IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Gil Chinellato, nasci em Campinas em 30 de setembro de 1957. FAMÍLIA Meu pai é Gilberto Chinellato e minha mãe é Maria Terezinha Darros Chinellato. Minha família é italiana. Por todos os lados, meus ancestrais são italianos. Convivi com os quatro...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Gil Chinellato, nasci em Campinas em 30 de setembro de 1957.
FAMÍLIA Meu pai é Gilberto Chinellato e minha mãe é Maria Terezinha Darros Chinellato. Minha família é italiana. Por todos os lados, meus ancestrais são italianos. Convivi com os quatro avós e me lembro muito bem deles. Do meu lado paterno, meu avô Ângelo é um grande relojoeiro, muito capacitado e um grande gravador de jóias, de troféus, taças. Ele tinha uma linda letra. Eu me lembro muito bem dele fazendo esses trabalhos. Do lado da minha mãe, meu avô materno, também italiano nato - o típico italianão, torcia pelo Palmeiras - viveu como todo imigrante, viveu no campo. Veio da Itália pequeno, foi pra roça, depois veio pra cidade. Fez a vida dele na cidade. Meu pai é comerciante, já vindo do meu bisavô, que chegou da Itália e se estabeleceu como comerciante. Depois o negócio continuou com o meu avô e meu pai cresceu no comércio.
Meu bisavô, o Luigi Chinellato veio da Itália com os filhos. Veio no final do século 19, em 1880 e alguma coisa; 86, se eu não me engano. Ele veio pra cá, foi para as fazendas, como todo mundo. Mas já vinha de vivências dele na Itália, de trabalhar como comerciante e começou a vender relógios. Não em Campinas, mas na região de Cordeirópolis, Limeira que é aqui pertinho. Ele veio pra Campinas com o filho mais velho, montou a primeira loja que foi a Relojoaria Chinellato, em 1921. Meu avô é um dos mais novos da família. É uma família grande e começou o negócio. Na verdade, foi com o Pedro, o filho mais velho, que meu avô trabalhava e depois ele se associou, em 1942, com outro comerciante, também descendente de italianos, de Mogi Mirim, que tinha uma relojoaria lá, que é o Ricardo Cop, da família Cop. Se uniram e formaram a Cop & Chinellato. Montaram a relojoaria Omega, que até hoje existe. A Omega era no centro da cidade. Eles compraram uma relojoaria na frente da Relojoaria Suíça e ficaram com as duas lojas. O prédio da Omega foi demolido pra construir outro prédio, um edifício. Eles mudaram e a relojoaria Omega ficou no lugar da Suíça, na Rua Conceição, no centro. Ali que meu pai e meu tio - irmão do meu pai - começaram, já pequenos, a trabalhar juntos. Dali, cada um montou o seu negócio: meu pai montou a Gilberto Chinellato e meu tio montou a Toni Jóias. Tudo ali muito próximas uma da outra.
Nessa hora, meu avô desfez a sociedade. Isso já foi em 1950. Meu pai montou a loja em 1953 e meu avô manteve a sociedade até 60 e tantos. Ficou mais de 20 anos com a sociedade, praticamente de irmãos, com o Cop, que é como se fosse um grande irmão pra ele. Ele saiu dessa sociedade pra ajudar os dois filhos nos dois novos negócios, nas duas novas lojas.
A outra Chinellato, que abriu em 1921, que era do outro irmão do meu avô, também durou 75 anos; fechou em 1996. E a Toni Jóias do meu tio fechou um tempo depois. Nós estamos até hoje. Depois da morte do meu pai, a minha mãe assumiu o controle da empresa e estamos aí, tocando até hoje.
Tenho uma irmã que chegou a ter atividades no comércio, mas hoje ela não trabalha mais com isso. Ela mora em São Paulo e tem outras atividades.
INFÂNCIA Nasci no centro da cidade. Até os oito anos, eu morei no centro ou próximo do centro. A minha vida era por ali. Brincava nas praças e havia bonde na época. Eu curtia muito aquilo lá. E depois, mais tarde, já adolescente, fui pra São Paulo estudar, fazer faculdade de Engenharia. Quando eu voltei, nós já não morávamos mais no centro. Morávamos em um bairro mais afastado. Eu morava em frente à praça onde sempre teve a Igreja do Carmo. Todos os meninos da minha idade brincavam ali na rua. É um pouco diferente do que é hoje: saía pra rua, brincava, empinava pipa, jogava bola, andava de bicicleta. Fazia a igreja de palco para as nossas brincadeiras de esconde-esconde, no meio dos bancos. O padre e o sacristão nos conheciam. Minha infância era por ali. Era tranqüilo, tinha um ponto de táxi na frente de onde eu morava e nós éramos amigos dos taxistas, de todos os senhores, eles gostavam de nós, nós brincávamos com eles.
TRANSPORTE Eu lembro que com nove ou dez anos de idade eu estudava na Escola Alemã Rio Branco, que era perto do Viaduto Cury. Não era muito perto da minha casa. Eu ia cedinho pra escola, meus pais me levavam, e muitas vezes eu voltava de bonde. Pequenininho, com oito, nove, dez anos de idade eu voltava de bonde da escola. Hoje acho meio perigoso, eu não confiaria um filho meu de nove anos, em um bonde sozinho, mas na época era tranqüilo. A gente se empoleirava naquilo e vinha. E era gostoso, vinha brincando, vinha com os amigos.
COMÉRCIO DE CAMPINAS Eu lembro que eu ia cortar cabelo em um magazine, como tem hoje a C&A, e dentro tinha um barbeiro infantil lá. Nós cortávamos o cabelo dentro da loja. Era Casa Regente, na Rua Costa Aguiar. Era um magazine antigo, tinha um barbeiro no meio da loja.
Eu me lembro que na praça em frente de onde eu morava, tinha um armazém de uns irmãos portugueses, lógico e eles eram muito meus amigos. Nós brincávamos dentro do armazém: corria, entrava, saía de dentro do armazém, ia ao depósito, pegava caixa de papelão. E lá era o nosso mercado. Não tinha supermercado, então era um mercadinho de bairro.
VIAGENS Eu tinha parentes em São Paulo - primos e tios - e nós viajávamos para passeio com os meus pais. Eu também ia, às vezes, com os meus pais buscar taças, troféus para nossa loja. Íamos nas indústrias trazer material e íamos de carro.
EDUCAÇÃO Estudei no Colégio Rio Branco, que é uma escola alemã, do primário até a quarta série. Depois fui para o Colégio Pio XII, que é uma escola que pertence a PUC [Pontifícia Universidade Católica] de Campinas. Terminei o colegial lá. De lá eu fui para São Paulo fazer faculdade. Eu quis estudar Engenharia. Me formei, voltei pra Campinas e montei o meu escritório de Engenharia que eu mantenho até hoje; já está fazendo quase 30 anos. Eu faço projetos de estruturas, mas eu não podia deixar de dar continuidade na loja, porque é uma empresa que já está há mais de 50 anos. Estamos tocando e eu acho que tem que continuar.
VOCAÇÃO PARA O COMÉRCIO Não sei se eu tinha vocação para o comércio. Eu sei que nós vamos fazendo, aprendendo, se envolvendo e acaba criando gosto pela coisa. Todo negócio eu acho que é assim, não só o comércio. O negócio em que você se envolve tem os seus atrativos, você acaba se envolvendo mesmo com vontade.
Eu ia pra loja, ajudava, fazia alguns servicinhos internos... Sempre fiz, nunca parei, mas nunca pensei que eu iria continuar o negócio. Minha idéia era estudar alguma coisa qualquer e tocar uma carreira independente. Em parte consegui também porque eu consegui os dois negócios, as duas coisas. São dois “Gils”. Uma linguagem pra cada coisa. Eu tenho horários distintos, não resolvo assuntos de uma atividade no meio dos negócios da outra. São coisas bem distintas.
JUVENTUDE Como todo adolescente, nós fazíamos muita coisa: festinhas de amigos, em festinhas de não amigos, vivíamos assim. Quando eu comecei a fazer programas com os amigos não tinha muita coisa. Campinas cresceu depois nesta atividade de lazer pra adolescente, pra jovem, quando as universidades PUC e Unicamp se instalaram e começaram a crescer também. Aumentou, vieram muitos estudantes, mas quando eu comecei a fazer programas não tinha muita coisa.
Ia, às vezes, para os clubes tradicionais da cidade que tinham as festinhas, os bailinhos e outros eventos. Havia muitos cinemas bons no centro da cidade. Hoje não tem mais nada no centro, mas nós freqüentávamos muito o cinema.
Viajei sozinho, com amigos, depois de 17, 18 anos, nos finais de semana, principalmente para a praia. Antes eu viajava com a família. Íamos pra praia, viajava de carro. Naquele época não se viajava de avião, eram viagens de carro pra praia, para o Rio de Janeiro, para o interior, ia pra onde dava.
TRANSPORTE Fiz algumas viagens de trem. Eu peguei um trem para o litoral, pra Itanhaém. Ele saia de Campinas, passava por São Paulo, descia a serra. Era uma viagem bonita.
Houve uma época em que fui escoteiro e fazíamos umas viagens de trem pra acampar. Isso com 15 anos, 14 anos. Eu peguei trem pra São Paulo, também, algumas vezes. O trem era engraçado. O que ia pra Santos, descia a serra e depois pegava a Praia Grande até Itanhaém; era um trenzinho antigo, tudo de madeira. Os vagões de primeira classe eram todos simples e os de segunda classe eram com bancos duros, de madeira. Havia vagões melhores, mas eu lembro que era bem antigo. A viagem era muito divertida. A parte da serra era muito bonita. Eu gostava porque era tranqüila, era um passeio.
CIDADES / SÃO PAULO / SP Eu nunca me adaptei a São Paulo durante os cinco anos de faculdade. Eu gostava, tinha muita coisa legal, nós fazíamos muita coisa diferente, aproveita muito a cidade, mas a vida... É uma cidade boa, uma cidade grande, uma metrópole, tinha de tudo, mas eu não gostava de ficar lá. Tanto é que todos os fins de semana eu voltava para casa correndo.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Depois da faculdade, quando voltei, eu comecei a auxiliar na loja, a fazer alguma coisa. Não atuei assiduamente não. Eu me dediquei à Engenharia, à minha área. Estudei mais um pouco, me especializei e fiquei na Engenharia. A loja eu fui continuando. Eu ficava mais um pouco à distância, supervisionando a empresa. Eu achava que eu tinha um conhecimento bom pra palpitar em tudo e eu ficava gerenciando de longe.
O segredo é vender o que nós fazemos; tem que saber vender o seu peixe. Por mais capacitado que nós sejamos, por melhor engenheiro que eu seja, eu tenho que saber vender o meu produto. E nós sentimos isto na loja, vemos como é o relacionamento com o cliente, com as pessoas e vamos aprendendo. Sem dúvida, influencia muito também no meu relacionamento com os clientes do escritório de engenharia porque também é uma venda como no comércio.
Meu pai já tinha falecido, minha mãe assumiu o comando da loja e, apesar de a loja ter funcionários muito antigos, com mais de dez anos de casa, a gente que toca a empresa. Tem que ser a família que comanda, minha mãe continua comandando. Só que ela vai ficando com mais idade e nós falamos: “Olha, está na hora dela parar. Chega, vamos dar ordem pra passar pra outra geração.” Muito embora ela não queira. Ela continua, está com 76 anos e ainda vai todo dia na loja. Eu estou administrando, me envolvendo mais por conta disso, mas está na hora da renovação.
OFÍCIO DE GRAVADOR Quando o meu avô veio trabalhar com o irmão mais velho na Relojoaria Chinellato, ele foi aprendendo. Era novinho e foi aprendendo gravação, ourivesaria, conserto de relógio. Todo serviço interno de uma empresa, ele foi aprendendo. E ele se transformou num grande gravador. Ser gravador é um trabalho meio artístico, gravar no metal com um burilzinho é um trabalho artístico. Ainda hoje eu estava conversando com o pessoal da Omega e eles falaram: “Seu avô foi o melhor gravador que existiu na cidade” Relojoaria e joalheria sempre têm gravação: o nome da pessoa no relógio, as jóias gravadas eram feitos à mão, com o buril. Isso é antigo, vem de 1930, por aí.
Meu pai quando montou a empresa em 1953, ele já era gravador também de jóias. A gravação de troféus é o mesmo trabalho. Se você pegar uma peça de metal grande e gravar um texto qualquer é a mesma coisa. Então o meu pai montou a loja que tinha além de relógios e jóias a parte diversificada com prêmios e homenagens, que são troféus, taças, medalhas, placas, essas coisas que envolvem gravação. Eles usaram o conhecimento que eles tinham de gravação.
CHINELLATO A loja foi mudando com o tempo. Depois de uns anos aboliu o relógio. Ficou a parte de jóias, presentes e coisas assim. E a parte de prêmios e homenagens. Quando alguém quer homenagear alguma pessoa e não tem idéia do que fazer, lembra de nós: “Vamos ver o que eles tem lá.” Ou então o cara imagina uma coisa super maluca: “Quem será que faz isso? Vamos lá na Chinellato ver se eles resolvem o nosso problema.” Aparece sim muita coisa maluca, muita coisa diferente que nós temos que quebrar a cabeça pra conseguir transformar em um produto.
Nós desenvolvemos também. As pessoas vêm com uma idéia e nós tentamos transformar essa idéia em um prêmio, em uma homenagem. Tem coisas engraçadas. Ainda esses
dias, chegou uma pessoa, mandou um desenho de um troféu que é uma letra “i”; o pingo do “i” tem que estar flutuando no ar. É isso que eles querem. É uma peça de metal, um “i” de metal e um pingo. Se colocar um aramezinho segurando o pingo já fica feio... É lógico que não dá pra fazer um pingo flutuando, mas nós temos que dar uma solução que mostre o pingo fora do “i”. Eles não têm idéia de como fazer, eles querem que nós resolvamos. Buscar soluções, alternativas que dêem esse efeito e que satisfaça. Aí já entra até um pouco da engenharia: eu tenho que dar uma de engenheiro para construir o troféu.
CLIENTES Nós temos duas lojas. Na parte de jóias é aquele cliente, aquela senhora que vai, o pessoal que passa e vai comprar uma jóia, vai, escolhe e tal. É um público diferente da clientela de prêmios e homenagens, que são empresas, associações, clubes e coisas assim. São perfis bem diferentes de clientes. Nós vendemos para os dois, tanto que nossa empresa é separada: pra cá é uma coisa e pra lá é outra. Mas a jóia sempre manteve; é uma tradição que se mantém e a parte de homenagens e prêmios aumentou muito. A cidade cresce, tem muitas empresas e uma demanda boa, tem aumentado muito.
OFÍCIO DE OURIVES Nós temos ourives na loja. É um trabalho que continua a mesma coisa. A confecção de uma jóia, a reforma de uma jóia é exatamente isto, é um trabalho artesanal. Mantemos isso. Tem bastante procura, continua tendo, isso é uma coisa que tem se mantido estável ultimamente.
Nós revendemos e nós criamos. Às vezes, o cliente imagina um anel, por exemplo, vem com uma foto, um desenho e pergunta: “Dá pra fazer?” E a gente: “Dá, o ourives desenvolve isso.” Esse é o trabalho do ourives: criar também e não só reformar e consertar. Quando a pessoa quer uma coisa que não existe pronta, industrializada, nós fazemos. O ourives desenvolve, cria a peça como o cliente quer. Mas só por encomenda: “Eu quero uma peça assim, assim, assado.” Eu falo: “Dá, dá pra fazer.” Caso contrário, temos as jóias que nós revendemos, que é uma linha padrão que só pode escolher, não tem muita opção de mudar.
Já aconteceu de fazer uma peça repetida pra outros clientes, mas é difícil, a não ser que seja uma pessoa muito famosa que apareça com essa jóia. É difícil divulgar. Mas já aconteceu. A pessoa fez, depois vem um parente: “Eu quero uma igual. Quero uma parecida assim, assado.” Às vezes, acontece, mas de lançar uma linha ou aquele modelo virar uma moda, não. É difícil.
VENDAS Nós vendemos um sonho, vendemos um desejo para a pessoa, não vende só uma peça. Nossos funcionários têm que ser capacitados, treinados pra compreender isso do cliente. Uma mulher vai lá e busca ficar bonita, não busca uma jóia, não quer comprar uma jóia, ela quer ficar bonita com aquela jóia. Tem que ter esse sentimento, tem que sentir o cliente, o que ele gosta, sentir o que ele está sentindo pra poder resolver a emoção dele. Isso é certa psicologia de vendedor, é uma estratégia de vendedor. Tem que ter. No nosso negócio é mais a mulher. Tanto pra si própria como pra presentear. É a mulher que vai. Vão muitos homens também; vão mais pra comprar e dar pra esposa.
No tempo que eu dedico à empresa eu participo na parte de retaguarda. A resolver um pingo no “i”, por exemplo. Eu deixo o pessoal vendendo lá porque esse pingo no “i” ninguém vai conseguir resolver (risos). Tem coisas muito estranhas, pessoas que querem inventar, vêm com umas idéias mirabolantes e que nós acabamos não gostando. Fica feio, não é um negócio bonito, não é um negócio agradável. Mas nós fazemos. Às vezes para o que o cliente está precisando, para o que ele está imaginando, aquilo realmente é o ideal; nós é que não estamos enxergando que aquilo vai funcionar. Então embarca na idéia, discute, coloca os prós e os contras: “Se fizer assim fica melhor, se fizer assim fica pior.” Nós tentamos entrar em um consenso com o cliente e criar uma coisa que lhe agrade. Tentamos usar da experiência do negócio pra resolver da melhor forma a idéia do cliente.
Já chegou, há pouco tempo, alguém quis uma estatueta do Oscar de cristal. É complicado fazer um Oscar de cristal. Tem que ter um molde, uma forma. É uma coisa que nós não dominamos. Não dá para fazer um Oscar de cristal. Consultei muita gente. Porque o que nós não conseguimos resolver, tem que ajudar o cliente a ver quem é que resolve. Existem empresas no Sul, em Santa Catarina, que trabalham com cristais, com vidros, eu falei: “Procura esse pessoal lá. Quem sabe eles não têm uma idéia para isto.” Nós encaminhamos.
COMÉRCIO DE CAMPINAS O comércio transformou-se muito. Eu vejo uma separação muito grande, não só em Campinas como em todas as cidades grandes. É uma separação muito grande entre comércio mais popular e o comércio para as classes mais altas, que se constituem em shoppings. E o centro da cidade vira um comércio mais popular, ou o comércio mais específico, como o que temos. Você vai para o centro e você encontra muitas lojas populares e comércios específicos. Coisas que não dependem muito de localização. Nós vemos isso. Antigamente, eu lembro que eu passeava pelo centro da cidade e aquelas lojas chiques eram todas lá junto com as lojas populares. Era uma mistura. Também não existia tanto contraste como hoje, tanta diferenciação. O degrau era menor. Hoje o degrau é maior.
SHOPPING CENTER O sopping afetou o comércio, mas não no nosso caso. É uma área muito específica. A parte de jóias que seria mais afetada, nós não sentimos, nós estamos em uma área de grande concentração de bancos, escritórios de advocacia, de gente que trabalha em escritório e nós atendemos esse público. E na parte de homenagens independe de shoppings, é uma coisa mais específica. Onde nós estivermos, o público vai.
As empresas que serviam uma clientela de classes mais altas e não foram para shoppings, começaram a ter dificuldade. Porque as classes mais altas não freqüentam mais o centro. Vão direto para o shopping, tem carro, pega o carro e vai para o shopping. As empresas que trabalham com esta clientela e não foram para o shopping ou para uma área nobre da cidade que não seja o centro, sentiram, muitas fecharam.
O comércio se espalhou. Em Campinas nós vemos o Cambuí, que é uma área residencial, é um bairro residencial como os Jardins de São Paulo. Tem muito comércio, tem comércio de elite. É muito próximo do centro, o comércio do centro se expandiu e este lado do Cambuí ficou uma área nobre. Nós percebemos isto.
COMÉRCIO DE CAMPINAS A relojoaria Omega, que é onde meu avô começou, continua até hoje, com os filhos desse sócio do meu avô. Eles estão tocando. Eles têm uma história que se confunde com a nossa. Eles começaram em Mogi Mirim, vieram para cá, se associaram com o meu avô e depois de um tempo, a geração seguinte, que foi a do meu pai, se ramificou para um lado e ele se ramificou para outro, como eles estão até hoje. Hoje mesmo conversei com ele sobre esse projeto de memória e ele achou interessante a idéia. O antigo sócio do meu avô, os dois, eram como irmãos. Eram dois grandes amigos, muito íntimos. E os filhos são como se fôssemos primos, nós sempre tivemos muito bom relacionamento. Na nossa região, no nosso miolinho ali, que eu tenho mais contato, não sobrou quase ninguém antigo do comércio. Tem o Seu Aníbal, que tem a Refrigeração, ele deve estar com mais de 50 anos ali também, uma casa de geladeiras, faz serviço de geladeiras, de refrigeração; é o mais antigo ali da região. O que eu me lembro é que tinha há muito tempo a Casa Picoloto que agora foi para shopping, mas é muito antiga também.
VENDAS Na parte de jóias, Dia das Mães, Dia dos Namorados e final de ano é quando se vende mais. Na parte de homenagens, também. Nos finais de ano acontecem os maiores eventos, quando há um boom, mas homenagem é uma coisa que vai regulada, tem o ano todo.
MODERNIZAÇÃO Nós modernizamos e foi muito bom. Nós temos muito retorno através da internet e é muito bom porque é uma empresa de mais de 50 anos. Pelo menos na nossa região ela é bem tradicional e conhecida. É uma empresa honesta, as pessoas confiam. Pelo menos os antigos que acompanharam. E nós tentamos passar esta imagem na internet. Realmente eu acho que ela é passada. Porque a internet atinge o Brasil inteiro. Uma pessoa que está no Norte do país vai procurar empresas como a nossa e vê: “Essa aqui tem 50 anos.” Vê alguma coisa ali que sente um pouco. Como a pessoa não vê fisicamente a loja, não está lá presente dentro da loja, ela sente mais segurança em ver que existe uma loja muito antiga e confia um pouco mais do que numa mais nova. Não que não sejam boas, mas é que passa um pouco mais de confiança esta carga, esta tradição que nós temos. Isso é bom, tem sido bom para nós.
CHINELLATO Ela começou na César Bierrenbach, que é a uma quadra de onde nós estamos, em 1953 e foi até 1987. De 1987 pra cá nós estamos neste endereço. Em 50 e poucos anos ela ficou em dois endereços, o que também é uma boa referência.
MOBILIÁRIO Muda um pouco, acompanha um pouco as tendências, moderniza, mas não muda muito. A nossa distribuição física não mudou nada. Mudaram as peças, o mostruário, mas a distribuição física continuou. Não vejo por que mudar também. Também passa uma imagem de coisa tradicional, que é bom.
CLIENTES Temos clientes que confiam em nós. Ainda esses dias nós estávamos desenvolvendo um prêmio pra uma empresa e a funcionária falou pra eles: “Eu vou te mandar uma mostra, um modelo de como vai ficar, para você entender...” “Não, não, não. A Chinellato não precisa mostrar nada, eu confio em vocês, faz do jeito que você achar melhor que está bom.” É cliente antigo que sempre procura e está satisfeito; não há porque dessa vez dar errado. E como eles, muitos são assim. Tem que se esforçar (risos) pra atender bem. Às vezes, chegam casais pra fazer aliança de bodas de ouro e que fizeram a aliança de casamento com a gente há 50 anos atrás. Voltam lá pra fazer a nova aliança. Isso é muito comum. Às vezes, vemos a mãe que leva a filha com o noivo: “Olha, aqui eu fiz a aliança com o seu pai. Agora eu vou fazer com vocês.” Isso tem muito.
PROMOÇÕES Na maior parte das vezes as vendas andam por si só. Nós fazemos promoções, mas é esporádico.
DESAFIOS O nosso maior adversário é o governo (risos). São os encargos. Isso é a maior dificuldade que todas as empresas hoje enfrentam. Realmente é uma carga pesada que nós temos que arcar e realmente pesa. Se não fosse tão pesada, as coisas seriam mais fáceis. Mas isso, temos que encarar como desafio. Essas são as regras, tem que seguir. Desafio mesmo são estas criações malucas que nós temos que desenvolver, às vezes. É um desafio técnico, mas como negócio não tem outra coisa não.
SUCESSO Dedicação, trabalhar com vontade. É essa questão de tradição, de qualidade que nós sempre procuramos atingir: “Se eu sou bom no que eu faço, porque eu vou parar? Vou continuar sendo.” Isso é bom, continuar sendo bom no que eu faço. Eu faço um negócio tão bom e vou parar agora? Não. Está bom, vamos continuar. E isso faz o negócio continuar andando, não morrer.
MODERNIZAÇÃO É normal, o negócio muda. Hoje não é a mesma coisa. Continua, mas não é a mesma loja, é tudo muito diferente. Eu lembro que antigamente meu pai estava gravando à mão, em um trabalho artesanal, artístico e punha uma placa: “Silêncio, estamos gravando”. Imagina se põe uma placa desta em uma loja hoje É um absurdo. Tinha uma época que tinha uma frase: “Não vendemos fiado, principalmente para amigos”. Quer dizer, hoje, todo mundo compra parcelado, faturado, 30 dias. Isso são coisas muito diferentes, é outra época. Ou “Não passamos preços por telefone”. Isso é uma ordem de há muito tempo atrás. Hoje você tem compra por telefone, compra por internet. O preço está na internet, não precisa nem falar.
FORMAS DE PAGAMENTO Amigo levava uma coisa, levava outra e ia no caderninho. Esquecia de pagar - e isso é uma coisa que acontecia - e daí a placa: “Não vendemos fiado, principalmente para amigos”. Pelo menos um amigo chega e já fala: “Olha, é melhor não pedir dessa vez não, é melhor comprar à vista.” Hoje não é assim não. Hoje a pessoa pega, leva, depois recebe a cobrança em casa.
COMÉRCIO DE CAMPINAS Ele acompanha o crescimento da cidade e como todo negócio hoje, está mais globalizado; uma empresa da cidade vende para o Brasil inteiro. E por outro lado, clientes da cidade compram no Brasil inteiro. Especialmente nesta área de prêmios, com a facilidade hoje de comunicação, de remessa de mercadoria, nós vendemos para o Brasil inteiro e o Brasil inteiro compra de nós e assim como muita gente de Campinas compra de outros lugares também, sem qualquer dificuldade. Uma loja em uma cidadezinha do interior pode crescer muito também. Vendendo para o Brasil inteiro sem ninguém saber que está em um interiorzinho, em uma cidadezinha.
VENDAS Tem muita encomenda. Em termos de porcentagem, eu diria que é da ordem de 20%, mais ou menos, fora da região. Fora da região sem contar cidades mais próximas. É um retorno da internet. Isso é muito bom, mas também é muito ruim. Porque as pessoas de Campinas que são clientes nossas, nada impede que deixem de comprar de nós e comprem de outras empresas, de outros lugares do Brasil. É uma faca de dois gumes; é bom e ruim ao mesmo tempo. Mas pra nós foi melhor do que ruim (risos). Tem que ter qualidade. Brigamos por preço e qualidade com outras empresas, mas tentamos vender a qualidade. Se a qualidade é boa e a pessoa confia, acredita que temos uma qualidade boa, ela vai nos preferir a um outro que não tenha tanta confiança. Mesmo sendo bom, vai preferir aquele que confia.
Eu compro pela internet daquela empresa que dá a impressão que vai me entregar o produto direitinho. Não compro da mais barata. Eu acho que o cliente de internet pensa assim também.
RELAÇÃO COM A ARTE Eu tenho um escultor, um artista plástico muito conceituado, premiado, primo da minha esposa que faz esculturas para nós. O cliente quer uma estatueta, uma escultura, ele desenvolve, ele cria, fica dois, três meses esculpindo uma peça pra depois nós produzirmos um troféu. Isso o cliente tem que entender que é um trabalho artístico, uma coisa totalmente diferente. O tempo é muito mais longo do que ir a uma loja e comprar. O preço é outro, os materiais são coisas nobres e você tem que vender uma arte. E isso nós temos lá, nós vendemos a arte, tem cliente que não imagina. Na hora que você fala que vai levar dois meses, que tem um artista ficando dia e noite em cima daquilo pra desenvolver - e que isto tem um preço - o cara não quer saber: “Eu não vou pagar isso.” Não enxerga que é arte. Outros não. Outros dizem: “Isso é legal. Eu quero, é artístico.” E vai assinado, vai numerado. Nós temos que vender isso, faz parte. Um exemplo bem recente: o cliente quis uma estátua de um deus grego; ele viajou até a Grécia e não encontrou essa estátua. Ele nos mandou fotos de museus que tinham estátuas grandes desse deus, fotos, reproduções e pediu pra nós fazermos. Esse é um cliente que reconhece a arte: “Eu quero uma estátua para o meu consultório.” Desenvolveu a arte. Primeiro tem a peça inicial, tem a escultura, faz a fundição, você pode fazer quantas cópias quiser nesta fundição. E a primeira cópia se chama “prova do artista”, fica guardada ali pra nós. O cliente recebe a número dois, número três. Vai numerado. Ele vai ver o valor daquela peça. As primeiras peças tem um valor maior talvez não monetário, mas um valor emocional maior.
MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS Eu acho muito bom. No nosso caso, se levasse mais alguns anos para acontecer esta entrevista, teria informações que eu não conseguiria dar mais, porque as gerações estão indo (risos). É muito bom manter isso, continuar. É uma coisa que não deve parar porque tudo vai mudando. Eu acho muito interessante.
LIÇÕES DO COMÉRCIO Nós temos que trabalhar muito, trabalhar duro. Não só no comércio, mas em qualquer atividade. A vida não é uma loteria. Tem que progredir pra não afundar, tem que trabalhar duro em qualquer área. Trabalhando duro e com dedicação vai ter um retorno.Recolher