I – PRIMEIRA INFÂNCIA E PARTE DA ADOLESCÊNCIA (0 aos 13 anos)
Na tentativa de evocar as lembranças de um passado já distante, dividirei os registros em 3 etapas; a primeira infância e parte da adolescência, a segunda parte da adolescência a juventude e a idade adulta. Geminiana, nascida ...Continuar leitura
I – PRIMEIRA INFÂNCIA E PARTE DA ADOLESCÊNCIA (0 aos 13 anos)
Na tentativa de evocar as lembranças de um passado já distante, dividirei os registros em 3 etapas; a primeira infância e parte da adolescência, a segunda parte da adolescência a juventude e a idade adulta. Geminiana, nascida em 10 de junho, no interiorzão do Estado do Paraná, numa localidade chamada Espigão Alto. Sou mais ou menos, a filha do meio de 13 irmãos (2 morreram ao nascer e uma, aos 5 meses de idade). Meu pai trabalhava na roça, plantando o básico: milho, feijão, mandioca, batata doce e hortaliças, apenas para o consumo da família. Para comprar o que faltava: arroz, óleo,
carne, café e leite - trabalhava por empreitada para outros agricultores da região. Não tínhamos luz elétrica, e nos ligávamos ao mundo por meio de um pequeno receptor, um radinho de pilha. Nosso meio de transporte, eram nossas próprias pernas, andávamos grandes distâncias a pé.
Nossa diversão. Que diversão? Nem mesmo sabíamos o que era isso. O gosto pela música vinha da igreja presbiteriana, a única que tínhamos no bairro, e das modinhas de viola, ouvidas no rádio. Os 10 irmãos eram afinados. Cantávamos forte e em vozes bonitas, harmoniosamente diferenciadas. Toda criança gosta de ouvir histórias e dormir na casa das primas: Nira, Neusa e Eloina era uma grande euforia, para ouvirmos a história de Joãozinho e Maria, contada pela nossa tia.
Meu pai era um homem alegre, tinha uma voz potente. Era o assador de carne e gostava de dançar nas poucas festas de que me lembro ter participado. Era também um excelente contador de causos, a beira do fogo. Mas só contava quando recebíamos visitas ou nos puxirões.
Novembro e dezembro eram os meses mais alegres do ano, pois neles começavam os preparativos para a comemoração do natal. Decorávamos poesias, diálogos, peças e músicas natalinas com grande entusiasmo. Até hoje, guardo na memória, partes de um diálogo em que
minha prima Nira era a Mangedoura e eu era a Estrela. Ei-lo:
Estrela
Eu moro nas alturas consteladas, e ando por entre gáseas nebulosas no Édem onde as estrelas são as fadas de longas cabeleiras luminosas. A via láctea, o tálamo argentino Onde derramo toda a minha luz, iluminar o céu é meu destino, pois para isso na amplidão me pus.
E tu, quem és, humilde mangedoura para que contes toda a tua glória? Hás de passar e eu sou imorredoura pois não tem fim a minha trajetória.
Mangedoura
Eu nada valho diante de uma estrela que enche o infinito todo de clarão porém não seu eu fulgurante e bela, a minha glória não é sem razão. Vivo na terra, habito com a pobreza e nada sei da tua formosura Sou palha seca, seca e sem beleza, pois só o pobre pária me procura. Os bois que mugem ao cair do dia buscam-me sempre com satisfação. Porque meu feno a fome que os crucia, vai lhes servir de abençoado pão...
Aprendemos a ler e a escrever na escola isolada do bairro, sob a batuta do Professor Gerônimo Valentim Guimarães. Homem inteligente e autodidata. O único método que conhecia e reconhecia como o correto era o tradicionalzão. Sendo assim, levava ao pé da letra o velho ditado “escreveu, não leu, o pau comeu”. Era tenso, e muito comum, assistirmos colegas sendo humilhados perante a turma e/ou levando surras e castigos com varas de marmelo.
Sempre fui boa aluna, talvez por isso nunca tenha apanhado. Queria avançar nos meus estudos, pois meu objetivo era superar aquela condição de extrema simplicidade e pobreza em que vivíamos, e para tal, só estudando. Desde que aprendi a pronunciar as primeiras palavras eu dirigia a Deus uma prece: “Papai do céu, eu quero ser professora e quero aprender a tocar gaita”.
II – SEGUNDA PARTE DA ADOLESCÊNCIA (13 aos 19 anos)
Apesar da pouca idade e parcos recursos, minha única chance de avançar e superar aquela situação, era mudar para a cidadezinha mais próxima, Jaguariaíva, a sede do município, onde teria chances de trabalhar e continuar os estudos. Trabalhei na casa de uma enfermeira, como babá, cuidando de 4 crianças. Ao conversar com as vizinhas da minha patrôa, eu afirmava: esta situação é provisória, pois eu serei professora universitária. Muitas vezes esta minha afirmação foi motivo de risos, pois elas eram incapazes de vislumbrar para mim, um futuro diferente.
Ao completar 14 anos, fui chamada para trabalhar na camisaria das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, onde já trabalhavam minhas irmãs: Alzira e Maria do Carmo. Elas trabalhavam no regime de turno, na tecelagem e na sacaria e eu faria o horário normal. Trabalhei numa máquina de furar colarinhos, pelo período de um ano, quando a minha seção fechou. Fui transferida para outro setor, mas não me adaptei com o regime de turnos e comecei a faltar ao trabalho para ficar lendo gibis (começou aí meu período de rebeldia que durou bem pouquinho).
Foi quando meu irmão, Joaquim, que pastoreava a Igreja Presbiteriana Independente de São Francisco do Sul-SC, foi nos fazer uma visita e me levou para morar com ele.
Lá voltei a frequentar a igreja e estudar a 5a. Série do antigo ginásio. Um ano depois, agora com 16 anos, mudei com o Rev. Palmiro e sua família para estudar Teologia, no Instituto Bíblico de Arapongas, onde permaneci por 2 anos, mudando depois para o ISBL (Instituto Bíblico de Londrina), onde concluí o curso de Teologia e dei início ao ensino médio (Técnico em Química Industrial). Com 19 anos, retornei para Santa Catarina e fiz o vestibular para Pedagogia.
III – JUVENTUDE E IDADE ADULTA
Estava dividida entre o desejo de voltar para Londrina e dar continuidade ao curso técnico em Química Industrial, ou matricular-me na Faculdade de Pedagogia na Associação Joinvilense de Ensino. As duas situações exigiriam um patrocinador, uma vez que não tinha renda própria e nem emprego. Consegui um estágio pelo projeto Rondon, e comecei a trabalhar no setor de perícia médica do INSS, em São Francisco do Sul, de onde saía, diariamente, uma Van com os universitários para Joinville. O que eu ganhava (um salário mínimo) era insuficiente para pagar o transporte e a mensalidade da faculdade particular. Foi quando, finalmente ganhei uma bolsa do MEC, e isso me possibilitou cursar a faculdade até sua conclusão, quando já estava trabalhando como professora, no setor de treinamento da empresa Döhler S/A, e a seguir, como ACT, numa escola estadual. Começava aí, a realização do meu sonho de criança, mas ainda faltava um detalhe.
Neste período, casei, tive filhos. Constituí minha família. O mestrado veio mais tarde, quando já morava em Florianópolis.
O sonho se realizava por completo. Agora, como professora universitária. A música, sempre aconteceu, tanto antes, quanto durante e de forma paralela ao magistério. Cantei no Coral da Assembléia Legislativa de Santa Catarina – ALESC, e em 2013, me formei no curso de instrumentos de orquestra do IFSC (viola), fazendo parte da orquestra experimental (OEX), até julho deste ano. Hoje, sou professora aposentada, mas nunca parei de estudar. Atualmente, participo do curso de Contação de Histórias e Mediação de leitura animada no CIC – Centro Integrado de Cultura e Biblioteca Municipal de Florianópolis.Recolher