DONA MARIA: UM EXEMPLO DE MULHER
Maria dos Santos e Silva, de 83 anos, é uma senhora que tem uma vida de conquistas, por isso, merece ser contada para servir de exemplo e incentivo a muita gente. É uma mulher guerreira, determinada, alegre, simpática, divertida, ed...Continuar leitura
DONA MARIA: UM EXEMPLO DE MULHER
Maria dos Santos e Silva, de 83 anos, é uma senhora que tem uma vida de conquistas, por isso, merece ser contada para servir de exemplo e incentivo a muita gente. É uma mulher guerreira, determinada, alegre, simpática, divertida, educada, humilde, carismática e muito vaidosa. Está sempre bem vestida, perfumada e maquiada. Todos que a conhece, admira pela sua disposição. Seus 83 anos não a impede de acordar bem cedo para fazer caminhada e
atividade física na praça do Fórum. Tem uma vida bem dinâmica e alegre. Além das atividades físicas, que realiza diariamente, participa de todas as atividades religiosas da
Paróquia do seu bairro e dos bairros vizinhos. Não é natural de Bom Jesus, mas considera como sua cidade natal, pois há muito tempo veio morar aqui. Foi aqui que criou seus quinze filhos e acompanhou de perto o crescimento de Bom Jesus, outrora conhecida como Buritizinho.
Antes de vir para Bom Jesus, Dona Maria, como é conhecida, morava em Floriano, Piauí. Lá viveu sua infância com a família. Época da qual sente muitas saudades. Ela gostava de muitas brincadeiras, mas as de que mais gostava eram de
boneca, fazer piquenique
com suas amigas,
cantar e dançar para alegrar o ambiente.
Sempre que chegava alguma visita
em sua casa, iam logo pedindo para que dançasse. Sem nenhuma timidez e com muita simpatia, subia numa mesa e começava a cantarolar e a dançar, só para ouvir os aplausos e elogios de todos. Infelizmente, tudo passou muito rápido e daquele tempo só lhe restou as doces lembranças.
Um certo dia, aquela menina alegre, foi ao mercado municipal da sua cidade, comprar
temperos que sua mãe havia pedido. Era um local simples, popular, daqueles que os feirantes espalham suas mercadorias pelo chão ou em prateleiras de madeira. De repente, percebeu que estava sendo seguida por um rapaz desconhecido. Sentiu medo, principalmente porque ele era um policial. Naquela época, as pessoas se intimidavam com a presença de soldados. Ela tentou despistá-lo, mas nada adiantou.
Ele a seguiu até à sua casa. Dias depois, foi à sua residência para pedir sua mão em casamento. E para sua maior tristeza, os pais aceitaram, pois era um rapaz mais velho, tinha um emprego e por isso era considerado um bom partido. Daquele dia em diante, sua fase de brincadeiras chegara ao fim.
Logo aconteceu o casamento. Foi simples, em casa, com a presença de poucos convidados. Apenas familiares e alguns amigos. Quando viu chegar um carro cheio de policiais e o juiz que realizaria a cerimônia, sentiu medo e teve a certeza de que aquele momento não era apenas um pesadelo. Não queria se casar, pois era muito jovem, apenas 14 anos. O noivo tinha o dobro da sua idade. Além disso, não eram namorados. Em meados da década de 40, o namoro era bem diferente. Os jovens não tinham oportunidade de se conhecer melhor. Era um como vai, um aperto de mão e só. Os pais eram quem decidia se o rapaz servia ou não para casar. Hoje é tudo mudou, diz ela.
Lembra que naquela tarde,
foi arrumada e colocada na sala como se fosse uma boneca, pois não lhe deram a oportunidade de decidir a sua própria vida. Foi assim que aconteceu, porém esclarece que nunca disse “O sim”. A lua de mel não foi nenhum conto de fadas. Não foi fácil dividir o mesmo quarto com um estranho. Apesar de tudo, cumpriu o juramento feito perante o juiz e testemunhos “lhe prometo ser fiel na saúde e na doença... até que a morte nos separe.”
Alguns dias depois, viajaram para a cidade de Guadalupe, Piauí. A viagem foi em embarcação e demorou dias para chegar ao destino. Essa foi a primeira viagem do casal. Morou em várias cidades, até chegar em Bom Jesus. Recordou que vieram de mudança em um pau de arara, transporte mais usado na época. O carro vinha carregado com mantimentos para serem vendidos aqui. Era um dia chuvoso. Foi o começo de uma nova fase em sua vida.
Bom Jesus era uma cidade simples, com casinhas pequenas e cobertas com palhas de buriti. Somente os senhores donos de fazendas ou proprietários de comércio, tinham casas cobertas com telhas e paredes pintadas. Não havia energia elétrica. As ruas eram calçadas, os meios de transportes eram cavalos, mulas, jumentos e carro de boi para transportar alguma mercadoria. Sua primeira moradia foi num presídio, num quartinho pequeno, sem ventilação, porta baixa, para passar era preciso se abaixar. Só lembrando, morou num presídio, mas não era presa não, é porque seu esposo era policial.
Foi aqui que Dona Maria e esposo conseguiram sua primeira casa. Era pequena, sem piso e com teto coberto de palha. Apesar da simplicidade dava para abrigar seus filhos que chegavam. A cada ano era um. Foram quinze filhos. Foi o fato mais marcante da sua vida. Eram seus companheiros.
Ensinou-lhes a ser honestos e trabalhadores. Mostrou para eles a importância dos estudos. Apesar de não ter estudado por falta de oportunidades, não media esforços para que frequentassem a escola. Alguns conseguiram se formar, outros não.
Seu dia a dia não era fácil, pois trabalhava muito para cuidar das crianças. Não havia água encanada em casa, tinha que buscar no grotão, com um balde na cabeça. Costurava, lavava roupa no rio, cozinhava à lenha, fazia todas as tarefas domésticas. Diversão! Não fazia parte da sua rotina, pois não sobrava tempo. Já seu esposo, nos dias de folga do trabalho, comenta, tinha tempo para sair com os amigos para se divertir, beber e jogar nos bares e ela ficava na companhia de seus filhos.
Quando os filhos começaram a estudar, não tinha dinheiro para comprar materiais escolares para todos. Foi aí que resolveu fazer pasteis para vender que aprendera fazer ainda bem jovem. Aquilo era novidade na cidade, não havia outra vendedora de pasteis.
Com isso, conseguia um dinheirinho para ajudar nas despesas. Ela conta que, às vezes, brigava com os açougueiros, porque só queriam vender para ela a pior carne. A carne boa era para os “senhores”, pessoas de melhores condições financeiras.
Diante das dificuldades econômicas, tinha uma alimentação simples, à base de arroz, feijão, beiju, mucunzá, cuscuz feito de milho pisado em pilão. Raramente comiam carne, pois era difícil de encontrar para comprar. Agora, a cidade oferece quase tudo
de que a população precisa. Não só em alimentos, mas também
em educação, transportes, tecnologia, saúde, etc.
Bom Jesus foi se desenvolvendo, chegou a energia elétrica na cidade, depois a televisão. Era um espetáculo quando o Armazém Paraíba instalava uma em praça pública. Ela ficava maravilhada com aquelas imagens. Como não podiam comprar uma, seus filhos saiam para assistir na vizinhança, que muitas vezes fechavam a porta da casa para que elas não entrassem. Diante daquela situação de humilhação, decidiu que compraria uma. Criou coragem e foi ao Paraíba, única loja de eletrodoméstico da época, e comprou em várias prestações. Quando foram fazer a entrega, a euforia tomou conta de todos. Teve que aumentar a produção de pasteis para pagar todas as prestações. Foi um acontecimento marcante na sua vida. Naquela época, as mulheres não tinham autonomia para tomar qualquer decisão sem a permissão do marido.
Daquele dia em diante, percebeu que aquilo que desejava poderia se tornar realidade. Só bastava ter força de vontade. Começou a conquistar cada vez mais os seus sonhos.
Quando os filhos já estavam crescidos, ficou viúva. Ao contrário de muitas, ergueu a cabeça e recomeçou sua história. Aos 78 anos resolveu estudar. Frequentou a escola Araci Lustosa por dois anos. Aprendeu a ler e a escrever. Disse que ficou muito emocionada quando aprendeu a pegar no lápis e a rabiscar as primeiras letras. Foi a partir daí que se sentiu mais completa.
Para ela, sem a educação o mundo não tem como melhorar. “A educação é a maneira de transformar a vida de uma pessoa”.
Atualmente, Dona Maria está com 83 anos, dos quinze filhos estão vivos treze ,que lhe deram quarenta e sete netos, vinte e nove bisnetos e quatro tataranetos. Continua uma mulher alegre, animada, gosta muito de ir à igreja, conversar com amigos e familiares. Se sente feliz, livre para fazer suas próprias vontades e alcançar suas metas. Viaja sempre que possível. Já conheceu várias praias como Praia do Futuro, em Fortaleza, Rio de Janeiro, Parnaíba etc.. Mora numa casa melhor que a dos sonhos: bonita, confortável, paredes pintadas e teto coberto de telhas. “Um palácio”.
Ela Não pôde voltar à infância perdida, porém conseguiu traçar novos caminhos e hoje, faz tudo o que deseja e lhe faz bem. Para ela, a vida deve ser vivida intensamente. A felicidade é o limite. O que pretende daqui para frente? Curtir cada dia com muita alegria... Com ela, pôde-se aprender que apesar das dificuldades, os sonhos devem ser alimentados e que a educação é um meio para transformá-los em realidade.
Essa é a Dona Maria dos Santos e Silva.Recolher