Projeto Minha História, Sua História, Nossa História
Depoimento de Wesley Braga Chaves
Entrevistado por Marcia Trezza e Tereza Farias
Rio Branco, 27/04/2018
Realização Museu da Pessoa
HTC_HV17_Wesley Braga Chaves
Transcrito por Mariana Wolff
Revisado e editado por Paulo Rodrigues Ferreira
P/1...Continuar leitura
Projeto Minha História, Sua História, Nossa História
Depoimento de Wesley Braga Chaves
Entrevistado por Marcia Trezza e Tereza Farias
Rio Branco, 27/04/2018
Realização Museu da Pessoa
HTC_HV17_Wesley Braga Chaves
Transcrito por Mariana Wolff
Revisado e editado por Paulo Rodrigues Ferreira
P/1 – Wesley, a gente vai começar a nossa conversa e só para começar, para registrar, diga o seu nome completo, onde você nasceu e a data.
R – Meu nome é Wesley Braga Chaves, eu nasci no dia 29 de agosto de 1996, em Rio Branco, Acre.
P/1 – Wesley, quais são as primeiras lembranças de quando você era criança?
R – As primeiras lembranças? Eu nasci primeiro que a minha irmã, eu tenho uma irmã mais nova do que eu um ano. As lembranças que eu tenho da minha infância são muito poucas, brincando com ela no quintal de casa, mesmo; dentro de casa, na rede. São poucas, são vagas as lembranças que eu tenho de quando eu era pequenininho.
P/1 – Você tem mais irmãos, além dela?
R – Uma irmã por parte de pai. Meu pai teve outra filha, fora do casamento.
P/1 – Mais nova do que vocês?
R – Não, mais velha.
P/1 – E essa imagem da rede, como é que era? Essa imagem, assim, na rede?
R – Na rede? É um pouco engraçado porque a minha mãe costumava fazer a minha irmã dormir e enquanto ela estava dormindo eu ia lá, pegava um cabo de vassoura e ia brincar com ela. Ia mexer com ela. Essa é uma imagem de que eu me recordo muito, da minha infância.
P/1 – Você ficava cutucando ela?
R – Cutucando enquanto ela dormia na rede (risos).
P/1 – E sua mãe, quando via?
R – Ah, minha mãe, quando via, ela embrabava, queria me colocar de castigo, porque toda vez que a minha irmã ia dormir, eu ia lá e mexia com ela, cutucava ela.
P/1 – Mas você queria brincar, não é?
R – Isso. Enquanto eu queria brincar… Ela queria fazer ela dormir, eu queria brincar com ela.
P/1 – E você, além da sua irmã, brincava com outras crianças?
R – Sim, sim, as crianças da vizinhança.
P/1 – Vocês moraram em que bairro? Aqui em Rio Branco, mesmo?
R – Aqui em Rio Branco.
PAUSA
P/1 – Wesley, eu perguntei se você brincava com outras crianças, além da sua irmã.
R – Sim, sim. Com as crianças da vizinhança.
P/1 – Em que bairro você morava quando era criança?
R – Bairro da Paz, se eu não estou enganado. O nome era Bairro da Paz.
P/1 – E você ficou nesse bairro durante longo tempo, depois mudou?
R – Durante alguns anos. Alguns anos da minha infância.
P/1 – Sua infância foi toda lá?
R – Não, não. Acho que de zero a cinco anos, só, mais ou menos.
P/1 – E quando você mudou para outro bairro, como era esse outro lugar em que você foi morar?
R – Como era?
P/1 – Até os cinco anos você ficou nesse lugar em que você brincava com a sua irmã e depois você mudou.
R – Sim.
P/1 – Aí eu lhe perguntei: “Como era esse outro lugar para o qual você mudou?”.
R – Antigamente, a senhora está querendo…
P/1 – Ah, quando você era criança, é.
R – Bom, pelo que eu me lembre, na época, a rua em que eu morava tinha, tipo, um bosque; não tinha muitas casas na época, também. Tinha um bosquezinho, onde as crianças gostavam de brincar à tarde, sempre à tarde.
P/1 – Você tem alguma história que aconteceu nesse bosque quando você era pequeno?
R – Não, não. Não lembro, agora.
P/1 – Era gostoso lá?
R – Era. Era. Toda tarde a gente gostava de ir para lá. Eu me lembro bem disso, que toda tarde a gente estava lá no bosquezinho.
P/1 – E o que vocês faziam lá?
R – Brincava, brincadeira dessas... Pega-pega, se esconde, esse tipo de brincadeira de criança mesmo.
P/1 – E a sua mãe trabalhava fora de casa?
R – Trabalhava. Na época, ela era empregada doméstica, trabalhava fora.
P/1 – E você conviveu com o seu pai, também?
R – Sim, sim.
P/1 – E ele trabalhava?
R – Trabalhava.
P/1 – Em quê?
R – Ele é pedreiro. Ele era e ainda é, na verdade, pedreiro.
P/1 – E que lembranças você tem do seu pai e da sua mãe quando você era criança ainda? Do que ele fazia ou alguma coisa que ele costumava fazer com vocês.
R – O meu pai costumava muito levar a gente para pescar. Ele sempre gostou de pescar; até hoje ainda eu vou pescar com ele na colônia… A gente tem… Uma colônia, não, uma chácara da minha falecida avó, porque a minha avó, a mãe dele, já faleceu, e aí deixou essa chácara para nós. Desde pequeno, então, ele sempre costumava levar a gente para pescar.
P/1 – Gostoso.
R – É, isso eu lembro muito bem.
P/1 – E ele ensinava a vocês?
R – Sim, sim, ensinava. Sempre ensinou.
P/1 – Como ele falava, fazia…?
R – Ele dizia que era para nós pegarmos o caniço - porque nós pescávamos com caniço, não é? Dizia como colocar a isca no anzol e jogar dentro do açude, do igarapé.
P/1 – Você pescou, assim… O primeiro peixe que você pescou, você lembra?
R – O primeiro peixe que eu pesquei, na verdade, não era nem um peixe, era um… Aqui se chama sarapó, ele é um peixe só que ele é comprido, parece uma cobra. Foi bastante engraçado até, porque quando eu o tirei de dentro da água, de dentro do açude, eu joguei em cima dos peitos do meu pai (risos), que eu puxei com o caniço assim, aí pegou em cima dos peitos dele (risos). Isso eu lembro bem porque foi a primeira vez que a gente foi pescar e eu peguei esse peixe.
P/1 – Já bagunçou os peixes do seu pai?
R – Foi. Daí a gente já veio para casa, ele ficou chateado também porque eu joguei o peixe nele, a gente veio para… Foi um fato bastante engraçado.
P/1 – Foi o seu batismo na pesca?
R – Foi.
P/1 – E até hoje você pesca com ele?
R – Sim. Quando eu estou de folga - geralmente eu folgo na sexta ou na quinta, igual hoje, sexta - aí a gente costuma ir, mas hoje é mais raro.
P/1 – Esse momento, assim, da pesca com o seu pai, como você descreveria? Não só com a pesca, porque você já contou como você aprendeu, mas esse momento tem um sentimento?
R – Tem sim. Para mim é um momento de união entre nós dois. Porque a gente sempre foi muito unido, desde pequeno. Eu e o meu pai sempre fomos muito unidos, então para mim é um momento de união. A gente estar ali junto é bastante legal para mim.
P/1 – Gostoso, não é? Esse sentimento. E com a sua mãe, assim, que marcas você… Como você descreveria, você e ela?
R – Com a minha mãe... A minha mãe sempre cuidou de mim, não é? Ela trabalhava muito fora, às vezes a gente tinha que ficar com a nossa avó, mas toda vez que ela tinha um tempo ela saía com a gente, passeava. É o que eu me recordo. Porque ela sempre trabalhou muito, igual ao meu pai, não é? Trabalhava fora, como empregada doméstica. Então, a maior parte do tempo a gente ficava com a nossa avó.
P/1 – E quando ela saía com vocês, você lembra de algum dia, assim, que foi muito bom, muito especial?
R – Não, não. Eu lembro que ela costumava levar a gente para um parquinho que tinha perto da nossa casa. Sempre era bom.
P/1 – Ela levava sempre vocês lá?
R – Isso.
P/1 – Você e a sua irmã?
R – É, eu e a minha irmã, na época.
P/1 – Você disse que ficava bastante tempo com a sua avó?
R – Isso.
P/1 – Como que era a sua avó com vocês?
R – A minha avó? A minha avó era muito boa. Minha avó, meu avô, a convivência com eles era bem agradável. Nunca nós… Até porque ela era um pouco rígida na época, não é? Coisa de avó, mesmo.
P/1 – Você lembra de alguma coisa que o seu avô ou a sua avó sempre falavam, assim, tipo ensinamento?
R – Não desrespeitar nem o meu pai e nem a minha mãe. Era o que eles sempre falavam para mim, que eu lembro: “Quando você chegar em casa, trate o seu pai e sua mãe bem, como vocês tratam a gente aqui”. Era o que sempre ela falava, e ele também.
P/1 – O carinho era grande, não é?
R – É. Era sim. Até quando a minha avó faleceu, a gente sofreu muito - eu e a minha irmã - porque fomos criados com ela. Essa minha avó, ela era mãe do meu pai e foi uma perda assim que até hoje eu tento caçar explicação, não é? Por que Deus quis levá-la. Mas a gente está tentando aceitar, está acho que com um ano e cinco meses que ela faleceu.
P/1 – Ela era relativamente nova, então?
R – Era! Nova assim, fisicamente. Ela tinha 78 anos, já.
P/1 – Mas para vocês, não é?
R – Não… Porque quando ela faleceu, assim, foi um momento que ninguém estava esperando. Ela teve uma parada cardíaca na frente da casa dela, desmaiou e foi do nada. Ela não tinha nenhuma doença, por incrível que pareça. Pela idade dela, 78 anos, ela não sofria de nenhuma doença. Só pressão alta mesmo.
P/1 – Entendi. E você pode dizer o nome dela? E diga para a gente o nome dela completo, o nome do seu avô.
R – Era… Meu Deus…
P/1 – Ou só o primeiro nome, mesmo.
R – O nome da minha avó? Zélia.
P/1 – Zélia. E do seu avô?
R – Mauricio.
P/1 – E dos seus pais?
R – O nome do meu pai? José Vênus Esteves Chaves. É completo o nome?
P/1 – É. Da sua mãe também.
R – O nome da minha mãe é Maria Idalina da Silva Braga.
P/1 – E da sua irmã?
R – Da minha irmã, Wesla - Wesla Braga. O meu nome é ao contrário, só com E no final.
P/1 – A gente pergunta para deixar aqui gravado com a sua história, não é? E quando você entrou na escola, como foi?
R – Quando eu entrei na escola, pequenininho?
P/1 – Isso. Sua primeira experiência com a escola.
R – A minha primeira experiência foi querer voltar para casa (risos). Eu acho que como toda criança, não é? Assim que eu passei o portão, que eu vi a minha mãe lá atrás, eu quis sair correndo, voltando para trás. Mas aí fecharam o portão e ela foi embora. Eu lembro que nesse dia eu passei a manhã todinha chorando dentro da escola. Essa foi a primeira experiência.
P/1 – A sua irmã não foi? Só você que foi?
R – Não, porque a gente… A minha mãe sempre costumou colocar os horários diferentes: eu estudava pela parte da manhã e a minha irmã pela parte da tarde. A reação dela, na época, eu não me recordo como foi.
P/1 – Eu perguntei se vocês estavam juntos porque você começou a chorar, e a sua irmã? Achei que ela tivesse ido também.
R – Não, ela não estava junto, não. Estávamos só eu e a minha mãe.
P/1 – Wesley, e pensando assim na escola, no ensino fundamental - de primeira a oitava séries - que lembranças você tem marcantes da escola? Desse período?
R – Bom, desse período do Fundamental que a senhora está falando?
P/1 – É, isso.
R – Eu tenho uma lembrança da primeira série, que eu estava brincando no parquinho da escola, estava no escorregador e eu caí e bati a cabeça. Aí a diretora me levou para o hospital. Essa é uma das lembranças da primeira série que eu tenho. Já mais para a frente, no Fundamental, eu não me recordo muito, assim, de lembranças marcantes, não.
P/1 – E algum professor que tenha marcado você, teve algum?
R – No Fundamental eu sempre fui uma criança meio rebelde, como se diz, não é? Eu costumava tratar o professor muito mal. Tanto que eu reprovei várias vezes no Fundamental para poder passar para o projeto.
P/1 – Wesley, você… Até o quarto ano a gente tem, geralmente, um professor só. Era assim?
R – Isso!
P/1 – Na sua época?
R – Era, era.
P/1 – E você, nessa época em que tinha um professor só, você já teve…
R – Já, já. Já apresentava uns problemas.
P/1 – Você repetiu algum ano?
R – Repeti depois acho que no sexto para frente, até a oitava série, eu repeti um ano.
P/1 – De primeira até o sexto, ne nhum ano?
R – Não, acho que foi do sexto para frente.
P/1 – E você foi rebelde. Você disse que desde pequeno?
R – Isso.
P/1 – O que acontecia? O que você fazia de rebeldia que as pessoas diziam?
R – Eu sempre fui um pouco… Como se diz, respondão. Eu gostava muito de responder aos professores, a professora, o que ela falava eu não concordava muito. Rebelde para mim foi isso, eu era muito respondão, na verdade. Os professores não gostavam, se incomodavam com isso, não é? E quanto mais eu via que eles se incomodavam, mais eu respondia.
P/1 – E você lembra, você consegue lembrar o que provocava esse questionamento em você?
R – Não, não. Era coisa do nada. Acho que por influência de outros colegas também, que eu via. Aí costumava fazer.
P/1 – Entendi. E você nessa época... Vocês brincavam na escola, você e os seus colegas? Nessa época, quando você era mais novo.
R – Brincava, brincava.
P/1 – Que tipos, assim, de brincadeira?
R – Nessa época do Fundamental, que a senhora está falando, a gente costumava jogar bola, tinha um campinho na escola, a gente costumava jogar bola, sempre no intervalo.
P/1 – E quando chegou na sexta série, você falou que repetiu, não é?
R – Uhum.
P/1 – E como foi essa situação?
O que aconteceu? Como foi a sexta série?
R – Bom, foi um pouco frustrante para mim. Da primeira até a sexta eu nunca tinha repetido nenhum ano. E de sexta para frente eu comecei a perder o interesse pelo estudo, não é? Começou… Aí, em casa, eu gostava bastante de ler. Mas eu parei de ler, de estudar, foi o ano em que eu reprovei.
P/1 – Até aí você lia? Gostava?
R – Gostava.
P/1 – E você lia o quê? Quando você… O que você gostava de ler?
R – Eu gostava de ler poemas, frases. Não me recordo quais eram, mas eu sempre gostei bastante de ler poemas e frases.
P/1 – Você escrevia também algum poema?
R – Não, não, não. Escrever, eu não escrevia não. Eu só gostava mesmo é de ler.
P/1 – Mas você disse que começou a se desinteressar, não é?
R – Foi.
P/1 – O que fez você começar a se desinteressar pela escola? O quê da escola lhe fez desinteressar?
R – Bom, da escola assim… Da escola mesmo, não, foi falta de interesse mais meu mesmo, pelo estudo. O interesse foi mais meu. Da escola não teve nenhum tipo de influência, foi mais da minha pessoa mesmo, pelo estudo.
P/1 – E você lembra o que começou a fazer você mudar esse interesse? Assim... Como foi acontecendo?
R – Bom, na época em que eu reprovei, eu lembro que costumava ir para a escola e quando tinha o intervalo eu costumava pular o muro e ir jogar videogame. Isso eu acho que foi um dos fatores também que me desinteressou mais, que eu passei a sair muito no horário de intervalo e perdia muito as matérias, não é? Não estava mais conseguindo acompanhar por conta disso. Eu gostava de brincar, de sair no intervalo e brincar e eu não voltava mais. Eu lembro que sempre costumava deixar o meu caderno. No outro dia eu chegava, ele estava em cima da cadeira, porque eu costumava sair e não voltar mais. Dali de onde eu ia brincar eu já ia direto para casa. Chegava lá no horário em que, geralmente, eu saía da aula. Minha mãe perguntava e eu: “Não, estou chegando em casa, estou vindo da aula”. Ela não costumava saber.
P/1 – E você deixava o seu caderno para quê?
R – Eu esquecia. Pulava o muro, ia embora e me esquecia do caderno. No outro dia, quando chegava, é que lembrava, porque eu o via em cima da cadeira.
P/1 – E alguém da escola, algum professor, algum diretor, coordenador nunca lhe perguntou sobre isso?
porque eu fazia. Eu dizia que era para brincar, jogar videogame, só isso.
P/1 – E nunca ninguém falou para sua mãe?
R – Falou! Ixi... A minha mãe... Lá na escola em que eu estudava tinha uma ladeira, antes de chegar nela. Ela cansava de subir essa ladeira, e descer, atrás de mim, porque ligavam quando eu saía. Aí ela tinha que ir lá conversar com o diretor e com o professor.
P/1 – E depois, como é que funcionava com você?
R – Depois, quando ela chegava em casa, ela conversava comigo, me botava, às vezes, de castigo e ela e o meu pai falavam para eu não fazer mais, não é? Mas no outro dia eu tornava a fazer a mesma coisa (risos), que eu lembro.
P/1 – Wesley, você ia jogar videogame onde?
R – Numa lan house que tinha perto da escola. Eu jogava videogame pelo computador. Gostava bastante.
P/1 – Você consegue me dizer... Assim... É interessante saber o seu sentimento... Assim... Todo mundo falava: “Você não pode fazer isso”, mas você continuava fazendo. O que você sentia? O que fazia você…
R – Na verdade, eu sabia que o que eu estava fazendo estava errado, mas o meu interesse por jogar era mais forte. Eu preferia jogar do que estar dentro da sala.
P/1 – Tinha outros amigos que iam com você?
R – Tinha sim, tinha dois ou três, se eu não me engano.
P/1 – Também que fugiam da sala?
R – Também que pulavam o muro e iam jogar videogame, todo mundo junto.
P/1 – E aí, teve alguma vez em que você falou assim: “Não, não vamos…?”
R – Tinha um ou dois que sempre falavam: “Hoje nós não vamos, não…”. Aí eu dizia: “Vamos, hoje nós vamos, sim”. Eu sempre fui o cabeça, não é? Chamava: “Vamos, vamos, é só hoje”. E esse negócio de só hoje era quase todo dia que a gente ia.
P/1 – E eu não sei se você pode falar, mas como é que vocês faziam? Porque pagava lá, não é?
R – Pagava. Na época, o meu pai costumava me dar dinheiro todo dia para eu merendar na escola - salgado, suco... Ele me dava dinheiro e eu costumava usar esse dinheiro para pagar. Os outros, eu não me recordo como eles conseguiam, mas eu sei que eles tinham também, eles conseguiam.
P/1 – Está certo. Você… Aí acabou que você repetiu.
R – Isso.
P/1 – Como foi esse momento?
R – Bom, esse momento para mim, como eu falei, foi frustrante, não é? Porque eu, na verdade, já estava esperando. Porque eu já sabia que ia reprovar mas não tinha falado nada para ninguém, nem para a minha família. Então eu fazia as provas, eram sempre notas baixas, estava se aproximando o final do ano e eu fazendo as provas e as notas eram muito baixas. Então, foi bastante frustrante esse momento.
P/1 – E depois, você continuou estudando?
R – Sim, sim. Eu repeti, fiz o mesmo ano, não é? Passei e quando chegou, acho que na oitava série, eu parei de estudar, teve uma época que eu não quis mais ir. Foi quando apareceu o projeto.
P/1 – E na sétima e oitava, você continuou com o vídeo game?
R – Não, não, aí já foi uma fase que passou. Aquelas fases de adolescentes mesmo, que passou.
P/1 – Antes da gente entrar no projeto, você, na sua juventude, além da escola, tinha amigos? Você se divertia de que forma?
R – Tinha amigos, sim. Eu gostava bastante de jogar bola. Antes de entrar no projeto, eu conheci alguns amigos que também me influenciaram a querer que eu parasse de estudar no ensino regular. No caso, de sétima e oitava. Eu parei porque tinha uns amigos que me influenciaram a coisas erradas. Aí foi uma época da minha vida em que eu parei de estudar, antes de entrar no projeto.
P/1 – Entendi. Você, nessa fase, assim, você não se interessava mais pela escola?
R – Não, não… Eu perdi o interesse um pouco.
P/1 – E você tinha que atividades além da escola?
R – Além da escola, eu estava acostumado a jogar bola, a conversar com os amigos, ia para a casa de um, ia para a casa de outro, e assim ia. Ia brincar, porque lá perto de casa -
onde eu moro agora - tinha uma mata, a gente ia lá para dentro caçar, pegar passarinho. Era isso que eu costumava fazer. No tempo em que eu não estava indo para a escola.
P/1 – Wesley, você falou: “Chegou na oitava série, eu me desinteressei mesmo”…
R – Foi.
P/1 – Conte assim... Por que... O que você sentia…
R – Bom, o meu desinteresse foi mais por influência de amigos, mesmo. Chegou uma parte da minha vida em que eu conheci algumas pessoas que me levaram… Me influenciaram a ir para um caminho que não era o certo, não é? Um caminho errado, em que alguns deles usavam até drogas. Aí eu comecei a acompanhar, não cheguei a usar, mas eu estava ali perto, não é? Eu queria estar perto todo dia, queria ficar com eles, a minha mãe falava que era errado, mas mesmo assim eu deixei de estudar para ficar com os amigos. Como eu falei, eu não cheguei a usar, só acompanhei mesmo. Isso eu acho que foi um dos pontos fortes para eu não querer mais continuar estudando.
P/1 – Certo. Você largou a escola, passou algum tempo assim, em que você ficou distante alguns anos.
R – Passei acho que um ano sem estudar. Da oitava série eu passei um ano, porque se eu não estou enganado, eu reprovei não só uma vez, foram duas vezes. Na sexta série eu reprovei, aí eu continuei estudando, fui para a sétima e reprovei na oitava, que foi quando eu parei também de estudar.
P/1 – Os professores influenciaram você em algum… Conversaram? Ou não entendiam? Como era essa relação com os professores nesse momento em que você desistiu? Como era essa relação com os professores?
R – A gente tinha uma relação assim, não…
PAUSA
P/1 – Wesley, enquanto acontecia todo esse movimento com você, com os seus amigos, a escola... Porque você repetiu a oitava, não é?
R – Isso.
P/1 – Tinha alguém, algum professor, algum coordenador que conversava com você? Como era a atitude deles com você?
R – Tinha professores e diretores que costumavam conversar comigo, sim. Falar para eu voltar a ser como era antes. Eu lembro que o diretor sempre foi falar comigo, conversar comigo. Na época, ele falava que o que eu estava fazendo era errado. Mas na época eu não queria entender, não conseguia entender o que ele estava falando.
P/1 – Não teve nenhum que falou de um jeito que você entendesse ou quisesse…
R – Não. No ensino regular, não.
P/1 – E não tinha nada na escola que despertasse o interesse? Ou havia algo na escola que despertava o seu interesse?
R – Não, não tinha, não.
P/1 – Esses colegas dos quais você começou a
ficar muito junto, eles também eram da escola?
R – Não, por incrível que pareça, eram uns colegas que eu conhecia da rua mesmo, perto de casa. Não eram da escola, não.
P/1 – E aí, você disse que encontrou o Telecurso, não é?
R – Isso.
P/1 – Como você chegou ao Telecurso?
R – Estava tendo a inscrição para o projeto nessa mesma escola em que eu estudava no ensino regular. E a minha mãe foi fazer a inscrição novamente para a oitava série, para eu fazer de novo. E por lá ela encontrou uma coordenadora do projeto, que estava lá - eu não me recordo se foi uma coordenadora ou se foi uma professora. Ela citou que ia ter o projeto, que iam ter vagas abertas, não é? A minha mãe foi lá, me inscreveu no projeto, fez uma inscrição e foi por meio dela que eu entrei. Por meio de uma professora ou coordenadora, eu não estou me recordando.
P/1 – Wesley, e você lembra como a sua mãe lhe falou que ela o havia inscrito no curso?
R – Lembro sim. Ela disse que tinha chegado para fazer a inscrição novamente, da oitava série, e que tinha uma professora que havia falado para ela que estavam abertas vagas para o Telecurso para o aluno, não é? E que ela achava melhor que eu entrasse porque eram dois anos só, na época, e que iria acelerar o meu processo, que eu já tinha perdido dois anos também e que ia ser mais rápido para eu chegar ao ensino médio.
P/1 – E aí, você foi?
R – Sim. No começo... Quando começou, eu achei um pouco diferente porque a metodologia do Telecurso é diferente do ensino regular, não é? A maior diferença que eu acho é o professor, porque só tinha um. E no ensino regular tinham vários. No Telecurso só era um, não é? Acho que foi a maior diferença que eu notei.
P/1 – E você lembra, assim, de quando você chegou na sala? Conte como foi.
R – Bom, quando eu cheguei na sala, na época, as cadeiras eram todas “arrodeadas”, tinha que sentar um olhando de frente para o outro. Aí, isso para mim foi bastante interessante, no caso.
P/1 – E você… Assim... Foi interessante, mas interessante como? Você sentou lá… Conte um pouco as suas sensações.
R – Eu sentei, a professora pediu para eu falar o meu nome, me apresentar para os alunos, para os outros, não é? E foi só isso…
P/1 – Sim, mas você disse que achou interessante, não é? Por que você achou interessante?
R – Porque no ensino regular as cadeiras não eram em círculo, todo mundo sentava um atrás do outro. E no Telecurso as cadeiras eram em círculo. Eu achei interessante por causa disso, também.
P/1 – E essa primeira semana, como que você foi sentindo esse novo… Essa nova escola?
R – No começo eu não me adaptei muito bem, eu queria trazer o mesmo costume que eu tinha com os professores do ensino regular para o Telecurso, não é? No começo eu não tratava a professora bem, eu era um pouco arrogante com ela. Foi bastante difícil para ela e para mim, também.
P/1 – E como foi esse processo? Você foi arrogante, você disse que foi difícil e como foi acontecendo depois?
R – Bom, no começo assim... Eu vinha comentando com ela no carro que, às vezes, eu não queria ir para a aula, a professora ia me buscar em casa, não é? Eu gostava bastante de ficar em casa, de faltar à aula e não ia, no começo. Aí ela sempre ia me buscar em casa, ela dizia que em casa não era… Que naquele horário eu não tinha que estar em casa, que eu tinha que estar na aula. Também tinha um posto de lavagem de carro perto de casa que eu também sempre estava lá. Às vezes ela ia me buscar lá e me levava para… Aí a minha mãe também ia junto, com o carro dela. Aí fazia eu tomar banho e ir para a aula (risos). Eu chegava, às vezes, no segundo período, depois do intervalo, não é? Ela ia no intervalo me buscar.
P/1 – E quando ela chegava… A primeira vez que ela chegou, como foi?
R – Ah, eu tomei um susto, porque não era comum o professor buscar o aluno dentro de casa, não é? No começo eu me assustei um pouco.
P/1 –
E repetiu outras vezes de fazer isso?
R – Algumas vezes, umas duas, três vezes.
P/1 – E como você parou de querer faltar?
R – Porque… Eu quis parar porque eu fui me interessando e ficando interessado pela aula por causa das dinâmicas que tinha. O que tinha no Telecurso não tinha no ensino regular, não é? Eram as dinâmicas. Toda vez que a gente entrava, eu lembro que… Toda vez que a gente entrava, no começo da aula, a professora lia um poema, e aí eu gostava de fazer também, de ler. Eu lia um poema, lia uma frase, aí eu fui querendo… Comecei a me interessar. Tinha trabalho em grupo, também. No começo eu fiquei meio assim para participar, mas logo depois fui me adaptando, querendo participar cada vez mais.
PAUSA
P/1 – Wesley, bom, foi indo, você começou a se interessar…
R – Isso.
P/1 – O que mais… Qual a maior diferença entre o que te desinteressava na escola e o que começou a te interessar no Telecurso? Qual foi a maior diferença?
R – A maior diferença eu acho que foi o cuidado da professora comigo. Isso foi a maior diferença.
P/1 – Mas você disse que o diretor, os professores ficaram falando para você: “Isso é errado, você não deve fazer”, e ela… Como que ela fez e eles não, entendeu? O que fez você…
R – Ela tinha um cuidado a mais com a gente, não só comigo mas com todos. Acho que a maior diferença foi essa, ela procurar entender o que estava acontecendo, não é? Ela ligava para as nossas mães, às vezes… Ela sabia que quando a gente chegava diferente dentro da sala, ela procurava entender o que estava acontecendo. E no ensino regular não tinha esse tipo de coisa, do professor com o aluno, porque era tanto que eles tinham os horários, não é? Passava de quarenta minutos a uma hora dentro da sala e não procurava muito saber o que estava acontecendo com o aluno. Na minha época, não é?
P/1 – Quando tinha essa conversa com… Chamaram você para conversar lá no ensino regular e ficavam falando para você as coisas. Aí a sua professora também falava coisas para você sobre a sua participação.
PAUSA
R – A diferença - estou tentando lembrar - mas era... O diretor fazia as perguntas diretas e eu respondia assim, por impulso. Ela não, ela procurava saber detalhadamente. Tanto que eu não respondia diretamente para ela, a gente conversava mais pelo Memorial, na verdade.
P/1 – Explica isso para a gente. O que é o Memorial? Como é que acontecia?
R – O Memorial era um caderninho que a gente tinha para escrever o que acontecia com a gente, na nossa vida fora da sala e dentro da sala. E nesse Memorial eu costumava sempre conversar com ela por lá, porque eu tinha vergonha de chegar e falar diretamente para ela. Eu escrevia bastante coisa e ela sempre dava muita atenção, ela sempre lia, todo dia, e eu escrevia algumas coisas. Durante um determinado tempo o meu pai, ele se acostumou a querer ficar bebendo direto todos os dias, não é? E nesse Memorial eu contava. Às vezes ele chegava em casa bêbado, queria bater na minha mãe, queria bater na gente e eu falava para ela o que acontecia, não é? Eu não tinha coragem de falar diretamente para ela, mas eu escrevia. E ela sempre teve um cuidado de responder direitinho, porque ela escrevia também. De me dar um conselho, de falar uma palavra amiga, de me orientar da forma adequada, como eu tinha que agir.
P/1 – Você lembra de alguma coisa assim que ela escreveu que lhe marcou bastante?
R – Eu lembro que uma vez ela disse para mim... Eu escrevi para ela e disse: “O meu pai chegou hoje e estava querendo bater na minha mãe, e eu me meti”. Ela disse: “Você tem
que orar pelo seu pai, isso só se resolve você orando e pedindo para Deus”. Ela sempre costumava citar o nome de Deus no Memorial. Isso me marcou muito, também.
P/1 – Entendi. E você, na sala, com os seus colegas, como era essa relação com o grupo?
R – Era muito boa. A gente… Na sala de aula costumava fazer bastante trabalho em grupo e sempre era uma convivência muito boa, fazer os trabalhos, apresentar... Sempre foi uma convivência boa, bastante agradável.
P/1 – Tinha as equipes?
R – Tinha sim. Socialização, Síntese, Coordenação e Avaliação. Eram quatro equipes que tinha.
P/1 – E você participou de todas?
R – Todas! Porque ela costumava fazer rodízio com a gente, não é? Um mês uma equipe ficava… Um determinado grupo de pessoas ficava com uma equipe, noutro mês terminava na outra equipe, e assim ia mudando.
P/1 – E você ficou em todas. Teve algum aprendizado? Como foi isso?
R – Sim, eu gostava muito de duas: da Coordenação e da Síntese. A Coordenação era a equipe que ajudava a professora, pegava a televisão para assistir a teleaula, ajeitava as cadeiras dentro da sala, e a Síntese era a que fazia a Ata do dia, escrevia o que aconteceu durante a aula. Essas duas eu gostava bastante.
P/1 – Você aprendeu alguma coisa com essa participação nessas equipes?
R – Aprendi sim. Trabalhar em grupo. Hoje eu vinha falando para ela, dentro do carro, porque ela me perguntou como é que era no meu trabalho, não é? E eu disse para ela que o projeto me ensinou a trabalhar em grupo. O pessoal lá costuma dizer que eu falo demais no meu trabalho, que eu falo demais, às vezes dizem que eu até passo do limite, porque eu falo muito. E eu trouxe isso do projeto - trabalhar em grupo, não é? Veio junto comigo, do projeto. Porque antes eu era muito tímido. Quando eu gostava de ficar com as pessoas em grupo, não tinha aquela convivência de harmonia em grupo.
P/1 – E no Telecurso, teve alguma situação marcante do começo, de participar da equipe, teve alguma… ou mesmo depois, alguma situação marcante assim, que você viveu com os seus colegas?
R – A situação marcante é que eu tinha alguns colegas e eles seguiram, quando eu estudava no ensino regular. E quando eles vieram para o projeto, eles fizeram a mesma coisa que eu havia feito lá, eles saíram do projeto, eles não… Havia dois caras, dos quais eu gostava bastante, e teve um determinado tempo do Telecurso em que eles começaram a se afastar e não quiseram ir mais. A gente era bem próximo e isso me marcou muito, porque eu vi que o que aconteceu comigo nesse ano regular, estava acontecendo com eles no Telecurso. E eles, de uma certa forma, eles não quiseram voltar de jeito nenhum, nem ela indo atrás, nem a professora indo atrás deles. Isso me marcou bastante porque a gente convivia dentro de sala, a gente era bem unido, não é?
P/1 – E você disse que era bastante tímido, hoje…
R – Eu tento falar um pouco, não é?
P/1 – Como foi acontecendo essa transformação?
R – Dentro de sala de aula mesmo. A transformação veio de quando eu estudava. De, como eu falei, trabalho em equipe, apresentação de trabalho lá na frente, a professora pedia para a gente ler alguma coisa, a gente lia. Veio de dentro da sala de aula mesmo, de quando eu estudava no Telecurso.
P/1 – Você lembra do primeiro trabalho que você teve que apresentar?
R – Não, não. Eu me recordo de alguns, mas o primeiro, não.
P/1 – Mas que seja um trabalho que tenha marcado você.
R – Eu lembro que a gente fez uma certa pesquisa e aí tinha que apresentar. E eram quatro pessoas que tinham que falar. Nesse dia, no trabalho, a gente tinha feito na cartolina. E éramos eu e mais três, se eu não me engano. Nesse dia, os três faltaram e eu tive que apresentar só, falar sozinho, e isso me marcou bastante. Porque eu lembro do trabalho.
P/1 – Se saiu bem?
R – Gaguejando, mas saí (risos).
P/1 – Aí, pronto, você perdeu o medo?
R – Foi. Daí para frente eu já comecei a me acostumar, porque eu sabia que sempre ia ter que apresentar o trabalho e ia ter que ficar em equipe. Porque no Telecurso a metodologia sempre foi essa: trabalhar em equipe e apresentar trabalho lá na frente.
P/1 – E quando vocês trabalhavam em grupo você disse que, ou nas equipes ou nos trabalhos em grupo, nesse círculo grande, como era assim a relação entre os colegas?
R – Era boa, não tinha nenhum tipo de desentendimento, não, sempre foi uma relação boa.
P/1 – Mas a professora fazia alguma coisa para acontecer isso?
R – Fazia. Como eu falei para a senhora, toda vez que a gente chegava, a gente tinha uma certa cerimônia, se apresentava um para o outro, dizia como é que estava o dia da gente. E ali todos foram criando laços de amizade uns com os outros, porque ela fazia isso acontecer, não é? Ela costumava deixar todo mundo unido dentro da sala.
P/1 – Como que acontecia isso?
R – Como que acontecia? Através de conversas mesmo, de leitura de poemas, porque ela fazia leitura compartilhada, todo dia a gente ficava em grupo. Isso aí não tinha por onde escapar. Então, a partir daí eu acho que todos foram se acostumando a trabalhar em equipe.
P/1 – Agora você... Como você disse... Você repetiu duas vezes. E sobre o aprender... Além dessa relação, o aprender as matérias, os assuntos, a diferença do Telecurso para o ensino regular?
R – Diferença que eu lembre é que no ensino regular eram várias matérias no mesmo dia, às vezes quatro ou cinco matérias. E no projeto, eu me lembro de que todo dia era uma matéria diferente, e eu acho que isso era melhor para a gente porque a gente aprendia mais sobre a matéria só, no dia; no outro dia, a gente tinha outra matéria. No ensino regular, não, a professora vinha passar quarenta minutos, falava um pouco mas não explicava detalhadamente como no projeto.
P/1 – No projeto?
R – Pois é, como no projeto, não é? Como eu estou falando para a senhora, no projeto todo dia tinha uma matéria diferente, ela explicava no dia só uma matéria. E, com isso, a gente passou a
aprender mais. Por exemplo, eu passei a aprender mais porque um dia estudava uma matéria e no outro dia estudava outra. E aquilo ali entrava mais na minha mente do que no ensino regular, que era tudo muito rápido, os professores queriam saber de passar a matéria rápido. No projeto não, era tudo detalhadamente, cada dia uma matéria.
P/1 – Você lembra dos módulos? Módulo “Quem Sou Eu”?
R – Lembro muito pouco. Não lembro assim muito bem, não, dos módulos.
P/1 – Você não lembra dos nomes, não é?
R – Não, não.
P/1 – Certo, mas era dessa forma que você falou, cada dia um…
R – Cada dia… É, eu lembro que cada dia tinha uma matéria e cada dia ela explicava uma matéria diferente.
P/1 – Wesley, como foi acontecendo com esse grupo de amigos fora, que você ficava sempre junto com eles? Isso aí continuou do mesmo jeito ou mudou?
R – Não, eu passei a me interessar mais pelo estudo e aquelas pessoas foram se afastando, não é? Eu passei a parar de andar com eles mas foi um processo um pouco lento, em que eu, mesmo estudando, continuava andando. E a professora sempre me aconselhava, até mesmo no Memorial, a largar porque eram influências que não iam dar certo na minha vida. Tanto que hoje eu acho que, se eu tivesse me deixado levar pela influência, não teria chegado até aqui. Porque muitos dos meus amigos que se deixaram influenciar pelo lado errado, foram por aquele caminho, uns estão presos e outros até mortos, já falecidos. Então o Telecurso me ajudou muito nisso, não é? Eu passei a me interessar e esquecer das amizades que não era para eu ter.
P/1 – E lá dentro do seu íntimo, que transformação maior houve? No seu íntimo?
R – A transformação maior foi de querer ser alguém, não é? Antes eu não pensava o que eu queria do futuro, como ia ser. A transformação maior foi essa, de querer avançar na vida, de querer sempre crescer. Essa foi a transformação maior, de ter uma família, de ter uma filha. Hoje eu tenho uma filha, ela tem dois anos, tenho uma esposa, tenho uma casa. E antes eu não pensava nisso. Eu acho que a transformação maior dentro de mim foi isso.
P/1 – E teve momentos que fizeram você construir esse projeto para você?
R – Sim, sim. Dentro do Telecurso mesmo, minha mente começou a abrir dentro da sala de aula mesmo. Querer alguma coisa para o futuro, não é? Foi dentro da sala de aula mesmo, veio de dentro do Telecurso.
P/1 – Mas como acontecia isso? Numa aula? Numa conversa? Num estudo? Como isso vai acontecendo? Conta como que, de repente... Que não é de repente…
R – Não é de repente. Eu comecei a me interessar, como eu falei, pelo estudo. E isso abriu minha mente para eu pensar nas coisas mais para frente, para o futuro. Durante as aulas eu sempre pensava, não é? Via a professora explicando: “Isso aqui, daqui um tempo vocês vão lembrar. Se vocês não escutarem, vocês não vão lembrar que eu disse que ia acontecer”. Até um tempo atrás eu estava lembrando de que ela falou isso uma vez: que se a gente seguisse esse caminho certo, ia dar tudo certo na nossa vida, a gente ia ter um bom trabalho, ia ter uma família, uma casa. E isso foi um dos pontos que influenciavam a gente quando ela falava, também.
P/1 – E você lembrou outro dia disso?
R – Foi… Porque eu a tenho nas redes sociais, eu vi o perfil dela e eu lembrei. Porque há um tempo atrás, um amigo meu, que estudava comigo também, faleceu, mataram ele aqui na região por causa dessas brigas que estão tendo, de facção; ele participava. Aí, foi quando eu vi o perfil dela e eu lembrei do que ela falava para a gente: “Que se vocês seguirem o caminho certo, mais para frente vocês vão ter um futuro, vão ter uma família, uma casa”. E foi isso que me levou a querer pensar lá na frente, que você me perguntou.
P/1 – Muito bom. Você conheceu a sua esposa onde?
R – A minha esposa eu conheci no meu primeiro trabalho. Eu trabalhava como auxiliar de limpeza no Tribunal de Justiça aqui do estado do Acre, aqui em Rio Branco, no município. Eu conheci ela lá, ela trabalhava no mesmo serviço que eu. Eu conheci ela lá.
P/1 – E agora já têm uma filhinha?
R – Já, já está com uns três anos e meio que eu estou junto com ela e há dois anos a gente teve a nossa filha, não é? É parecida comigo, eu costumo dizer que é parecida comigo e não com a mãe dela (risos).
P/1 – E ela diz que é parecida com ela?
R – É, ela diz que é parecida com ela.
P/1 – Como ela chama, a sua esposa?
R – A minha esposa? Vânia. Vânia Campos.
P/1 – E a sua filhinha?
R – Ana Sofia.
P/1 – Nome bonito. E você, quando teve essa menina, quando ela nasceu, qual foi a sua sensação?
R – Bom, no começo eu fiquei um pouco assustado, porque não era esperado, não é? Mas, com o passar do tempo, eu fiquei feliz pela oportunidade de ser pai, porque eu sei que ser pai é uma oportunidade única que todo mundo… Às vezes não pode ter, não é? E eu tive. E eu sou muito feliz, amo a minha filha. Quando eu chego do trabalho ela está lá na porta de casa me esperando, toda vez, parece que ela adivinha o horário que eu vou chegar. Aí ela me vê passando no portão, diz: “Pápá, pápá”. E já chama a mãe dela, já fala que eu cheguei. E quando eu chego, muitas vezes nem tiro a roupa e já vou brincar com ela, nem vou tomar banho e nem nada.
P/1 – Wesley, quando você entrou no Telecurso você trabalhava, já?
R – Não. Não, não trabalhava, não.
P/1 – Quando você começou
a trabalhar? Foi junto? Foi como?
R – Não. Eu comecei a trabalhar depois que eu terminei o Telecurso. Aí eu fiz o ensino médio, terminei e procurei um trabalho para mim. O único trabalho que surgiu na época, se eu não me engano, foi de auxiliar de limpeza.
P/1 – E agora?
R – Agora eu trabalho numa empresa aqui do estado, numa rede de supermercados, de fatiador, na verdade, fatiador. Repositor de frios. Eu trabalho no setor de reposição de frios, só que no fatiado, que é como chama.
P/1 – Você gosta? É um trabalho que tem responsabilidades?
R – Tem muita responsabilidade. Gosto, sim. Gosto porque é um trabalho digno. Também eu gosto de estar lá, eu entro às seis horas e saio às duas e vinte, à tarde. Eu tenho tempo para a minha filha, esse é um fator que eu gosto mais ainda, porque eu tenho tempo livre para a minha filha.
P/1 – Você tem sonhos, projetos para a frente?
R – Tenho sim. Mais para a frente eu quero fazer um vestibular para entrar na faculdade, prestar vestibular. E o meu sonho é sempre crescer. Eu estou nesse trabalho porque tem que trabalhar mesmo, porque tem que manter as coisas, mas eu pretendo, daqui mais um tempo, fazer uma faculdade. Educação Física, que foi sempre o que eu quis, não é? E vou lutar para isso.
P/1 – Com certeza. Agora eu vou falar um pouco de um acontecimento: você foi para o Rio de Janeiro pelo projeto?
R –
Isso, fui sim.
P/1 – Comente sobre isso.
R – Eu fui convidado pela professora, a gente já tinha terminado… Eu já tinha parado de estudar, na verdade, nessa época. Eu estava cursando o ensino médio, já. Já estava terminando o ensino médio quando um certo dia ela me ligou perguntando onde eu estava. Eu disse que estava em casa. Ela falou: “Eu fui convidada para o aniversário dos trinta e cinco anos do Telecurso e, nesse convite, eles perguntaram se eu não tinha um aluno para levar comigo”. Aí ela disse que a primeira pessoa que veio na mente dela fui eu. Num primeiro momento eu fiquei muito feliz, chamei minha mãe, falei para ela. Ela disse: “Você quer ir comigo?” ‘Quero sim”. “Tal dia a gente viaja”. O pessoal de lá entrou em contato comigo e falou, não é? E aí a gente foi para lá. Eu e o pessoal daqui que também já tinha feito o Telecurso. Foram, se eu não me engano, quatro dias. Foram muito agradáveis, a gente lá, tive bastante conhecimento das coisas do Telecurso, que eu ainda não sabia e fiquei sabendo, não é? Conheci pessoas de outras partes do Brasil que também fizeram o projeto, só que projetos de nomes diferentes. Só que era a mesma coisa que eu fazia aqui. Do Rio de Janeiro, Amazonas, Pará. Conheci várias pessoas lá. E foram dias bastante agradáveis para mim, eu gostei muito, eu nunca tinha saído, viajado para outro estado e poder ir pelo Telecurso foi ainda mais interessante. Porque o Telecurso me ajudou muito em determinada fase da minha vida e poder estar lá nesse aniversário foi bastante agradável para mim, eu gostei muito.
P/1 – E quando ela falou isso: “escolhi você para ir comigo”?
R – Eu fiquei bastante feliz, porque onde eu estudava não era só eu, tinha uma base de umas trinta pessoas, ela poderia ter escolhido qualquer outra pessoa, mas ela me escolheu, não é?
P/1 – Ela falou o motivo?
R – Ela disse que porque se identificou muito com a minha história de vida, muito pelo que eu contava no Memorial, essas coisas.
P/1 – Se você pudesse lembrar algum trecho... Você já falou do Memorial, mas hoje você ainda tem esse Memorial?
R – Não, não. Eu até disse que ia procurar, mas procurando lá pela casa da minha mãe, porque as minhas coisas… Se tinha ficado lá, mas eu não consegui encontrar.
P/1 – Não sei se você consegue lembrar assim, do começo até a conclusão, não é? Nesse Memorial assim… Assim... O que eu quero dizer: “Era assim, aí aconteceu isso…”.
R – Eu lembro que no começo eu costumava escrever bastante coisa da sala de aula, mesmo. Aí do meio para o fim eu já fui falando mais sobre a minha vida, o que acontecia fora. A conclusão, não me lembro muito bem, eu não me recordo. Mas, no começo, foi mais sobre a sala de aula e, do meio para o fim, mais sobre a minha vida pessoal mesmo, que eu gostava bastante, eu anotava no Memorial.
P/1 – E você falou das respostas da professora, não é?
R – Sim.
P/1 – Bom, aí vocês foram para lá e teve alguma apresentação aqui? Como é que foi essa apresentação? Como é que vocês se prepararam?
R – Lá tinha que explicar sobre o Poronga, não é? Sobre o que era o Poronga, que eu estou até com um brochezinho que eu ganhei dela. Aí lá a gente foi explicar o que era o Poronga, não é? E Poronga para nós significa abrir caminho, caminho de luz, que os seringueiros usavam na cabeça com a luz, e lá a gente tinha que explicar para as pessoas, para os convidados sobre o que era o Poronga.
P/1 – E você se preparou bastante para isso?
R – Sim, sim. A gente tinha alguns textos, eu não me recordo muito bem o que era, mas estudamos bastante no hotel onde a gente estava para poder explicar para o pessoal.
P/1 – E quando você chegou lá qual foi a sua sensação?
R – Eu me senti muito feliz por estar lá, no meio daquele monte de gente importante, que tinha bastante gente importante. Eu me senti uma pessoa bastante importante também por estar naquele local, naquela ocasião.
P/1 – Aí vocês apresentaram sobre o significado?
R – Foi. A nossa parte era o significado do que era Poronga.
P/1 – E esse broche, você ia falar, fale um pouco quem deu, como que…
R – Esse broche quem me deu foi a professora Laura, ela fez alguns… Ela colocou alguns como lembrancinha para nós levarmos não é? E no final ela deu para cada um que tinha ido. Aí eu guardei comigo, desde então. Está com cinco anos, estava guardado dentro do meu guarda-roupa lá. E quando me ligaram para vir para cá eu disse para a minha esposa que eu ia colocar, porque é uma coisa que representa muito na minha vida, o Telecurso, não é? Uma coisa que eu sempre vou levar comigo para onde eu for. Costumo sempre dizer que o Telecurso me ajudou muito numa fase da minha vida em que eu mais precisei.
P/1 – Quer perguntar alguma coisa? Está tudo certo? Wesley, pensando em todos esses colegas que você falou, que, hoje, se você estivesse com eles talvez você não estivesse aqui para contar essa história, então…
R – Verdade.
P/1 – Como você disse que foi muito importante na sua vida, o que você falaria do Telecurso para alguns outros jovens que estão numa situação que você já viveu? Se você fosse recomendar o Telecurso, para eles se interessarem, o que você diria?
R – Assim como eu tive uma pessoa dentro do Telecurso, a professora, ela me incentivou
a continuar, eu ia incentivar essa pessoa a continuar, também. A seguir o sonho dela, a não desistir. Para ter um futuro lá na frente, melhor, não é? Isso é o que eu diria para a pessoa. Nunca desistir daquilo que ela almeja, sempre procurar evoluir, alcançar os seus sonhos.
P/1 – Mas, e se você quisesse convidá-los a fazer o Telecurso, como é que você iria dizer do Telecurso para que eles se interessassem?
R – Bom, o ensino regular é bom, mas eu costumo dizer para alguns que o Telecurso é melhor ainda porque vai ter um professora que vai lhe acolher, como as outras não lhe acolhem, não é? É só uma professora. O Telecurso seria uma melhor opção para uma pessoa que, assim como eu, repetiu de ano e quisesse avançar. Isso é o que eu diria para a pessoa.
P/1 – Você falou uma coisa aí que eu queria que você me explicasse. Você disse que no ensino regular é só uma professora…
R – No Telecurso só uma professora e no ensino regular várias, não é? Como eu falei antes,
no Telecurso essa professora dá mais atenção para você do que no ensino regular, que são vários. Eu acho que uma pessoa que desiste, para voltar ela precisa de mais atenção, de mais cuidado. E os professores do Telecurso têm esse cuidado com a pessoa, eles cuidam de verdade.
P/1 – Muito bem, está ótimo, viu?
R – Fechou?
P/1 – Alguém quer perguntar alguma coisa? O que você achou de contar a sua história aqui para nós?
R – Eu achei legal. Quando me chamaram eu pensei assim e logo de cara eu aceitei, porque é uma história de vida, não é? Porque eu quero que como... Assim... Eu tive uma fase da minha vida, que os outros se espelhem também e vejam o que aconteceu comigo. Eu achei bastante legal estar aqui.
P/1 – E ficar aqui assim falando, como foi?
R – (risos)
P/1 – Foi difícil, foi fácil?
R – Foi difícil, foi (risos). Eu não estou acostumado com esse tipo de coisa, filmagem, não é? Eu nunca tinha feito nenhuma filmagem. Eu tinha feito, na verdade. Fiz uma no Rio de Janeiro, lá nos trinta e cinco anos, uma filmagem também, dei uma entrevista lá.
P/1 – Ah, então…
R – Foi. No Jardim Botânico.
P/1 – Está ficando já craque nas câmeras. Você quer falar alguma coisa que a gente não perguntou, que você gostaria muito de deixar aqui gravado na sua história? Qualquer fase da vida, de qualquer coisa que eu não perguntei?
R – O que eu gostaria de falar mais uma vez é que quem está me vendo agora, que vai me ver, nunca desistir dos seus sonhos. Sempre procurar almejar aquilo que você quer, aquilo que você botou na sua mente e ir fundo naquilo. Só isso mesmo que eu queria deixar.
P/1 – Está ótimo. Muito obrigada, então, parabéns para você.
R – Obrigado.
P/1 – Parabéns pela história.
R – Obrigado.
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