Foi jorrante. Quer dizer, o poço milagroso. Todo mundo __________, porque o poço jorrava, jorrava, graças a Deus. "Graças a Deus não, você fez um poço como deveria ser feito."
P/2 – Mas hoje, com toda essa questão do que o mundo está aquecendo, e que o grande valor vai ser a água, o que é que deveria ser feito no Brasil que é tão rico de água?
R – Primeiro é uso e conservação.
P/2 – Que é que quer dizer exatamente uso e conservação?
R – Uso e conservação quer dizer que é fundamentalmente o problema de que você tem que usar e conservar a água. Conservar na sua qualidade e na sua quantidade. E que a gente sempre pensou em quantidade e nunca em qualidade. O senhorio do escravo tinha o hábito de, caminhava ia deixando seus detritos na rua e o escravo vinha atrás e pegava. Esse ainda existe a mentalidade, a gente joga fora tudo o que não quer, vai comendo e jogando fora. E o escravo vai atrás coletando tudo. Isso que nós precisamos entender que uso e conservação da água significa quantidade e qualidade. Ninguém espera...
P/1 – Vamos dar uma paradinha?
P/2 – Mas como isso, para que a gente consiga que as pessoas comuns entendam também..
R – O senhorio do tempo do escravo é hoje o habitante do apartamento na cidade. E a gente verifica que não mudou nada a mentalidade. O senhorio dos apartamentos ainda acha que não pode, não precisa cuidar da água porque o escravo cuida. O escravo coleta tudo e eles dizem assim: "Eu não vou favorecer os pinicos de São Paulo", que são os quatro, cinco pinicões de São Paulo, em Mundo Novo, Barueri, Santo André, e São Caetano, e aquele outro lá de cima de Itaquaquecetuba.
P/1 – Diadema? Mauá?
R – Lá acima, Mauá, Mauá. Que eles não vão favorecer esses pinicões porque eles são contra o Maluf que os construiu. Eu digo: "Você não pode misturar política com água." A água dissolve tudo mas não lava a língua dessa gente.
P/2 – Mas o que é que quer dizer, me explica melhor isso, essa história do, do...
R – Dos pinicões?
P/2 – É.
R – Daqui?
P/2 – É.
R – Era o seguinte, eles tinham feito os pinicões para adotar as águas e serem utilizadas e vendidas, revistas, reuso de águas pluviais. Você quando pega a sua descarga, a água que dá a descarga ela iria para a rede coletora principal, o tronco. Eles não fazem a ligação do prédio para as redes porque eles não são a favor da política, do político, do Maluf. Ora, se eles fizessem ligação na rede Barueri não ficaria como uma obra faraônica, que não serve para nada.
P/2 – Porque na realidade Barueri, ou qualquer um desses, receberia toda essa água do esgoto e retrataria para revender? E isso não funciona hoje?
R – Não funciona.
P/2 – Por que não funciona?
R – Não funciona porque primeiro eles querem tratá-la a nível de potabilidade. A nível do potável, de ser consumida pelo homem. Ele não precisa disso, porque a chapa de aço não precisa de água ou para encher a torre de indústria não precisa de águas...
P/2 – Potáveis.
R – Potáveis. Ele precisa de água somente. Para lavar piso você não precisa de água potável. Para lavar escada não precisa de água potável. Então devia ter 10% a mais nos prédios de apartamento aqui, devia ter duas canalizações. A água potável, que você pode beber, e a água não potável, que você não pode beber. Mas eles só vendem a água potável.
P/2 – Isso a Sabesp?
R – A Sabesp. Só vende água potável.
P/2 – E essa água da Sabesp vem não dos pinicões, vem de outro lugar?
R – Vem de outro lugar.
P/2 – Vem das represas?
R – Das represas. Das represas que eles fazem na Serra do Mar, onde chove 4 mil milímetros, quatro metros de água, que chove por ano lá na Serra do Mar. É um absurdo de água que chove por ano. Na Califórnia chove 100 milímetros, aqui chove 4 mil, até 4 mil milímetros da Serra do Mar. Eles fizeram uns contatos para a produção da energia elétrica com as empresas internacionais. Os canadenses ficaram aqui muito tempo mamando nessa beleza que é o Rio Tietê. Hoje, o Rio Tietê é aprofundado com recursos do empréstimo dos japoneses. O japonês veio aqui e queria conhecer onde era o Rio Tietê antes de... Ao dono do Tietê, antes de ir ao Departamento de Águas e Energia. Ele me convidou para pegar no aeroporto. O japonês chegou no aeroporto e eu trouxe até o Hotel Transamérica que ele ia ficar. Fiz todo o percurso do Rio Tiete. Então eu disse: "Está vendo, o Rio Tietê? É essa coisa aqui." Ele disse: "E o que você viu depois da outra viagem que você fez aqui?" "Já pintaram as pontes, já pintaram as pontes, já pintaram as pontes" e fizeram muita plantação de verdes no Rio Tietê. Agora estão dizendo que vão cortar aquele verde todinho, que vai ser uma pista de rolamento para ampliar a pista do Tietê. Porque ela é impossível de ser transitada. Porque tem várias estradas que chegam e...
P/2 – Mas ele não foi limpo o rio, não, certo?
R – Não, não foi limpo, não. Eles estão dragando o rio com o empréstimo do japonês, e estão dragando, dragando, mas não vai servir pra nada. Se o povo em si não tiver aquela publicidade dizendo que vai entregar o seu _____ limpo, limpo, limpo, eles não podem gerar os elementos. Estão gerando lá na cabeceira rios, que é tudo ligado ao ambiente. Os rios descem, o escoamento desce e vai para os rios. Descarrega no rio, ______ superficial. O escoamento profundo só vai chegar milhares de anos depois e vai ________, enquanto o rio circula _____________ por hora, no subsolo a centímetros por hora. A relação é de...
P/2 – Dez.
R – De 11 centímetros por hora. Lentamente a água subterrânea e vai perfurando até, e com essa massa de energia que nós recebemos do sol, ele vai se autodepurando. Porque todo manancial tem como objetivo
a autodepuração. Todo manancial. Se você mora a ajudante dela, ela tem que tomar cuidado para não prejudicar ________. Ela tem que coletar o seu esgoto, ela tem que coletar sua descarga nos rios. Porque o rio ao sair nesse espaço não tem tempo de se autodepurar. Se a gente fosse mar abaixo você bebia água o ano inteiro do
rio, sem problema nenhum. Que já estaria depurado.
P/1 – Agora, no interior, o Tietê é mais limpo, por conta desse processo de autodepuração?
R – É.
P/1 – A água chega em Pederneiras.
R – Em Pederneiras, aquela, olha, lá na, como é o nome _______, fica no Rio Tietê, Barra Bonita. Em Barra Bonita, tem já uns processos de que todas as eclusas de lá têm uma grade de ferro na entrada das eclusas para não deixar as ________ avançar a eclusa. E o rio não descer abaixo a poluição. Esse já é um processo muito bonito de uso e conservação. As eclusas do rio. Então o rio é navegável, o Tietê é navegável, até Lussanvira, ele é navegável, mas a partir de Barra Bonita ele tem eclusas em vários trechos para permitir a autodepuração. Porque a eclusa determina os trechos de autodepuração do Rio Tietê, de forma que o Rio Tiete desce da cabeceira, passa em São Paulo, leva bilhões de toneladas por ano de detritos que ele consome todo antes de chegar em Lussanvira, que é no Paraná, em Lussanvira. É no Paraná. Ele tem autodepuração funcionando. E então em todas as cidades você tem um problema de quantidade e qualidade. Todas as cidades ao longo do Tiete estão com problema de quantidade e qualidade. Qualidade e quantidade. Porque quando você faz um poço, se ele é raso ele coleta só o lençol freático ele fica ligado ao rio. Todo ________ vão para o rio. Tudo vai correr para o rio. Se você rebaixa muito, inverte o gradiente, eles passam a contribuir para o poço. Então o poço ______ o rio. Se ele é feito mais profundamente ele vai pegar o fraturado no contato. E se ele é feito muito profundamente ele vai pegar o fraturado já na disposição adequada. Então se você quiser _______ de água você tem que fazer poço...
P/2 – Fundo.
R – ...fundo. Quando vêm os fundos, você tem o circo. Você não pode fazer comparação entre água de poço e água de rio. Porque esses poços fundos são alimentados pela zona de recarga, lá de cima.
P/2 – Que eles descem mais lentamente para o lençol.
R – E tem mais depuração. Daí você só pegar amostra do poço, se dá água boa, no fim do bombeamento, quando o nível está mais baixo, que você pode testar. Nós temos aqui em Jaguaré uns altos como Osasco, como na fronteira de Osasco com São Paulo, uns altos. Nesses altos estão fazendo poços que usam esse sistema de depuração na medida que penetra. Porque os sulcos intermediários e regionais são captados pelos poços profundos e os sulcos locais são captados pelos, o sistema de sulcos locais é captado pelos poços mais rasos. E esse então ele tem um posto de gasolina uma, ou uma, como é que chama, uma oficina mecânica que despeja todas aquelas águas lá no fundo do quintal, eles não interferem no poço de água minerais e águas boas e potáveis para beber. Porque está tirando dos poços profundos que pega os sulcos regionais. ________ os rasos que pegam os sulcos locais. Então você tem que ver qual é a profundidade do poço e qual é o nível de exploração e de compatibilização entre o rio e o poço. Nós temos aqui na cidade, a maioria dos poços são mal feitos. Eles atravessam a estrutura subverticais, que atravessam as fraturas das rochas, quando atravessam. E recebe filtros que essas zonas de entrada de água no poço em toda a coluna tem filtro. Eles não podem, eles tem que ter uma engenharia geológica muito apreciada e muito importante na obra das águas __________. Eles não podem prometer, quer dizer, que o poço vai encher em uma hora de bombeamento. Porque eles tem que bombear 20 horas de bombeamento para ter _________ embaixo, incompatível com os filtros, e fazerem uma engenharia sanitária de produção do poço. Então entra engenharia geóloga, engenharia sanitária, engenharia hidráulica, que é a produção da bomba. Porque não pode rebaixar muito o nível dos poços. Engenharia sanitária, hidráulica, e geóloga. São três engenharias que ele tem que fazer. A maioria dos poços são construídos sem nenhuma engenharia, são construídos ao Deus dará. Qualquer poceiro pode fazer um poço. Não é possível isto. Tem que haver uma lei que regulamente isto. E a lei saiu a 433 em 2000, saiu uma lei que determina que toda a água do Brasil deve ser em gestão integrada. E a gestão integrada significa bacias hidrológicas, bacias hidrográficas. Bacias de rios. E você deve compatibilizar os fluxos, o sistema de fluxos _________ e superficiais. E aí nós não teríamos estações como Barueri e seriam estações que só coletam água de superfície. Essa água que escoa e que vai parar no rio, e gera enchente na cidade. A _________ a população é que é o principal problema do processo. A população só consome 8% da água do Brasil.
P/2 – O resto é para...
R – É para a indústria e para a agricultura. A agricultura consome 70%, mas é 70% da água do mundo, e do Brasil muito, muita água vai para a agricultura. Você vai ver em Ribeirão Preto, que ________ fundamentais do Botucatu, que é o Guarani, que aqui a gente chamava Botucatu, imagina a flora _________________, o que é isso é um erro. Os fulanos que mapearam, fizeram os mapas antigos que queriam achar que Botucatu era arenito de Botucatu, era arenito, depois basalto, era abaixo do basalto. Eles tem em Bauru uma janela que é uma erosão do basalto que gera uma janela em Bauru. Janela é o buraco, buraco que você enxerga _________ Botucatu lá embaixo. E eles então esses ________ descem e vão influenciar as suturas geológicas, que são aquelas suturas que cortam as camadas verticalmente, ou subverticalmente, e que muito profundamente, e que deram origem ao vulcanismo dos basaltos no Paraná. ___________________. Arenito de Botucatu, arenito Guarani hoje é formado por duas camadas, ____________ litoestratigráfica, chamadas camadas litoestratigráficas. Litologia estratigráfica ________________ entre Jurássico e Triássico. O Triássico fica em cima, o Jurássico fica em baixo, Jura-Triássico, e nós encontramos esse Jura-Triássico no domínio dos dinossauros,
na época dos dinossauros. A Bacia do Paraná era um grande deserto. E o mundo inteiro um grande deserto. Porque nós encontramos essa seqüência basalto e arenitos no triássico lá na África. Encontramos lá no Volge da França, era um grande deserto. A terra então quando dizia assim, mudança climática, a terra vai ter mudança climática muito maiores e mais extensas. E na época no triássico, que é já no, na época, no terciário e quaternário. Na época do terciário já dominava um clima quente e úmido, devido aos vulcões que já lançavam as cinzas na atmosfera e impedia o sol de nos atingir. Nós encontramos 72 linhas de arrecifes em frente a Recife. E encontramos linhas de arrecifes que cortam as praias e vão
o continente e vão até as falésias das barreiras _____ mortas, como Guararapes e companhia. Então o mar subiu cinco, seis metros acima do nível atual inundando toda a planície de Recife. Agora você vai ver que precisa cuidar muito da qualidade porque eles estão explorando um aquífero
confinado em Recife. Que é o Aquífero Beberibe, do Cretáceo. Esse aquífero fica lá em baixo sobre os _______, que é do Cretáceo superior, ele já fica lá em baixo e o nível sobe. Eles rebaixam e dizem assim: "Entrou água salgada." O poço é mal feito. Porque a água salgada você escuta a cachoeira, entra pelo freático. Quer dizer, a principal problema é o poço mal feito. O poço mal feito. O poço mal feito, o pior problema do Brasil é o poço mal feito, que não leva em consideração a estrutura geológica. E nós temos a estrutura geológica em todo o Nordeste, que é cristalino em todo o Nordeste, que é bacia sedimentares e você vai ver o São Francisco vai Nordeste, Sul, Sudeste. Vai lá para cima e depois ele vira a 90 graus para a costa. Vira em cima de Salvador, ou de Alagoas e Sergipe. O São Francisco tem um processo, é um regime extremamente influenciado pela geologia. Porque ele percorre uma estrutura geológica definida pela abertura do Oceano Atlântico que começou aqui no Pré-Cambriano e terminou lá em cima no Terciário, e no Cretáceo. De formas que a, quando a Petrobras foi criada em 1950, que não se tinha conhecimento geológico nenhum, no Brasil sobretudo, ou do...
P/2 – Nós estamos falando um pouco do São Francisco.
R – Do São Francisco, o São Francisco segue e volta quase 90 graus para o Oceano Atlântico. O Oceano Atlântico nem sempre existiu. A Pangea, a Pangea é o bloco dos continentes todos juntos. Quando vou no Cretáceo, há 60 milhões de anos, a abertura deriva continental que em 1861 o nosso amigo Werner já falava dela. Que era um alemão que viu que o continente
da América do Sul colava na África, e houve a separação no Cretáceo. A partir do Cretáceo eles ficaram independentes. O lençol tende a se enrugar onde, na parede, onde não para o deslizamento. Então o que acontecia com a corrente do Brasil? Todas as bacias foram levantadas e empurradas contra a Cordilheira dos Andes. A Cordilheira dos Andes se enrugou e formou a grande montanha aqui no sul, ao passo que no Oceano Atlântico tinha um gradiente, ela baixava. Todos os rios do Brasil são rios de planaltos. E seguem suturas geológicas antigas. A Serra do Mar começou a subir no Pré-Cambriano. Pré-Cambriano, ____ antiga. Quando veio a Serra do Mar e a Bacia do Paraná enquanto na Serra do Mar ele subia, subia, subia, e chegava a dois mil metros, três mil metros de altura, no Paraná baixava, baixava, baixava. Nós vemos o exemplo que o arenito Botucatu, o Guarani, foi lavado pelo menos 300 vezes por essas variações de cotas entre o nível do mar, que ele chega a dois mil metros lá no interior de São Paulo. O basalto, que tudo indica que a sutura geológica que é percorrida pelo Rio Paraná, que a sutura geológica é muito tranquila de se perceber. Que quando você tem a rocha fraturada ela é mais erodível, mas facilmente transportada. Por isso as calhas do rio são conhecidas como suturas geológicas. O São Francisco tem uma sutura geológica norte-nordeste. E é sul-sudeste. E que volta para o leste lá na altura de Pernambuco. E então isso faz com que o Rio São Francisco hoje tenha três regimes independentes: acima de Sobradinho, abaixo de Sobradinho e lá na Foz, abaixo de Xingó, que fica em Aracaju. Aracaju significaria Sergipe. Fica em Sergipe. Então os terrenos Cretáceos e Terciários desenvolveram mais aqui no estado de São Paulo. Indicando que houve uma inversão do relevo nesse período. E houve uma tendência a todos os rios mudarem de perfil, que antes corriam para o Pacífico, que era o único oceano que era disponível para desaguar, e agora passaram a ter o Atlântico, há 60 milhões de anos atrás.
P/2 – Então essas mudanças todas que vieram ocorrendo nessa história da terra. Essa mudança atual que está todo mundo falando é mais uma mudança.
R – É mais uma mudança.
P/2 – Isso então, não necessariamente tem a ver com toda essa questão da poluição, o senhor não acha?
R – Não, eu acho que não. Esse problema do buraco do ozônio, que é o FSC, que é o fluor-carbono, que é da geladeira, isso é fajuto. Olha o Bush tem muito o que contar para os seus netos, se ele viver muito. É fajuto. Esse acordo climático aí, da ONU, é fajuto.
P/2 – Por quê?
R – Fajuto porque não é só o Carbono que está aquecendo a atmosfera, é o FFC e outros gases, que nós estamos produzindo. Que são responsáveis por esse sol que entra as oito horas da manhã a gente não pode sair em São Paulo. Esse sol que queima, que exagera atualmente, os lixeiros já pediram protetor solar para a pele, para não morrer de câncer de pele. Então são doenças do norte que eles estão empurrando para baixo.
P/2 – Mas então o senhor está dizendo que tem a ver com a industrialização tudo isso sim.
R – Mas não é ela só a responsável. Isso ia acontecer no tempo biológico. _________ Geologia a ideia de que o homem é um segundinho na história da Terra. Quando a Humanidade surgiu, daí para cá é um segundinho na história da Terra. A Terra não vai desaparecer nunca, porém o homem talvez desapareça, essa condição talvez desapareça. A gente vai ter que viver em cavernas, descer a cavernas e voltar à origem, ao original. No original, um homem muito forte, cabeludo. (risos) Mas daqui a dois mil anos talvez, que começa o novo século talvez. Mas esse período do homem vai desaparecer.
P/2 – Mas isso pela mudança geológica da Terra ou pelo tipo de colonização na Terra que o homem está fazendo?
R – Esse é um agravante, mas não é o responsável, é um agravante. O homem, nos recursos naturais, está admitindo que tudo é: "Não, não tem problema, não." Não tem problema? Vai ter problemas, ter que pagar essa conta depois, nada é de graça nesse mundo. Não tem problema? Você vai pagar a conta depois. "Ah, depois que a barriga encher eu vou pagar a conta?" Ele se vangloria do fato de ele estar com a barriga cheia, vai pagar a conta com a barriga cheia? Mas ele vai pagar a conta, vai pagar.
P/2 – E tem alguma coisa a ser feito ou vamos em frente?
R – Vamos em frente, vamos em frente.
P/1 – (risos)
P/2 – (risos)
R – Vamos em frente porque não tem nada a ser feito. Porque nós tivemos a Interglacial no Quaternário, _______ geológica no Quaternário. No recente Interglacial, e nós vamos entrar em um período de Interglacial agora.
P/2 – Interglacial? Frio?
R – Interglacial.
P/2 – É quente então?
R – É, Interglacial é um período de derretimento das geleiras, dos gelos.
P/2 – Interglacial, quer dizer, a geleira vai derreter.
R – Derreter. O mar vai subir. Os mares todos vão...
P/2 – Mas isso vai trazer problemas para a água, ou os problemas serão de todas as ordens?
R – Serão de todas as ordens.
P/2 – A água nesse sentido o que acontece com ela, a água do mundo, a água doce?
R – A água do mundo, a água doce, ela sofre um processo de reciclagem, a água. Hoje já observamos aqui que a terra exige, estão na reciclagem. As rochas são massas, as águas são também massas ______. E nós temos que pensar que a maior, o Amazonas tem pouca gente nas zonas secas, muitas secas, e atualmente as secas estão atingindo já o nível dos rios. Colocando em secas periódicas no Amazonas. O Amazonas tem hoje que considerar que o ciclo das águas leva muito tempo, muito mais tempo que a gente pensava que era antes, era de um ano. Era muito mais tempo que a gente pensava. Leva milhares de anos, centenas de anos, e que isso precisa ser contabilizado. Que a água subterrânea, a água do subsolo é o principal reservatório da água doce no mundo. E que se nós não fizermos uma coleta razoavelmente equilibrada vai faltar água doce em baixo, e sobrar em cima. Sobrando água na superfície, superficial. E o que nós temos que ver é que esse modelo econômico de uso dos recursos naturais vai ter mil anos talvez de vida. E nesse ponto você tem que repensar a como se adaptar a essa condição. E começa desde agora. ___________________ (risos)
P/2 – Então se o senhor pudesse e tivesse o poder, o senhor sugeriria agora que tipo de caminho, vamos dizer, para o próprio Brasil?
R – Para o Brasil?
P/2 – É.
R – O caminho de uso e conservação. Aquele desenvolvimento sustentável, aquele desenvolvimento que leva em consideração as deficiências em recursos naturais, que leva em consideração que não existe recurso natural ad perpetuum, infinito, tudo tem um limite. E você vai regulando esse limite.
P/2 – Queria que o senhor fizesse uma reflexão, o senhor sabe muito sobre a água, não é? E no Brasil isso foi muito, essa o senhor sistematizou muito isso. E ao mesmo tempo a política do Brasil veio caminhando. O que é que o senhor percebeu nesse tempo da sua vida entre o conhecimento científico por um lado e o desenvolvimento político e social no Brasil? O senhor tem alguma percepção de como isso se entrelaçou? Se entrelaça? Como foi?
R – Faltou ao meu ver um entrelaçamento muito mais salutar e compreensível desses entendimentos. Faltou no Brasil, sobretudo, essa percepção de que esses conhecimentos estariam entrelaçados. Historicamente a gente podia falar, desde o descobrimento para cá você não pode considerar a América Latina como homogênea, como era considerado lá na Espanha e Portugal. E é considerada aqui o Brasil como homogêneo de Brasília. Cada região dessas tem um circuito diferente, um processo diferente de renovação, e de aproveitamento. As cidades litorâneas são de veraneio, onde você vai gastar o que não consumiu durante o ano. E é preciso que esse gasto seja regular. E você tem que produzir aquilo que come, a água que bebe e os recursos naturais que consome. Assim nós vamos ter
influências climáticas que são muito grandes aqui. O tropicalismo não é uma situação muito confortável, estou falando para vocês, isso a longo prazo, _______ a curto prazo. O tropicalismo é realmente muito efêmero, muito _______ o tropicalismo. Exigindo que a gente tome medidas severas logo, se queremos sobreviver, se não vai perecer todo mundo no mesmo balaio. Todo mundo, todo, no mesmo balaio. Eu não posso, um modelo que é canadense, eu não posso transportá-lo para cá. Porque lá eu tenho condições específicas de uma infiltração muito profunda e de cima para baixo. Porque chove lá como neve, aqui chove mais horizontalmente, e chove mais líquido. E lá a neve que aquece o sol, o sol aquece a neve e vai derretendo e ela vai infiltrando, infiltrando, infiltrando, infiltração mais vertical, aqui é mais horizontal. Por isso lá tem uma capacidade de autodepuração muito mais baixo, porque não tem energia solar. Aqui muito mais alta, ________ dos fluxos de água.
P/1 – Então, aproveitando que a gente está falando das viagens que o senhor fez, eu queria que o senhor falasse um pouco assim: a segunda vez que o senhor foi para a França o senhor já era casado com a Dona Suzi.
R – Já.
P/1 – E o senhor foi com as crianças também.
R – Fui.
P/1 – Qual que foi assim a mudança toda da família, como é que foi mudar, a família toda viajar junto, ir para o estrangeiro?
R – Olha, foi muito gratificante. Muito salutar para o país e para nós. Porque eu tinha estado na França antes como solteiro. E agora eu via um país diferente. E com proporções diferentes, e com perspectivas diferentes. E agora eu tinha amigos lá. Eu tinha amigos aqui. Era muito diferente a gente via. Eu viajava de primeira classe. Nos trens pegava ____ primeira classe, por conta do governo francês. Eu não estava nem ligando. Isso era muito bom. Muito bom porque eu tinha uma bolsa do CNPQ, a bolsa do governo francês, uma bolsa, e que ___________, no meu curso de língua francesa, Madame Chevale, fazia, uma cavala...
P/2 – Madame Cavala. (risos)
R – Madame Cavala. (risos) Chevale que fazia.
P/1 – Em que cidade vocês foram morar?
R – Estrasburgo. Estrasburgo fazia 20 abaixo de zero, durante o inverno. Foi dureza.
P/2 – E as crianças gostaram? Como é que foram...
R – Gostaram muito, muito. Eu fui a um colégio matricular as crianças. Eles diziam assim: "Onde é que você mora?" "Aqui." Ele disse: "Não, seu endereço qual é?" "É aqui."
"Nós é que temos que arranjar uma vaga para você, não ______ de aluno não. E você vai ficar aqui no colégio confessional." Eu disse:"Confessional? O que é que é isso?" "Confessional é um colégio de freiras da confissão, confessional." Então eu disse: "Confessional? Que é isso confessional?" Ele disse: "Colégio de freiras que têm uma religião e têm uma confissão como base da religião." Eu disse: "Olha, meus filhos são católicos apostólicos romanos e batizados, mas só batizados. Eu não tenho nenhuma religião." Ela disse: "Então é difícil assim para você entender que essas escolas _______ os meninos estudem em um colégio confessional. Quanto mais o senhor insistir nesse parâmetro, mais difícil vai ser entender. A ________ não ________." Elas obrigavam os menores, que é a Simone e Lídia a dormirem depois do almoço. Enquanto que André ficava jogando bola depois do almoço. Quando eu chegava lá para pegá-los à tarde, eles ficavam o dia todinho no colégio, durante a manhã eles estudavam e a tarde faziam esporte. Eu chegava no fim da tarde, André pegava a bolinha dele, onde estivesse, ele vinha colocava a bolinha no cesto, apertava a mão do professor e saía. Eu digo: "André, que é isso rapaz você _____ a bola." Ele chegou e disse que se for para ______ primeiro, que ele queria que o molequinho lá de _______ estivesse com aquela indumentária lá de Estrasburgo. Porque ele nunca tinha visto um cara seminu. "Esses moleques não têm, esses meninos não têm roupa, não?" (risos) Então ele achava que eles não tinham roupa. Eu digo: "Não, é o clima, rapaz, é o clima que é tão frio aqui." ___ foi para beira mar, para a beira da praia, com uma casinha que a gente tinha lá de ______, porque o apartamento tinha alugado e ia até o fim do ano. E o cara não saiu. E era um cara amicíssimo, que eu tinha _____ amigo. Amicíssimo. E ele não teve jeito, não saiu. Que era para morar ____________. Eu saí e fui para a praia. Ele disse: "Ah, mas você está saindo da casa?" "Eu tenho um apartamento lá na praia eu vou ________ casa lá." E eu fiquei no Recife durante nove meses só recebendo ______ do diretor do Instituto de Geociências, que era o Nilson. Porque eu tinha ido para a França fazer um doutorado de estado francês. Que era o mais alto grau. E ele tinha feito doutorado da universidade, que era o mais baixo grau. E eu tinha ido fazer o doutorado de estado que é o mais alto grau. E ele dizia: “É, você fez o mestrado e eu fiz o mestrado na seguinte forma, você chega lá eu não falava francês, era mais conhecido pelos americanos, doutores americanos”. Porque os americanos eles analisam o seu curriculum, as notas que você obteve na escola. E você pode chegar a ser um PhD, sem ter publicado nada. Eles olham só as publicações. Aí ele dizia: “E você só mestra a tese, o francês era uma comissão, que é multidisciplinar e que leva muito tempo para analisar”. Eu fiquei uns três meses na universidade esperando que eles analisassem o meu currículo. Finalmente veio o cara dizer que eu não podia fazer o doutorado em Geociências. Eu disse: "Eu tenho que fazer em Geociências." Esse orientador era um geólogo que era o Millor. Ele disse: "O seu doutorado, pelo projeto que você apresentou, é, sobretudo de Ciências Humanas, Sociais, Economia. Sabe o que é econômico?" Eu disse: "Eu tenho que fazer em Geociências, porque meu orientador me mandou para cá. Era para eu fazer o doutorado em Geociências." Ele: "Não, você vai fazer em Ciências Humanas." Eu fui e disse: "E se eu tirar essa parte aqui?" "Ah, pode ser." "Ah, está ótimo." Tirei uma parte da tese e deixei a tese, e acabei desenvolvendo o trabalho todo. Fiz a parte de custo de água na Bacia do Potiguar, no Rio Grande do Norte, que era a Bacia Escola. Levei um saco de documentos: "A minha base é essa aqui." Ele disse: "Está muito bom essa base." Era um saco de documentos. "A minha base está aqui." E lá é um problema social muito grande no nordeste. Ele: "Por que é um problema social?" "É econômico e social, porque o Banco Mundial só financia projetos que são inviáveis nos países em desenvolvimento e emergentes como o Brasil." Eu tive que explicar isso, foi fogo. (risos) É isso mesmo. Eles só financiam aqui se isso já vai nos deixar mais pobres do que rico, não vai a lugar nenhum. O Banco Mundial é terrível. Tanto assim que minha filha que estudou Ciências Humanas na USP, a Lídia, ela fez Ciências Humanas na USP, a orientação do, de um cara aí de lá que atualmente é um diretor do Instituto. E ela fez Ciências Humanas na USP e disse assim, que ela foi para a Gazeta Mercantil e o último artigo dela acho que não vai ser publicado, não. E não foi. Ela pediu demissão e foi para o Estadão. Eu digo: "Você vai ter muito problema no Estadão, porque os caras lá além de incompetentes são picões. Eles procuram levar você para a cama."
P/2 – (risos)
R – Ela ficou apavorada. Não tinha três meses no Estadão, pediu demissão. Foi para a Abril. Eu disse: "Você está muito volúvel. Você deixou um brasileiro nato, um quatrocentão por um italiano." (risos)
P/1 – (risos)
R – Ela disse: "Não, não sei o quê, não sei o quê." Quando ela fez a reportagem sobre os postes, o que estava faltando nos postes com as novas televisões pagas, eles disseram: "Isso aqui não vai ser publicado, não, Lídia. Sinto muito, mas não vai ser publicado, não." Não foi publicada, a Abril deu para ela uma licença sem remuneração para ela ir para Washington. Ela vai para o Banco Mundial, e eu disse: "Você não vai durar muito no Banco Mundial, não. Os caras lá são muito cretinos, e são muito prepotentes, são muito politizados." E ela foi, ficou lá e saiu para Avina, que é uma ONG. Uma ONG. Eu disse "Aqui pode ser, mas você vai ver, que eles vão te jogar para cima e para baixo até você desistir." Ela foi para Recife, montou escritório lá, voltou para Curitiba e já está em São Paulo. Ela já está no retorno. Na próxima vez vai para, a gente vai dizer: "Olha, ______ tem um posto lá em Belô, ou você pega o se lasca. E você vai se lascar." E ela está na Avina hoje, é difícil.
P/2 – Mas o senhor acha que ela é uma filha... O senhor tem orgulho dela?
R – Me orgulho dela porque ela é batalhadora, e é insistente e convence todo mundo. E convincente. E eu estou aqui por causa dela.
P/1 – (risos)
P/2 – E os seus outros filhos, o que é que o senhor, o senhor tem orgulho também? O que o senhor...
R – Muito. O André fez a mesma profissão que eu fiz: Geologia. E hoje é diretor presidente da Arcades, que é uma holandesa que faz tratamento de água, ligado à água, hidrologia. Hidrologia ele faz ________ quando você cria uma indústria a Cetesb indica ele para você fazer o contrato com ele. E aí a Doroti funciona como uma espécie de bypass no sistema. E ela indica ele, e ele faz _______ a base ambiental do seu terreno, do terreno que você quer comprar. Eu não faço nenhum negócio hoje sem antes mostrar a André. "André, eu posso comprar isso?" "Não." Lá em, lá na Lapa eu fui comprar um apartamento: "André, você conhece o apartamento tal?" "Conheço, o prédio tal." "Ah, conhece. E o que é que, eu posso comprar?" "É, esse apartamento aí a gente fez um diagnóstico do terreno e condenou o apartamento." "E o que eles fizeram por lá?" "Eles fizeram a garagem toda em cima." Eu cheguei achei estranho, porque eles estão em um morro. Eles deviam ter rebaixado um pouco, eles ganhavam já o nível. Porque aqui tinha um posto de gasolina. O tanque de gasolina vazava muito. E gota a gota ia entrando no solo. Ele disse assim: "Se você quiser morrer sobre um _________, vá para lá." Então eu não comprei o apartamento.
P/1 – E tem mais um menino?
R – E tem mais uma outra que é Propaganda e Negócios, na Morumbi, que essa não fez na USP, não.
P/1 – Como que ela chama?
R – Simone. Simone, essa fez, eu digo: "Enquanto eu for vivo, você não engole sapo, mas depois que eu for, que eu bater as botas, você vai engolir sapões. Mas enquanto você puder não engolir sapo, você vai levando." E ela é consultora da Natura, hoje ela é consultora da Natura. Consultora, vendedora da Natura. São produtos Natura, e vive em inoculações mentais, aquela confusão.
P/1 – (risos)
R – Inoculação mental e a confusão. (risos) Ejaculação mental. Eu digo: "Simone, enquanto eu viver, você não engole sapo, mas que depois que eu morrer, você vai engolir sapões. Você vai ver." E assim é a vida. Assim é a vida. Você coloca três no mundo e cada um segue a sua carreira, e você não pode fazer nada.
P/2 – E a sua esposa?
R – Ela fazia no Recife, era bancária, trabalhava em um banco. Quando casou, teve que sair do banco. Na época a CLT não permitia mulheres casadas trabalhando em banco, ela teve que sair do banco. E eu pensei que tinha dado um golpe do baú (risos), porque ela _______ muita grana. Eu disse: "Ai, deixa o banco." Ledo engano, mas eu só vim descobrir depois de casado. (risos)
P/2 – Quer dizer, que o senhor achou que ela era rica, então?
R – É, que era rica. E aqui o português chega, puxando a cachorrinha, mas ele põe uma padaria, daqui a pouco põe o padeiro, daqui a pouco fica no balcão, só atendendo os fregueses e as freguesas. E daqui a pouco ele tem um império econômico. Eu digo: "Esse cara aí vai ser uma mão na roda." Que nada, era um pobretão desses, safado. Ce lá vie. Mas são as coisas da vida.
P/1 – Mas ela acompanhou a vida toda o senhor?
R – Acompanhou. 40 anos nós fizemos o ano passado, e agora vai já para 50 anos. Ela está me preparando para os 50 anos de casamento...
R – ...de casado com ela. Ela é formidável. Ela é realmente formidável, segurou todas _________ que eu dei, que eu levei-a para a Europa e depois fui ver, todo ano eu ia à Europa durante o período que eu estive na universidade, e todas as vezes ela foi à Europa. Paris a gente conheceu depois dessas viagens, porque na época que a gente esteve lá, os meninos eram pequenos e não podia chegar em Paris, não. Porque Paris era terrível. É um país muito difícil de viver, a França.
P/2 – Muito difícil.
R – Muito difícil de viver, sobretudo com família, com filhos. Porque lá o cachorro tem mais valor do que o filho. O cachorro tem mais valor, é mais importante que um filho. E o que é que está piscando aí? _________
P/3 – Está acabando.
R – Está bom.
R – Ela foi, é meu braço direito. Ela toma conta de todos os bancos, que ela gosta muito de banco.
P/2 – Ela gosta de banco?
R – Gosta de banco. Ela gosta de banco. Eu já descobri agora que ela gosta muito de banco, porque ela se enfeita toda, se emperiquita toda, vai para o banco. Eu digo: "Vai para o banco para falar com os seus colegas?" (risos) "É, eles estão querendo uma consultoria para decidir se vão ou não vão reformular, reformar a agência. Eu vou lá dar os meus pitacos como cliente." (risos) Ela vai lá dar pitaco, eu digo: "Puxa vida, vocês fizeram, foram tão obedecidos que você tem um pitaco muito forte." (risos)
P/1 – (risos)
R – Ela faz, foi na agência do Banco do Brasil, que ela gosta muito, e fez um pitaco lá. Eu digo: "Aqui está a minha mulher francesa, ali está a americana, ali está a canadense, ali..." Eu ia distinguindo assim onde é que o dedo dela estava. E ela fez um canadense, um americano, e eu disse: "Rapaz..." eu trouxe um visitante da França e ele disse: "Rapaz, esse banco é muito bom, rapaz. É como se fosse um banco francês." Eu digo: "É o pitaco daqui." Ela deu o pitaco do banco francês, deu o pitaco do banco americano, deu o pitaco de um banco espanhol, deu pitaco em uma questão lá. Eu digo: "Você está influenciando muito esse gerente”.
P/2 – Mas e agora, o senhor então está casado com ela e teve toda essa carreira. O senhor tem alguma coisa que o senhor acha importante assim de reflexão da sua vida? O que é que o senhor vê que... O senhor tem alguma conclusão? Alguma avaliação de toda essa sua trajetória tão rica, tão cheia de viagem?
R – Que o Brasil não é um país de viver, país para morar. Onde ele passa uma chuva e essa chuva descer rápida. E depois de cumprir essa tarefa, você devia ir embora para outras águas e outras situações. Porque não aproveitam nada nesse país. Não reciclam, não reusam, as pessoas, é muito difícil viver nesse país.
P/2 – O senhor tem vontade de ir para outro lugar?
R – Para a França, talvez eu fosse para a França. Não, acho que não. Todos os lugares são parecidos. O Brasil está querendo imitar os povos desenvolvidos. E que isso me dá uma tristeza, um desgosto. O Brasil tinha condições de estabelecer o modelo específico dele para o mundo ______. Ele está empurrando o modelo, goela abaixo, o modelo americano, o modelo de outros países do norte. Do Hemisfério Norte. A gente continua aqui porque é a circunstância. Mas olha, é muito difícil viver nesse país por essa mania que tem, um cara, nós somos pobres, um cara desses estava lá na Holanda onde ele estava fazendo um seminário sobre água, ele disse: "Somos pobres de água em Recife." Eu disse para ele: "Você é safado, mania de fazer política." "Sou político", ele disse. Ele se declarou político. Olha, eu sei que tem pessoas aqui que estão bem intencionadas, mas eu quero só um resultado para a casa, para o meu país. Política. Porque eles gostam muito parecendo uma vontade louca de ser considerados pobres, miseráveis. Falei: "Você não é pobre, não, você é desonesto."
P/2 – Isso quem são? São brasileiros lá fora?
R – Lá fora. Eles apelam muito para esse problema. É uma apelação. Eles se sentem bem por dizer que são pobres. Esse é o problema. "Você é um explorador e que está na classe superior, e você é ____________, tem lá." Então eles não gostam, não.
P/2 – Tem mais alguma pergunta?
P/1 – Não, está ótimo.
R – Está ótimo.
P/1 – Chega?
R – Olha, hoje eu ____ outra vez, falar a impressão que eu vivi em um só dia. Eu digo: "Mas, Suzana, você está querendo desde o início já trambicar?"
P/1 – (risos)
R – (risos) "Não, você não _________ não, porque você ainda vai voltar aqui. Tem que saber que você veio com essa roupa. E é a roupa do dia." Eu digo: "Você já vai querer que eu uso só ____________ do Museu da Pessoa __________ já seja enganada”. (risos) É. Ela deve estar lá na biblioteca agora.
P/1 – É, ela está aqui em cima. O senhor gostou de dar a entrevista para a gente?
R – Muito, muito, muito. Vocês são ótimas. Vocês, olha, realmente as historiadoras tem uma história para contar.
P/1 – E de olhar assim para a sua infância, desde quando a gente começou lá no Ceará, como é que foi o processo para o senhor?
R – Foi doloroso porque eu tenho que, a cuca aqui, tomar aquelas coisas. Ah, eu queria __________, papai não terminou o curso de Engenharia, nem um curso superior. Ele não tinha diploma superior.
P/1 – Ele foi um autodidata, certo?
R – Foi um autodidata. Foi um autodidata. E era um juiz porque ele tinha, e ele lia muito, e ele tinha como regra ler muito. A FTD ele leu toda a coleção FTD. E isso lhe deu uma bagagem muito grande em Física, sobretudo. Física e Engenharia. Então assim que os caras __________, ele sempre era chamado. Vinha helicóptero lá em casa pegá-lo de
manhã e trazia a tarde. Um helicóptero. No começo em que o Brasil o helicóptero era uma figura remota. Na década de 50 eu vi o papai subir de helicóptero. E _______: "Esse avião - que eles estava perto da cerca -, esse avião sobe na vertical?" E ele subia na vertical, o helicóptero. E papai ia nele, porque os caras das salinas, montavam as salinas, eles não sabiam nada sobre a operação, teor, o grau de sal que tinha a água. E ele ia lá ensinar isso. Isso é o coração o aquecimento solar, e o teor de sal d’água. E os cata-ventos. Os moinhos d’água que ele passava, a água ia embora para outro, que eram feitos os cata-ventos. Os moinhos. Então eu digo: "Papai, e as bombas?" Ele introduziu as bombas. Já existia isso, engenharia, ele rapidamente introduzia esses conceitos novos, modernos. Era muito aberto. E depois que ele teve uma visão nos mandar estudar, todos os 16 estudaram fora. Todos os 16. E quando ele terminou ele fechou a escola da nossa casa. Ele fechou a escola porque ele não queria mais ver menino lá. Só os netos é que chegaram bagunçando todo o coreto.
P/1 – Então, seu Aldo, obrigada pela entrevista.
R – Muito obrigado também.
P/1 – A gente agradece demais o senhor ter vindo aqui, e ter colaborado com a gente, obrigada.
P/2 – Obrigada, seu Aldo.
R – Eu espero que vocês tenham aproveitado bastante esse papo.Recolher