Meu pai Inisio Caleffi nasceu no dia 13 de novembro de 1927. Meu pai era uma figura muito especial, marcante. Não era de falar muito muito. Era moreno, cabelos bem preto e cacheado, puxou a sua mãe Maria Frania Uzae Caleffi, que era da Ilha da Sardenha, na Itália, morena como todos que vieram ...Continuar leitura
Meu pai Inisio Caleffi nasceu no dia 13 de novembro de 1927.
Meu pai era uma figura muito especial, marcante.
Não era de falar muito muito.
Era moreno, cabelos bem preto e cacheado, puxou a sua mãe Maria Frania Uzae Caleffi, que era da Ilha da Sardenha, na Itália, morena como todos que vieram da ilha italiana, era uma sardenhola, ao contrário de meu avô Santo Caleffi, que era loiro de olhos azuis, alto, grande, um italianão. Meu pai puxou a sardenhola Maria Frania Uzae Caleffi.
Inisio Caleffi, era inteligente, sensível, numa época em que quase ninguém sabia ler e escrever ele já sabia.
Meu pai nasceu no dia 13 de novembro de 1927, é o filho mais velho de Santo Caleffi e Maria Frania Uzae Caleffi, dos quatro filhos que tiveram. É neto de Teodoro Caleffi e Vincenza Bastasini Caleffi. Nasceu na Cidade de Monte Santo no Estado de Minas Gerais.
Morou ali numa fazenda de café. Seu avô e seu pai vieram da Itália como imigrantes em busca de uma vida melhor. Vieram do Norte da Itália, da Região da Lombardia, Província de Mantova, moravam na Comuna de Poggio Rusco. Chegaram no Brasil no dia 19 de outubro de 1898.
Passou a sua meninice ali nesta fazenda, junto com seu avô Teodoro Caleffi, com seu pai Santo, com sua mãe Maria Frania Uzae Caleffi e seus outros quatro irmãos, Mário, Valdomiro, Onofre e Antonio; Antonio era filho de Santo com Genoveva Bonato Caleffi, do primeiro casamento de Santo. Genoveva tinha falecido e Santo casou-se com Maria Frania Uzae. Além de seus tios e primos. Cresceu ali nesta fazenda de Minas. Ali não foi fácil não. Luta dura para a sobrevivência.
No ano de 1936, Inisio com nove anos de idade, muda-se para a cidade de Guaranésia, ainda no Estado de Minas Gerais, seu pai Santo Caleffi, resolveu sair de Monte Santo de junto de seu pai Teodoro, de seus irmãos e muda-se para uma fazenda no Município de Guaranésia, em busca de uma vida melhor. Meu pai era criança ainda. Vai trabalhar em outra fazenda de café. O irmão mais velho de meu avô Santo Caleffi, Credo, já tinha ido morar na fazenda de Guaranésia, há um bom tempo, meu avô Santo vai morar lá com ele, na mesma fazenda. É ai que Inisio vai morar por um bom tempo.
Meu tio Valdomiro Caleffi(Tio Miro), irmão de meu pai, contava, que ali em Guaranésia, a fazenda era grande, a maior da região, com muitas famílias trabalhando na lavoura de café. A maioria eram imigrantes italianos recém chegados da Itália, assim como eles.
A fazenda era da mesma família dona da fazenda de Monte Santo. Esta família tinha muitas fazendas em Minas Gerais e no interior do Estado de São Paulo. Era uma fazenda melhor do que a de Monte Santo, bem organizada. Ali recebia salário, além da lavoura de subsistência. Tinha 24 casas de tijolos, iluminadas e com água encanada, coisa que não tinha na fazenda de Monte Santo e nem na maioria das fazendas da região. Tinha até escola, onde meu pai estudou até a quarta série. Meu pai foi o que mais avançou nos estudos ali. Naquela época ter estudado até a quarta série já era muita coisa. Ele sempre gostou de estudar, era criativo, atento, curioso, inteligente. Morou nesta fazenda de Guaranésia até o ano de 1944. Meu pai Inisio Caleffi ficou oito anos morando nesta fazenda em Guaranésia.
Com 17 anos de idade, meu pai, junto com sua família, mudou-se para o Estado do Paraná, terra a ser desbravada, era um mundo novo, uma nova fronteira. Imagine o que passou na cabeça do jovem Inisio Caleffi, de apenas 17 anos! Viveu intensamente aquele momento, de ousadia.
Era o dia 06 de junho de 1944, quando chegaram na cidade de Cornélio Procópio, estava muito frio, vento forte, mas era um dia ensolarado, lindo, céu azul, sem nenhuma nuvem encobrindo o céu. Veio pela estrada de ferro Mogiana-Sorocabana, até a cidade de Ourinhos, ainda no Estado de São Paulo. Vieram de trem, junto com seu pai, sua mãe e seus irmãos e o pouco de mudança que tinham. Foi uma viagem que durou três dias. Meu pai vinha contemplando tudo aquilo, aquela viagem, aquele desafio, sonho de jovem, sonho de imigrante.
Foram morar numa fazenda chamada Sobrau, a uns sete quilômetros da cidade de Cornélio Procópio. La já morava seu tio Credo com sua família. Era uma fazenda grande, também bem organizada. Tinha outros colonos morando lá também.
Depois, com 19 anos, meu pai, mudou-se para uma fazenda no Município de Cambé, junto com sua família. Foram formar uma lavoura de café. Derrubar mata e tudo. Começar do zero. Meu avô Santo Caleffi era famoso formador de lavoura de café, famoso em toda região. A fazenda ficava a quinze quilômetros da cidade de Cambé.
No ano de 1948, finalmente, a família de meu pai, comprou seu pedaço de terra, no Município de Marialva. Mudaram-se para o sítio de Marialva, agora deles, no ano de 1951. Meu pai tinha 24 anos de idade.
Casou-se no ano de 1953, com Madalena Santiago Caleffi, que morava num sítio próximo, meu pai tinha 26 anos de idade. Inisio e Madalena tiveram quatro filhos.
Meu pai, depois de um bom tempo, começou a ter um certo tipo de depressão. Naquele tempo foi identificado como loucura. Ele sofreu muito. Foi encaminhado a vários sanatórios no interior do Estado de São Paulo, na cidade de Londrina e em Maringá. Levou muitos choques elétricos, como forma de tratamento, tomou muitos remédio fortíssimos.
Como podia existir um tratamento desses, uma verdadeira tortura, totalmente desumano! Como pode?!
Chegou a tal ponto, o tratamento desumano, que uma certa vez, ele não suportou e fugiu do sanatório. Fugiu e veio de Maringá até o nosso sítio em Marialva, só com a roupa do corpo. Pegou um ônibus, com o pouco dinheiro que tinha, da cidade de Maringá até a cidade de Marialva. De Marialva até o nosso sítio, um vizinho o conheceu e deu-lhe carona, dali desceu a pé, os dois quilômetros, que ainda faltava, até chegar a nossa casa.
Quanto vimos ele atravessando a ponte, que fica no rio que passa nos fundos de nosso sítio, foi uma grande surpresa para todos, mas também, motivo de alívio e muita alegria. Chegou descalço, sujo, cansado e maltrapilho. Mas estava tranquilo, sereno, feliz, sorriu ao ver todos ali acolhendo-o. Abraçou a todos e foi descansar. Foi acolhido com surpresa, alegria e muito amor, por todos. Foi motivo de festa. Nunca mais foi internado em nenhum sanatório não. Nunca mais!
Lembro com muita afetividade, não sai de minha alma, são momentos únicos, quando eu chegava da escola com meu caderno e livros, tarefa a fazer, ele me pegava no colo, dentro de nossa casa simples, sentado em uma cadeira de madeira, meio colonial, cadeira que era forrada com vime, linda, sentado entrono de uma grande mesa de madeira, na cozinha de nossa casa, perto do fogão a lenha, ele pedia para ver meu caderno e meus livros, para ver minhas atividades e tarefas, quando encontrava uma folha em branco, ele olhava com um carinho especial, seus olhos brilhavam, fazia silêncio, parecia que estava contemplando, passava sua mão de leve, bem devagar, parecia que estava sentindo a folha branca, limpa, sentindo sua textura, eu ali contemplando aquele momento sublime, vivendo aquele momento mágico, era o meu pai, ele depois de um tempo, tempo eterno, depois de um silêncio, silêncio que falava muito, que ficou em minha memória, em minha alma, ele olha-me e dizia, olhando em meus olhos, de menino, "olha meu filho quantas histórias dá para escrever aqui nestas folhas em branco, quantas histórias!"
Meu pai morreu no dia 12 de outubro de 1973, com apenas 46 anos de idade. Eu tinha apenas 12 anos de idade. Ele será sempre um exemplo de luta e dignidade. De amor e de luta contra o preconceito, de luta pela liberdade.
Se estivesse vivo, meu pai Inisio Caleffi, estaria fazendo 93 anos, neste dia 13 de novembro de 2020.
História de luta, de dignidade, de liberdade.
História, memória.
Amor. Saudade.
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