Por uma farsa, tornei-me escritora

Na escola, cartazes das datas comemorativas eram coloridos com minhas rimas. Diante da folha branca, o lápis estava pronto para eternizar um verso. Era abril de 1997, a lição de casa era poetizar a chegada dos portugueses no Brasil. Me animei diante da próxima criação. Confiante, deixei para v...Continuar leitura

Na escola, cartazes das datas comemorativas eram coloridos com minhas rimas. Diante da folha branca, o lápis estava pronto para eternizar um verso. Era abril de 1997, a lição de casa era poetizar a chegada dos portugueses no Brasil. Me animei diante da próxima criação. Confiante, deixei para versar quando a inspiração não coubesse mais em mim. Até que fui surpreendida a um dia da entrega do trabalho. O lápis, que antes se rendia à criação, foi cúmplice da cópia: apresentei uma poesia já feita pela minha irmã mais velha. "Sem choro nem vela\ Eles ficaram contentes\ Conquistaram mais uma terra" - os versos me ganharam e era a solução mais fácil. O resultado da cópia apareceu mais tarde. Sem saber, as poesias foram inscritas em um concurso cultural promovido pela Prefeitura de Campinas (SP). E eu era uma das premiadas. No dia de receber o prêmio, a folha do certificado pesou em minhas mãos. Como eu, aspirante a poetisa, fui aplaudida por versos que não eram meus? O absurdo foi vivido com graça pelos meus pais. Minha irmã nem se importou. Foi então que o incômodo se fez inspiração. Prometi que meus próximos textos valeriam aquele prêmio. Por uma farsa, tornei-me escritora. Na busca de cumprir o prometido, o ponto final só é então colocado quando, na palavra que o preceder, me fizer levantar os olhos da folha. Com o olhar parado, se consigo reler com a imaginação, o lápis volta a ser meu amigo e eu peço seu perdão. O texto está pronto. Ele merece o prêmio. Sou escritora. Ponto final.Recolher