Eu nasci em uma família de evangélicos ligados a Congregação Cristã no Brasil, eles nunca foram fanáticos, extremistas, mas a questão de cortar o cabelo era um tabu e mantê-lo era uma virtude. Com 12 anos, eu já não me identificava com a doutrina e sonhava em ter um cabelo curto e 'modern...Continuar leitura
Eu nasci em uma família de evangélicos ligados a Congregação Cristã no Brasil, eles nunca foram fanáticos, extremistas, mas a questão de cortar o cabelo era um tabu e mantê-lo era uma virtude.
Com 12 anos, eu já não me identificava com a doutrina e sonhava em ter um cabelo curto e 'moderno". Aos 15 anos, decidi que era hora de cortar a cabeleira que não combinava com meu estilo, pois naquele tempo eu fazia curso de artes no CCSP e no Sesc Pompeia, tinha convicção que queria ser artista. Aquela história de bela, recatada e princesinha não era comigo.
A decisão acabou sendo um processo muito rápido. Nunca tinha cortado o cabelo em um salão de beleza; era um espaço que não conhecia bem, por isso, não sabia como escolher um profissional e nem tinha muito dinheiro. Essas razões mais a indicação uma amiga, acabaram me levando junto a uma caravana formada pelas minhas grandes amigas Isabel, Fabiana, Juliana e Cristine ao bairro Jardim Jaqueline.
Só uma das amigas conhecia o bairro. Eu morava no Butantã e as outras em Pinheiros onde estudávamos, me pego pensando hoje que um salão no Largo da Batata teria sido melhor. Confesso não ter
ajudado muito ao explicar como queria o trabalho, levei uns 15 modelos diferentes de cortes curtos e disse que queria algo mais ou menos assim.
A cabeleireira começou dividindo meu cabelo - que tinha uns 60 cm de comprimento, em quatro rabos de cavalo e cortou o primeiro na frente, rente à orelha. Naquele momento bateu o desespero! O primeiro corte já ficou mais curto do que eu achava ter combinado e desatei a chorar. Choro meu e o nervosismo da profissional, criaram um ambiente parecido com o filme
"Edward Mãos de Tesoura" porque a cabeleireira cortava cada vez mais e mais rápido. O resultado era uma franja no estilo Chitãozinho & Xororó e o comprimento de 5 cm de comprimento,
que por nunca ter sido cortado, ficava todo arrepiado. Nesse dia, coloquei umas 50 presilhas “tic tac” coloridas no cabelo para descer a juba que se formara e fui encontrar minha mãe na loja em que ela trabalhava. Ao me ver, ela tomou um susto e começou a chorar imediatamente.
Meu medo era a reação do meu pai, achava que ele pudesse ficar raivoso e me castigar, mas ao me ver ele também começou a chorar e evitou olhar para mim se trancando no quarto. Na escola, também foi um desencantamento geral: um garoto o qual gostava de mim, disse que todo o sentimento dele tinha se acabado. Até hoje quando ele me encontra ele não se conforme e fica lamentando dizendo “Como você era bonita!”
A questão é que para mim, esse processo foi uma libertação. Continuo usando cabelo curto e quando vejo uma garota de cabelos compridos penso mais em submissão do que em beleza.Recolher