O que registro agora aconteceu hoje de madrugada quando passei a mão sobre a cama e vi que meu marido não se encontrava. Levantei aflita, em silêncio, fui vagarosamente onde o encontrava, seu escritório. Abri a porta sem que ele notasse, foi em vão. Ergueu seu olhar como se fosse um cachorro c...Continuar leitura
O que registro agora aconteceu hoje de madrugada quando passei a mão sobre a cama e vi que meu marido não se encontrava. Levantei aflita, em silêncio, fui vagarosamente onde o encontrava, seu escritório. Abri a porta sem que ele notasse, foi em vão.
Ergueu seu olhar como se fosse um cachorro com o rabo no meio das pernas, fingindo corrigir provas, como costumeiramente fazia. Lá estava ele. Cabisbaixo. Olhou-me de cima abaixo como seu eu o tivesse roubado, deixando-o sem beira e nem eira. Estremeceu... A convivência, por muitos anos, nos faz adivinhar até o que o outro pensa. Carrega a culpa de ter me aniquilado com os afazeres domésticos e os cuidados com os filhos para que ele pudesse crescer. Isso se chama abnegação. Fruto de uma educação romântica e fora de moda. Ah. Os homens são todos iguais, roubam-nos a juventude. Agora lá está ele. Nada que eu fale irá acalmá-lo. Fico melhor aqui no canto admirando esse Adonis
em seu outono. Não era preciso dizer absolutamente qualquer palavra. Não tirei meus olhos sobre ele, pois sabia que estava ruminando sobre os últimos acontecimentos da noite. Nós mulheres somos práticas. Pisei mais fundo no assoalho de madeira e o seu estalido fez com que ele se agarrasse ao papel que fingia escrever, permanecendo imóvel. Teríamos essa conversa, custe o que custasse. Era preciso. Percebi seu nervosismo.
Apanhei o bloco de rascunho que se encontrava entre seus papéis e rapidamente fui curta e grossa na escrita “vim em busca de amor”, este foi o meu grito de alerta. Ele continuava ali assustado, apenas abaixou os olhos perdidos e pregou-os sobre a mesa. Como se passara um tempo grande até ele se manifestar, novamente lhe escrevi “responda”, com uma raiva danada. Percebi que ele não queria enfrentar a realidade, não se mexia, sofria e me suplicava para que ali o deixasse. Tentei olhar para aquele homem (foi um esforço) em sua primavera, iluminado, altivo, e que agora me expunha um olhar num golpe de misericórdia. Cruzei os braços e esperei.
Quebrou paradigmas, me surpreendi. Pegou o bloco sobre a mesa e escreveu todo trêmulo “não tenho afeto para dar” descansando caneta de volta, abaixou os olhos. Fiquei olhando a frase perplexa. Forneci a oportunidade para ele se abrir, falar do seu problema fui cúmplice. Qual o que. Cansei. Coloquei o bloco sobre a mesa suavemente e serenamente com zelo, era assim que ele pensaria que iria refazer o meu ímpeto. Esbocei que iria sair do escritório. Comecei a acariciá-lo. Meu dedo em histe passeou pelo seu corpo do dorso do seu pescoço, roçou suas as orelhas, desceu seu peito escasseado de pelos grisalhos chegando entre as suas pernas, serpenteando
e boleando.
Quando desci mais um pouco... Nada se defrontava no front. Sem se virar, subiu o braço, segurou minha mão ao alto, retirou-a dali como se retirasse um objeto corrompido,
mas de repente frio, perdido entre seus cabelos. Desceu lentamente nossas mãos até onde chegava o comprimento do meu braço, e foi nessa altura que ele, num gesto claro, abandonou minha mão no ar.
Saí detrás dele, meu corpo ardendo de desejo, minha camisola de seda se abriu esboçando um vôo largo como Isadora Duncan e sua echarpe. Num revés no olhar ele me via mais uma vez, mordendo meus dedos sufocando meu desejo. Dei-lhe as costas. Fui até a janela e o que se vê em seguida são as tentativas de uma gueixa. Desfiz o laço do decote da camisola, e, meus seios teimando ficar em pé, recostei-me
com
olhar de luxúria sobre seu peito, numa acrobacia de trapezista meus pés tocaram a sola do dele. Sondei-o até as partes baixas.
Mais segura, próspera, devassa achei a braguilha de seu pijama, me esfreguei na densidade dos seus pelos, subindo afoito. Lambia-o. Já me encontrava em chamas. Surpreendi-me. O problema não era comigo. Suspirei fundo, me ergui. Minha postura era de pedra: joguei a cabeça para trás, meus cabelos continuavam com o viço de antes,
fechei
meus
olhos e balancei a minha cabeça como na mímica se diz “não dá mesmo”; dois frisos úmidos e brilhantes contornaram o arco das minhas pálpebras, minha boca carnuda trazia resquício do meu batom rosa, mas cerrei os dentes de raiva, que lamentável, não deu mais uma vez. Num estalo, meus passos se tornaram largos até chegarem à porta. Parei subitamente de modo teatral, não era uma parada qualquer e ele sabia que esta parada, estava sendo adiada há muito. Passaram-se segundos que mais parecia uma eternidade. Não se tratava de uma tarefa trivial a ser cumprida quando o dia clareasse. Tratava-se de deixá-lo na escuridão da sua memória e só, muito só com a sua fuga. Pedira-lhe que fosse se tratar a tanto tempo. Bem, pouco me importava agora, não que fossem por esse motivo ou aqueles vários outros, só sei que, passado um instante de reflexão, resolvi voltar para minha cama porque estava morta de sono.Recolher