Falar sobre a minha mãe, Madalena Santiago Caleffi, é para mim, uma grande honra, mas é também uma grande emoção e responsabilidade. Ela é chamada carinhosamente, pelos seus sobrinhos e sobrinhas, de tia amada. Esta mulher, quase invisível, é para mim tudo de bom, que um filho pode ter, de ...Continuar leitura
Falar sobre a minha mãe, Madalena Santiago Caleffi, é para mim, uma grande honra, mas é também uma grande emoção e responsabilidade. Ela é chamada carinhosamente, pelos seus sobrinhos e sobrinhas, de tia amada. Esta mulher, quase invisível, é para mim tudo de bom, que um filho pode ter, de dignidade, de luta, paciência, persistência, silêncio, que diz muito, exemplo. Madalena é uma mulher forte. Fisicamente frágil, mas só fisicamente. Ela tem uma história densa, bonita, de luta e vitórias, inacreditável. É a aparente fragilidade, que se transforma numa força e resistência sem fim. Muitas vezes no silêncio. Num amor sem fim aos filhos. Sacrificando sua própria vida por isso. Mas desistir jamais. É um exemplo.
Madalena Santiago Caleffi é filha de João Santiago e Carmella Artoni Santiago, italianos. Nasceu no dia 24 de fevereiro do ano de 1932, numa cidadezinha, cidade de Dourado, no interior do estado de São Paulo. A cidade de Dourado, se localiza na região central do estado de São Paulo, interior do estado, a cinquenta quilômetros da cidade de Araraquara, também a quarenta e oito quilômetros da cidade de São Carlos e a trinta e oito quilômetros da cidade de Jaú. Sua população é basicamente formada de imigrantes italianos, como a família de minha mãe Madalena, vindos em sua maioria do sul do estado de Minas Gerais e da região central de Minas Gerais. A cidade de Dourado, viveu seu auge entre os anos 1900 a 1930, chegando a ter nestes anos cerca de 18 mil habitantes. Com a crise de 1929, houve grande redução das lavouras de café no município, além disso, a estrada de ferro que passava pela cidade de Dourado, deixou de passar por lá, parou de operar. Dourado sofreu muito com tudo isso. Com isso, muitos imigrantes deixaram o município de Dourado e foram em busca de novas oportunidades em outra localidades, em outras fronteiras. Foi o que ocorreu com a família de minha mãe Madalena. Madalena, ainda criança de colo, com apenas três anos de idade, junto com sua família, migrou-se, para a cidade de Echaporã. Corria o ano de 1935. A cidade de Echaporã, foi fundada no dia primeiro de janeiro de 1939, com o nome de Bela Vista. Em 30 de novembro de 1944, passou a chama-se Echaporã. É uma pequena cidade do interior do estado de São Paulo, com cerca de seis mil habitantes. Echaporã fica próximo da cidade de Marília, a quarenta quilômetros de distância. A família de Madalena ficou morando em Echaporã oito anos. No ano de 1942, com apenas dez anos de idade, migrou com a família, para o município de Marialva, no Paraná. Madalena tinha apenas dez anos de idade.
A viagem de Echaporã até o sítio de Marialva durou dois dias. Colocaram a mudança em cima de um caminhãozinho e seus irmãos mais velhos, mais alguns vizinhos vieram no caminhão, junto com a mudança. A estrada era de chão batido e muito ruim. Madalena e seus pais mais suas três irmãs e um irmão mais novo, vieram de ônibus. Mas foi uma verdadeira aventura. A estrada era uma verdadeira picada, no meio da mata virgem. Saíram de Echaporã e chegaram na cidade de Londrina à noitinha. Londrina era uma cidadezinha bem pequena sem nenhuma infraestrutura, uma verdadeira vila. Pousaram num hotelzinho muito simples e no outro dia pegaram outro ônibus até a cidade de Apucarana e depois, finalmente, até Marialva. Marialva era era uma vilazinha, com uma rua e poucas casas, no meio do mato e da poeira. Algumas casa tinham rodas e eram transportadas e puxadas por animais de um lado para o outro. De Marialva, até ao sítio, eles foram de charrete, por um trilho, no meio da mata. Aventura, sonhos, esperanças, histórias vividas, viva vida. Coragem, ousadia.
No sítio, seus pais fizeram um barraco na beira da estrada Marialva, que passava na cabeceira do sítio, até poderem fazer uma casa melhor e definitiva, num lugar mais apropriado. Havia todo tipo de bichos e muitos insetos Os animais selvagem chegava bem pertinho da casa deles. Aventura, vida. Uma vez Madalena ficou toda picadinha de insetos da mata, parecia que estava com sarampo.
Viveu sua adolescência, juventude e vida adulta, quase toda, no sítio de seus pais, no município de Marialva. Nos fundos do sítio, passava o rio Marialva, que era um rio caudaloso e limpinho, que dava para o fundo ver, tinha muitos peixes. Sua mãe Carmella lavava roupa ali. Enquanto isso, Madalena, junto com suas amiguinhas, ficava brincando no rio. Pegavam uma peneira e com uma amarração de pano, segurava a mesma e colocavam algumas iscas e soltavam a peneira no rio. Quando puxavam a peneira, vinha cheia de peixes, lambaris e outros pequenos peixes, era fartura e beleza. Vivia livre e feliz, no meio da natureza. Era uma menina muito bonita e inteligente. Estudou pouco, dentro das possibilidades da época, até o quarto ano primário, que para época já era bastante. Sabia ler e escrever. Assim que chegaram lá no sítio de Marialva, os moradores construíram uma pequena escolinha de madeira, num sítio em frente ao deles. Só anos depois, que se construiu uma escola melhor, de alvenaria, no quilômetro dez da estrada Marialva. Madalena, casou-se no dia 07 de novembro ano de 1953, com 21 anos de idade, com Inísio Caleffi, com 26 anos de idade. Depois de casada, mudou-se para o sítio dos Caleffi, que ficava pertinho do sítio dos seus pais em Marialva, na mesma água, a uns dois quilômetros de distância um do outro. Teve quatro filhos.
Vivia feliz. No ano de 1957, depois do nascimento de sua filha. Era a segunda, pois já tinha um menino. Ficou muito doente. Chegou ser desenganada, recebendo até extrema unção. Ela pegou uma doença, chamada na época de tifo. Passou muito mal, mas não desistiu de lutar pela vida.Tinha dois filhos pequenos para criar. Depois de muita luta, remédios, orações, enfim, tudo que podia ser feito na época e com a ajuda de uma médica, Dr. Iorfinda Mora e depois de um médico, Dr.Pedro Barros, onde ficou internada durante doze dias em seu hospital, na cidade de Marialva. A médica, Doutora Iorfinda Mora, resolveu visitá-la, lá no sítio, depois de que meu pai Inísio Caleffi, ter lhe pedido e lhe explicado a gravidade da situação, para que ela viesse ver minha mãe, ela começou a se recuperar e melhorou. Quanta coragem, que luta! Ela venceu a doença. Voltou a viver. Ressurgiu. Superou tudo.
Depois disso, teve mais dois filhos, um menino e uma menina. A família estava completa e feliz.
No início da década de 1970, meu pai começou a ficar doente. Começou ai, uma outra luta, para Madalena. Uma luta muito dura. Com os filhos pequenos, ela teve que tomar frente de tudo na lavoura, nos cuidados com as crianças, além da atenção ao marido. Não foi fácil. Ela teve que assumir o papel de líder da família, ser mãe e pai ao mesmo tempo. Só uma mulher, com a fibra de Madalena, para não fraquejar. Aguentar firme tudo, as vezes no silêncio sozinha. Mas sempre corajosa e firme. Sem nunca entregar os pontos. Desistir jamais. Só ela e Deus sabe o que passou. Mas passou, venceu com fibra. Meu irmão e minha irmã mais velha, aos pouco pode ir ajudando ela em tudo. Acabou sendo os parceiro dela, nas lutas duras, mesmo sendo meninos ainda. Outros filhos, eram ainda muito novos, para poder entender tudo. Mas estavam sempre por perto. Meus tios e tias que moravam juntos, lá no sítio, ajudaram muito.
Meu pai teve um distúrbio neurológico, que até hoje não foi bem explicado ainda. Deve ser, por causo da época, que havia poucas informações e recursos para o diagnóstico correto e para o tratamento. Meu pai sofreu muito. Ele tomava remédios muito fortes, para controlar as crises, que passava. Alguns diziam que era depressão, mas nunca ficou muito claro se era isto mesmo. Só sei que ele sofreu muito. Minha mãe também, junto com a família. Mas desistir jamais. Meu pai chegou a ser internado em sanatórios em que levava choques elétricos, um horror. Uma verdadeira tortura. Sofreu muito, além da conta. Nós também. Imagina o sofrimento de minha mãe. Foi duro. Batalha, batalha, batalha! Mas se manteve firme e lutando, sem fraquejar. Eu não esqueço de tudo isto. Me marcou profundamente, para sempre.Tenho uma lembrança carinhosa, muito afetiva de meu pai. Muito amor. Um amor sem fim. Ele era muito querido, carinhoso, amoroso, inteligente e muito sensível. Que saudade! Há se eu pudesse abraça-lo novamente! Madalena foi muito forte, corajosa. Se não fosse o amor, a determinação, a dignidade, a coragem de Madalena, com certeza não teríamos chegado até aqui. Ela foi e é tudo que devemos ser na vida.
No dia 12 de outubro de 1973, Madalena perdeu seu marido. Inísio Caleffi morreu neste dia. Era o dia da padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida. Que golpe! Que duro! Muito sofrimento. Para Madalena e seus filhos. Mas era preciso reagir. Tocar a vida para frente. Buscar força, a onde nem imaginava que pudesse ter. Mais do que nunca, Madalena não podia fraquejar neste momento, por mais que estivesse em frangalhos, seu coração despedaçado, por perder o companheiro de sua vida, de tantos sonhos, projetos e alegrias. Mas a vida é assim. Prega cada uma na gente. Que nem sempre entendemos. Madalena tinha os filhos para acabar de criar. Chorou, as vezes sozinha, no silêncio, desesperar jamais. Haja força e coragem para enfrentar tudo isto! Mas enfrentou e venceu, apesar da dor sem fim. Mulher de fibra.
No ano de 1974, Madalena com seus filhos resolveram sair do sítio e mudar para a cidade. Tinha que ter muita coragem, para tomar uma decisão desta. Teve! Como sempre, nunca teve medo de enfrentar os desafios da vida. Não havia outro caminho. Assim como os seus antepassados, quando oprimidos, empurrados, por situações difíceis, onde eles estavam já não era mais possível viver, ter uma vida boa para a família, tomavam decisões difíceis, ousadas, tentava novos caminho, migrava.Tomava coragem e migrava. Foi o que aconteceu com Madalena e seus filhos. Migraram para a cidade, vieram para Maringá. Ai começa uma nova fase.
Em Maringá, com a ajuda de um irmão seu, que já morava na cidade, alugou uma casinha de madeira, de parede meia, no bairro aeroporto e ali se instalou com seus filhos e a pequena mudança que tinha. Era o final da manhã de um dia ensolarado, dia 19 de agosto de 1974, uma segunda-feira, quando chegaram com a mudança em Maringá. Era um bairro acanhado, sem nenhuma infraestrutura, como asfalto. Mas para quem estava vindo do sítio, estava muito bom. Fez logo amizade com os vizinhos e os filhos logo começaram a trabalhar.
Uma das primeiras coisas que Madalena fez, foi procurar escola para os filhos mais novos. Não foi fácil, pois era mês de agosto e o terceiro bimestre letivo estava em andamento. Visitou várias escola perto de sua casa, mas as escolas não aceitavam a matricula dos meninos, por que diziam, que o ano letivo, já estava caminhando para o final. Mas Madalena não desistiu, até conseguir matricular seus filhos. Ela, não queria que eles perdessem aquele ano e se atrasassem nos estudos. Diante das dificuldade que ela estava encontrando, para colocar seus filhos mais novos na escola, pediu ajuda a seu irmão e os dois juntos, continuaram a vistas as escolas, até conseguirem fazer as matriculas do menino e da menina. Conseguiram. Não perderam o ano letivo de 1974. Isso graças a determinação de Madalena. Que mesmo sem muito estudo, sabia da importância de estudar os filhos, para que eles no futuro, pudessem ter uma vida melhor. Foi o que fez. Lembro, que nos primeiros dias de aulas, ela ia nos levar e buscar na escola, pois nós tínhamos vindo do sítio e não conhecia nada da cidade. Nem ela, mas ela ia todo dia com a gente, no início da nossa vida na escola. As vezes, na hora do intervalo, eu via ela, estava lá de longe, lá fora da escola, me chamando para me dar um lanche, que ela tinha feito em casa e queria me dar. Era uma visão de puro amor, ontológica. Mãe é mãe. Depois, fomos nos acostumando e íamos e voltávamos sozinhos da escola. Ela ficava mais tranquila, pois nós voltávamos juntos com uma professora que morava perto da gente. É amor e cuidado que marca a gente para sempre e define a nossa vida.
Meu irmão mais velho e minha irmã já estavam trabalhando. Eu, que já tinha completado treze anos de idade, comecei a trabalhar num açougue, no período da tarde e de manhã estudava. Depois, comecei a estudar a noite e trabalhar o dia todo. As coisas, devagar, começou a melhorar, a se ajeitar. Graças a determinação de Madalena.
Alguns sobrinho de Madalena, que ainda tinham suas famílias morando no sítio, pediram para ela, se podiam vir morar com a gente em Maringá, para tentar arrumar emprego e estudar. Madalena de imediato aceitou. Para ela, aqueles meninos era como filhos dela. Viviam, todos juntos em Maringá, sobe os cuidado de Madalena. Vieram três sobrinhos. Veio até o filho de um vizinho do sítio lá de Marialva. O coração de Madalena é enorme, nunca soube dizer não, quando pode ajudar alguém ajuda e pronto. Moraram algum tempo com Madalena e família, até que seus pais, vieram também morar em Maringá. Mas quando as famílias deles chegaram em Maringá, eles já estavam empregados e trabalhando. Isso ajudou muito, para estas famílias começarem vida nova.
Alguns anos depois que eu estava trabalhando no açougue, tive que fazer uma cirurgia no joelho. Ela arrumou tudo. Foi pelo INSS. Fiz a cirurgia no hospital Santa Casa de Maringá. Ela acompanhou tudo de muito perto. Fiquei dois meses com a perna engessada, em casa. Madalena cuidava de tudo.
No ano de 1977, construiu uma casa de madeira numa data que tinha comprado no jardim alvorada em Maringá e neste ano mesmo, a família de Madalena, mudou-se para a nova casa. Agora deles. Parou de pagar aluguel. Foi muito bom. Melhorou muito. Apesar do jardim alvorada ser um bairro novo, sem quase nenhuma infraestrutura, como asfalto, mas agora a casa era da família de Madalena. Dava mais tranquilidade e segurança.
Madalena teve que passar por uma cirurgia de estômago, para tirar uma ulcera. Sofreu muito. Mas superou, se recuperou.
No ano de 1979, completei 18 anos. Tinha que fazer alistamento militar e servir. Eu não queria de jeito nenhum e nem podia, pois tinha que trabalhar, para ajudar a família em casa. Lembro, como se fosse hoje. Ela foi comigo, pedir para que eu não fosse servir. Dona Madalena, estava em todos os lugares e momentos que os filhos precisavam, sem nenhum acanhamento ou receio de interceder pelos seus filhos, diante quem quer que fosse. Sempre falando a verdade.
No ano de 1981, eu fui estudar no seminário em Curitiba, fiquei cinco anos morando fora. Madalena aceitou, mas com certeza não foi fácil para ela. O filho mais velho, José Alécio Caleffi, casou-se. Logo em seguida a filha mais velha, Maria Aparecida Caleffi, também casou-se. No ano de 1985 eu voltei para Maringá, ela já tinha se mudado para a vila morangueinha, em Maringá. Eu fui morar com ela. Depois mudou-se para a Avenida Guaiapó. Morando junto com meu irmão e minha irmã.
No ano de 1989 casei-me, com Zenaide Aparecida Cortes Caleffi e logo no outro ano minha irmã mais nova, Carmem Irene Caleffi também casou-se.
No ano de 2000 eu sai candidato a vice-prefeito de Maringá. Ganhei a eleição. Foi uma campanha dura. Madalena deve ter sofrido muito. No ano de 2003, o meu companheiro de chapa, que era o prefeito, morreu, eu tive que assumir a prefeitura da cidade como prefeito. Madalena acompanhava tudo, como mãe, ficou preocupa, mas orgulhosa do filho. Vice prefeito e prefeito, imagina de Maringá, que orgulho e honra. Passou um filme na cabeça dela. Aquele menino que perdeu o pai com treze anos de idade, veio do sítio em Marialva e que ela procurou vaga para estudar, quando chegou em Maringá, no ano de 1974 e quase não conseguiu. Mas sua insistência venceu as barreiras . Agora era prefeito, de Maringá. Era um orgulho enorme ver seu filho prefeito da cidade de Maringá, cidade que a acolheu com carinho no ano de 1974. Era para ela impensável que isso ia acontecesse. Mas aconteceu. Aquilo que tem que ser tem força.
Madalena mulher de fibra.
História, memória.Recolher